50 Lições de Filosofia 10 AnoF

July 14, 2019 | Author: afonso | Category: N/A
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filosofia para o ensino médio...

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LIÇÕESDE LIÇÕES DEFILOSOFIA FILOSOFIA

50licoes.blogspot.pt

PowerPoints, manual digital interativo e interativo  e outros materiais

124 páginas

64 páginas

239 páginas

LIÇÕESDE LIÇÕES DEFILOSOFIA FILOSOFIA

Porquê lições? !

!

!

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Porque facilita e simplifica o trabalho de professores e estudantes As ideias são apresentadas e explicadas tendo em conta o que é possível lecionar aula a aula Cada aula tem uma unidade e uma autossuficiência que facilita a aprendizagem A planificação planificação das aulas torna-se desnecessária: o próprio manual já está planificado de acordo com a realidade do trabalho do professor

2

LIÇÕESDE LIÇÕES DEFILOSOFIA FILOSOFIA

Lição 16, pp. 70-72 !

Breve informação histórica sobre o utilitarismo

!

Ideias centrais da teoria utilitarista do bem ! ! ! !

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A felicidade é o bem último Imparcialidade Hedonismo Prazeres superiores e inferiores

Objeção ao hedonismo !

A máquina de experiências

3

PARTE

3

Espaço do Professor

A dimensão ético-política da ação humana e dos valores

Lição

16

Utilitarismo e felicidade A natureza colocou a humanidade sob a governação de dois mestres soberanos: a dor e o prazer. Somente  a eles lhes compete dizer o que devemos fazer. Jeremy Bentham 1 O professor pode recorrer a casos que estejam de momento em discussão, de modo a tornar vívida a ideia de que em muitos desses casos raciocinamos em termos utilitaristas. 2 A relação entre a noção de bem último e de ação correcta é clara: uma vez que para os utilitaristas a felicidade é o bem último (a única coisa com valor intrínseco), então uma acção para ser correcta tem de promover esse bem último – isto é, a

A teoria utilitarista foi explicitamente desenvolvida a partir do século XVIII, por Jeremy Bentham (1748-1832). Mas foi no século XIX que John Stuart Mill (1806-1873) lhe deu nova vida, sendo hoje uma das duas teorias éticas mais estudadas. Além disso, é uma teoria que está na base de muitas das nossas leis e maneiras de pensar. Quando decidimos onde fazer um hospital, por exemplo, pensamos muitas vezes em termos utilitaristas, considerando que devemos fazê-lo no lugar A em vez de B, se em A o hospital beneficiar mais pessoas do que em B.1

Felicidade e imparcialidade Segundo a teoria utilitarista do bem, a única coisa boa em si mesma é a felicidade. As outras coisas boas são instrumentalmente boas se forem meios adequados para a

A fundamentação da moral

Hedonismo 1

Capítulo

4

Espaço do Professor

Segundo o utilitarismo, a felicidade é a única coisa boa em si. Mas o que é a felicidade? Bentham considerava que a felicidade era apenas o prazer e a ausência de dor, sendo a infelicidade a dor e a ausência de prazer. A teoria utilitarista é hedonista quando concebe a felicidade em termos de dor; quando concebe a felicidade em termos de realização pessoal, por exemplo, o utilitarismo não é hedonista. Bentham tinha também uma visão puramente quantitativa dos prazeres, pressupondo que podemos medi-los a todos, atendendo exclusivamente à sua intensidade e duração. Por exemplo, o prazer que o João sente ao passar de ano com boas notas talvez seja maior em intensidade e duração do que o prazer que o Manuel sente durante um curto passeio pela praia. O mesmo tipo de cálculo pode ser feito em relação às dores: uma dor de dentes, por exemplo, é mais intensa e prolongada do que uma pequena picadela no dedo. Assim, quando fazemos o cálculo do prazer, devemos subtrair as dores. Por exemplo, o prazer que o Manuel sente durante um curto passeio pela praia pode diminuir dramaticamente se durante esse passeio ele sentir dor de dentes. Mill mostrou-se insatisfeito com esta forma simples de hedonismo, argumentando que na avaliação de uma vida boa não basta ter em conta a quantidade dos prazeres mas também a sua qualidade. Para percebermos esta ideia imagine-se, por exemplo, a vida tranquila e agradável de uma ostra, como a duração de trezentos anos. Agora compare-se essa vida com a de uma pessoa intelectualmente ativa que desfrutou de prazeres superiores que resul2

3

4

1 A palavra «hedonismo» de _

 _

riva do grego hedone, que significa «prazer».

2A

ideia hedonista de que só o prazer é intrinsecamente bom e só a dor é intrinsecamente má remonta a Epicuro, que baseava nela a sua teoria moral.

3 Ao

contrário do que pensava Bentham, não é de todo claro que, em rigor, se possa fazer este tipo de cálculo. E a di ficuldade pode ser mais do que meramente prática.



comum os filósofos usa-

PARTE

3

Espaço do Professor

1

Propõe-se o filme Matrix  dos irmãos Wachowski (1999). Talvez aquelas poucas pessoas completamente desinteressadas pela vida optassem por um mundo assim, semelhante àquele em que se vive sob o efeito permanente de drogas e alucinogénios que criam

A dimensão ético-política da ação humana e dos valores

Objeção ao hedonismo Como vimos, as teorias hedonistas baseiam-se na ideia de que o bem humano resulta de um saldo positivo entre prazeres e dores, tendo em conta prazeres superiores e inferiores. Assim, uma vida boa é aquela em que predominam as experiências agradáveis. Mas será isto verdade? Imagine-se que vivemos num mundo em que todas as pessoas se encontram ligadas a sofisticadas máquinas que controlam os nossos pensamentos e sentimentos. Imagine-se também que as máquinas controlam as nossas experiências de forma a tornar as nossas vidas virtuais extremamente ricas em prazeres. Em tal mundo, temos uma vida repleta de sucesso e prazer, sem nunca termos de enfrentar obstáculos ou dissabores. Imagine-se ainda que este mundo seria pleno de todo o tipo de prazeres, superiores e inferiores. Se o hedonismo fosse verdadeiro, então este mundo seria melhor do que o nosso. Mas este não é um mundo melhor, é um mundo bastante pior porque é uma farsa. Logo, o hedonismo é falso.1 Este é o argumento da máquina de experiências, proposto pelo filósofo Robert Nozick (1938-2002). Segundo Nozick, não é verdade que uma vida seja boa apenas devido às experiências agradáveis que a constituem. A autenticidade das nossas experiências é algo intrinsecamente valioso. Uma vida constituída por experiências ilusórias, ainda que muito agradáveis, tem menos valor do que uma vida real.

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Lição 17: pp. 73-75 !

Ideias centrais da teoria utilitarista da ação correta ! !

!

Só contam as consequências A ação correta é a que maximiza a felicidade

Duas objeções ! !

Limites da maximização Exigência excessiva

4

A fundamentação da moral

Lição

17

Capítulo

4

Espaço do Professor

Utilitarismo e consequências As ações são corretas na medida em que tendem a promover a felicidade, incorretas na medida em que  tendem a produzir o reverso da felicidade. John Stuart Mill

Se aceitamos que o bem último é a felicidade, como se defende no utilitarismo, é natural pensar que o critério da ação correta é a promoção da felicidade. Isto leva-nos muito naturalmente a pensar que só as consequências contam para a correção de uma ação. Daí que o utilitarismo seja uma teoria consequencialista. É este aspeto do utilitarismo que vamos agora estudar.

Consequencialismo e maximização

PARTE

3

Espaço do Professor 1

O utilitarismo enfrenta outras objeções. No entanto, iremos apenas abordar duas das mais intuitivas e populares.

2

Como exercício de compreensão, sugere-se que os estudantes, em grupo ou individualmente, construam os seus próprios exemplos de forma a testar a teoria utilitarista.

3

Uma resposta utilitarista a esta objeção é que matar pessoas inocentes para salvar outras acabaria por produzir infelicidade porque ficaríamos inseguros.

A dimensão ético-política da ação humana e dos valores

A objeção dos limites da maximização Será que as ações moralmente corretas são sempre aquelas que maximizam a felicidade? Segundo os críticos do utilitarismo, não.1 Estes argumentam que o mero facto de uma ação fazer muitas pessoas felizes não a torna correta. Em particular, é moralmente errado maltratar uma pessoa para beneficiar outras. Por exemplo, a Maria é uma cirurgiã especializada na realização de transplantes. No hospital em que trabalha enfrenta uma terrível escassez de órgãos – quatro dos seus pacientes estão prestes a morrer devido a essa escassez. O Jorge está no hospital a recuperar de uma operação. A Maria sabe que o Jorge é uma pessoa solitária – ninguém vai sentir a sua falta. A Maria tem então a ideia de matar o Jorge e usar os seus órgãos para realizar os transplantes, sem os quais os seus quatro pacientes morrerão.2 Não hesitamos em considerar a ideia da Maria abominável. Contudo, a opção de matar o Jorge permitirá salvar quatro pessoas que de outro modo morreriam. Vistas as coisas exclusivamente em termos da felicidade produzida, matá-lo e usar os seus órgãos trará mais felicidade a mais pessoas do que não o matar e deixar as outras pessoas morrer. Pelo que, se o utilitarismo estivesse correto, a Maria teria a obrigação de matar o Jorge. Mas este resultado é muitíssimo implausível. Logo, esta forma de utilitarismo não parece adequada3.

A fundamentação da moral

A objeção da exigência excessiva O utilitarismo tem também sido criticado por ser demasiado exigente. Se temos a obrigação moral de agir sempre de forma a maximizar a felicidade, teríamos o dever de fazer coisas que não parecem obrigações morais. Por exemplo, imagine-se que o João decide comprar um computador novo que custa 500 euros. O seu computador antigo ainda funciona, mas já está algo lento e está à venda um modelo novo. Se tivéssemos a obrigação moral de maximizar sempre a felicidade, então o João estaria a fazer algo moralmente errado ao comprar um computador novo. A obrigação dele seria dar o dinheiro a uma instituição de caridade, contribuindo para tornar mais pessoas um pouco mais felizes. Mas não parece que o João esteja a fazer algo errado ao comprar um computador novo. Faria algo louvável se decidisse dar o dinheiro a uma instituição de caridade, mas isto não significa que tivesse a obrigação de o fazer. As ações louváveis vão além do que a moral exige. 1 Se os utilitaristas tivessem razão, a maioria das nossas ações, coisas com o ir à praia, comer a sobremesa ou ir passear com um amigo, seriam moralmente incorretas uma vez que não maximizam a felicidade do maior número de pessoas. Ora, se tivéssemos a obrigação moral de agir sempre de forma a maximizar a felicidade, deixaríamos de poder fazer a maior parte das coisas que gostamos de fazer. Mas isto é demasiado exigente. Logo, defendem os críticos, o utilitarismo é falso.2

Equilíbrio reflexivo

Capítulo

4

Espaço do Professor

1 Costuma chamar-se «sobre-

-erogatórias» a esse tipo de ações.

2 Os utilitaristas responderam

a estas críticas, e algumas dessas respostas levaram a novas formas de utilitarismo. Uma resposta é dizer

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Porquê 50 lições? !

O programa prevê 50 lições de 90 minutos

!

O 50LF foi concebido para 50 lições de 45 minutos

!

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O tempo restante é para trabalhar textos, promover atividades na aula, fazer desvios e aprofundamentos, etc. O 50LF dá espaço ao trabalho de reflexão, diálogo e exploração próprios da filosofia

5

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Lição 20, p. 84 !

Espaço do professor: !

!

!

Os alunos perguntam por vezes que alternativas há às duas teorias éticas estudadas O professor pode desejar dar uma aula sobre a ética aristotélica

Livro de Apoio, páginas 36 e 37 ! !

!

Apresenta as ideias centrais da ética aristotélica Inclui o desenvolvimento contemporâneo da ética aristotélica Compara a ética de Kant e a de Mill com a aristotélica

6

PARTE

3

Espaço do Professor Os alunos perguntam muitas vezes que alternativas há às duas éticas, dado que ambas enfrentam dificuldades que parecem simétricas. Há duas alternativas: o contratualismo e a ética das virtudes, baseada em Aristóteles. Mas é a última que tem recebido recentemente mais atenção, como alternativa à ética utilitarista e deontológica. Ver o livro de apoio para mais informações.

A dimensão ético-política da ação humana e dos valores

Neste exemplo, a ética utilitarista produz um resultado mais próximo das nossas intuições morais: independentemente das motivações da Ana, a sua ação parece moralmente valiosa. Agora imagine-se que dois amigos, o Manuel e o Francisco, passam a noite de sábado juntos num bar a beber cerveja. Ambos acabam a noite bastante embriagados, e ambos decidem ir para casa a conduzir os respetivos carros. O Manuel, apesar da sua condução perigosa, tem a sorte de chegar a casa sem causar qualquer acidente. Mas o Francisco não tem essa sorte, atropelando uma pessoa que atravessava a rua perto de sua casa. Como avaliaríamos este exemplo? Segundo os defensores da ética de Kant, ambos agiram incorretamente, pois não deviam ter conduzido embriagados. E, apesar de o Manuel ter tido a sorte de não atropelar ninguém, a sua ação foi tão incorreta quanto a do Francisco. Contudo, para os utilitaristas, só a ação do Francisco foi incorreta, pois só ele causou sofrimento. Neste exemplo, a ética de Kant parece mais próxima das nossas intuições do que a ética utilitarista: ambos agiram incorretamente, independentemente do q ue aconteceu.

Revisão 1.

Quais as vantagens e desvantagens da ética de Kant?

2.

Quais as vantagens e desvantagens do utilitarismo?

4

A fundamentação da moral

Alternativas

Os alunos perguntam por vezes se não há alternativas às duas éticas estudadas; é uma pergunta importante, pois ficam algo perplexos com as dificuldades que ambas as teorias enfrentam e que parecem paralelas. Parece que ficamos, pois, como que empatados. Não haverá uma alternativa? Na verdade, há duas alternativas: o contratualismo e a ética das virtudes, mas é a última que contrasta mais fortemente com o utilitarismo e o deontologismo. Ao mesmo tempo, é a ética das virtudes que melhor parece lidar com as dificuldades que estas duas últimas éticas enfrentam – na verdade, o problema do trólei foi introduzido pela filósofa Philippa Foot em 1967, que defendia uma versão da ética das virtudes. A referência clássica mais conhecida no que respeita à ética das virtudes é Aristóteles. No que respeita à teoria do bem, a ética das virtudes de Aristóteles aceita que a felicidade é o bem último; mas insiste numa conceção objetivista de felicidade, opondo-se ao hedonismo. Já no que respeita à teoria da ação correta, contudo, a teoria das virtudes afasta-se do consequencialismo num aspeto, e aproxima-se da ética deontológica; mas afasta-se desta última noutro aspeto fundamental. A teoria aristotélica da ação correta afasta-se do consequencialismo porque não aceita que o critério seja a maior felicidade para o maior número de pessoas. Agir corretamente, do ponto de vista de Aristóteles, não é uma questão de promover a maior felicidade de todos os envolvidos; ao invés, é uma questão de promover a nossa própria virtude. Porque se trata da nossa própria virtude, e não da virtude dos outros, esta teoria aproxima-se mais do deontologismo: o deontologista pergunta-se se o que vai fazer está de acordo com as suas melhores intenções, se emana da sua vontade boa;

LIVRO DE APOIO

O particularista, contudo, considera que em ética não é possível fazer boas teorias generalistas, porque a realidade moral é demasiado complexa. Se o fizermos, inevitavelmente teremos teorias inadequadas, que nos dão respostas implausíveis, como no caso do trólei. Assim, o que o particularista partidário da teoria das virtudes defende é que em vez de descobrirmos, digamos, os axiomas últimos da ação correta, para depois ser apenas uma questão de os aplicar à vida, o que temos de fazer é aprender a raciocinar em termos morais, sem que este raciocínio seja redutível a axiomas gerais. De modo que o trabalho de Aristóteles é analisar várias virtudes paradigmáticas, mas desta análise não emerge qualquer regra universal de aplicação cega. Assim, o defensor de uma ética particularista das virtudes responde ao problema do trólei dizendo que tudo depende de muitos outros fatores que são deixados em aberto no exemplo: quem são os cinco trabalhadores, quem é o outro trabalhador, quem é o homem obeso, quem somos nós e que relações temos com todas aquelas pessoas. E a ideia é que não é de esperar de uma teoria ética que nos diga o que fazer naquele caso; somos nós que temos de arriscar e decidir.

50 LIÇÕES DE FILOSOFIA

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Um instrumento flexível !

O 50LF é assim um instrumento flexível ! ! !

!

Não pretende substituir-se ao professor Nem esgotar as abordagens Nem engessar a lecionação

O que faz é oferecer um mapa, uma espinha dorsal ! !

Arruma as ideias de maneira simples e operativa Esclarece, indica, ajuda: não impõe nem obriga

7

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Organização !

Cada unidade está dividida em capítulos

!

Cada capítulo está dividido em lições

!

Cada lição está dividida em pequenas secções

8

9

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Valores Opção A ou B Temas/problemas

Unidade inicial Ação humana Objetividade/subjetividade Fundamentação da moral Ética, direito e política Estética Religião A destruição de obras de arte A ética da crença religiosa Liberdade de expressão

Lições

Textos

5 5

3 4 4 4 6 11 11 2 2 3

15 8 3

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Capítulo 4, p. 65 !

Índice das lições

!

Página 66: percurso do capítulo

!

Primeira lição: apresentação do problema

10

3

A dimensão ético-política da ação humana e dos valores

Capítulo 4 A fundamentação da moral Lição 15 | Apresentação do problema

Percurso do capítulo 4 A fundamentação da moral

O que está em causa?

O bem último.

Teorias

A ação correta.

Utilitarismo: maximizar a felicidade.

Felicidade.

Consequências.

Deontologismo: agir por dever.

 Vontade boa.

Intenções.

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Tornar os problemas vivos !

!

Os problemas são sempre apresentados de maneira muito simples e intuitiva Partindo de uma experiência reflexiva ao alcance do aluno

!

Lição 23, página 101

!

Lição 26, página 121

11

Liberdade e justiça social

Lição

23

Capítulo

6

Espaço do Professor

Liberdade e igualdade Uma vez que a justiça exige que todos os indivíduos tenham direito a um mínimo de liberdade, torna-se necessário que  todos os demais indivíduos sejam impedidos, pela força se preciso for, de privarem quem quer que seja dela. Isaiah Berlin

Imagine-se duas mulheres, a Joana e a Clara, ambas pintoras. Acontece que a Joana tem tido imenso sucesso internacional, e a Clara não. Algumas das obras da Joana atingem valores de tal modo elevados que ela acabou por ganhar muito dinheiro. Tornou-se pintora profissional, viaja por todo o mundo e tem um estilo de vida muitíssimo abastado. Já a Clara, apesar de continuar a pintar com a mesma paixão, nunca teve sucesso. Acabou por ter de fazer várias coisas e tem uma vida muito modesta. Agora que ambas têm filhos, a Joana pode pagar as melhores escolas para os seus filhos, enviando-os até para o estrangeiro. A Clara, pelo contrário, tem de limitar-se a enviar os seus filhos para a escola pública mais próxima, que por acaso enfrenta vários problemas. Nem os filhos da Joana nem os da Clara são culpados seja do que for. Contudo, os primeiros podem ter tudo o que há de melhor, e os segundos não.

A experiência e o juízo estéticos

Lição 26 O estético e o não estético

Capítulo

7

Espaço do Professor

O abaixo assinado, Robert Morris, sendo o autor da construção metálica intitulada Litanies, descrita no Anexo A, retira por este  meio da dita construção todas as qualidades e conteúdo estéticos e declara que, a partir desta data, a dita construção não tem qualquer dessas qualidades nem tal conteúdo. Robert Morris

(declaração registada em cartório notarial pelo próprio artista)

Experiência estética Imaginemos que a Rita e o João passam em frente de uma galeria de arte. A Rita olha para a montra e, de repente, detém-se encantada a olhar para um quadro do século XVIII que representa várias pessoas a passear num jardim1. Por sua vez, o João não sente nada de especial, mas acaba por ficar também a observar o quad ro, interessado apenas no modo como as pessoas se vestiam na época em q ue o quadro foi pintado.

1 Por

exemplo,

The Mall in

St. James Park ,

de Thomas Gainsborough.

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Tornar as ideias simples !

Sem caricaturar, o objetivo é apresentar versões tão simples quanto possível de ideias filosóficas complexas

!

Isso consegue-se isolando os seus elementos centrais

!

Lição 40, página 188

12

PARTE

4

Espaço do Professor

1 Dos

argumentos a favor e contra a existência de Deus, o único que é a priori  é o ontológico. Um argumento é a priori  quando recorre exclusivamente a premissas a priori , não se apoiando em qualquer informação empírica; um argumento é a posteriori se pelo menos uma das suas premissas é a posteriori , apoiando-se por isso em alguma informação empírica.

A dimensão religiosa | (opção B)

Lição 40 A prova ontológica Se aquilo mais grandioso do que o qual nada pode ser  pensado existisse apenas no espírito, este mesmo ser mais grandioso do que o qual nada pode ser pensado seria algo mais grandioso do que o qual algo pode ser pensado. Mas isto é obviamente impossível. Logo, não há qualquer dúvida de que aquilo mais grandioso do que o qual nada pode ser  pensado existe tanto no espírito como na realidade. Santo Anselmo

Não será contraditório pensar que Deus não existe? Há quem considere que sim. Se compreendermos bem o conceito de Deus, vemos que a sua inexistência é impossível. Do mesmo modo, se compreendemos bem o conceito de triângulo, vemos que é impossível que tenha quatro lados. Afinal, Deus é um ser perfeito. O mais perfeito que pudermos imaginar. Contudo, como poderá o ser mais perfeito que pudermos imaginar não existir? Se não existisse, não seria assim tão perfeito.

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Os filósofos têm a palavra !

Cada lição começa com um pequeno texto

!

A lição pode ser trabalhada com ou sem esse texto

!

!

Mas a própria lição permite ao aluno compreender o texto Deste modo, o aluno contacta suavemente com os clássicos da filosofia

13

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Textos integrados !

!

Sempre que é esclarecedor para o aluno damos a palavra aos filósofos Capítulo 2, lição 9, página 40

14

PARTE

2

Espaço do Professor 1

2

Apesar da crítica severa de Nietzsche à possibilidade de uma vontade autodeterminante, no sentido libertista, ele acreditava no livre-arbítrio, defendendo uma forma de determinismo moderado ou compatibilismo. O barão de Munchausen (1720-1797) foi um nobre alemão famoso contador de histórias fantasiosas.

A ação humana e os valores

O filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900) foi um crítico feroz do libertismo, afirmando:1 «A aspiração ao “livre-arbítrio”, nesse sentido metafísico superlativo que domina ainda, infelizmente, os cérebros dos semi-instruídos, essa aspiração em tomar a inteira e última responsabilidade dos seus atos, aliviando Deus, o universo, os antepassados, o acaso, a sociedade, não é senão o desejo de […] se puxar a si mesmo pelos cabelos, com uma temeridade que ultrapassa a do barão de Munchausen2, para sair do pântano do nada e entrar na existência.» Friedrich Nietzsche, Para Além do Bem e do Mal , trad. Delfim Santos, 1886, p. 21

Uma pessoa não pode pegar em si mesma ao colo, ou levantar-se do chão puxando pelos cabelos, sublinha Nietzsche. Do mesmo modo, as nossas escolhas não são possíveis se não forem determinadas por crenças e desejos. Escolhas indeterminadas não são escolhas. Quando uma pessoa escolhe ir pelo caminho 2 em vez de ir pelo caminho 1 ou pelo 3 é porque tem razões para isso. Talvez o caminho 2 seja o mais curto, por exem plo, ou o mais bonito. O que importa é que escolher é ser determinado pelas nossas crenças e desejos. Se não for isso, não se percebe o que é. Assim, a segunda crítica ao libertista é que na sua teoria não há sequer uma conceção plausível da escolha, ao passo que a primeira crítica era que o libertista não tem bons argumentos a favor da sua ideia de que o livre-arbítrio não é uma ilusão.

LIÇÕESDEFILOSOFIA

15

50 textos !

!

!

No final de cada capítulo há vários textos Cada texto ilustra uma posição ou uma ideia que foi explorada nesse capítulo Os textos foram cuidadosamente selecionados tendo em vista: ! !

!

A relevância temática A adequação didática

Capítulo 3, página 61 !

Textos 8, 9, 10 e 11

Os valores

Capítulo

3

Texto 8

A distinção facto/valor Roger Crisp Segundo os defensores da distinção facto/valor, nenhum estado de coisas do mundo pode ser um valor, e os juízos valorativos não devem ser entendidos como juízos de facto puros. A distinção foi importante na ética do século XX e continua em aberto o debate sobre o estatuto metafísico do valor, a epistemologia do valor e sobre qual será a melhor caraterização dos juízos de valor. Um facto é um estado de coisas efetivo. Um valor é algo bom (o prazer, por exemplo), ou uma crença de que algo é bom (dizer que o prazer é um dos meus valores é dizer que eu acredito que o prazer é bom). […] Numa das versões da distinção facto/valor, não há valores «no mundo». John Mackie, por exemplo, argumentou que tais itens são demasiado peculiares para integrarem qualquer metafísica ou epistemologia decente, e que a inexistência de valores é a melhor maneira de explicar os desacordos valorativos. De acordo com a ética existencialista, a não factualidade do valor deixa-nos numa posição de liberdade radical para escolher. A distinção, se entendermos que é acerca de valorações, sugere que estas não são tentativas puras de exprimir factos. Uma versão famosa e influente desta perspetiva é a de Hume, que afirmou que as conclusões com «deve» não se seguem logicamente de afirmações com «é». Logo, se afirmamos corretamente que algo deve ser feito (e isso pode ser um dos nossos valores) com base num argumento que aparentemente se re-

 .   p   s    i   r    C   r   e   g   o    R

PARTE

2

A ação humana e os valores

Texto 9

Os valores são relativos Associação Antropológica Americana Se começarmos, como tem de ser, com o indivíduo, vemos que desde que nasce não só o seu comportamento mas o seu próprio pensamento, as suas esperanças e aspirações, os valores morais que presidem à sua ação e justificam e dão sentido à sua vida, aos seus olhos e aos dos seus semelhantes, são determinados pelo corpo de costumes do grupo de que se torna membro. O processo pelo qual isto ocorre é tão subtil, e os seus efeitos são tão profundos, que só depois de uma formação considerável temos consciência dele. […] Os padrões e valores são relativos à cultura de que derivam, de modo que qualquer tentativa para formular postulados que emergem das crenças ou códigos morais de uma cultura tem, nessa medida, de neutralizar a aplicabilidade de qualquer Declaração de Direitos Humanos à humanidade como um todo. As ideias do que é correto ou incorreto, de bem e mal, encontram-se em todas as sociedades, apesar de diferirem na sua expressão em povos diferentes. O que é tido como um direito humano numa sociedade pode ser encarado como antissocial por outro povo, ou pelo mesmo povo num período diferente da sua história. O santo de uma época seria mais tarde encarcerado por se considerar que é incapaz de lidar com a realidade. Mesmo a natureza do mundo físico, as cores que vemos, os sons que ouvimos, estão condicionados pela língua que falamos, que faz parte da cultura em que nascemos.

Os valores

Texto 10

Valores não relativos Organização das Nações Unidas Artigo 1.º: Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. Artigo 2.º: Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita qualquer distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autónomo ou sujeito a alguma limitação de soberania. Artigo 3.º: Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Artigo 4.º: Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, são proibidos. Artigo 5.º: Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

Capítulo

3

PARTE

2

A ação humana e os valores

Texto 11

Santos morais Susan Wolf 

 .    f    l   o    W   n   a   s   u    S

Não sei se há santos morais. Mas se há, ainda bem que nem eu nem as pessoas mais importantes na minha vida são santos morais. Por santo moral entendo uma pessoa cujas ações são, todas, tão moralmente boas quanto possível, ou seja, uma pessoa que tem tanta valia moral quanto a que for possível. […] Parece-me que a perfeição moral, no sentido de santidade moral, não constitui um modelo de bem-estar pessoal a que fosse particularmente racional ou bom ou desejável almejar. […] Primeiro, um santo moral poderia ser alguém cuja preocupação pelos outros desempenha o papel que na maior parte das nossas vidas é desempenhado por preocupações mais egoístas ou, em qualquer caso, menos moralmente valiosas. Para o santo moral, a promoção do bem-estar dos outros desempenha talvez o papel que para a maior parte de nós é desempenhado pelo usufruto de confortos materiais, pela oportunidade para nos entregarmos a atividades físicas e intelectuais da nossa escolha, e o amor, respeito e companhia de pessoas que amamos, respeitamos e de quem gostamos. A felicidade do santo moral repousaria assim verdadeiramente na felicidade dos outros, de modo que se dedicaria a eles de cara alegre e integralmente. Por outro lado, um santo moral poderia ser alguém para quem os ingredientes básicos da felicidade não são diferentes dos da maior parte de nós. O que faz dele um santo moral é, ao invés, o facto de não dar atenção, ou quase nenhuma atenção, à sua própria felicidade, devido à importância superlativa que dá às preocupações mais vastas

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Filmes e leituras !

No final de cada capítulo há sugestões... ! ! !

!

De leituras Filmes Internet

Capítulo 6, página 112

16

PARTE

3

A dimensão ético-política da ação humana e dos valores

Estudo complementar Rosas, João Cardoso (Org.). 2008. Manual de Filosofia Política. Coimbra: Almedina, caps. II, III e IV. Apresentam-se as teorias do liberalismo igualitário (Rawls), do libertarismo (Nozick) e do comunitarismo (Sandel).  Vaz, Faustino. «A Teoria da Justiça de John Rawls». Crítica, 23 de abril de 2006, http://criticanarede.com/pol_justica.html. Uma exposição clara e acessível do problema da justiça social, bem como dos argumentos da teoria da justiça de Rawls e de algumas críticas. Wolff, Jonathan. 1996. Introdução à Filosofia Política. Trad. Maria de Fátima St. Aubyn. Lisboa: Gradiva, 2004, cap. 5. Apresentação e discussão da teoria da justiça de Rawls.

Filmes 2081 (EUA, 2009), de Chandler Tuttle. Curta metragem de 27 minutos sobre uma sociedade futura em que todas as pessoas são obrigadas a ser iguais. Grau de Destruição (GB, 1966), de François Truffaut. Carateriza a vida numa sociedade do futuro na qual se adota uma conceção universal do bem e da felicidade. John Q., (EUA, 2002), de Nick Cassavetes. A luta de um pai para salvar vida do seu filho, que está a ser vítima das desigualdades sociais.

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Imparcialidade e autonomia !

Não apresentamos apenas as ideias dos filósofos

!

Apresentamos também as objeções

!

O objetivo é dar ao aluno a liberdade e a autonomia para refletir por si

17

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Immanuel Kant “Estaríamos a trair a confiança que o público nos dispensa se, em vez de alargar a capacidade de entendimento dos jovens entregues ao nosso cuidado e em vez de os educar de modo a que no futuro consigam adquirir uma perspetiva própria mais amadurecida, se em vez disso os enganássemos com uma filosofia alegadamente já acabada e cogitada por outras pessoas em seu benefício.”

18

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Um exemplo do capítulo 3 !

Percurso do capítulo, página 48

!

Lição 12, página 51 ! !

Tese: o seu esclarecimento Argumento 1 a favor do subjetivismo !

!

Duas objeções

Argumento 2 a favor do subjetivismo !

Objeção

19

Percurso do capítulo 3 Problema Os valores são objetivos?

Não. Nenhum valor é objetivo.

Teoria do subjetivismo Tese: os valores são relativos aos sujeitos.

Teoria do relativismo Tese: os valores são relativos às sociedades.

Sim. Alguns valores são objetivos.

Teoria do objetivismo Tese: alguns valores não são relativos.

Os valores

Lição

12

Capítulo

3

Espaço do Professor

Subjetivismo O homem é a medida de todas as coisas: das que são, que o são; e das que não são, que não o são. Protágoras

A tese central da teoria subjetivista é que os juízos de valor são meras expressões das preferências dos sujeitos. Quando uma pessoa exprime um dado juízo de valor, não pode estar enganada. Isto contrasta com os juízos de facto. Quando alguém afirma um juízo de facto, estará enganada se os factos não forem como ela pensa. Por exemplo, o juízo de facto de que Justin Bieber não é um cantor é falso porque ele é de facto um cantor. O subjetivista pensa que os juízos de valor são apenas preferências pessoais. Por exemplo, quando o Luís defende que devemos mentir em alguns casos, está apenas a manifestar a sua preferência. E, claro, a Joana tem outra preferência e defende que nunca devemos mentir. Mas nenhum dos dois tem mais razão do que o outro. É por isso que se diz que os gostos não se discutem: os valores são subjetivos. 1

1 No subjetivismo, os juízos

de valor são relativos aos su jeitos; no relativismo, são relativos às sociedades. Trata-se assim, nos dois casos, de maneiras diferentes de ser relativista. Por facilidade de exposição, e por ser mais habitual, usaremos os termos «subjetivismo» e «relativismo».

PARTE

2

Espaço do Professor 1

Aprovados na Assembleia-Geral das Nações Unidas, no dia 10 de dezembro de 1948, no Palácio de Chaillot, em Paris. Veja-se um excerto no Texto 10.

2

A importância desta objeção é chamar a atenção paraa ilusão que resulta de se dar atenção apenas aos casos polémicos, esquecendo os muitos casos em que há pelo menos uma forte convergência de juízos de valor.

3

A premissa que está a ser rejeitada é uma condicional: «Se os juízos não fossem subjetivos, não haveria

A ação humana e os valores

e valores inscritos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1 subscritos por quase todos os países do mundo, mostram que há valores fundamentais que são consensuais, ainda que a prática não esteja muitas vezes de acordo com isso. Assim, o argumento a favor do subjetivismo pressupõe erradamente que não há consenso quanto aos valores. 2 A segunda objeção põe em causa a ideia de que se um juízo não for subjetivo, não há discordância. Pelo contrário, há muitos casos em que estamos perante juízos que não são subjetivos e no entanto há discordância. Por exemplo, há quem pense que os seres humanos foram diretamente criados por Deus, como é descrito na Bíblia, e quem pense que os seres humanos surgiram de outras espécies, por meio de processos naturais. Contudo, não se trata de juízos subjetivos. Acontece apenas que as pessoas não conseguem chegar a um consenso. Também há quem pense que o clima hoje é mais quente devido aos seres humanos, e quem p ense que não. Uma vez mais, não estão em causa juízos subjetivos. Apesar disso, as pessoas não conseguem chegar a um consenso. A falta de consenso pode ocorrer pelos mais diversos motivos. Em alguns casos ocorre porque é muito difícil saber algumas coisas; noutros casos ocorre porque as pessoas são teimosas e insistem no que a outras parece comprovadamente falso. O que isto significa é que a objetividade de um juízo é perfeitamente compatível com a existência de discordâncias. Logo, o argumento a favor do subjetivismo parece basear-se numa premissa falsa.3

O argumento do conflito de valores

Os valores

Objeção ao argumento do conflito de valores O argumento baseia-se na ideia de que não há maneiras objetivas de resolver conflitos de valores. Será isto verdadeiro? Imaginemos que vamos decidir se os estudantes do sexo feminino devem ter prioridade para entrar na universidade. Alguém propõe fazer uma lei de tal modo que se só tivermos mais uma vaga e tivermos dois candidatos exatamente com as mesmas qualificações escolares, entra o candidato do sexo feminino. A Joana e o Carlos vão agora decidir se aceitam a lei ou não. Se cada um deles pensar apenas nos seus interesses, a Joana quererá aceitá-la porque é do sexo feminino, ao passo que o Carlos quererá rejeitá-la porque é do sexo masculino. Se cada um deles continuar a insistir na defesa dos seus interesses, sem ter em consideração os interesses do outro, ficarão num impasse: o Carlos vota contra a lei, e a Joana vota a favor. É isto que é inevitável acontecer, pensa quem defende q ue os juízos de valor são subjetivos: não há uma maneira objetiva de defender os conflitos de valores. Imaginemos agora que a Joana e o Carlos decidem discutir a lei sob um véu de ignorância. O que isto quer dizer é que discutem a lei fazendo uma experiência mental: imaginam que não sabem se amanhã serão homens ou mulheres, apesar de saberem que serão uma coisa ou outra. Ora, sob este véu de ignorância, farão ambos o mesmo raciocínio: 1

Capítulo

3

Espaço do Professor

1A

expressão é de Rawls, cuja teoria da justiça será estudada na Lição 24.

2

«Não sei se serei um homem ou uma mulher. Se for uma mulher, a lei benefi-

2O

professor pode chamar nesta altura a atenção para o papel que as experiências mentais têm na discussão de problemas, teorias

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Um exemplo nos temas/problemas !

Percurso do capítulo, página 226

!

Lição 49, página 229 !

Argumento a favor da liberdade de expressão !

!

Objeção ao argumento

Princípio do dano (a favor da liberdade de expressão) !

Objeção ao princípio

20

Percurso do capítulo 13 Liberdade de expressão

A favor

O argumento do conhecimento.

Contra

O princípio do dano.

O argumento paternalista.

Consequências indesejáveis.

Porquê a liberdade de expressão?

Lição

49

Capítulo

13

Espaço do Professor

A favor da liberdade de expressão As nossas crenças mais justificadas não têm qualquer outra garantia sobre a qual assentar senão um convite permanente  ao mundo inteiro para provar que carecem de fundamento. John Stuart Mill1

O argumento da descoberta O filósofo John Stuart Mill defendeu que o silenciamento das ideias é incorreto porque é um obstáculo à descoberta da verdade.2 Quando as ideias são verdadeiras, Mill defende que silenciá-las seria privar a humanidade de descobrir a verdade, ou pelo menos atrasar a sua descoberta. Se descobrir a verdade for importante para nós, o silenciamento de ideias verdadeiras prejudica-nos. Essa seria a razão pela qual o silenciamento de Galileu, por exemplo, seria incorreto. Contudo, Mill defende que as ideias que consideramos falsas também não devem ser silenciadas. E isso por duas razões. Primeiro, porque podemos estar enganados. Dado que somos falíveis, as ideias que consideramos falsas talvez sejam verdadeiras. Foi o que aconteceu aos acusadores de Galileu: pensavam que estavam a silenciar ideias falsas, e afinal estavam a silen-

1 Em função do contexto de

turma, o professor poderá querer chamar a atenção para a radicalidade desta proposta de Mill. A um modelo solipsista da descoberta da verdade Mill opõe um modelo dialético em que o controlo mútuo de erros entre agentes epistémicos falíveis, como nós, é o fundamento de todo o conhecimento. 2 As

ideias de Mill devem muito à defesa anterior da liberdade de expressão levada a cabo pelo poeta

PARTE

5

Espaço do Professor

1 Na

verdade, Mill tem em mente o género de discussão honesta e cuidadosa de ideias que procuramos ensinar aos alunos, nomeadamente em filosofia. É importante que os alunos tenham noção de que a discussão honesta e cuidadosa de ideias infelizmente não é a habitual nos debates públicos. O professor pode pedir aos alunos para verem debates públicos, apontando por escrito os atropelos à discussão honesta e cuidadosa.

2 Assim, a crítica é que a

aceitação de toda a discussão tem por vezes efeitos perversos. Outra questão é sa

Temas/ Problemas do mundo contemporâneo

Objeção ao argumento da descoberta A objeção mais importante a Mill é que ele parece ter em mente um ambiente em que as pessoas discutem ideias com muita honestidade. Num ambiente de discussão cuidadosa e honesta, Mill parece ter razão: o confronto com as ideias falsas é importante porque nos ajuda a descobrir a verdade. Contudo, nas discussões públicas as coisas não são sempre assim. Vejamos um desses casos.  Vários cientistas defendem que o equilíbrio ecológico do nosso planeta está ameaçado devido ao aquecimento global da atmosfera. Em função desta ameaça, consideram que devemos tomar medidas para diminuir ou resolver o problema. Acontece que as únicas pessoas que realmente são capazes de formar uma opinião fundamentada sobre este tema são os cientistas; o resto da população tem de confiar neles. É aqui que a introdução de opiniões contrárias tem um efeito devastador. Imaginemos que é realmente verdadeiro que há aquecimento global e que podemos fazer algo para evitar as piores consequências. E imaginemos que quem defende que não há aquecimento global está apenas a defender interesses inconfessados. Basta que várias pessoas, nomeadamente cientistas, ponham em causa os outros para que as pessoas comuns fiquem sem saber o que fazer. A introdução de opiniões discordantes provoca confusão e ruído. Rapidamente se passa de uma discussão cuidadosa de ideias para palavras de ordem gritadas em manifestações, frases feitas ditas na televisão e truques de retórica. Quando isto acontece, a discussão cuidadosa e esclarecedora deixa de ser possível. E isso aconteceu precisamente porque se permitiu que qualquer pessoa, com ou sem conhecimento das coisas, pudesse exprimir publica1

Porquê a liberdade de expressão?

ças. Devido à publicação dessa notícia falsa, o Pedro perde o emprego e até alguns amigos; terá de mudar de casa e só depois de muitos anos consegue limpar o seu nome em tribunal. Este é um prejuízo direto e inequívoco. Segundo o princípio do dano, é incorreto que a Clara publique tal notícia, e deve ser proibida de o fazer. 1 Aplicando o princípio do dano à liberdade de expressão, a pergunta a fazer é se alguém fica prejudicado de maneira direta e inequívoca com a divulgação de tais ideias. Por exemplo, quando Galileu publicou o seu livro, muitas pessoas talvez se tenham sentido prejudicadas porque algumas das suas crenças fundamentais foram postas em causa. Contudo, o defensor do princípio do dano dirá que este não é um prejuízo direto e inequívoco: é apenas um prejuízo indireto e vago.

Objeção ao princípio do dano Uma importante objeção ao princípio do dano, aplicado à liberdade de expressão, é que desvia a atenção do que realmente está em causa. Saber se há um prejuízo direto e inequívoco para alguém é irrelevante, pois em muitos casos há esse prejuízo e no entanto seria incorreto silenciar. Por exemplo, um político desonesto arrisca-se a perder o emprego caso um jornalista apresente provas fortes de que ele cometeu várias ilegalidades. Esse é, pois, um prejuízo direto e inequívoco para o político. Contudo, seria incorreto silenciar o jornalista. Segundo esta objeção, quando alguém quer exprimir uma ideia e alguém quer silenciá-la, há sempre dano envolvido. Quando se silencia, provoca-se um dano a quem

Capítulo

13

Espaço do Professor 1O

professor poderá pedir aos alunos outros exemplos em que é óbvio que há danos diretos e inequívocos, como alguém publicar num jornal ou no FaceFace book todos os dados de acesso bancário de uma dada pessoa.

LIÇÕESDE LIÇÕES DEFILOSOFIA FILOSOFIA

Informações complementares !

!

!

Capítulo 10, lição 37, página 181 Caixas com informações complementares ajudam a simplificar o texto principal A aprendizagem é assim facilitada

21

Religião, Razão e Fé

Objeção à aposta de Pascal Uma objeção à aposta de Pascal é q ue o argumento pressupõe que se Deus existir e não formos crentes, temos tudo a perder. Mas como sabe Pascal que isto é verdadeiro? Talvez, pelo contrário, Deus castigue as pessoas crédulas, que acreditam nele sem provas, e recompense as pessoas cuidadosas, que, na ausência de provas, não acreditam. Afinal, Deus é bondoso e não vingativo; 1 por isso, não irá castigar quem não acreditar em Deus, desde que sejam boas pessoas. Assim sendo, é falso que tenhamos tudo a perder se não acreditarmos em Deus.2

A divindade teísta Ao longo da história da humanidade, muitas foram as divindades a que os seres humanos prestaram culto. As divindades da antiguidade egípcia eram diferentes das divindades da antiguidade grega e romana, que por sua vez eram diferentes das divindades chinesas e indianas. Todas estas religiões eram politeístas porque prestavam culto a várias divindades. Nas religiões monoteístas presta-se culto a uma só divindade. É o caso do cristianismo, do judaísmo e do islamismo. Chama-se «teísmo» à religião monoteísta que atribui a Deus cinco caraterísticas, entre outras: omnipotência, omnisciência, suma bon-

Capítulo

10

Espaço do Professor

1 Além

disso, se Deus castigasse os descrentes honeshonestos,, não seria sumamente tos sumamente bom.

2 O professor pode explorar

outras objeções com os alunos; por exemplo: talvez Deus castigue pessoas calculistas, que acreditam na sua existência só porque fazem um cálculo do que têm mais a ganhar.

LIÇÕESDEFILOSOFIA

22

Livro de Apoio !

Glossário de termos filosóficos ! ! !

Definições e explicações simples mas rigorosas Surgem também no Caderno do Estudante Organizadas capítulo a capítulo

!

Capítulo 6, página 41

!

Página 42 ! !

Explicações e aprofundamentos Lição a lição

124 páginas

CAPÍTULO

6

Liberdade e justiça social

Glossário de noções centrais Comunitarismo Perspetiva política segundo a qual os laços comunitários são anteriores e mais fundamentais do que as preferências individuais das pessoas. Equidade A ideia de que todas as pessoas merecem, à partida, igual consideração. Igualitarismo Perspetiva segundo a qual a igualdade é o valor fundamental a promo-

6

Liberdade e justiça social

Princípio da diferença Princípio da justiça proposto por Rawls, segundo o qual as de-

sigualdades sociais e económicas são aceitáveis na medida em que permitam beneficiar todos, em especial os mais desfavorecidos. Princípio do dano Princípio segundo o qual só se justifica interferir na vida e na liber-

dade das pessoas para impedir danos ou prejuízos que possam ser causados a terceiros.  Véu de ignorância Imagem usada por John Rawls para ilustrar a condição de impar-

cialidade na escolha dos princípios da justiça que ocorre na posição original. O véu de ignorância garante a imparcialidade ao esconder de nós próprios os factos particulares das nossas vidas e da nossa situação que poderiam tornar as nossas escolhas tendenciosas.

Lição 23: Liberdade e igualdade Pretende-se com esta lição colocar apenas o problema, de modo que os alunos compreendam o que está em causa. É importante que os alunos não confundam a noção de justiça social (ou justiça distributiva) com a justiça que se pratica nos tribunais, tendo como agentes principais os juízes e advogados (justiça retributiva). O que aqui está em causa é a primeira e não a segunda. A melhor maneira de tornar o problema mais vivo é contrapor duas tendências aparentemente conflituantes sobre a justiça social: o liberalismo (a liberdade indivi-

LIÇÕESDEFILOSOFIA

23

Aprofundamentos !

Exemplo: Capítulo 1, páginas 10-11 !

!

Ao aluno é apresentado um conceito simplificado de proposição Mas ao professor são apresentados outros aprofundamentos sobre o conceito, incluindo históricos

124 páginas

1

A filosofia e a sua dimensão discursiva

humanos. Procurou então caraterizar as várias posições que podemos ter quanto à insolubilidade dos problemas filosóficos, insistindo que há espaço para uma posição inteiramente naturalista. Deste ponto de vista, os problemas que para nós são insuscetíveis de serem resolvidos são perfeitamente naturais, e não sobrenaturais; acontece apenas que não temos capacidade para os resolver. O livro que o tornou mais conhecido do grande público é uma introdução autobiográfica à filosofia, intitulada Como Se Faz Um Filósofo (publicado entre nós na Bizâncio). Neste livro, McGinn explora vários problemas da filosofia de modo introdutório, incluindo o argumento ontológico de Anselmo, problemas de filosofia da linguagem e da mente, de metafísica e de outras áreas. Muitas pessoas consideram-no uma das melhores introduções contemporâneas à filosofia. McGinn dedicou-se também à filosofia da literatura e ao papel que a literatura desempenha na reflexão ética, assim como à filosofia do cinema, explorando o impacto que o cinema exerce sobre nós. É ainda autor de Não Me F**** o Juízo: Crítica da Manipulação Mental  (Bizâncio), livro que explora as muitas maneiras como as pessoas podem ser manipuladas mentalmente.

Lição 3: Teses e proposições Teses e teorias

O conceito de tese é algo vago, mas procurámos dizer o essencial que, para o aluno, seja esclarecedor. Na verdade, uma tese é apenas uma proposição ou conjunto

LIVRO DE APOIO

que exprime ideias, como é o caso de símbolos escritos num papel ou sons proferidos por alguém. Antes disso, os estoicos tinham também distinguido claramente as duas coisas, o que não parece ocorrer no caso de outros filósofos da antiguidade grega. Os estoicos chamavam lekta ao meio de expressão das ideias, a que hoje chamamos frase, e axiomata ao que hoje chamamos proposição, ou seja, as ideias que exprimimos com as frases. A partir do renascimento, os filósofos afastaram-se da noção de proposição, que entendiam no sentido de Boécio, defendendo que nos interessa, não a expressão verbal das ideias, mas as ideias em si. Por isso, introduziram um termo novo: juízo. Do ponto de vista dos filósofos modernos, a propositio é apenas a expressão verbal do  juízo; do ponto de vista atual, é a frase que é a expressão verbal da proposição, sendo esta o mesmo que o juízo (termo que passou a ser preterido devido às suas conotações psicológicas: não queremos falar do ato subjetivo de ajuizar, mas do conteúdo desse ato).

Meio de expressão (falada escrita)

Ideia expressa

Lekta

Axiomata

Medievais

Propositio (Boécio), dicta

Propositio (outros autores)

Modernos

Proposição

Juízo

Estoicos

50 LIÇÕES DE FILOSOFIA

LIÇÕESDEFILOSOFIA

24

7 testes completos !

Um teste para cada unidade temática 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7.

!

Unidade inicial Ação humana Valores Ética Ética, direito e política Estética Religião

Propostas de resolução dos testes

124 páginas

LIÇÕESDEFILOSOFIA

25

7 testes completos !

Exemplo: página 88

!

Grupo I !

8 questões de escolha múltipla 124 páginas

!

Grupo II !

!

4 questões com interpretação de texto

Grupo III !

2 questões abertas de desenvolvimento

LIÇÕESDEFILOSOFIA

26

Banco de questões !

Página 99 !

!

50 questões de escolha múltipla

Para cada uma das 7 unidades temáticas ! !

7 questões resposta curta 4 questões de desenvolvimento

124 páginas

27

LIÇÕESDEFILOSOFIA

Apoio contínuo !

!

No blog 50licoes.blogspot.pt os autores estão sempre disponíveis para esclarecer e ajudar Publicamos ! ! ! !

Notícias relevantes Artigos esclarecedores Aprofundamentos Textos traduzidos Os materiais deste blog serão em breve de acesso reservado aos professores que adotarem o 50LF

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Obrigado pela vossa atenção! Aires Almeida Célia Teixeira Desidério Murcho

LIÇÕESDEFILOSOFIA

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