54185167 SAUTCHUK Carlos Ciencia e Tecnica

April 21, 2019 | Author: baader | Category: Anthropology, Ciência, Ethnography, Homo Sapiens, Sociology
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Ciência e Técnica Carlos Emanuel Sautchuk 

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Introdução

A expressão ciência e técnica como designação de tipos de pesquisas ou temas da Antropologia é recente no cenário brasileiro. Teve início nos anos 1990, firmando-se como identificador explícito apenas neste século, quando se consolidou como forma de reunir linhas de reflexão antropológica com orientações originais diferentes. Essa situação se diferencia da Sociologia brasileira, onde a análise de fenômenos como as políticas públicas e as profissões alavancou os estudos sobre ciência e tecnologia, tornando-os um campo profícuo, que se desenvolve de maneira relativamente coesa e bem estabelecida no seio da disciplina. Ao contrário, o que permite falar de Antropologia da ciência e da técnica no cenário brasileiro é a reunião de linhas diferentes de pesquisa convergindo para algumas questões semelhantes. semel hantes. Pensando na produção atual e nas perspectivas futuras, três campos se conectam a este movimento  – ciência, cultura material e biotecnologia. Dito isso, é possível mirar por dois ângulos a produção antropológica sobre ciência e técnica no Brasil. O primeiro deles, ao qual esse texto se dedica, é diacrônico e particular, evidenciando que cada um desses campos apresenta desenvolvimento próprio, tendo derivado para a reflexão sobre ciência e técnica mais recentemente. O outro ponto de vista é sincrônico e comparativo, indicando que nichos de investigação aparentemente distintos tem convergido para discussões similares, recorrendo a reflexões de mesma ordem. Essa perspectiva permite notar que a reunião dos três campos se apóia no fato dessas manifestações da Antropologia feita no Brasil empreenderem uma análise sobre as formas de sociabilidade ou sobre o estatuto do humano (ou da pessoa), a partir das relações estabelecidas com diferentes tipos de não humanos, sejam eles extraterrestres, animais, artefatos, grafismos, embriões ou genes. Os diferentes estudos aqui analisados voltam-se, ainda que de maneira particular, ao fato de que a dimensão não humana da vida social é extremamente relevante para o enfoque das formas de sociabilidade e das noções de humanidade. Guardadas as especificidades de cada área de estudo, esse intuito geral vale para o índio Carlos Emanuel Sautchuk  é professor do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília, onde coordena o Laboratório de Antropologia da Ciência e da Técnica (LACT).



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que trança um cesto, o cientista que observa um macaco ou o casal envolto nos procedimentos de reprodução assistida. Ao focar esses tipos de situações, os antropólogos têm analisado as construções cosmológicas que organizam a distribuição e as características de humanos e não humanos. Num outro nível, isto aponta para abordagens preocupadas, em diferentes graus e perspectivas, em repensar a dicotomia entre cultura e natureza e suas tributárias (artificial e natural, sujeito e objeto etc.), que perpassam tanto a modernidade de modo geral quanto o próprio fazer antropológico. 1 No registro dessa preocupação com a manifestação da modernidade (na antropologia e/ou em seus “objetos”), cabe comentar algo sobre a preferência pelo

termo técnica, e não tecnologia, na definição do escopo deste texto. Em primeiro lugar, como fica evidente pelo próprio delineamento das abordagens tratadas neste artigo, ciência e técnica não demarcam um objeto empírico  –  não se trata de abordagens antropológicas voltadas ao domínio da “ciência & tecnologia” nos Estados modernos  –  mas são noções tomadas antes na qualidade de categorias analíticas a orientar a investigação antropológica. Nesse sentido, adotar o termo técnica não indica rejeição, mas cautela em relação a tecnologia. Se no contexto anglo-saxão e no Brasil de modo geral o vocábulo tecnologia é mais acionado, entre francófonos técnica ganha mais importância e abrangência. Veja-se a tão importante quanto pouco lembrada produção de Mauss (2006) sobre o tema, onde tecnologia é compreendida como o estudo da técnica. É verdade que existe alguma correspondência entre os dois termos, atestada, por exemplo, na tradução para o inglês de autores como Latour, Foucault, Ellul, Daumas, Mauss, Lemonnier, onde technique no original é vertido como technology. Mas essa equivalência é parcial e pode dar margem a algumas confusões. Tanto assim, que diversos autores franceses incomodam-se com o emprego do termo tecnologia, considerando-o equivocado ou abusivo (Séris, 1994, p. 3-6; Sigaut 1994, p. 442; Latour 2001, p. 219). E mesmo Bryan Pfaffenberger, em Social Anthropology of Technology 1

Não foram consideradas aqui as pesquisas dedicadas à relação entre conhecimentos tradicionais e ciência moderna, assim como aquelas relativas à cibercultura, ainda que, em alguma medida, elas guardem proximidade com o tema. Além disso, dada a desproporção entre o campo a resenhar e as dimensões do texto, pareceu-me necessário renunciar a qualquer pretensão de ser exaustivo, guardando, entretanto, o objetivo de ser indicativo das principais tendências. Trechos deste trabalho receberam a leitura de Mariza Peirano, Marcela Coelho de Souza e Guilherme Sá, a quem agradeço a gradeço pelas observações, as quais nem sempre consegui atender. Ao Guilherme devo também boas indicações sobre estudos relativos ao tema; cabe a mim, igualmente, a responsabilidade por não ter incorporado devidamente todas A ntropologia da as informações repassadas. Versão inicial deste texto foi apresentada na  II Reunião de Antropologia , em maio de 2009, na Universidade Federal de Minas Gerais ( (UFMG). UFMG). Ciência e da Tecnologia 2

(1992), propõe a substituição do termo tecnologia por técnica ou por sistema sociotécnico. Não se trata de fazer a defesa de uma linha de pensamento em detrimento da outra seria, o que seria, no mínimo, prova de um estreitamento teórico inoportuno para um esforço de mapeamento. O cenário brasileiro não permite que se tracem linhas absolutas, pois se cruzam ambas as tradições e ambos os vocábulos. Portanto, a escolha do termo técnica aqui justifica-se, antes de tudo, por abrangência e cautela. Explicitemos isto a partir da seguinte indagação: dado que tecnologia não se refere ao estudo da técnica, o que justifica a adição do sufixo “logos”? Tecnologia pode

sugerir o superlativo de técnica, no sentido de outra ordem, racional, mais sofisticada, com métodos complexos, consciente dela mesma, de suas necessidades e finalidades, informada por um saber especializado e científico, associado ao progresso. Opor-se-ia, assim, às técnicas ditas “rudimentares”, baseadas no empirismo ou no conheciment o intuitivo, arraigada nas convenções. Assim, o valor associado ao termo tecnologia estaria conectado à dicotomia moderno-tradicional, enquanto transformação radical. Em acepção um pouco diferente, tecnologia pode significar a dimensão intelectual da técnica, isto é, os conhecimentos, saberes, conceitos relativos a alguma operação material, o que remete à separação entre domínio ideal e material. Ainda que em certas análises as transformações instauradas pelo mundo industrial ou as elaborações abstratas relativas à técnica devam ganhar ênfase, parece injustificado admitir isso como distinção a priori, extensiva a todas as situações. Tecnologia pode também significar coletivo de técnicas. Este uso, consagrado entre antropólogos anglo-saxões, remete à ideia de que as técnicas se reuniriam em sistema, ou pelo menos num conjunto que se relacionaria com outros (de humanos, símbolos etc.). Assim, artefatos estariam primariamente em relação com artefatos, e este sistema, caracterizado pela cultura material, manteria uma relação de outra ordem com a sociedade. Essa distinção fundamental entre o humano e o técnico (derivada do pensamento hilemórfico, cf. Simondon [2001]) sustenta o dilema entre tecnotopia e tecnofobia, tão característico do pensamento moderno (cf. Ribeiro, 1999). Note-se então que considerar as técnicas enquanto um sistema próprio, em alguma medida exterior, não raro dominado ou dominando a vida humana extratécnica, pode implicar em um viés etnocêntrico, instaurando importantes limitações heurísticas. Ver-se-á que tal dicotomia está em contradição com parte considerável do esforço reflexivo avançado nos estudos analisados a seguir. 3

Enfim, a opção pelo termo técnica não se deve à afirmação de um tipo de abordagem, mas à reserva epistemológica e à cautela empírica face aos pressupostos que podem subjazer ao uso do termo tecnologia. Pode-se dizer, então, que o termo técnica não se opõe, mas engloba os diferentes usos de tecnologia. Isso parece especialmente importante quando se trata de designar todo o escopo de abrangência do tema na Antropologia praticada no Brasil. Cultura material

Ao introduzir um artigo sobre habitação popular, Luiz de Castro Faria notou que os estudiosos das populações de origem africana no Brasil privilegiavam os aspectos religiosos e sociológicos, um “unilateralismo” que prejudicava a compreensão dos “bens materiais de cultura” (Castro Faria, 2000, p. 339 -340). Esta frase, publicada em

1951, ressalta dois aspectos significativos sobre os desenvolvimentos ulteriores dos estudos de cultura material na Antropologia brasileira. O primeiro deles é o alcance relativamente limitado em que este campo de pesquisa se manteve no quadro de interesses da antropologia no Brasil, se comparado com a qualidade dos estudos realizados. Outro ponto é que a forma como Castro Faria buscou minorar essa carência, no decurso de sua longa carreira como pesquisador e professor, pode ser tomada como representativa dos tipos de preocupações que pautaram os antropólogos dedicados à materialidade. Como se sabe, dentre sua vasta contribuição à formação da Antropologia brasileira destacam-se a aproximação (e a crítica) aos museus, estudos arqueológicos, escritos sobre a arte indígena, cursos sobre Antropologia econômica, além da participação decisiva na implantação da legislação referente ao patrimônio histórico cultural. Esse rol de temas explorados por Castro Faria, se não está na origem direta de todas as abordagens contemporâneas à cultura material no Brasil, pode ser tomado como um quadro indicativo delas, conforme apresentadas a seguir. Comecemos por sua influência sobre os estudos de populações de pescadores. Ela pode ser sentida na abordagem que, enfocando as questões ambientais e políticas, não descuida da dimensão técnica e econômica, empreendendo descrição e análise cuidada das diferentes formas de pescaria (Kant e Pereira, 1997). Os detalhados resultados de uma pesquisa etnográfica ao longo da história de uma comunidade pesqueira e as transformações em seu ambiente natural e sociopolítico podem ser vistos

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na obra Gente das areias (Mello e Vogel, 2004), que situa boa parte de seu interesse nas técnicas relacionadas ao ambiente. A preocupação com o trabalho, como apropriação dos recursos valendo-se das técnicas, é que articula os diferentes planos da análise, e define um papel importante na dinâmica explicativa destas pesquisas para a dimensão econômica. Nisso pode ser encontrado um traço mais geral dos estudos sobre sociedades de pescadores entre pesquisadores brasileiros (por exemplo em Furtado, 1993; Chaves, 1973; Mussolini, 1980). Esse viés preocupa-se com os modos de apropriação dos recursos naturais, ainda que priorize mais uma leitura socioeconômica do que propriamente técnica. Assim, a ênfase recai sobre as formas de socialização e de relação com o ambiente, enquanto modo de reprodução. Mas é notável que, se os estudos sobre pesca no Brasil emprestam importantes balizas teóricas dos de campesinato (como o trabalho articulando ambiente, economia e sociedade), eles investem mais na etnografia das atividades técnicas como forma de compreensão das dimensões socioeconômicas. Malgrado algumas referências rápidas, é curioso notar que as clássicas contribuições de André Leroi-Gourhan (1983, 1984) à Antropologia da técnica não ecoam nas correntes de pesquisa sobre cultura material no Brasil. Sem explorar aqui as razões disso,2 limitemo-nos a apontar sua influência em trabalhos recentes. Em dissertação sobre as transformações das habitações kaiowá, Mura (2000) explora o ambiente doméstico indígena face aos diversos planos do contato interétnico, recorrendo a três horizontes teóricos: a Antropologia da técnica francesa, a Antropologia econômica de Godelier e a elaboração da etnicidade inspirada em Barth. Assim, sua análise não adota a distinção entre técnica indígena e técnica ocidental, buscando compreender a constituição da materialidade num ambiente de fluxos de diferentes ordens (matérias-primas, mercadorias, conhecimentos etc.). Inspirado noutra faceta de Leroi-Gourhan, abordei a gênese associada de humanos e técnicas, ou ainda, a tecnogênese do humano (Sautchuk, 2007). Considerei as atividades de pesca costeira e lacustre no estuário do Amazonas a partir da conexão entre habilidades técnicas (Ingold, 2000) e construção da pessoa, buscando compreender os sentidos de humanos e de não humanos (como artefatos e animais) a partir dos engajamentos práticos.

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Ausência tanto mais notável quanto Leroi-Gourhan se dedicou longa e profundamente à relação entre técnica e estética e à própria noção de arte, que, veremos a seguir, são fundamentais nas abordagens da cultura material indígena. 5

Por outra, anoto que um dos âmbitos da pesquisa sobre cultura material que tem crescido em número e importância é influenciado pelas políticas públicas de identificação de saberes e técnicas enquanto patrimônio cultural imaterial. É preciso distinguir ao menos três níveis diferentes de implicação da Antropologia com esse movimento: a atuação na identificação de bens culturais, a reflexão antropológica sobre a patrimonialização (cf. Carneiro da Cunha, 2005; Coelho de Souza, 2005; Gallois, 2007) e os estudos de relevância antropológica associados a tais políticas. Sobre esse último ponto, cito dois exemplos que indicam a diversidade e o valor que podem assumir: a elegante etnografia sobre alfaiatarias em Curitiba (Santos et al., 2009) e a valiosa pesquisa sobre os sistemas agrícolas do rio Negro (Emperaire et al., 2008; Emperaire, 2005). Esta última apresenta dois pontos a ressaltar. O fato de a pesquisa ser levada adiante por uma equipe capaz de lidar com múltiplas dimensões do fenômeno agrícola  –  como sói acontecer nesse tipo de projeto  –  aponta provavelmente uma tendência metodológica. Depois, por contribuir à redução da insondável lacuna nos estudos sobre cultura material dedicados às técnicas de cultivo e aos processos de disseminação agrícola, ela indica um dos campos potenciais para seu desenvolvimento. Mas é nos trabalhos voltados às populações indígenas que a análise da materialidade multiplicou-se, constituindo uma tradição de estudos. A começar pela etnoarqueologia, que estabelece associações entre o passado de uma população e a forma em que estão relacionados atualmente artefatos, conhecimentos e ambiente (cf. Silva, 2009; Silva e Souza, 2002; Funari, 1998; Ribeiro, 1990). Para ilustrar o tom recente deste debate  –  sobre a relação entre dados etnográficos e arqueológicos  –  notemos que Silva (2007, p. 102) afirma, baseada em etnografia sobre fabricação e uso de artefatos, que as formas de descrição e classificação através da qual são estabelecidas as periodizações arqueológicas em geral, não levam em consideração os mecanismos mais complexos de produção de identidades sociais externas e internas aos grupos. Tais aspectos podem ser acessados pelo estudo etnográfico da produção e da circulação de artefatos, associado às categorias êmicas usadas para referir-se a eles. Ao dar-se conta das tensões entre tecnologia e agência, continuidade e mudança, a etnografia pode assim auxiliar na melhor compreensão de comportamentos e trajetórias de populações. É movida por estas preocupações que Silva (2002) escreve um dos raros trabalhos realizados no Brasil em que se traça um panorama de propostas teóricas sobre a relação entre técnica e significado no âmbito da Antropologia.

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Por outro lado, são bem conhecidas as abordagens relacionando expressões materiais e simbólicas das sociedades indígenas com base em material etnográfico. A esse propósito sobressai o nome de Berta Ribeiro, que, além de suas próprias pesquisas, organizou os três volumes da Suma Etnológica Brasileira (Ribeiro, 1986). Das várias facetas de sua obra,3 sublinhemos duas: a ênfase na forma como um aspecto central na descrição e classificação dos artefatos (Ribeiro, 1988); e o intuito de “estudar a cultura

material como uma iconografia étnica” (Ribeiro, 1986, p. 12; cf. também 1989), o que confere à dimensão estética a chave de abertura para o sentido simbólico da vida material indígena. Inclusive, é sob influência desse princípio que se desenvolve uma linha importante de trabalhos acerca da iconografia indígena, em suas múltiplas manifestações (Vidal, 1992). Não se trata de negar que também compunha o programa de pesquisas de Berta Ribeiro (1995) a “tecnoeconomia”, isto é, a dimensão da materialidade diretamente

voltada à relação com o ambiente e à subsistência, incluindo processos de fabricação e uso. Mas digamos que estas duas disposições  – a “forma” como dado privilegiado e a “estética” como dimensão reveladora –  são cursos principais de sua reflexão, assim

como da maneira como antropólogos brasileiros lidam com a cultura material. Penso que, em alguma medida, isto seja um subproduto do fato mais geral de a etnologia no Brasil se constituir em contraposição às interpretações materialistas de diferentes ordens, enfatizando para tal a organização social e o simbolismo. O texto de síntese de Vidal e Silva (1992) evidencia bem os pressupostos e as potencialidades desse enquadramento. A ênfase na noção de um sistema de objetos como base empírica e na articulação entre arte e cultura material como horizonte compreensivo é fundamental. Mas o refinamento etnográfico alcançado por esses trabalhos deve-se também à formação em artes ou museologia de parte considerável dos antropólogos responsáveis por elas. 4 Isto não é negligenciável, tanto mais se considerarmos que um dos desdobramentos mais instigantes nesse cenário é a reflexão sobre a noção ocidental de arte e o modo como ela incide na compreensão antropológica (nessa linha, cf. Costa, 1988 e Velthem, 2000). A título de exemplo, citemos as ideias de criatividade individual, autoria e autenticidade, que se revelam muito diferentes no mundo indígena. 3

A esse respeito, ver Velthem (1999) e Botelho (2005). É o caso de Berta Ribeiro, Heloísa Fénelon Costa, Lux Vidal, Lúcia van Velthem, Aristóteles Barcelos Neto etc. 4

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Contudo, este desdobramento na reflexão sobre a estética indígena somente pode ser considerado em associação com outro fator, que diz respeito à etnologia de modo geral. A partir da década de 1980 torna-se explícita a percepção de que há “necessidade de se tomar o discurso indígena sobre a corporalidade e a pessoa como informador da  práxis social concreta” (Seeger et al., 1979, p. 16). Há então uma conexão produtiva

entre a tradição de pesquisa da materialidade em tela  –  com um olhar atento à iconografia, inclusive à ornamentação corporal  –  e a aproximação às dinâmicas de formação da pessoa através do idioma da corporalidade. Nessa direção, recente leva de pesquisas renova os estudos sobre cultura material, basicamente operando com as noções de alteridade e de agência, como Velthem (2003), Lagrou (2007), Barcelos Neto (2008) e Miller (2009). A trajetória de Lúcia van Velthem expressa os principais capítulos da transformação na abordagem da cultura material na Antropologia brasileira. Suas primeiras publicações, a exemplo da dissertação sobre a cestaria Wayana, dão prova do rigor descritivo, da minúcia no tratamento da produção e da forma dos artefatos e de seus motivos gráficos. Já em O belo é a fera , explorando o vínculo necessário entre beleza e predação, Velthem (2003) compreende a estética Wayana frisando que os objetos e os padrões figurativos não constituem obras puramente humanas, mas são recebidos ou arrebatados de outros seres, sejam eles animais, inimigos, sobrenaturais etc. De modo que a decoração é uma forma de “integrar o que lhe é estranho, de

assimilar o outro como condição da própria identidade, individual e coletiva, capacidade esta veiculada através da arte que se revela para os Wayana enquanto possibilidade de afirmação de humanidade” (idem, p. 389). Não só a relação com a alteridade é condição de humanidade, mas dado que a “fabricação” tanto de coisas como de pessoas,

independente de sua constituição material, é concretizada de acordo com uma mesma técnica, a grande questão aqui é detectar “o que há de „humano‟ nas coisas e o que há de „coisa‟ nos humanos” (idem, p. 63, cf. Velthem, 2009).5

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Dedicando-se mais recentemente ao estudo de populações ribeirinhas no Acre, Velthem (2008, p. 11) constata que a fertilidade dos estudos sobre certas categorias artesanais dos povos indígenas (cestaria, plumária, cerâmica) contrasta com o tratamento meramente utilitário dado aos objetos envolvidos nos contextos produtivos de outras populações. Levando adiante essa constatação, seria o caso de acrescentar que muitas vezes esse desequilíbrio se apresenta no próprio âmbito dos estudos sobre povos indígenas. Nesse sentido, vale ressaltar que a emergência da noção de predação, que estende seu potencial heurístico a diversos planos da vida indígena, não tem gerado entre pesquisadores brasileiros uma valorização das aproximações etnográficas sobre a atividade cinegética propriamente dita. Aspecto que tem sido enfocado por antropólogos de outras nacionalidades, como Descola (1986), Ingold (1988 e 2000) e Kohn (2002). 8

Em seu estudo sobre o estilo gráfico kaxinawa, Lagrou (2007; cf. também 2002) também se afasta dos intentos classificatórios ou formalistas, que tendem, num segundo momento, a desviar a atenção dos objetos para os sistemas de pensamento. Ela trata de modo inseparável forma, sentido e ação, apoiando-se em Gell (1998) para levar adiante uma abordagem de objetos, artefatos e arte “como se fossem pessoas”. Isto é, objetos

cujo sentido não está no plano contemplativo, semiótico ou linguístico, mas advém de certas modalidades de agência, está em seus efeitos práticos (Lagrou, 2007, p. 54). A ideia mesmo de poder criativo é alvo de exame, suscitando a rediscussão tanto dos pressupostos de uma Antropologia da arte quanto da ideia de agência no mundo indígena. De modo que “pensar sobre arte entre os a meríndios equivale a pensar a noção

de pessoa e de corpo. Porque objetos, pinturas e corpos são assuntos ligados no universo indígena, no qual a pintura é feita para aderir a corpos e objetos são feitos para completar a ação dos corpos” (idem, p. 50) .

Esse movimento nas abordagens da cultura material, a partir das ideias de fabricação de corpos e pessoas e da alteridade como dimensão constitutiva, reorganiza a própria forma de atribuição da qualidade de sujeito e de objeto, estabelecendo um quadro relacional e situacional para a compreensão do sentido dos seres e das coisas. É de se prever, então, que isto oxigenaria fortemente temas próximos, como os associados à circulação dos objetos. Refiro-me à inserção de objetos industrializados no meio indígena (cf. Ramos e Albert, 2002) e, de outro lado, ao trânsito de objetos indígenas no mundo não indígena, particularmente nas situações de sua comercialização e musealização. Baseado em detalhado estudo sobre máscaras rituais xinguanas, Barcelos Neto (2006 e 2008) estende-se a respeito dos múltiplos sentidos da musealização, inclusive na ótica indígena, tema de interesse crescente (por exemplo em Gordon e Silva, 2005). Por fim, é o caso de constatar que objetos (nos dois sentidos: artefatos e temas de estudo) outrora relegados aos capítulos sobre cultura material, ganham vida no cerne da etnologia contemporânea. Penso que isso faz parte de um deslocamento mais amplo no modo de compreensão das populações indígenas  –  de suas concepções de humanidade e práticas de socialidade  – , que dá mostras de passar de modo cada vez mais intenso pelos não humanos – artefatos, animais, espíritos. Técnicas do vivo

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Dos três temas definidos no escopo deste artigo, este é sem dúvida o mais profuso e difuso, de modo que sobressairá mais aqui o caráter apenas indicativo das referências e comentários. De sorte que inicio lembrando que os termos técnica/tecnologia/biotecnologia são recorrentes nos estudos sobre as práticas de saúde em geral, o mais das vezes conotando o processo mesmo de medicalização, remetendo às dinâmicas de construção de gênero e/ou de subjetivação, com marcada influência foucaultiana (a exemplo de Rohden, 2004; Leibing, 2004; Duarte e Leal, 1998). Visto que a amplitude dessa produção escapa ao objetivo deste artigo, interessarão apenas aqueles estudos que lidam mais explicitamente com a questão da técnica como mediação entre o humano e o não humano na modernidade. Ou seja, os dedicados aos problemas da fronteira ou da condição do humano; que remetem, por assim dizer, ao dilema do ciborgue (Haraway, 2000). Os textos comentados a seguir apresentam como tema central o humano perpassado por suas próprias técnicas. A hipótese, trazida aqui como critério de mapeamento, é que a dramaticidade com que tal questão se anuncia só pode ser adequadamente apreciada na moldura da modernidade ocidental. Antes de tudo, porque fora disso o drama tornar-se-ia banal – o humano sempre foi, por definição, alvo de suas próprias técnicas (Leroi-Gourhan, 1983; Neves, 2006). Mas, mesmo que se queira conceder preeminência às especificidades de nossa época, ainda assim a pertinência antropológica do dilema do ciborgue  –  isto é do mal-estar com a técnica modificando o seu autor  –  não está em se tratar de uma questão referente ao advento da modernidade para a humanidade, mas às redefinições do humano na modernidade. Como os estudos antropológicos abaixo denotam, por vias distintas, a inquietação gerada pelas biotecnologias no Ocidente moderno deve ser tratada como um fenômeno êmico, cujas chaves de inteligibilidade estão em sua própria cosmologia. Uma das formas em que essa preocupação se verifica é nas aproximações aos modos de diagnóstico derivados do saber biomédico. Chazan (2007) trata do ultrassom obstétrico que, ao transportar o feto para o âmbito da visualidade, participa da reorganização da gestação e da relação com o feto. As imagens e a forma como o ultrassom obstétrico opera, por meio da psicologização e da fisicalização do feto,  promovem sua existência “social” (isto é, na forma do indivíduo) antes do nascimento  – 

a nomeação passa a ocorrer quando da determinação do sexo. Entre as consequências deste dispositivo, está sua utilização política na controvérsia sobre o aborto, como prova da condição de pessoa do feto, e a constituição do rito de visualização, onde há algo de 10

diagnóstico e algo de espetáculo. O exame pressupõe algum aprendizado visual e gira em torno da fruição das imagens “decifradas” na tela.

Investindo preferencialmente no desenvolvimento laboratorial de diagnósticos, Monteiro (2005) debruça-se sobre o surgimento de novos formatos de exame, pautados na genética e na informática, que buscam detectar biomarcadores de câncer de próstata. O foco é na forma como interagem percepções de corpo e de humano e no modo como estes aspectos associam-se no plano político. No contexto das academias de ginástica, delineei os modos de funcionamento da avaliação antropométrica, considerando o manejo das dimensões íntimas (psíquicas) e internas (físicas) do indivíduo pela elaboração sociotécnica da gordura (Sautchuk, 2007). Já Bonet (2004), trata justamente da constituição do componente humano necessário aos dispositivos de diagnóstico e terapêutica, pois enfoca o aprendizado prático de médicos em situação de residência. Há igualmente pesquisadores voltados ao transbordamento de discursos e dispositivos gerados no âmbito da ciência, movendo a atenção do contexto de sua produção ou funcionamento para aquele da sua difusão. Veja-se os estudos sobre a forma como as neurociências instituem novos marcadores de identificação pessoal e de explicação de sintomas; enfim, como estes dispositivos biomédicos avançam sobre o cotidiano extra-hospitalar, seja contribuindo à afirmação de um “sujeito cerebral” (Azize, 2008, 2010), seja possibilitando o surgimento de um movimento de “neurodiversidade”, que associa o individualismo com a noção de uma cultura cerebral

(Ortega, 2008). Sem mencionar aqui estudos voltados ao consumo de medicamentos, assinalo que outra forma de explorar os desdobramentos da biotecnologia é enfocando seus usos com o fim de gerar os ditos estados de alteração. Vargas (2006; 2008) considera as drogas enquanto objetos sócio-técnicos, que não comportam sentido intrínseco absoluto ou essencial, mas sim relacional. De modo que elas permanecem indeterminadas até que os agenciamentos a constituam enquanto tais; afinal, elas operam mediando formas particulares de engajamentos com o mundo. Para notar, enfim, que o identificador “bio” aplica-se também a técnicas não ligadas à medicina, veja-se Ferreira (2008), sobre o transe associado à música eletrônica. Dado o escopo aqui fixado  –  a relação entre o humano e a técnica face à modernidade –  é preciso demorar um pouco mais nas novas técnicas reprodutivas, pois se instaura entre antropólogos brasileiros um verdadeiro diálogo, marcado pela influência considerável de Strathern (1992) e levando adiante por etnografias e elaborações analíticas realizadas em diferentes direções (Grossi et al., 2003; Ramírez11

Gálvez, 2009). Nesse contexto, Salem (1997) circunscreve alguns pontos de referência, dentre eles o emprego sistemático do aparato conceitual de Dumont, o que demonstra o intuito de colocar em perspectiva a modernidade por meio de um de seus dilemas fulcrais. Para ela, “o próprio mo do de formular o dilema envolvido na manipulação de

embriões evidencia que, em última instância, está-se discutindo a Pessoa: o que significa ser pessoa e quais as qualidades que instalam em um ser humano essa condição” (idem , p. 84).

Consequência disso, a condição de inteligibilidade de toda a controvérsia, o suposto de seus diferentes argumentos, é o Indivíduo, a categoria ocidental de pessoa. Grosso modo, a controvérsia está em se o embrião é, e até quando, tecido celular ou

pessoa. E isso se definiria a partir da localização de certas características instauradoras do indivíduo, que confluem para a “posse” de certas qualidades ou marcos.

Independentemente de que sejam defendidos atributos morais ou biológicos, trata-se sempre de “uma realidade inerente ao indivíduo” um “domínio autocontido”, “logicamente anterior às relações sociais” (idem , p. 84). Daí emergem questões sobre o

estatuto mesmo do embrião (intra ou extracorpóreo) e de como hierarquizar seus “direitos” em relação aos da mãe.

A partir de quadro teórico próximo ao de Salem (1997), mas trabalhando com dados oriundos de etnografia sobre processos de reprodução assistida, Naara Luna (2007a e 2007b) insiste na questão sobre quais atributos confeririam ao embrião subjetividade e identidade individual. Ela nota então a transferência dos critérios de individualidade e autonomia do plano moral para o plano biológico, afirmando que ocorre genetização, ou biologização do parentesco, o que se expressa de modo mais geral: A análise das novas tecnologias reprodutivas permite vislumbrar como Natureza e Cultura não são domínios estanques, mas que há um fluxo contínuo de significados, um intercâmbio em que significados naturais são culturalizados e significados culturais são naturalizados. A Natureza ora serve de modelo à Cultura, ora o entendimento pela Cultura se impõe à Natureza. (L una, 2004, p. 152)

Exemplo disso é o sangue, que comporta sentidos genéticos (DNA) e de pertencimento familiar, acionando a importância do parentesco e da pessoa no âmbito da herança. Ademais, emergem do universo biológico novas figuras de parentesco e, portanto, de humanidade, como células, óvulos, fetos. Igualmente, se os limites da concepção do humano e das relações de parentesco são redesenhados com as novas

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técnicas reprodutivas, ressignificam-se também a paternidade e a maternidade (idem, p. 151). É o que indica Fonseca (2005) sobre o exame de DNA para definição de paternidade. Além disso, ela enfatiza que a verdade biológica abre um horizonte de novas dúvidas, negociações e dilemas em torno do estabelecimento ou do rompimento de vínculos de parentesco. Conclusão próxima à que Machado (2008) avança sobre a alteração nas definições da interssexualidade: quanto mais se aguça a detecção de traços de veracidade a respeito da definição do sexo, mais afloram ambiguidades entre diferentes níveis (anatômico, genético etc.). A partir de pesquisa sobre a tramitação da Lei de Biossegurança brasileira  – que permitiu sob certas condições o uso de células tronco de embriões inviáveis ou congelados e a produção de alimentos transgênicos  –  Cesarino (2006) faz contribuições importantes a este debate. Notadamente, ela promove uma articulação entre a controvérsia no campo político-moral e o fator econômico, enfrentando o problema de equacionar mercado e ciência nos dilemas cosmológicos da modernidade. Para compreender os sentidos do debate político a respeito da Lei de Biossegurança  –  articulando fatos científicos e mercadorias  – , Cesarino associa de maneira muito oportuna certos aspectos da Antropologia simétrica latouriana com a teoria dumontiana, especialmente no que se refere à relação entre o individualismo e a autonomia da economia na modernidade. Assim, se “o indivíduo é a forma assumida pelos humano s

no círculo de trocas do livre-mercado, a mercadoria seria a forma por excelência de inserção dos não humanos no mercado capitalista” (Cesarino , 2006, p. 204-205). Adição importante, já que o indivíduo não é, então, o único suposto no debate sobre a Lei de Biossegurança: a mercadoria é o suposto oposto  –  a condição das coisas. No caso da permissão para o uso de embriões, ela se vale da noção de englobamento para mostrar como, sem deixar de ser o valor preeminente da modernidade, as qualidades do indivíduo puderam ser consideradas tão diminuídas no pré-embrião a ponto de permitir sua desumanização relativa e seu uso nas pesquisas, na qualidade de parte do mundo natural, passível de manipulação (Cesarino, 2007, p. 373). Identificando traços gerais aos trabalhos comentados aqui, ressalto a percepção de que as biotecnologias remetem à questão da fronteira da humanidade, mas que devem ser explorados frente aos quadros cosmológicos da modernidade. Associado a isso temos a constatação de que estes permanecem muito bem assentados, ainda que mobilizados de modo distinto. Tanto em relação à Lei de Biossegurança, como nos 13

demais casos referidos, a ciência não perde nada do seu vigor, assim como a separação entre cultura e natureza. Seria o caso de dizer que, se as inovações técnicas causam reordenações importantes, elas estão longe de reconfigurar as bases da cosmologia moderna. Ao menos no plano formal (político, legal ou médico), as noções fundamentais de Indivíduo, Mercado, Natureza permanecem operando e organizando (ou estimulando) o funcionamento das novas técnicas. O que as etnografias mostram são ajustes “pragmáticos”, que evidenciam plasticidades significativas, mas não uma

reordenação. Portanto, um dos aspectos mais interessantes evidenciados pelos estudos sobre os dilemas biotecnológicos é o vigor e a agilidade com que suas categorias se rearranjam (mercado, natureza, indivíduo) para dar conta dos fenômenos de fronteira. Ciência

É um traço característico da Antropologia feita no Brasil o estudo da própria configuração das Ciências Sociais enquanto especialidades científico-acadêmicas. Como observou Peirano, há um conjunto de trabalhos nessa direção, que apresentam “o

propósito mais amplo de compreender a ciência como manifestação da modernidade” (Peirano, 1999, p. 244). Tal é seu espaço na Antropologia feita no Brasil, que estes trabalhos compõem uma das quatro denominações usadas pela autora para mapear a produção nacional. Deve-se acrescentar que esse tema dá mostras de atualidade, a exemplo do estudo de Garcia Jr. (2009) sobre a configuração dos programas de pósgraduação e as diferentes correntes de pensamento. Tem igualmente se diversificado, pois também a prática de antropólogos vinculados diretamente ao Estado e às ONG, que tem se expandido nas últimas décadas (tanto como peritos na esfera jurídica, quanto como técnicos na esfera administrativa), é alvo de uma auto-reflexão que se afigura cada vez mais intensa e urgente (Silva et. at., 1994; Leite, 2005; Silva, 2008 e Leitão 2009). O eixo dessa reflexão, entretanto, volta-se predominantemente para a análise do papel desempenhado pelo antropólogo, e para as questões daí derivadas  –  políticas, éticas, jurídicas e epistemológicas. Se essa abordagem antropológica em torno da prática científica, quando dirigida à própria Antropologia, parece comum no cenário brasileiro, seu avanço sobre outros empreendimentos científico-acadêmicos é menos evidente, a ponto de exigir, se não um esforço explicativo, ao menos um gesto de afirmação (cf. Viveiros de Castro, 2003: Marras e Sá, 2005; Monteiro, 2006 e 2010 e Branquinho e Santos, 2007). Uma das 14

razões é que estes trabalhos têm origem mais recente, que recua no máximo à última década do século passado. Pode-se detectar nessa produção duas orientações, ou dois momentos distintos. Sem falar das publicações de escopo mais abrangente, tratando de modo geral da ciência e suas crises (Ribeiro, 1999; El Far e Hikiji, 1998), há pesquisas sobre manifestações particulares da atividade científica, que mantém em primeiro plano o interesse por investigar suas relações com os aspectos constitutivos da modernidade. Um estudo fundamental no movimento de posicionar a dinâmica interna à ciência  –  a fala e o fazer dos cientistas  –  no centro da reflexão antropológica é empreendido por Aranha Filho (1990, 2002), enfocando a busca por inteligência extraterrestre na astronomia moderna. Mais especificamente, a mensagem enviada a bordo da espaçonave não tripulada Voyager , destinada a vagar indefinidamente pelo espaço sideral. A própria escolha do material empírico sobre o qual se desenvolve o estudo é sintomática. O autor analisa publicações de cientistas como Carl Sagan, referentes ao projeto de busca por contato com alguma inteligência extraterrestre, demarcando um contraste significativo com os estudos sobre o fenômeno Ovni (Objetos Voadores Não Identificados) e a ficção científica. Esses também foram tema de antropólogos brasileiros, considerados enquanto mitos modernos (Ferreira Neto, 1984; Leirner, 1992 e Lourenço, 2000), 6 mas Aranha Filho opta por visar a própria atividade científica. Desse modo, o autor diferencia-se da proposta de abordar aquilo que está em torno da ciência  –  seu contexto ou desdobramentos  –  para explorar justamente o cerne de sua atividade, os parâmetros que regem sua racionalidade e seu fazer. Ele delineia então os vínculos da mensagem da Voyager  com questões fundamentais para a modernidade ocidental, como a relação entre humanidade, civilização e evolução técnica. Para Aranha Filho a mensagem tem uma função relativa ao próprio objetivo da espaçonave, já que ela “desempenha uma função simbólica complementar, procurando

compensar o caráter de investida unilateral da sonda” (1990 , p. 189). Ou seja, contrabalançando o desígnio principal da nave, de exploração, o disco doa informações, saúda e revela algo sobre nós  –  embaixador amistoso ao invés de espião, curiosidade 6

O professor Martin A. Ibañez-Novion propunha outro modo de aproximação à ficção científica. Nos cursos que ministrou sobre o tema na UnB na virada dos anos 2000, pouco antes de falecer, ele argumentava que as vertentes cinematográfica e literária da ficção científica são dotadas de um potencial heurístico intrínseco – são uma espécie de vanguarda do pensamento sobre a ciência e a técnica. De modo que caberia ao antropólogo estabelecer uma aproximação e notar seu caráter ativo no pensar sobre a contemporaneidade e o futuro, mais do que tomá-las apenas na qualidade de objetos de análise. 15

científica e não apenas territorialidade militar. Mas nem por isso o autor deixa de ressaltar as “funções terrestres” da mensagem, já que ela se constitui em convite ao

intercâmbio sideral com base no auto-retrato genealógico da humanidade, na perspectiva da civilização ocidental. Ao mostrar os contrapontos (e as semelhanças) do projeto de busca por inteligência extraterrestre em relação à ufologia, o autor caracteriza o extraterrestre como um Outro para certa manifestação do pensamento ocidental, que no período pós-colonial se considera em uma solidão cósmica: “seja pela violência rubra do extermínio ou pela branca da aculturação, o resultado é o mesmo: a globalização da cultura ocidental fez-se ao preço da extinção do outro, ou melhor, do exterior” (1990, p. 208). Daí a premência da instauração (cósmica e científica) de uma

alteridade com a qual transacionar. Portanto, este trabalho tem o mérito de voltar o alvo da reflexão antropológica para processos e lógicas constitutivos da ciência enquanto tal, e não apenas a seu contexto, mostrando como a ciência opera através das categorias fundantes da modernidade. Em movimento semelhante a esse, mas já refletindo a difusão na Antropologia local das propostas teórico-metodológicas oriundas dos estudos sociais da ciência, Sá (2002 e 2004) ressalta as associações entre argumentos de matizes científico e religioso nos debates sobre o Projeto Genoma Humano. O trabalho também não se detém na ideia de que a ciência é uma forma de religião ou um mito moderno, assim como não se limita a descrever um debate entre as duas perspectivas frente a uma noção de humanidade una, apelando às noções de natureza e espírito. Sá ressalta justamente que essa fronteira não é tão bem definida, o que fica demonstrado pelo fato de haver biólogos lançando mão de argumentos oriundos do contexto religioso para dimensionar e justificar suas descobertas, ao passo que religiosos buscam subsídios elaborados nas pesquisas científicas para sustentar suas formulações. A ideia moderna de distinção radical entre ciência e religião (ou verdade e crença) é, em grande medida vinculada à dicotomia entre natureza e cultura, que aparece como uma espécie de nódulo gerador das principais questões antropológicas nos estudos sobre a ciência. É o que evidencia, por exemplo, o estudo de Marras (2002) sobre o modo como a indústria farmacêutica busca subtrair da experiência laboratorial toda manifestação subjetiva, como o “efeito placebo” ou a “sugestão”, na elaboração de

um medicamento. Ocorre que, malgrado os recursos investidos, isso não se realiza  –  o medicamento permanece sempre um híbrido de molécula biologicamente ativa e efeitos de “sugestão”. Inspirado no argumento de Pignarre (1999), Marras afirma que, dada a 16

impossibilidade de compreender e circunscrever o efeito placebo, o medicamento assenta-se em uma verdade estatística; disso resulta que, apesar de tudo, sua eficácia comporta os aspectos qualificados como subjetivos ou culturais. Esses estudos mostram que a própria prática científica não pode ser distinguida de modo absoluto da política, da religião, dos fatores subjetivos. Porém, Marras aponta que a matriz dualista  –  natureza/cultura  –  revela-se frágil sobretudo “quando enfim entramos empiricamente num laboratório e acompanhamos  pari passu a feitura do fato [...] desde a nascente da ciência dura até, enfim, surpreendermos a construção do dado” (2002, p. 128). É a partir deste tipo de convicção que se instaura o que podemos chamar de outra fase da abordagem da ciência entre antropólogos brasileiros, associando Antropologia da ciência e etnografia de laboratório. Busca-se assim verificar o surgimento dos fatos científicos a partir do cotidiano da ciência, implementando alternativas interpretativas à visão genérica da Ciência e também à análise dos fatos já consumados. Nesse sentido, a influência de autores como Latour (1994 e 1997) é notável, tanto nas proposições metodológicas quanto na crítica aos desdobramentos analíticos do dualismo natureza/cultura  –  seja o realismo-naturalismo ou o construtivismo-sociologismo (Marras e Sá, 2005). Marco dessa nova etapa dos estudos sobre ciência é o estudo desenvolvido por Sá (2006) entre primatólogos no interior de Minas Gerais, pois lança mão da observação participante para estudar a atividade de pesquisa. Envolvendo-se no cotidiano da relação entre cientistas e primatas, Sá vai além de frisar os vínculos entre a prática científica e os traços marcantes da modernidade. Ao deparar-se com a “personificação” atravé s da qual os cientistas tratam os macacos, o autor traça um quadro interpretativo elaborado, buscando associar a visão objetificante (ou purificante, no jargão dos estudos sociais da ciência) própria à empresa científica e a construção intersubjetiva do pesquisador e do alvo da pesquisa. Atento aos discursos oficiais e oficiosos, Sá não faz uma inversão simplista, que afirmaria serem os primatólogos animistas por definição: “trata-se (...) de um tipo de curto-circuito animista dentro de um sistema bem mais amplo que funciona segundo a lógica naturalista” (2006, p. 170). Ademais, não cabe falar em projeção de

características humanas sobre os macacos, já que não somente os primatas se constituem na relação com o cientista, mas o inverso também. Uma das conclusões de cunho mais abrangente, portanto, é que a distribuição dos traços de subjetividade e de objetividade na atividade dos cientistas não é dada, mas merece ser etnografada. Entre primatólogos e primatas a prática científica caracteriza-se 17

como relação intersubjetiva: a nomeação dos macacos, por exemplo, tem a dupla função de batizar os filhotes não humanos e iniciar os neófitos humanos enquanto primatólogos (Sá, 2006, p. 135). Sá adiciona ainda outro plano a esta análise, ligado ao fato de que o antropólogo é também cientista: a semelhança dos ofícios acarreta alguns aspectos particulares à aproximação etnográfica. Daí resultam conclusões epistemológicas importantes sobre a especificidade da Antropologia da ciência, levando-o a propor uma “Antropologia da aproximação”, em que entram em relação pelo menos três planos de objetivação e subjetivação: o “objeto”, o cientista e o antropólogo.

É preciso ressaltar que vem crescendo o número de etnografias de processos científicos e um breve panorama aponta a diversificação dos temas: obtenção e análise de informações bioatmosféricas da Amazônia (Walford, 2008), relação entre cetólogos e baleias (Calheiros, 2009), noção de risco entre epidemiologistas (Neves, 2008), vinculações entre cobaias de laboratório e a teoria evolutiva de Darwin (Marras, 2009), processos de classificação botânica de cientistas e de populações indígenas (Oliveira, 2009), etnografia histórica sobre mudanças em museus de História natural (Aranha Filho, 2009) e sobre instrumentos de antropometria no Museu Nacional (Sá e Santos, 2008), controvérsias acerca de marcadores biológicos de diferenças raciais (González, 2009), trocas sanguíneas na sociedade ocidental (Jesus, 2009), análise da construção da pessoa em laboratório de neurofisiologia (Carvalho, 2010). O estado da produção, de certo modo ainda inicial nesse campo, não deve enganar quanto ao ritmo acelerado de seu desenvolvimento, de que é prova o surgimento de diferentes instâncias para o diálogo acadêmico. Mas o principal desafio dessa tendência de estudos parece desdobrar de modo enfático uma questão que Peirano (1995) assinala para a Antropologia de modo geral, referente ao papel e à importância que assume a etnografia. Sem dúvida, o principal aporte da abordagem antropológica aos estudos sociais da ciência reside justamente no valor que confere à dimensão empírica e no seu modo particular de abordá-la (cf. também Peirano 2009; Sá, 2006). Para ressaltar isso, parece necessário evitar a todo custo a circularidade a que podem tender os quadros conceituais próprios de uma proposta que busca se afirmar. Seria o caso então de reverberar aqui a expectativa de vários pesquisadores, de que a ênfase na etnografia da ciência ande de par com a heterogeneidade e a reelaboração dos enfoques teóricos. Retorna-se, assim, ao eixo de articulação entre as diferentes perspectivas que derivam para a configuração de uma Antropologia da ciência e da técnica no Brasil. 18

Afinal, se esse campo é conformado a partir de um diálogo entre tradições de pesquisa de origens tão distintas quanto a cultura material, a biotecnologia e a etnografia da ciência, o sentido dessa interlocução reside principalmente no trânsito e no manejo criativo de propostas teóricas que promovam abordagens antropológicas voltadas aos não humanos. Referências bibliográficas ARANHA FILHO, Jayme.  Inteligência extraterrestre e evolução: as especulações sobre a possibilidade de vida em outros planetas no meio científico moderno. 1990. Dissertação (Mestrado)  –  Museu Nacional, Rio de Janeiro. ______. Jakobson a bordo da sonda espacial Voyager. In: PEIRANO, Mariza (Org.). O dito e o feito : ensaios de antropologia dos rituais. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002. p. 59-82. ______. Museus de história natural em duas câmeras. In: II Reunião de Antropologia da Ciência e da Tecnologia, 2009.  Anais... Belo Horizonte, 2009. AZIZE, Rogério. Uma neuro weltanschauung? Fisicalismo e subjetividade na divulgação de doenças e medicamentos do cérebro.  Mana, v. 14, n. 1, p. 7-30, 2008. ______.  A nova ordem cerebral: a concepção de „pessoa‟ na difusão neurocientífica. 2010. Tese (Doutorado em Antropologia Social)  –  Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. BARCELOS NETO, Aristóteles. D es villages indigènes aux musées d‟anthropologie. De la proprieté et vente des objets rituels amazoniens. Gradhiva Revue D’Aanthropologie et de Muséologie , Paris, n. 4, p. 86-95, 2006. ______. Apapaatai: rituais de máscaras no Alto Xingu. São Paulo: Edusp, 2008. BONET, Octavio. Saber e sentir : uma etnografia da aprendizagem da biomedicina. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2004. BOTELHO, Emília U.  Berta Gleizer Ribeiro (1924-1997 ): Afinidade e autonomia . 2005. Dissertação (Mestrado em História Cultural)  – Universidade de Brasília, Brasília. BRANQUINHO, Fátima; SANTOS, Jaqueline. Antropologia da Ciência, Educação Ambiental e Agenda 21 local. Educação e Realidade , n. 32, p. 35-50, 2007. CALHEIROS, Orlando.  As transformações do leviatã: praxiografia de um projeto de cetologia. 2009. Dissertação (Mestrado)  – Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. CARNEIRO DA CUNHA, Manuela. Introdução: Patrimônio imaterial e biodiversidade.  Revista do  Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional , n. 32, p. 15-27, 2005.

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