38920540 Livro Etica Adolfo s Vazquez 2004 Resumo Completo

August 4, 2017 | Author: Adriane Santos | Category: Morality, Liberty, Sociology, Utilitarianism, Science
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FERNANDO COSTA FURLANI [Turma: 2º T]

RESUMO DO LIVRO “ÉTICA” de Adolfo Sánchez Vázquez

Trabalho de Graduação apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana

Mackenzie,

como

exigência parcial para satisfazer os requisitos

da

Disciplina

‘Ética

Cidadania Aplicada ao Direito II’

Professor: Marcos Peixoto Mello Gonçalves

São Paulo 2004

e

SUMÁRIO

CAPÍTULO I - OBJETO DA ÉTICA ............................................................... 4 CAPÍTULO II - MORAL E HISTÓRIA .......................................................... 7 CAPÍTULO III - A ESSÊNCIA DA MORAL................................................ 12 CAPÍTULO IV - A MORAL E OUTRAS FORMAS DE COMPORTAMENTO HUMANO .................................................... 15 CAPÍTULO V - RESPONSABILIDADE MORAL, DETERMINISMO E LIBERDADE ................................................. 17 CAPÍTULO VI - OS VALORES ..................................................................... 20 CAPÍTULO VII - A AVALIAÇÃO MORAL ................................................ 23 CAPÍTULO VIII - A OBRIGATORIEDADE MORAL............................... 27 CAPÍTULO IX - A REALIZAÇÃO DA MORAL......................................... 31 CAPÍTULO X - FORMA E JUSTIFICAÇÃO DOS JUÍZOS MORAIS .............................................................................................. 35 CAPÍTULO XI - DOUTRINAS ÉTICAS FUNDAMENTAIS ..................... 43 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ................................................................ 52

4 CAPÍTULO I - OBJETO DA ÉTICA

1. Problemas Morais e Problemas Éticos Nas situações efetivas e reais que ocorrem no dia-a-dia de todos os indivíduos, surgem problemas quando as decisões e ações deles são objeto de julgamento pelos demais membros do grupo social. Tais problemas não afetam apenas um indivíduo, mas também outras pessoas, e pode até mesmo afetar a comunidade como um todo. Em tais situações, as pessoas pautam seu comportamento por normas que julgam mais adequadas cumprir, e é quando se pode dizer que o homem age moralmente, ou seja, é o resultado de uma decisão refletida – e não espontânea. Destarte, de um lado temos os atos das pessoas, e do outro temos o juízo dos demais indivíduos sobre tais atos; ambos se pautam por certas normas de conduta. Desse plano prático-moral se passa à reflexão sobre os comportamentos práticos, surgindo então a teoria moral – ou a passagem da moral vivida para a moral reflexa. Tal passagem, que coincide com o início do pensamento filosófico, marca a entrada na análise dos problemas éticos. Os problemas prático-morais cuidam das situações concretas, enquanto os problemas éticos são de natureza genérica, de caráter teórico, de quem investiga a moral. O problema da essência do ato moral remete a outro problema crucial: o da responsabilidade; responsabilidade por ter tomado uma decisão de agir num sentido e não em outro. A liberdade da vontade de escolher sempre gera uma responsabilidade, que pode ser um fator limitador para a total “liberdade” de escolha entre dois comportamentos. A teoria da moral não se pode distanciar das questões prático-morais, posto que são sua própria razão de ser.

5 2. O Campo da Ética A ética, por ser disciplina teórica que estuda a moral, deve se limitar a explicar, esclarecer ou investigar uma determinada realidade, pois seu valor como teoria está naquilo que explica, e não no fato de prescrever ou recomendar com vistas à ação em situações concretas. Quando se ocupa de analisar a prática moral de uma sociedade de determinada época, a ética deve meramente esclarecer o fato de os membros daquele grupo social terem recorrido a práticas morais diferentes e até opostas. Por ser ciência que estuda a moral, a ética nem se identifica com princípios de moral em particular, nem fica indiferente a eles. A ética deve fornecer a compreensão racional de um aspecto real e efetivo do comportamento dos homens, pautados em fatos de valor.

3. Definição da Ética A ética é a teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade. A ética procura determinar a essência da moral, e as condições objetivas e subjetivas do ato moral, as fontes de avaliação moral, a natureza e função dos juízos morais, os critérios de justificação desses juízos e o princípio que rege a mudança de diferentes sistemas morais. Seu caráter científico deve aspirar à racionalidade e objetividade, e proporcionar conhecimentos comprováveis. A moral é objeto da ciência ética, podendo sofrer influência desta. Hoje em dia já há uma diferenciação clara entre a moral e a ética, que nem sempre ocorreu.

4. Ética e Filosofia Dada a sua pretensão de estudar cientificamente o comportamento humano moral, a ética se opõe à concepção tradicional que a reduzia a um simples

6 capítulo da filosofia. Em tempos remotos, enquanto ainda não se havia elaborado um saber científico, a filosofia se apresentava como uma espécie de “saber total” que tratava de tudo. Modernamente, porém, abre-se espaço para um conhecimento científico verdadeiro; e a ética, como outras ciências, desprendese do tronco comum da filosofia para se ocupar de um objeto específico de investigação com metodologia própria e racionalidade. Embora ética se desprenda do seu tronco, volta e meia se remete a ele, dada a sua inegável riqueza e vitalidade. Considerando o comportamento moral do homem, que não é algo estável e sim dinâmico que sofre constantes variações ao longo do tempo, a ética tem como fundamento a concepção filosófica do homem, que nos dá um panorama generalizado deste como ser social, histórico e criador.

5. A Ética e Outras Ciências A ética inegavelmente se relaciona com outras ciências, como por exemplo a psicologia, quando a ética precisa compreender as leis que regem as motivações internas, subjetivas do ato moral – que é o comportamento do indivíduo. Entretanto, há que se saber separar a ética das demais ciências, como da psicologia, por exemplo. Outrossim, a antropologia e a sociologia são ciências que contribuem para a ética, por analisar os indivíduos sob a óptica de seus relacionamentos sociais. Mas a ética tampouco se reduz à sociologia. Dado o processo de sucessão dos comportamentos morais na humanidade, a antropologia e a história propõem à ética um problema fundamental: o de determinar se existe um progresso moral. A ciência jurídica também dá suas contribuições, uma vez que trata de normas impostas com caráter de obrigação exterior e de forma coercitiva, diferentemente das normas morais, que não são exteriores nem coercitivas.

7 A ciência das relações econômicas também se relaciona com a ética, na medida em que modificam a moral dominante em dada sociedade, e também na medida em que os fenômenos econômicos colocam problemas morais no cotidiano das pessoas.

CAPÍTULO II - MORAL E HISTÓRIA

1. Caráter Histórico da Moral Historicamente, o conjunto de normas e regras de dada comunidade representadas pela moral sofre variações ao longo do tempo. Ocorre a sucessão de certas morais sobre outras morais, podendo-se falar da moral da Antigüidade, da moral feudal da Idade Média, da moral burguesa na sociedade moderna, etc. A ética considera a moral mutável com o tempo. Portanto, a origem da moral se situa fora da história – ela é anistórica, ou antihistórica, e esse a-historicismo segue três direções fundamentais: a) Deus como origem ou fonte da moral: quando as normas morais derivam de um poder sobre-humano; as raízes da moral estão fora e acima do homem, e não nele próprio. b) A natureza como origem ou fonte da moral: a conduta moral do homem seria mero aspecto da conduta natural e biológica. As qualidades morais teriam origem nos instintos, e poderiam ser encontradas até mesmo nos animais. c) O Homem como origem e fonte da moral: considera o homem como detentor de uma essência eterna e imutável inerente a todos os indivíduos; assim, a moral constituiria um aspecto desta maneira de ser, que permanece através das mudanças históricas e sociais.

8 Nas três concepções, há a coincidência quanto à busca da origem e da fonte da moral fora do homem concreto. Além disso, acentua-se o caráter histórico da moral, onde ocorrem as mudanças históricas na moral, que levam a questionar acerca (i) das causas ou fatores que determinam as mudanças, e (ii) do seu sentido ou direção – se há ou não um progresso moral.

2. Origens da Moral A moral surge quando o homem atinge sua natureza social, sendo membro de uma coletividade, onde ele sente que precisa se comportar de certo modo por ter uma consciência de sua relação com os demais. O trabalho do homem também adquire um caráter coletivo, e o fortalecimento da coletividade se torna uma necessidade vital para vencer as dificuldades de sobrevivência; é então que surgem uma série de normas não escritas que irão beneficiar a comunidade, e assim nasce a moral, para conciliar o comportamento individual com os interesses coletivos. Os indivíduos, então, passam a julgar o comportamento alheio como “bom”/útil ou “mau”/nefasto para manter a coletividade. A questão do benefício da comunidade é a origem do que modernamente chamamos de virtudes ou vícios. O conceito de justiça corresponde também ao mesmo princípio coletivista, seja no sentido de igualdade na distribuição, seja no de fazer a reparação de um mal causado a um membro da coletividade. Destarte, nas comunidades primitivas o aspecto coletivo absorve o individual, dizendo-se ser uma moral pouco desenvolvida, em contraposição com a moral mais elevada, baseada na responsabilidade pessoal. O progresso da moral se dá em virtude das novas condições econômico-sociais, particularmente o aparecimento da propriedade privada e a divisão da sociedade em classes.

9 3. Mudanças Histórico-Sociais e Mudanças da Moral O aumento generalizado da produtividade de trabalho tornou possível estocar quantidades excedentes de produtos, criando assim condições para que surgisse a desigualdade de bens entre chefes de família que antes repartiam igualmente os frutos em razão de sua necessidade mútua. Tal situação possibilitou ainda a apropriação privada dos bens ou produtos de trabalho alheio, e daí o antagonismo entre pobres e ricos. A propriedade privada acentuou a divisão entre os homens livres e os escravos, e fez surgir uma moral própria de cada uma dessas condições de escravidão ou de liberdade, sendo dominante a moral dos homens livres, tanto no campo prático como no teórico – não só porque se baseava na moral dos filósofos da Antigüidade, mas também porque a moral dos escravos não se conseguia alçar a um nível teórico. Com o desaparecimento do mundo Antigo, assentado na escravidão, nasce a sociedade feudal, cujo regime econômico-social se baseia na divisão em duas classes sociais fundamentais: a dos senhores feudais e a dos camponeses servos. Embora suas condições de vida continuassem difíceis, os servos já eram formalmente reconhecidos como seres humanos, em vez de coisas. Na pirâmide social de então se incluía a Igreja, que também possuía seus feudos; além disso, devido ao seu papel preponderante, a moral da Idade Média estava impregnada de conteúdo religioso, mas havia também as morais próprias dos nobres e dos cavaleiros. Aos poucos surgiu uma nova classe social: a burguesia, com sua moral peculiar, que era a dos trabalhadores assalariados – princípio da lei de produção de maisvalia econômica – e que também exigia mão-de-obra livre. A economia passa a ser regida pela lei do máximo lucro, que gera uma moral própria: uma moral muito individualista que dá lugar ao espírito de posse e ao egoísmo, tendo também métodos brutais de exploração do trabalho humano em busca da maisvalia. Tal situação evolui para o capitalismo baseado em métodos científicos e racionalizados de produção em série, e deste passo evolui ainda para um maior

10 respeito aos trabalhadores e à preocupação com seus interesses e necessidades, mas tudo visando ao benefício da empresa onde ele trabalha, visando maior produtividade. Ao longo de séculos, os mais diversos modos de exploração do homem pelo homem no capitalismo e a violência usada por conquistadores nas colônias se deu sem que se levantassem problemas morais para seus executores. Esta situação muda nos tempos modernos, quando se começa a recorrer à moral na tentativa de justificar as opressões. Entretanto, aos poucos os povos subjugados começam a desenvolver sua própria moral: com sua honra, a fidelidade aos seus, etc. A conclusão da exposição anterior é de que a moral vivida realmente na sociedade muda historicamente de acordo com as reviravoltas fundamentais verificadas no desenvolvimento social. Uma nova moral, autenticamente humana, implicará numa grande mudança de atitude, menos individualista e com mais espírito coletivista; entretanto, essa nova moral está longe de ser atingida, pois são necessárias várias mudanças de ordem econômica, social e política.

4. O Progresso Moral Já vimos que a moral se desenvolve ao longo do tempo de acordo com o momento histórico e social. É importante sabermos comparar as diversas morais já havidas para determinar qual delas se apresenta mais avançada, ou mais elevada. O progresso moral não pode ser concebido independentemente do progresso histórico-social, mas não se limita a este; destarte, é mister saber diferenciar uma coisa da outra. Pode-se usar como índice de progresso humano quando ocorre um desenvolvimento das forças produtivas. Porém isto não basta, posto que o homem produz somente em sociedade. Portanto, outro critério de progresso humano reside no tipo de organização social e no grau correspondente de

11 participação dos homens na sua praxis social. Há ainda outro índice: o da produção de bens culturais, como no campo da ciência e da arte. Todos esses índices – atividade produtiva, social e espiritual – são usados conjuntamente para avaliar o sujeito do progresso histórico: o homem social. Há de se atentar para os fatos de que o progresso histórico é fruto da atividade coletiva consciente dos homens, e também de que tal progresso se dá em ritmos diferentes nos diversos povos. Tiram-se duas conclusões das características do progresso histórico-social: (a) ele cria as condições necessárias para o progresso moral; e (b) ele pode afetar negativa ou positivamente os homens de dada sociedade sob o ponto de vista moral. O primeiro fator de medição do progresso moral é a ampliação da “esfera moral” na vida social. Isto se dá quando os indivíduos passam a reger seus atos por normas internas ou de ordem íntima e subjetiva, e não mais por normas externas, como a coação ou estímulos materiais como maior recompensa econômica. O segundo fator é a elevação do caráter consciente e livre do comportamento dos indivíduos ou dos grupos sociais, e pelo conseqüente crescimento da responsabilidade destes indivíduos ou grupos no seu comportamento moral. Assim, o progresso moral é inseparável do desenvolvimento da livre personalidade. O terceiro índice de progresso moral é o grau de articulação e de coordenação dos interesses coletivos e pessoais. A moral dita superior ocorre quando há um equilíbrio entre os interesses da comunidade e os estritamente individuais. O progresso moral também se dá na negação e na reafirmação de alguns elementos morais anteriores; os mais elevados – como a solidariedade, por exemplo – adquirem certa universalidade e se mantêm na história.

12 CAPÍTULO III - A ESSÊNCIA DA MORAL

Propõe-se a seguinte definição de moral como ponto de partida: a moral é um conjunto de normas, aceitas livre e conscientemente, que regulam o comportamento individual e social dos homens.

1. O Normativo e o Fatual Encontramos na moram dois planos: (a) o normativo, constituído pelas normas ou regras de ação, o dever-ser; e (b) o fatual, ou plano dos fatos morais, constituído por atos humanos concretos, e portanto independentes do dever-ser. Os fatos morais estão em constante interação com o normativo, posto que sempre adquirem um significado moral positivo ou negativo; e o normativo não existe independentemente do fatual, pois aponta para um comportamento efetivo. As normas existem e valem independentemente da medida em que sejam cumpridas ou violadas.

2. Moral e Moralidade A distinção entre moral e moralidade corresponde à indicada entre normativo e fatual. Entretanto, o melhor é empregar um único termo: moral – mas significando os dois planos, ou seja, o normativo e o prático.

3. Caráter Social da Moral A moral possui, em sua essência, uma qualidade social, e portanto ela se manifesta somente na sociedade. Essa socialidade se revela em três aspectos fundamentais:

13 A) Cada pessoa, comportando-se moralmente, sujeita-se a determinados princípios, valores ou normas morais válidas segundo a época histórica, a sociedade e o tipo relação social dominante. B) O comportamento moral é tanto de indivíduos como de grupos sociais humanos, e tem caráter livre e consciente. C) As idéias, normas e relações sociais surgem em decorrência de uma necessidade social. Para cumprir certas normas sociais, o poder coercitivo do Estado não é suficiente; busca-se que os indivíduos aceitem íntima e livremente a ordem social estabelecida, e aqui reside a função social da moral. A moral possui um caráter social porque (a) os indivíduos se sujeitam a normas social estabelecidas; (b) regula somente atos que acarretam conseqüências para os outros; e (c) cumpre a função social de induzir os indivíduos a aceitar livre e conscientemente determinados princípios, valores ou interesses.

4. O Individual e o Coletivo na Moral O indivíduo pode agir moralmente apenas em sociedade. No nível da regulamentação moral consuetudinária, o indivíduo sente sobre si a pressão do coletivo. Entretanto, por mais fortes que sejam os elementos objetivos e coletivos, a decisão e o ato respectivo emanam de um indivíduo que age livre e conscientemente, assumindo uma responsabilidade individual. Por outro lado, mesmo quando o indivíduo pensa que age em obediência exclusiva à sua consciência, a uma suposta “voz interior”, e portanto pensa que decide sozinho conforme sua consciência, ele não deixa de acusar a influência do mundo social do qual faz parte. A moral implica sempre uma consciência individual que faz suas ou interioriza as regras de ação que se lhe apresentam com um caráter normativo.

14 5. Estrutura do Ato Moral O ato moral há de ser analisado pelo seu motivo, e também pelo seu fim visado. O motivo, como aspecto importante do ato moral, pode ser de naturezas várias, inclusive inconscientes, e não pode ser objeto de aprovação ou desaprovação. O fim do ato moral é (i) algo voluntário, ou seja, houve uma decisão de realizar o fim escolhido, e (ii) pressupõe a escolha de um único fim em detrimento de outros fins possíveis, por achar que o escolhido é preferível. A seguir, vem a escolha dos meios para a consecução do fim escolhido, sendo que mesmo um fim muito elevado não justifica meios baixos para a sua consecução. O ato moral, ademais, supõe um sujeito real dotado de consciência moral. A intenção também é um aspecto importante do ato moral, e elas não se podem salvar moralmente, porque não podemos isolá-las dos meios nem dos resultados – em outras palavras: meios e resultados maus não se justificam com intenções boas.

6. Singularidade do Ato Moral A singularidade, novidade e imprevisibilidade de cada situação real colocam o ato moral num contexto particular que impede a possibilidade de ditar por antecipação uma regra de realização – pretensão vã do casuísmo ou casuística, que por sua vez empobrece a vida moral.

7. Conclusão Os traços essenciais da moral são os seguintes: 1) A moral é uma forma de comportamento humano que compreende um aspecto normativo (regras de ação) e outro fatual (atos de natureza prática). 2) A moral é um fato social; verifica-se somente em sociedade. 3) Embora a moral possua caráter social, o indivíduo nela desempenha papel decisivo, dada a exigência de interiorização das normas e da sua adesão íntima a elas.

15 4) O ato moral é uma unidade indissolúvel dos seus diversos elementos: motivo, intenção, decisão, meios e resultados. 5) O ato moral concreto é parte de um contexto normativo em vigor em uma determinada comunidade que lhe dá sentido. 6) O ato moral, sendo consciente e voluntário, supõe uma participação livre do sujeito em sua realização.

Definição de moral: a moral é um sistema de normas, princípios e valores, segundo o qual são regulamentadas as relações mútuas entre os indivíduos ou entre estes e a comunidade, de tal maneira que estas normas, dotadas de um caráter histórico e social, sejam acatadas livre e conscientemente, por uma convicção íntima, e não de uma maneira mecânica, externa ou impessoal.

CAPÍTULO IV - A MORAL E OUTRAS FORMAS DE COMPORTAMENTO HUMANO

1. Diversidade do comportamento Humano As relações do homem com o mundo exterior, diferentemente do animal, são de ordens muito diversas: trabalho, arte, conhecimento e religião. Além disso, as relações dos homens entre si também são muitas: econômicas, políticas, jurídicas, morais, etc. Cabe aqui examinar, em termos gerais, a distinção entre o comportamento moral e outras formas do comportamento humano, a seguir.

2. Moral e Religião Há duas teses sobre religião e moral: (i) a religião inclui certa moral; e (ii) Deus como garantia da moral. Entretanto, a história da humanidade demonstra que a moral não somente não se origina da religião como também é anterior a ela.

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3. Moral e Política Enquanto a moral regulamenta as relações mútuas entre os indivíduos e entre estes e a comunidade, a política abrange as relações entre grupos humanos (classes, povos ou nações). Na política, o indivíduo encarna uma função coletiva, ao passo que agindo moralmente o elemento íntimo e subjetivo desempenha um papel importante. As relações extremas entre política e moral são: (i) a do moralismo abstrato, que leva a reduzir a política à moral, e (ii) do realismo político, que defende a busca de resultados a qualquer preço, sejam quais forem os meios empregados, desconsiderando a moral.

4. Moral e o Direito De todas as formas de comportamento humano, o jurídico, ou do direito, é o que mais intimamente se associa com a moral, pois os dois estão sujeitos a normas que regulam as relações do homem. Há algumas diferenças entre as duas formas: (i) as normas morais são cumpridas pela convicção íntima dos indivíduos, ao passo que as normas jurídicas são cumpridas por motivos formais ou externos; (ii) a esfera da moral é mais ampla do que a do direito; (iii) a moral não depende necessariamente do Estado, como o direito.

5. Moral e Trato Social Também guardam relação com a moral os atos de trato social, como por exemplo o cavalheirismo, a pontualidade, a galanteria, etc., que podem ou não variar de um grupo social para outro, e de uma época para outra. O trato social procura regulamentar formal e exteriormente a convivência dos indivíduos na sociedade, mas sem o apoio da convicção e adesão íntima do sujeito (moral) e sem a imposição coercitiva do cumprimento das regras (direito).

17 6. Moral e Ciência As relações entre a moral e a ciência podem ser colocadas em dois planos: (a) o que diz respeito à natureza da moral, e se é cabível falar-se em caráter científico da moral. Esta questão foi abordada ao definir ética como a ciência da moral; e (b) o que diz respeito ao uso social da ciência, e aqui se fala do papel moral ou da atividade do cientista. A primeira questão enuncia o que alguma coisa é, e não o que deve ser. Assim, a ética nos diz o que a moral é, mas não estabelece normas. A moral não é ciência, e sim ideologia que pode se relacionar com as diversas ciências. A segunda questão diz respeito à responsabilidade moral assumida pelo cientista no exercício da sua atividade e pelas conseqüências sociais. O cientista não pode ser indiferente diante das conseqüências sociais do seu trabalho, que pode ser usado pra o bem ou para o mal da sociedade. Sob este aspecto, a ciência não pode ser separada da moral.

CAPÍTULO V - RESPONSABILIDADE MORAL, DETERMINISMO E LIBERDADE

1. Condições da Responsabilidade Moral O enriquecimento – ou progresso – da vida moral acarreta o aumento da responsabilidade pessoal, e portanto a determinação das condições dessa responsabilidade adquire importância primordial. A chave da questão consiste em saber quais são as condições necessárias para poder imputar a alguém uma responsabilidade moral por determinado ato, e elas são duas: (a) que o sujeito conheça as circunstâncias e as conseqüências da sua ação – ou seja, seu ato deve ser consciente; e (b) que a causa dos seus atos seja interior, e não exterior, ou seja, em outro agente que o force a agir de certa

18 maneira, isto é: sua conduta deve ser livre. Pelo contrário, a ignorância de um lado e a falta de liberdade do outro, permite eximir o sujeito da responsabilidade moral.

2. A Ignorância e a Responsabilidade Social A ignorância das circunstâncias, da natureza ou das conseqüências dos atos humanos autoriza a eximir um indivíduo da sua responsabilidade pessoal, mas essa isenção será justificada somente quando, por sua vez, o indivíduo em questão não for responsável pela sua ignorância; ou seja, quando se encontra na impossibilidade subjetiva (por motivos pessoais) ou objetiva (por motivos históricos e sociais) de ser consciente do seu ato pessoal. Para ilustrar esta questão, cita-se o caso de Aristóteles, que não poderia ser responsabilizado pela sua ignorância em saber que o escravo também era um ser humano e não um simples instrumento.

3. Coação Externa e Responsabilidade Moral A coação externa pode anular a vontade do agente moral e eximi-lo da sua responsabilidade pessoal, mas isto não pode ser tomado num sentido absoluto, porque há casos em que, apesar das suas formas externas, sobra-lhe certa margem de opção, e portanto de responsabilidade moral. Um exemplo de exceção é o caso do processo de Nurenberg contra os principais dirigentes do nazismo alemão, em que eles não podiam ser absolvidos de sua responsabilidade moral.

4. Coação Interna e Responsabilidade Moral Aqui há as hipóteses de doenças mentais, em que seu portador sente uma vontade irresistível de agir de certo modo, sobre o qual o agente não tem controle, como na cleptomania. Mas falando de pessoas normais – a maioria,

19 estas sempre têm controle sobre seus atos, por mais que sintam um ou outro impulso.

5. Responsabilidade Moral e Liberdade A responsabilidade moral pressupõe a possibilidade de decidir e agir vencendo a coação externa ou interna. Somente haverá responsabilidade moral se existir liberdade.

6. Três Posições Fundamentais no Problema da Liberdade 1ª – O determinismo é incompatível com a liberdade. 2ª – A liberdade é incompatível com qualquer determinação externa ao sujeito. 3ª – Liberdade e necessidade se conciliam.

7. O Determinismo Absoluto A tese central é a seguinte: tudo é causado, e portanto não existe liberdade humana nem responsabilidade social.

8. O Libertarismo Ser livre significa decidir e operar como se bem desejar. A característica desta posição é a contraposição entre liberdade e necessidade causal. A liberdade de vontade, longe de excluir a causalidade – no sentido de romper a conexão causal ou a negação total desta (indeterminismo) – pressupõe inevitavelmente a necessidade causal.

9. Dialética da Liberdade e da Necessidade As três tentativas mais importantes de superar dialeticamente a antítese entre liberdade e necessidade causal foram elaboradas por Spinoza, Hegel e MarxEngels. Para Spinoza, não se pode conceber a liberdade independentemente da necessidade. Hegel o complementa, afirmando que além desse fator há de ser

20 considerado o fator do desenvolvimento histórico quando se fala da liberdade – a historicidade. Marx e Engels aceitam as duas teorias acima, e partem do princípio que a liberdade é a consciência histórica da necessidade.

10. Conclusão O ideal é a conciliação dialética entre a necessidade e a liberdade, em conformidade com a solução de Marx e Engels. A responsabilidade moral pressupõe necessariamente certo grau de liberdade, mas esta, por sua vez, implica também inevitavelmente a necessidade causal. Responsabilidade moral, liberdade e necessidade estão, portanto, entrelaçadas indissociavelmente no ato moral.

CAPÍTULO VI - OS VALORES

Todo ato moral inclui a necessidade de escolher entre vários atos possíveis. O comportamento moral faz parte da vida cotidiana de todos os indivíduos, e as preferências por um ato sobre outro também. As preferências sempre envolvem algum juízo de valor sobre os atos.

1. Que são os valores Os valores podem ser atribuídos às coisas ou objetos naturais ou produzidos pelo homem, bem como podem ser relativos à conduta humana, particularmente a conduta moral. O objeto valioso não pode existir sem certa relação com um sujeito, nem independentemente das propriedades naturais, sensíveis e físicas que sustentam seu valor.

21 2. Sobre o valor econômico O termo “valor” deriva da economia. Para que um objeto tenha valor de uso deve satisfazer uma necessidade humana, independentemente de ser natural ou produto do trabalho humano. Quando estes objetos se transformam em mercadorias, adquirem duplo valor: de uso e de troca. O valor de troca é adquirido pelo produto do trabalho humano ao ser comparado com outros produtos. O valor de troca da mercadoria é indiferente ao seu valor de uso, ou seja, é independente de sua capacidade de satisfazer uma necessidade humana determinada.

3. Definição do valor O valor não é propriedade dos objetos em si, mas propriedade adquirida graças à sua relação com o homem como ser social. Mas, por sua vez, os objetos podem ter valor somente quando dotados realmente de certas propriedades objetivas.

4. Objetivismo e subjetivismo axiológicos O subjetivismo axiológico pode ser considerado como psicologismo axiológico, visto que reduz o valor de uma coisa a um estado psíquico subjetivo. Uma pessoa não deseja um objeto porque vale, mas este vale porque é desejado. De acordo com a posição subjetivista, não existem objetos de valor em si independentemente de qualquer relação com um sujeito. Esta tese recusa por completo as propriedades do objeto, sejam naturais ou criadas pelo homem. A tese do objetivismo axiológico rejeita o subjetivismo axiológico e afirma que há objetos valiosos em si, independentemente do sujeito. Segundo essa teoria, existe uma separação radical entre valor e bem (coisa valiosa) e entre valor e existência humana.

5. A objetividade dos valores

22 Os valores não existem em si e por si independentemente dos objetos reais (cujas propriedades objetivas se apresentam como propriedades valiosas – humanas e sociais), nem tampouco independentemente da relação com o sujeito (o homem social). Existem com uma objetividade social. Por conseguinte, os valores existem unicamente em um mundo social, ou seja, pelo homem e para o homem.

6. Os Valores Morais e Não Morais Os objetos úteis não encarnam valores morais, embora possam encontrar-se numa relação instrumental com estes valores. A “bondade” instrumental ou funcional de um objeto está alheia a qualquer qualificação moral, pois pode servir de meio ou instrumento para realizar um ato moralmente bom ou um ato moralmente mau. Os objetos devem ser excluídos do reino dos objetos valiosos que podem ser qualificados moralmente. Quando o termo “bondade” se aplica a eles (por exemplo, faca “boa”) deve ser entendido no sentido axiológico adequado, e não propriamente moral.

Os valores existem unicamente em atos ou produtos humanos. Tão-somente o que tem um significado humano pode ser avaliado moralmente – mas apenas os atos realizados livremente, ou seja, de modo consciente e voluntário. Um mesmo produto humano pode assumir vários valores, embora um deles seja o determinante. Por exemplo: uma obra de arte pode ter não só um valor estético, como também político, moral ou religioso. No entanto, nunca se pretende deduzir desses valores o seu valor propriamente estético. Um mesmo ato ou produto humano pode ser avaliado a partir de diversos ângulos, podendo realizar diferentes valores. Mas ainda que os valores se juntem num mesmo objeto, não devem ser confundidos. Os valores morais se encarnam somente em atos ou produtos humanos realizados de modo consciente e voluntário.

23 CAPÍTULO VII - A AVALIAÇÃO MORAL

1. Caráter concreto da avaliação moral A avaliação moral compreende três elementos: (a) o valor atribuível (b) o objeto avaliado (c) o sujeito que avalia

Numa caracterização geral da avaliação moral, a avaliação, por ter atribuição de um valor constituído ou criado pelo homem, possui um caráter concreto, histórico-social. Também é preciso considerar que se pode atribuir valor moral a um ato se – e somente se – tiver ele conseqüências que afetam a outros indivíduos, a um grupo social ou à sociedade inteira. A avaliação é sempre atribuição de um valor por parte de um sujeito. Portanto, pelo valor atribuído, pelo objeto avaliado e pelo sujeito que avalia, a avaliação tem sempre um caráter concreto, ou seja, é a atribuição de um valor concreto numa situação determinada.

Os itens a seguir se referem ao exame do valor moral fundamental: a bondade.

2. O bom como valor O ato moral pretende ser uma realização do “bom”. Comportando-se moralmente, os homens aspiram ao bem, isto é, a realizar atos moralmente bons. Definir o bom implica definir o mau. De uma sociedade para outra, mudam as idéias sobre o bom e o mau de acordo com as diferentes funções da moral efetiva de cada época, e essas mudanças se refletem sob a forma de novos conceitos nas doutrinas éticas. Nos povos primitivos o bom é, antes de tudo, a valentia, enquanto o mau é a covardia. Com a divisão da sociedade em classes,

24 perde o seu significado universal humano. Na Idade Média é bom o que deriva da vontade de Deus. Nos tempos modernos, o bom é o que concorda com a natureza humana concebida de uma maneira universal e abstrata que podemos definir no pensamento ético como felicidade, prazer, boa vontade, utilidade. Mas também pode ser caracterizado como verdade, poder, riqueza e Deus.

3. O bom como felicidade (eudemonismo) Para Aristóteles, a felicidade é o mais alto dos bens e está no exercício da razão. Isso significa que a felicidade está no alcance somente de uma parte privilegiada da sociedade, da qual, refletindo a realidade de sua época, estavam excluídos os escravos e as mulheres. O pensamento ético moderno sustenta o direito dos homens de serem felizes neste mundo, mas concebem a felicidade num plano abstrato, ideal, fora das condições concretas da vida social que favorecem ou constituem obstáculos para a consecução. Ou seja, a tese de que a felicidade é o único bom resulta demasiado geral se não se concretiza o seu conteúdo. Este conteúdo varia de acordo com as relações sociais que o determinam e a cujos interesses serve. Portanto, não se pode considerar – como adequada à natureza humana em geral – a felicidade que hoje se reduz às tendências egoístas do indivíduo ou ao seu “espírito de posse”. Numa sociedade na qual não vigore o princípio da propriedade privada nem a onipotência do dinheiro, e na qual o destino pessoal não se possa conceber separado da comunidade, os homens terão de buscar outro tipo de felicidade.

4. O bom como prazer (hedonismo) As teses básicas do hedonismo ético, citadas abaixo, consideram prazer no sentido de prazeres mais duradouros e superiores, como os intelectuais e os estéticos.

25 1ª. Todo prazer ou gozo é intrinsecamente bom. 2ª. Somente o prazer é intrinsecamente bom. 3ª. A bondade de um ato ou experiência depende do (ou é proporcional à quantidade de) prazer que contém. As teses, quantitativas e qualitativas do hedonismo ético reduzem o “bom” a reações psíquicas ou vivências subjetivas, deduzindo o juízo de valor a partir do juízo de fato.

5. O bom como “boa vontade” (formalismo Kantiano) Kant defende que o bom deve ser algo incondicionado, sem restrição alguma. A felicidade está sujeita a certas condições, e se essas não se verificam não se pode ser feliz. A boa vontade é uma determinação de fazer algo, de ser bom de uma maneira absoluta, sem restrição alguma, em toda circunstância e em todo momento, sejam quais forem os resultados ou as conseqüências da nossa ação, ou seja, a vontade que age não só de acordo com o dever, mas pelo dever, determinada, única e exclusivamente pela razão. Contra esta concepção Kantiana da “boa vontade” , existem algumas objeções mas em suma, por seu caráter ideal, abstrato e universal, oferece-nos um conceito do bom totalmente inexeqüível neste mundo real e, portanto, inoperante para a regulamentação das relações entre os homens concretos.

6. O bom como útil (utilitarismo) Útil para quem? O utilitarismo concebe, portanto, o bom como o útil, mas não num sentido egoísta ou altruísta, e sim no sentido geral de bom para o maior número de homens. Em que consiste o útil? A concepção pluralista sustenta que se os bens intrínsecos que os nossos atos podem causar não se reduzem a um só, mas a uma pluralidade dos mesmos, onde o bom não é só uma coisa – ou o prazer ou a

26 felicidade – mas várias coisas que podem, ao mesmo tempo, considerar-se como boas.

7. Conclusões a respeito da natureza do bom Os hedonistas e os eudemonistas consideram que os homens estão dotados de uma natureza universal e imutável, que nos faz procurar o prazer ou a felicidade, e exatamente nestes bens fazem consistir o bom. O formalismo Kantiano apela para um homem ideal, abstrato e situado fora da história, cuja boa vontade absoluta e incondicionada seria o único verdadeiro bom. Os utilitaristas põem o bom em relação com o interesse dos homens e, ao mesmo tempo, procuram encontrá-lo em certa relação entre o particular e o geral. A relação entre o indivíduo e a comunidade varia com o tempo e com as diferentes sociedades. Na sociedade moderna o bom só pode ocorrer realmente na superação da cisão entre o indivíduo e a comunidade, ou na harmonização dos interesses pessoais com os verdadeiramente comuns ou universais. A realização do bom na superação do círculo estreito dos interesses exclusivamente pessoais, no significado social da atividade do indivíduo, do trabalho ou do estudo e na transformação das condições sociais, acarreta uma peculiar relação determinada pela estrutura social. O egoísmo e suas opostas manifestações – solidariedade, cooperação e ajuda mútua – são encorajadas ou obstaculizadas de acordo com as condições concretas nas quais vivem os homens. Por isso, o problema do bom como conjunção dos interesses pessoais e dos interesses coletivos é inseparável do problema das bases e das condições sociais que tornam possível a sua realização.

27 CAPÍTULO VIII - A OBRIGATORIEDADE MORAL O comportamento moral é um comportamento obrigatório e devido. A obrigatoriedade moral impõe deveres ao sujeito. Toda norma funda um dever.

1. Necessidade, Coação e Obrigatoriedade Moral A obrigatoriedade moral não pode ser confundida com a simples necessidade causal e tampouco com a coação externa ou interna. Estas formas de “obrigação” tornam impossível a verdadeira obrigação moral.

2. Obrigação Moral e Liberdade A obrigação moral supõe necessariamente uma liberdade de escolha, bem como na determinação do comportamento, orientando-o numa certa direção. A obrigação moral deve ser assumida livre e internamente pelo sujeito e não imposta de fora.

3. Caráter Social da Obrigação Moral O fator social é essencial na obrigação moral, mas não é algo estritamente individual, mas também social.

4. A Consciência Moral A consciência moral acarreta uma compreensão dos nossos atos, mas sob o ângulo específico da moral. Além disso, o conceito de consciência está estreitamente relacionado com o de obrigatoriedade, posto que implica em avaliar e julgar nosso comportamento de acordo com certas normas conhecidas e reconhecidas como obrigatórias. A consciência moral dos indivíduos, por ser um produto histórico-social, está sujeita a um processo de desenvolvimento e de mudança.

28 5. Teorias da Obrigação Moral As teorias da obrigação moral nos respondem à questão de como devemos agir, ou que tipo de atos somos moralmente obrigados a realizar. As duas teorias predominantes são: (i) a denominada deontológica (de déon: dever) – quando a obrigatoriedade de uma ação não depende das conseqüências da própria ação ou da norma com a qual se conforma; e (ii) a chamada teleológica (de telos: fim), quando a obrigatoriedade de uma ação deriva unicamente de suas conseqüências.

Teorias da

A) Deontológicas

obrigação moral

a) do ato b) da norma

B) Teleológicas

a) egoísmo ético b) utilitarismo

1) do ato 2) da norma

6. Teorias Deontológicas do Ato Há consenso entre as teorias deontológicas no sentido de que não se pode apelar para uma norma geral a fim de decidir o que devemos fazer em cada situação específica.

7. Teorias Deontológicas da Norma (A Teoria Kantiana da Obrigação Moral) Em cada caso particular, o dever deve ser determinado por normas válidas independentemente das conseqüências de sua aplicação. Pode-se dizer que os indivíduos agem realmente por dever e não obedecendo a uma inclinação ou interesse por temor ou castigo, quando agem como seres racionais. A exigência da razão assume a forma de um mandamento, ou um

29 imperativo, que Kant divide em categóricos e hipotéticos. Os categóricos rejeita atos que não podem ser universalizados, e não admite exceção a favor de ninguém. A teoria kantiana de obrigação moral é inoperante e inexeqüível para o homem real.

8. Teorias Teleológicas (egoísmo e utilitarismo) Estas teorias têm em comum o relacionar a nossa obrigação moral com as conseqüências da nossa ação, ou seja, com o benefício que podem trazer, para nós ou para os demais. A tese fundamental do egoísmo ético, defendida por Thomas Hobbes e outros, é a seguinte: cada um deve agir de acordo com o seu interesse pessoal, promovendo o que é bom ou vantajoso para si. Entretanto, as observações empíricas fazem com que esta teoria não se sustente, posto que não explica os atos praticados a favor do próximo em detrimento de si próprio. Ao contrário, o utilitarismo se baseia em que devemos visar, acima de tudo, o benefício dos outros. O utilitarismo se divide em utilitarismo do ato e da norma.

9. Utilitarismo do Ato e Utilitarismo da Norma. Esta doutrina defende que devemos fazer aquilo que traz melhores resultados para o maior número. Para aplicar esta tese aos casos concretos, em certo ponto terá de ser feita a opção entre: fazer o maior bem para menor número de pessoas, ou menor bem para um maior número de pessoas. Entretanto, há muitas objeções de várias naturezas ao utilitarismo da norma, que o obrigam a passar do geral ao particular e deste àquele numa espécie de círculo vicioso. O utilitarismo da norma acaba coincidindo com a teoria deontológica – kantiana – da obrigação moral.

30 10. Conclusões relativas à Obrigatoriedade Moral 1º) O defeito comum das teorias da obrigação moral consiste em partirem elas de uma concepção abstrata do homem, fazendo com que a concepção da obrigatoriedade moral também seja abstrata, alheia à sociedade e à história. 2º) A obrigação moral deve ser concebida como própria de um homem concreto que, na sua prática moral real, vai modificando o conteúdo de suas obrigações morais de acordo com as mudanças que se verificam no modo como a moral cumpre a sua específica função social. 3º) A obrigatoriedade moral exige, em maior ou menor grau, uma adesão íntima, voluntária e livre dos indivíduos às normas que regulam as suas relações numa determinada comunidade. Por isto, o conceito de obrigatoriedade moral só tem sentido no contexto da vida social, no seio de uma comunidade. 4º) O sistema de normas, e com isto, o conteúdo da obrigação moral muda, historicamente, de uma sociedade para outra e, inclusive, no seio de uma mesma comunidade. O permitido hoje foi proibido ontem. O que atualmente se proíbe, talvez seja permitido amanhã. Contudo, seja qual for a época ou a sociedade de que se trate, os homens sempre admitiram uma obrigatoriedade moral. Sempre existiu um sistema de normas que define os limites do obrigatório e do não obrigatório. 5º) Não é somente o conteúdo da obrigação moral que se modifica histórica e socialmente – e, com ele, as normas que prescrevem determinada forma de comportamento –, mas se modifica também o modo de interiorizar ou de assumir as normas em forma de deveres. 6º) Nenhuma teoria – e ainda menos aquela que não conceba a obrigatoriedade moral em função de necessidades sociais – pode indicar o que o homem deve fazer em todos os tempos e em todas as sociedades. E, quando uma teoria faz semelhante tentativa, fica-se diante do formalismo ou universalismo abstrato, no qual caem não somente as doutrinas deontológicas (kantiana) mas também as teleológicas (como a do utilitarismo da norma).

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CAPÍTULO IX - A REALIZAÇÃO DA MORAL

Por realização da moral, há que se entender a encarnação dos princípios, valores e normas de comportamento de uma dada sociedade, no âmbito coletivo e não só no individual, ou seja, como processo social.

1. Os Princípios Morais Básicos Em cada época a realização da moral é inseparável de alguns princípios básicos – ou regras básicas de comportamento – cuja elaboração se dá na atividade prática social e que regem efetivamente o comportamento das pessoas. Tais princípios têm duas características: de um lado, respondem a uma determinada necessidade social, e do outro, por serem propriamente fundamentais, servem de fundamento para as normas que regulamentam o comportamento em certo sentido em uma sociedade. Embora o aspecto pragmático seja primordial nos referidos princípios morais, estes também podem ser objeto de uma elaboração teórica, cuja finalidade é fundamentar sua validade. Em tempos de crise social, certos princípios morais básicos também podem entrar em crise, que é solucionada quando tais princípios são substituídos por outros mais adequados às novas exigências sociais. Entretanto, enquanto tal substituição não ocorre, pode reinar durante algum tempo uma situação de confusão e incerteza como se pode observar em nossa sociedade atualmente. Como a realização da moral é a concretização de certos princípios, estes guardam relação com as condições sociais às quais se referem, e mudam de tempos a tempos para atender às aspirações e interesses que os inspiram.

32 2. A Moralização do Indivíduo O ato moral implica consciência e liberdade. O verdadeiro agente moral é o indivíduo, mas enquanto ser social, e não considerado na sua individualidade. A realização da moral é uma tarefa individual, mas, dada a natureza social do indivíduo, não é um assunto meramente individual. O conjunto de formas características de comportamento peculiares de cada indivíduo, que formam uma unidade indissolúvel, constituem o caráter de uma pessoa; o caráter é algo adquirido, modificável e dinâmico. O indivíduo pode adquirir uma série de qualidade morais sob o influxo da educação e da própria vida social – e tais qualidades morais, quando realizadas numa situação concreta, são designadas virtudes.

3. As Virtudes Morais A virtude supõe uma disposição estável ou uniforme de comportar-se moralmente de maneira positiva; isto é, de querer o bem. O seu oposto é o vício, enquanto disposição também uniforme de querer o mal. Vale lembrar o ensinamento de Aristóteles, segundo o qual “a virtude é um hábito”.

4. A Realização Moral como Empreendimento Coletivo Há três tipos de fatores sociais que contribuem de forma diversa para a realização da moral: a) Relações econômicas, ou vida econômica da sociedade. b) Estrutura ou organização social e política da sociedade. c) Estrutura ideológica, ou vida espiritual da sociedade.

5. A Vida Econômica e a Realização da Moral. A Vida Econômica da sociedade compreende a produção material de bens destinados a satisfazerem as necessidades humanas: alimentar-se, vestir-se, morar, etc. Compreendem-se também como as relações sociais que os homens

33 contraem nas relações de produção, por exemplo, na medida em que o trabalhador é uma força produtiva e na medida em que a produção satisfaz suas necessidades vitais.

Dentro das forças produtivas surgem problemas morais que não podem ser descuidados. Como o homem é afetado pelo seu trabalho? Eleva-o como ser humano ou o degrada? De que forma o uso dos meios ou instrumentos de produção afetam o trabalhador em sua verdadeira natureza? Os problemas morais da vida econômica surgem quando o homem é tratado como uma peça de um sistema econômico, o “homem econômico”; tal fato é conflitante, já que não se pode desprezar o ser humano concreto.

Significação Moral do trabalho humano – o trabalho como expressão exclusiva da atitude humana tem em si um sentido moral, dado o fato de que o homem deve trabalhar para ser verdadeiramente homem. Quem trabalha possui uma humanidade que não lhe pertence, pois não contribui para conquistar e enriquecer. Este é um caso onde o valor mudou com o passar do tempo: na Grécia Antiga, o valioso era o ócio físico, e o trabalho era tido como de menor categoria; exaltavam-se o estudo e a pesquisa.

Na Modernidade há o problema do trabalho alienado, pois o operário não vê no seu trabalho uma atividade realmente sua mas sim um empobrecimento material e espiritual. Neste caso o trabalho perde o seu conteúdo vital e criador, propriamente humano, e com isso se atenua também a significação moral.

Moral e Consumo – observa-se ainda a alienação do consumidor, o “homem econômico” não é somente produtor, mas também o consumidor, que, pressionado pela propaganda, cria em si necessidades que não são propriamente suas e adquire produtos que realmente não lhe são queridos. Assim como no

34 trabalho alienado o homem real não pertence a si mesmo, mas àqueles que o manipulam ou o persuadem de modo sutil, podemos apontar duas graves conseqüências: primeiramente, o homem como consumidor é rebaixado à condição de coisa ou objeto manipulável; em segundo lugar, impedido de suas escolhas livre e conscientemente, minam-se as bases do ato moral, restringindolhe seu domínio moral.

Avaliação Moral da Vida Econômica – numa sociedade na qual o trabalho é antes de tudo um meio para subsistir e não uma necessidade humana vital, na qual domina o culto ao dinheiro e na qual um sujeito é avaliado pelo que possui privadamente, tendo portanto a economia a sua moral apropriada.

6. A Estrutura Social e Política e a Vida Moral A Família – chamada célula social, é nela em que se inicia o processo de educação e formação da personalidade, e por isso tem grande importância do ponto de vista moral. A família conservará um elevado valor moral para si e para a sociedade se for uma comunidade livre, não egoísta, amorosa e racional.

As Classes Sociais – os indivíduos têm interesses e aspirações comuns como membros de uma mesma classe social, e isso se dá de forma independente da consciência do indivíduo. O fato de uma classe social se relacionar com uma moral determinada não descaracteriza o comportamento individual livre, consciente e responsável. Porém, mesmo com as escolhas próprias e livres, o meio social no qual um indivíduo vive tem grande influência, já que cria obstáculos ou favorece a realização da moral numa determinada sociedade.

O Estado – como instituição social, exerce poder efetivo sobre os membros da sociedade. Nenhum Estado renuncia a vestir com um manto moral a sua ordem

35 jurídica, política e social, não excluindo a possibilidade de o próprio Estado entrar em contradição com a moral devido às suas finalidades políticas.

Conclui-se, portanto, que seja favorecendo uma moral que lhe garante um apoio mais profundo e sincero do que o meramente externo ou formal, seja fomentando a privatização da mesma, o Estado sempre influencia, em um sentido ou em outro, a realização da moral.

7. A Vida Espiritual da Sociedade e a realização da Moral Nem só a produção material e as relações aqui implicadas esgotam a realização da Moral. Em toda comunidade existem idéias dominantes de diversas ordens e uma série de instituições que as difundem e realizam. São idéias políticas, estéticas, jurídicas, instituições culturais e educativas, meios de comunicação de massa. Mas, embora o indivíduo viva nesta atmosfera moral apresentada, legada pela tradição e costumes, não significa que esteja privado por completo da capacidade de decidir por si só. Atualmente tal fato tem crescido de maneira acentuada, visto que a mídia massifica padrões de moral não visando o desenvolvimento humano, e sim o lucro.

CAPÍTULO X - FORMA E JUSTIFICAÇÃO DOS JUÍZOS MORAIS

1. A Forma Lógica dos Juízos Morais A conformidade do comportamento com normas e regras, se expressam sob a forma de juízos e estes podem assumir formas lógicas denominadas: a) Enunciativas : “ x é y”; b) Preferenciais : “ x é preferencial a y “; e c) Imperativas : “ Deves fazer x”

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2. Formas Enunciativas, Preferenciais e Imperativas a) formas enunciativas Pode ser um juízo factual, por exemplo: “Pedro é alto” ou um juízo de valor, p.ex.: “Pedro é justo”, pois ser justo não é uma qualidade natural, como sua altura, mas decorre da relação com uma necessidade ou finalidade.

b) formas preferenciais É uma forma particular do juízo de valor, sob a forma de comparação, pela qual se estabelece a valoração de x em relação a y, podendo se tratar de juízo de conteúdo moral, p.e.: “É preferível enganar um doente a dizer-lhe a verdade” e não moral, p.e.: “Este trabalho é preferível àquele outro”. A preferibilidade evidencia o “ser mais valioso” de x em relação a y, sendo, portanto, inseparável do valor, pois não são considerados entre si, mas em relação a certa necessidade ou finalidade humana, considerando determinadas condições ou circunstâncias concretas.

c) formas imperativas Inicialmente cabe observar que para a forma imperativa ou normativa, diferente das anteriores, que podem se referir a atos já realizados ou objetos existentes ou a atos que se realizam ou objetos inexistentes, há uma exigência de realização: algo que não é ou não existe deve ser realizado. Assim, o juízo assume a forma de um mandamento ou exortação a que se faça alguma coisa. Os juízos imperativos também são inseparáveis dos juízos de valor, pois aquilo que se julga que deve ser realizado é sempre considerado valioso. Assim, os juízos que têm esta forma (lógica normativa ou imperativa), destinam-se a regular as relações entre os homens em uma sociedade e esta forma não é exclusiva de normas morais.

Têm a mesma forma lógica (exortativa ou

37 imperativa), mas um conteúdo diferente. Não poderíamos distinguir os juízos morais dos que não o são, apenas por sua forma lógica, Assim, pela sua forma lógica, os juízos morais podem ser enunciativos, preferenciais ou normativos. Mas, para distinguir o que há neles de específico, ou seja, o que os distingue daqueles que têm a mesma forma lógica, é necessário examinar seu significado e sua natureza ou função.

3. Significado do Juízo Moral É necessário verificar se a avaliação dos atos e normas morais que assumem, respectivamente, a forma de juízos de valor ou de juízos normativos desempenha função cognoscitiva, corresponde a fatos objetivos e se pode ser verificada. No entanto, é necessário que passemos pela justificação do significado dos juízos morais, isto é, o das razões da sua validade, mesmo porque, sem justificação para a variedade e diversidade de juízos morais entre épocas, entre sociedades e até mesmo dentro de uma mesma sociedade, fica-se sujeito a ameaça de um inimigo implacável no terreno moral: o relativismo. Por isso, examinaremos primeiro os problemas do significado ou da natureza dos juízos morais e dos seu possíveis critérios de justificação, para em seguida tratar no problema crucial do relativismo ético.

4. A Teoria Emotivista A teoria emotivista afirma que nos juízos morais não se afirma sobre fatos, propriedades ou qualidades, mas se expressa uma atitude emocional subjetiva (Ayer) ou se procura provocar em outros determinado efeito emotivo (Stevenson). Assim, os juízos morais não podem surgir de um estado emocional do sujeito, mas responde a necessidades e finalidades sociais, sem as quais não teria

38 sentido. Portanto, não poderia existir o juízo normativo “respeita os bens dos outros” numa comunidade primitiva, baseada na propriedade coletiva ou social dos bens. Se tudo é igualmente válido e tem a mesma justificação do ponto de vista moral, a conseqüência lógica não pode ser senão essa: tudo é permitido. Encontrarnos-íamos, assim, em pleno amoralismo.

5. O Intuicionismo Ético Diferentemente dos emotivistas, os intuicionistas éticos admitem que os juízos morais, que incluem o termo “bom”, ou que determinam deveres, atribuem propriedades e atos, pessoas ou coisas e que, neste sentido, dizem algo que pode ser considerado verdadeiro ou falso. Em contraposição aos naturalistas éticos, os intuicionistas sustentam que a bondade e a obrigatoriedade não podem ser observadas empiricamente. O bom é indefinível e os deveres fundamentais nos são impostos sem necessidade de prova, como algo evidente por si, isto é, são captados de maneira direta e imediata: por meio da intuição. Portanto, os juízos morais são intuitivos, logo, podemos considerá-los verdadeiros, estando acima da necessidade de provas empírica ou racional. Entretanto, esta justificação enfrenta várias objeções. Assim, o intuicionismo, ao sustentar que os juízos morais se referem a propriedades não naturais apreendidas direta e imediatamente, não admite a possibilidade de que eles possam ser justificados racional e objetivamente, ou seja, que possam apresentar razões em favor de sua validade.

6. A Justificação Racional dos Juízos Morais A própria natureza da moral, tanto mais quanto mais se eleva e enriquece no decurso do seu desenvolvimento histórico, exige uma justificação racional e objetiva dos juízos morais. Nas primeiras fases do desenvolvimento social, ou nas sociedades primitivas, que possuem uma moral também primitiva,

39 encontramos indivíduos com reduzida capacidade de interiorização: acomodamse às normas mais pela força da tradição, do que por convicção íntima. O código moral é aceito, em geral, sem necessidade de justificação. A medida, porém, que se percorre o desenvolvimento histórico-social da humanidade, sua moral se torna cada vez mais necessária, para que possa cumprir mis firmemente sua função social reguladora. A passagem da moral dos costumes e tradições, para uma moral reflexiva, autônoma e humanista, fica evidente na crescente necessidade de uma justificação racional das normas e atos morais. O verdadeiro comportamento mora, portanto, não termina no reconhecimento de uma norma, mas exige a justificativa racional das mesmas. E é aqui que a ética, como teoria, ajuda a abrir caminho para uma moral mais elevada e, sobretudo, identificando a possível justificação racional da moral, dos seus juízos de valores e das suas normas, bem como solucionando o problema de quais seriam as razões ou os critérios justificativos que se poderiam aduzir. Assim, rejeitas as respostas do emotivismo e do intuicionismo, continua a necessidade de justificar-se racionalmente os juízos morais.

7. A “Guilhotina” de Hume A propósito de se obter uma justificação racional dos juízos, deduzindo-se algo que é de algo que deve ser, morais, o que há tempo se proclama caminho fechado, costuma-se citar a seguinte passagem de Hume (do seu Tratado do entendimento humano): “Em todos os sistemas de moralidade que examinamos até agora se terá notado sempre que o autor, por certo tempo, exprime-se de uma maneira habitual, e estabelece a existência de Deus, ou faz comentários sobre os assuntos humanos; mas de repente surpreende deparar com o fato de que – em lugar dos verbos copulativos “ser” e “não ser” entre as proposições – não há mais nenhuma proposição que não esteja ligada por um “devia” ou “não devia”. Esta mudança é imperceptível; contudo, é de grande importância. Porque, dado que esse “devia” ou “não devia” expressa uma nova relação ou afirmação, é necessário que se analise e se explique; e, ao mesmo tempo que se dá alguma razão de algo que parece inconcebível, será preciso que nos expliquem como esta nova relação pode ser uma dedução de outras que são totalmente diferentes.”

40 Este argumento é considerado tão demolidor que é chamado por Max Black de “a guilhotina de Hume”. Tudo que pretende passar de um é para um deve ser, terá que cair sob esta guilhotina. E o que cai sob ela é a tentativa de deduzir uma conclusão que inclua algo não contido na premissa (um deve ser de um é), o que é ilegítimo do ponto de vista lógico, mas que não significa que o reino do dever ser não tenha nenhuma relação com o mundo do ser. Pode-se aceitar que a norma moral não pode ser identificada com o mero registro de um fato, e portanto não podem justificar-se pelo comportamento dos membros da comunidade. Pode acontecer que tal comportamento não se verifique na realidade, e que os indivíduos atuem em contradição com elas, o que não as invalida. Assim, a impossibilidade lógica de que um juízo moral normativo (um “dever ser”) seja deduzido de um juízo factual (um ”é”), não quer dizer que fique suspensa no ar como se nada tivesse a ver com os fatos. Embora as normas não derivem logicamente dos fatos,

recorre-se a eles para compreender sua

existência.

8. Critérios de Justificação Moral Os cinco critérios de justificação moral (social, prática, lógica, científica e dialética), não consideram a norma moral absoluta, sobre-humana ou atemporal, mas sim como produto humano que existe, vale e se justifica como nexo de relações.

I) A Justificação Social: Toda norma corresponde a interesses e necessidades sociais. A validade de uma norma é inseparável de sua necessidade social, sendo inoperante, caso entre em contradição com ela, não se justificando no âmbito da comunidade. Logo, “numa comunidade em que se verifica a necessidade x ou o interesse y, justifica-se a norma que exige o comportamento adequado”.

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II) A Justificação Prática: Toda norma implica numa exigência de realização, sendo, portanto, o guia de uma ação. A norma moral, por sua vez, exige certas condições reais para o seu cumprimento, e só pode ser justificada se se verificam as condições reais para que a sua aplicação não se oponha às necessidades da comunidade. Logo, “numa determinada comunidade na qual se verificam as condições necessárias, justifica-se a norma que corresponde a tais condições.”

III) A Justificação Lógica: As normas não existem isoladas, mas formam parte de um conjunto articulado ou sistema, que constituem o que se chama de “código moral” da comunidade, que deve apresentar coerência interna e, portanto, sem contraditoriedade. Logo, “uma norma se justifica logicamente se demonstra a sua coerência e não-contraditoriedade com respeito às demais normas do código moral do qual faz parte”.

IV) A Justificação Científica: Uma norma se justifica cientificamente quanto se adapta aos conhecimentos científicos estabelecidos, ou pelo menos não entrem em contradição com aqueles já comprovados. Logo, “dado o nível de conhecimento alcançado pela sociedade, uma norma moral se justifica cientificamente somente se baseada nesses conhecimentos ou compatíveis com os mesmos”.

V) A Justificação Dialética: A história moral tem um sentido ascensional, portanto, uma norma ou código moral se justificam pelo lugar que ocupam dentro deste

movimento progressivo. Na medida em que uma norma se

apresenta como um degrau ou uma fase do progresso de universalização da moral, e não como algo estático e imutável, é possível falar de uma justificação dialética. Logo, “uma norma moral se justifica dialeticamente quando contém

42 aspectos ou elementos que, no processo ascensional moral, se integram em um novo nível numa moral superior”.

9. A Superação do Relativismo Ético O relativismo ético parte do princípio de que diferentes comunidades julgam de maneira diferente o mesmo tipo de atos, proclamando, portanto, que os juízos morais, relativos a diferentes grupos sociais, justificam-se pelo contexto social. Além disto, considera-os corretos, mesmo que diferentes ou opostos, porque correspondem a necessidades e interesses de suas respectivas comunidades. Assim, cada juízo moral ficaria justificado por esta referência e, portanto, todos seriam igualmente válidos. É possível superar esta idéia? Existe um progresso rumo a uma moral universal e humanista, a partir das morais primitiva, passando pelas morais de classe, com suas limitações. Fala-se de elevação a níveis morais mais altos na medida em que se afirmam os aspectos morais: domínio de si mesmo, decisão livre e consciente, responsabilidade pessoal, harmonização do indivíduo e do coletivo, etc. Estes aspectos do comportamento moral define o lugar ocupado por uma norma dentro do processo histórico-moral, e permite compreender se sua validade caducou ou se conserva no processo. Permite, ainda, justificar dialeticamente a validade de uma norma diante de outra que postulem atos humanos diametralmente opostos. Tal justificação dialética nos impede de situar normas diversas, relativas a diferentes comunidades ou a diversas épocas, no mesmo plano, considerando-as igualmente válidas. Conclui-se que a relatividade da moral não acarreta necessariamente um relativismo, dado que nem todas as morais se encontram no mesmo plano, porque nem todas têm a mesma validade.

43 CAPÍTULO XI - DOUTRINAS ÉTICAS FUNDAMENTAIS

1. Ética e História As doutrinas éticas fundamentais nascem e se desenvolvem em diferentes épocas e sociedades com respostas aos problemas básicos apresentados pelas relações entre os homens, e particularmente pelo seu comportamento moral efetivo. Por isso, as doutrinas éticas devem ser consideradas dentro de um processo histórico de mudança e sucessão. Quando muda radicalmente a vida social, muda também a vida moral – e os princípios, valores ou normas acabam sendo substituídos por outros.

2. Ética Grega A ética, analisada quer sob um aspecto descritivo-científico quer sob um aspecto prescritivo-normativo, não pode ser desvinculada do contexto social em que é pensada e praticada. Destarte, a cada momento histórico corresponde uma corrente filosófica que traz em si uma concepção peculiar do que seja a ética e a moral. Não só isso, lembra Vázquez, mas as doutrinas, para além da correspondência que possuem com seu contexto histórico, político e econômico, correlacionam-se entre si, negando-se e confirmando-se umas às outras.

Os primeiros estudos sistematizados da ética e da moral no Ocidente datam da antiga civilização grega. Uma particularidade comum às diversas correntes que ali tiveram o seu nascimento é certamente o viés político dado aos conceitos de ética e moral. De fato, o surgimento e o apogeu das chamadas cidades-estados influenciaram sobremaneira o pensamento dos principais pensadores da época.

Os sofistas, corrente filosófica anterior a grande reviravolta realizada pelo pensamento socrático, deram o primeiro passo dos gregos naquela direção do

44 pensamento ocidental que teve seu nascimento oficial com Sócrates, qual seja, a de um abandono de uma abordagem naturalista do conhecimento e a busca de um conhecimento que tem no homem a sua origem. Assim, os sofistas trocaram a preocupação de se tentar entender o mundo, o universo e seu funcionamento e passaram a concentrar esforços na compreensão e no estudo do homem. Tratava-se, contudo, da busca de um saber prático, que pudesse ser utilizado na prática. Chegaram, neste sentido, a desenvolver a arte da retórica, ferramenta discursiva à disposição dos homens que participavam do campo político. Sócrates retomará a abordagem antropológica (centrada no homem) dos sofistas e desenvolvera sua própria corrente. No campo da ética e da moral, as idéias básicas de seu pensamento são as de que a felicidade constitui o fim último do homem, esta somente é alcançada através da prática do bem e, finalmente, somente o homem que ignora o bem pratica o mal.

Já Platão, discípulo de Aristóteles, introduz um viés político claro em suas concepções de ética e moral. Seu pensamento caracteriza-se por uma concepção dualística do mundo, que estaria dividido no mundo perfeito das idéias e no mundo imperfeito das sensações, e tripartida da alma, que seria composta pela razão, vontade e apetite. Segundo Platão, o aperfeiçoamento da alma estaria em certas virtudes cuja prática teriam relação com o desenvolvimento de cada uma destas partes da alma. Neste sentido, a prudência desenvolveria a razão, a fortaleza desenvolveria a vontade e, finalmente, a temperança desenvolveria o apetite.

Aristóteles, discípulo de Platão, desenvolveu a teoria do ato e da potência. Todo ser é ato de si mas potência de algo vindouro. Destarte, uma semente é ato de si, mas é potência de uma futura árvore. O homem, nesta concepção, é ato de si mas potência de algo superior, algo que é o fim último de sua existência. Para

45 Aristóteles, este fim seria um estado de plena felicidade, alcançável somente através da meditação teórica e da prática de virtudes. É importante ressaltar que o filósofo de Estagira concebia as virtudes como sendo o meio-termo de extremos absolutos. Assim, por exemplo, a virtude justiça é o meio termo entre o egoísmo e o esquecimento.

Tanto Platão quanto Aristóteles postulavam que a vida moral só poderia ganhar efetividade no espaço e no cotidiano das cidades-estados, daí, portanto, o forte viés político de suas teorias éticas.

3. Ética Cristã Medieval Após uma longa luta, o cristianismo transforma-se na religião oficial de Roma (séc. IV), impondo seu domínio durante dez séculos. Com a ruína do mundo antigo, o regime de escravidão dá espaço para o de servidão, organizando-se, com base neste, a sociedade medieval como um todo. Tal sociedade era caracterizada por sua estratificação e hierarquização, bem como uma profunda fragmentação econômica e política. Neste contexto, a religião cristã garante a unidade social desta sociedade, uma vez que a Igreja comanda a vida intelectual e espiritual de todos. Todos os aspectos da vida medieval são carregados de conteúdo religioso.

A Ética Religiosa A filosofia cristã parte de um conjunto de verdades a respeito de Deus, que é concebido como um ser bom, onisciente e todo-poderoso, criador do mundo e do homem. Assim, tudo o que o homem é define-se não em relação à comunidade humana, ou ao universo, mas, antes de tudo, em relação a Deus. A essência da

46 felicidade é a contemplação de Deus; o amor humano é subordinado ao divino, e a ordem sobrenatural tem a primazia sobre a ordem natural humana. O cristianismo pretende elevar o homem de uma ordem terrestre para uma ordem sobrenatural, na qual possa viver uma vida plena, feliz e verdadeira, sem as desigualdades e injustiças terrenas. Segundo a ética cristã, todos os homens são iguais perante Deus. Esta mensagem de igualdade confrontava-se com a realidade de um mundo social em que os homens conviviam com a mais espantosa desigualdade: escravos e homens livres, servos e senhores feudais, etc. A igualdade prometida, porém, deve ser concebida em um plano espiritual. Na Idade Média, a igualdade só podia ser espiritual, por isso ela coexistia com a mais profunda desigualdade social, enquanto não fossem criadas as condições sociais para uma igualdade efetiva. Ou seja, quando era completamente ilusório e utópico propor-se a realização de uma igualdade real entre os homens, a mensagem cristã tinha um profundo conteúdo moral, lançando os objetivos da vida terrena para alcançar uma sociedade justa no mundo espiritual. O fim supremo da ética cristã é regular o comportamento dos homens visando à ordem sobrenatural. Assim, o fim ou valor supremo é colocado fora do homem, isto é, em Deus. A religião cristã oferece aos homens certos princípios supremos morais que, por virem de Deus, têm para ele o caráter de imperativos absolutos e incondicionados.

A Ética Cristã Filosófica O cristianismo não é filosofia, mas religião. Apesar disto, faz-se filosófica na Idade Média para justificar, através da razão, o domínio das verdades reveladas.

47 Naquele tempo, dizia-se que a filosofia é serva da teologia. Assim, subordinavase, também, a ética à teologia. Na elaboração conceitual dos problemas filosóficos em geral, e morais em particular, aproveita-se a herança da Antigüidade (particularmente de Platão e Aristóteles), submetendo-a a um processo de cristianização. Santo Agostinho incorpora as idéias de Platão de purificação da alma e sua ascensão libertadora até eleva-se à contemplação das idéias, mas transforma-as na elevação cética até Deus, culminando no êxtase de felicidade que não pode ser alcançada neste mundo. A ética agostiniana se contrapõe ao racionalismo ético dos gregos ao sublinhar o valor da experiência pessoal, da interioridade, da vontade e do amor. São Tomás de Aquino sustenta uma ética baseada na de Aristóteles, porém também cristianizando sua moral e sua filosofia. Deus é o bem objetivo ou fim supremo, cuja posse causa felicidade, que é um bem subjetivo. E é nesse ponto que ele se afasta de Aristóteles, pois para este a felicidade é o bem último. Mas, assim como Aristóteles, a contemplação, o conhecimento (como visão de Deus), é o meio mais adequado para alcançar o fim último. Atém-se à tese do homem como ser social ou político e inclina-se para uma monarquia moderada, ainda que considere que todo o poder derive de Deus e o poder supremo caiba à Igreja.

4. A Ética Moderna É a ética dominante desde o século XVI até princípios do século XIX, com tendência antropocêntrica, e que atinge seu ponto culminante na ética de Kant.

I. A Ética Antropocêntrica no Mundo Moderno A ética moderna é cultivada na nova sociedade que sucede à sociedade feudal da Idade Média, a qual se caracteriza por mudanças econômicas (desenvolvimento das relações capitalistas de produção); sociais (fortalecimento da burguesia, que

48 se preocupa com a extensão de seu poder econômico e luta para impor a sua hegemonia política através de uma série de revoluções); estatais (criação de grandes Estados modernos, únicos e centralizados); e religiosas (a religião deixa de ser a forma ideológica dominante). Nessa nova sociedade o homem adquire um valor pessoal, não só como ser espiritual, mas também como ser corpóreo, sensível; e não só como ser dotado de razão, mas também de vontade. O homem aparece no centro da política, da ciência, da arte e da moral. Há a transferência do centro de Deus para o homem, que se apresenta como o absoluto.

II. A Ética de Kant É a mais perfeita expressão da ética moderna. O ponto de partida da Ética de Kant é o factum (o fato) da moralidade. O problema da moralidade exige que se proponha a questão do fundamento da bondade dos atos, ou em que consiste o bom. Para Kant, o único bom em si mesmo é a boa vontade. A bondade de uma ação não se deve procurar em si mesma, mas na vontade com que se fez. É boa a vontade que age por puro respeito ao dever. Se o homem age por puro respeito ao dever e não obedece a outra lei a não ser a que lhe dita a sua consciência moral, é legislador de si mesmo (como pessoa moral). Sendo assim, para Kant, parece profundamente imoral tomar o homem como o meio, porque todos os homens são fins em si mesmos e, como tais, fazem parte do mundo da liberdade ou do reino dos fins. Por conceber o comportamento moral como pertencente a um sujeito autônomo e livre, ativo e criador, Kant é o ponto de partida de uma filosofia e de uma ética na qual o homem se define antes de tudo como ser ativo, produtor ou criador.

49 5. A Ética Contemporânea Incluem-se aqui não apenas as éticas atuais, mas as que continuam tendo influência desde seu surgimento no século XIX – como as de Kierkegaard, Stirner ou Marx.

A ética contemporânea surge numa época de contínuos progressos científicos e técnicos e de um imenso desenvolvimento das forças produtoras, que acabam por questionar a própria existência da humanidade, e conhece um novo sistema social – o socialismo. No plano filosófico, a ética contemporânea se apresenta como reação contra o formalismo e o racionalismo abstrato kantiano, principalmente ao absolutismo de Hegel.

Os rumos principais nos quais se orientam as doutrinas fundamentais contemporâneas no campo da ética são os seguintes:

I. De Kierkegaard ao Existencialismo: Kierkegaard é considerado o pai do existencialismo, sendo tido como “anti-Hegel”. Ao contrário de Hegel, para Kierkegaard o que vale é o homem concreto, a sua subjetividade – e não seu caráter abstrato e universal, contrapondo a Hegel seu irracionalismo absoluto e o seu individualismo radical. Kierkegaard distingue três estágios na existência individual, na seguinte ordem hierárquica: religioso, ético e estético. Max Stirner segue no mesmo sentido, e até dá um passo além: a moral é praticamente impossível na individualidade. O existencialismo de Jean-Paul Sartre renova nos dias contemporâneos a orientação individualista e irracionalista de Kierkegaard, mas com algumas diferenças, por exemplo: para Sartre, Deus não existe; portanto, resta somente o homem como fundamento sem fundamento dos valores. Para Sartre, o homem é liberdade, e esta é a única fonte de valor, e o valor supremo.

50 II. O Pragmatismo. Como filosofia e doutrina ética, o Pragmatismo surge e se difunde nos EUA, com S. Pierce, W. James e J. Dewey. O progresso científico e técnico desse país criaram as condições para esta filosofia antiespeculativa e atenta às questões práticas, ao pragmatismo, que por sua vez consiste em uma variante utilitarista marcada pelo egoísmo, e como mais uma versão do subjetivismo e do irracionalismo.

III. Psicanálise e Ética. Fundada por Freud, as teses da psicanálise foram submetidas a um processo de revisão pelos seus outros ramos, seguidos por Adler, Jung, Sullivan e Fromm. A psicanálise clássica, de Freud, tem uma concepção naturalista do homem, e Fromm vem completá-la integrando-lhe os fatores sociais. A base da psicanálise é o inconsciente do homem, onde se armazenam recordações, desejos ou impulsos reprimidos, que lutam coma a consciência para escapar de sua repressão. Para Freud, a energia que se manifesta no inconsciente é de natureza sexual e se chama libido, que quando reprimida acarreta perturbações psíquicas. Freud ainda distingue três zonas da personalidade: o id, o ego e o superego. A contribuição de Freud à ética se dá no seguinte sentido: se o ato moral é o praticado de forma consciente e livre, os atos praticados por uma motivação inconsciente estão excluídos do campo moral. Entretanto, a versão de Fromm da psicanálise, por considerar seu aspecto social, oferece maiores contribuições à ética do que a psicanálise clássica de Freud.

IV.O Marxismo O marxismo critica as morais do passado e evidencia as bases teóricas e práticas de uma nova moral. Marx tenta mostrar que o homem é práxis; é um ser produtor, transformador, criador. Além disso, o homem é um ser social, e também um ser histórico. Chega ele à tese entre o desenvolvimento das forças produtivas e das relações de produção. Ao mudar a base econômica, muda também a moral.

51 Marx acredita no caráter histórico-social da moral. Aprofunda-se ele na nova moral, com que ele está entusiasmado, indo em busca dos aspectos das classes sociais e suas implicações, e das forças de produção; concluindo, Marx acredita que o homem tem o dever de interferir na transformação da sociedade, pois há a possibilidade de se voltar à barbárie e de o homem não consiga subsistir.

V. Neopositivismo e Filosofia Analítica Aqui estão as correntes éticas contemporâneas que acabam por concentrar sua atenção na análise da linguagem moral, começando com G.E. Moore. Moore afirma que o bom é indefinível, e existe como propriedade não natural, e conclui que ele só pode ser captado por meio da intuição. Seus seguidores – os intuicionistas – contribuem para endossar suas teses. O próximo passo depois do intuicionismo foi o dado pelos positivistas lógicos. Em seguida se abre espaço para o emotivismo ético, cuja conclusão é de que os termos éticos têm somente um significado emotivo, e as proposições morais carecem de valor científico. Embora sejam inegáveis as contribuições dadas pelos filósofos analíticos na investigação da linguagem moral, não se pode esquecer de que a linguagem moral é o meio pelo qual as relações efetivas se manifestam no mundo real. Não se pode reduzir a tarefa da ética à análise da linguagem moral, sob pena de abstrair dela o seu aspecto ideal de seus juízos e termos morais, sendo a investigação analítica insuficiente. Entretanto, todas estas contribuições parecem fazer parte da incessante dinâmica histórico-social da moral.

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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

SÁNCHEZ VÁZQUEZ, Adolfo. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.

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