Carlos A. Kuhnen
Mecânica Geral
Florianópolis, 2009
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K96m Kuhnen, Carlos A. Mecânica Geral / Carlos A. Kuhnen - Florianópolis : UFSC/EAD/ CED/CFM, 2009. 275p. ISBN 978-85-99379-46-2 1. Física. 2. Mecânica. I. Título. CDU 531 Catalogação na fonte: Eleonora Milano Falcão Vieira
Sumário Apresentação..................................................................... 7 1 Mecânica Newtoniana..................................................... 9 Introdução.................................................................................... 11 1.1 Espaço e Tempo.....................................................................12 1.2 As Leis de Newton.................................................................15 1.2.1 Primeira lei e referenciais inerciais.................................17 1.2.2 Segunda e terceira leis: massa e força...........................18 1.3 Movimento em uma Dimensão............................................ 22 1.3.1 Teorema do momento linear e da energia..................... 22 1.3.2 Força constante e força dependente do tempo.............. 25 1.3.3 Forças dependentes da posição: energia potencial........26 1.3.4 Forças dependentes da velocidade: velocidade limite.... 33
2 Oscilações.................................................................... 45 2.1 Oscilações lineares e não-lineares.......................................47 2.2 Oscilações lineares............................................................... 50 2.2.1 Oscilador harmônico simples........................................ 50 2.2.2 Oscilador harmônico amortecido................................. 55 2.2.3 Energia do oscilador amortecido.................................. 62 2.2.4 Fator de qualidade . ...................................................... 64 2.3 Oscilador harmônico forçado............................................... 65 2.3.1 Amplitude das oscilações e ressonância....................... 68 2.3.2 Potência e dissipação da energia mecânica...................72 2.4 Analogias entre oscilações mecânicas e elétricas...............75 2.5 Princípio de superposição.....................................................77 2.6 Oscilações não-lineares........................................................79 2.6.1 Sistema não-linear simétrico ....................................... 80
3 Movimento em Duas e Três Dimensões........................ 91 Introdução....................................................................................93 3.1 Cinemática no Plano ............................................................ 94 3.1.1 Coordenadas retangulares..............................................94 3.1.2 Coordenadas polares......................................................96 3.1.3 Cinemática em três dimensões...................................... 99 3.2 Elementos de Cálculo Vetorial ............................................ 99 3.2.1 Integral de Linha........................................................... 99 3.2.2 Gradiente......................................................................103
3.2.3 Divergente....................................................................105 3.2.4 Rotacional.....................................................................106 3.3 Teoremas do Momento Linear e da Energia......................108 3.4 Teorema do Momento Angular........................................... 110 3.5 Movimento de Projéteis....................................................... 112 3.6 Energia potencial................................................................. 121
4 Força Central.............................................................. 137 4.1 Forças Centrais.....................................................................140 4.2 Movimento sob a Ação de uma Força Central...................143 4.3 Força Central Inversamente Proporcional ao Quadrado da Distância...................................................154 4.4 As Leis de Kepler para o Movimento dos Planetas............165 4.5 Força do Inverso do Quadrado Repulsiva – O Problema de Rutherford........................................................................ 176
5 Dinâmica de um Sistema de Partículas....................... 185 5.1 Conservação do Momento Linear ......................................187 5.2 Conservação do Momento Angular.................................... 193 5.3 Conservação da Energia......................................................199 5.4 Sistemas de Massa Variável................................................201 5.5 Colisões entre Dois Corpos................................................. 211 5.6 O Problema de Dois Corpos................................................220
6 Sistemas de Coordenadasem Movimento.................... 233 6.1 Referenciais Inerciais e Não-inerciais................................ 235 6.2 Sistemas de coordenadas em rotação................................244 6.3 Dinâmica em Sistemas em Rotação...................................251 6.4 Efeitos Estáticos e Dinâmicos devido à Rotação da Terra..................................................................257 6.4.1 Efeitos estáticos............................................................257 6.4.2 Efeitos dinâmicos .......................................................259
Apresentação O presente texto aborda a Mecânica de Newton em um contexto que pressupõe o conhecimento prévio do cálculo diferencial e integral permitindo que se aplique a mecânica newtoniana em situações como o movimento de foguetes e de planetas em suas órbitas. Os assuntos tratados estão distribuídos em seis capítulos.
No capítulo 1 são discutidas as leis de Newton e seus limites de aplicabilidade. A partir daí desenvolve-se a dinâmica de uma partícula em uma dimensão considerando-se forças dependentes do tempo, forças dependentes da posição e forças dependentes da velocidade.
O capítulo 2 trata das oscilações lineares e não lineares de sistemas mecânicos. Em oscilações lineares são discutidos o oscilador harmônico, o oscilador amortecido e oscilador forçado onde discute-se ressonância. É apresentada a equivalência entre sistemas oscilantes elétricos e mecânicos. Resolvem-se exemplos simples de oscilações não lineares pelo método das aproximações sucessivas.
A dinâmica de uma partícula em duas e três dimensões é desenvolvida no capítulo 3. Aplica-se o teorema do momento linear, o teorema do trabalhoenergia e o teorema do momento angular no movimento de uma partícula em duas e três dimensões. O movimento de projéteis é analisado incluindose a resistência do ar. Define-se a função energia potencial para o movimento no espaço e identificam-se forças conservativas e não conservativas.
O capítulo 4 trata do importante caso de forças centrais onde se introduz a função energia potencial efetiva para a análise qualitativa e quantitativa do movimento. É tratado o caso da força central inversamente proporcional ao quadrado da distância e sua aplicação ao movimento dos planetas. As leis de Kepler são obtidas. Como exemplo de uma força central repulsiva abordamos o espalhamento de Rutherford e o surgimento do modelo nuclear do átomo.
A dinâmica de um sistema de partículas é tratada no capítulo 5. Os teoremas do momento linear e do momento angular e da energia são estendidos para o caso de um sistema de N partículas. O movimento de sistemas com massa variável é abordado e aplicam-se os princípios de conservação do momento linear e da energia para a solução de problemas envolvendo a colisão entre dois corpos.
O capítulo 6 apresenta a aplicação da mecânica de Newton em sistemas de coordenadas em movimento uniforme (referenciais inerciais) e em movimento acelerado (referenciais não inerciais). Discute-se o princípio da relatividade Newtoniana e explicitam-se as transformações de Newton-Galileu entre referenciais inerciais. O movimento descrito a partir de um referencial não inercial é analisado em termos de forças inerciais (ou fictícias). Os efeitos estáticos e dinâmicos devido a rotação da terra são explorados.
Com os assuntos tratados da forma exposta acima se pretende aprofundar a compreensão dos princípios fundamentais da mecânica aliando-se técnicas matemáticas mais avançadas de modo a tratar o formalismo da teoria e a resolução de problemas físicos sob um ponto de vista mais abrangente
Carlos Alberto Kuhnen
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Mecânica Newtoniana
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Mecânica Newtoniana
MECÂNICA NEWTONIANA LEX I - Corpus omne perseverare in statu suo quiescendi vel movendi uniformiter in directum, nisi quatenus a viribus impressis cogitur statum illum mature. LEX II - Mutationem motus proportionalem esse vi motrice impressae et fieri secundum lineam rectam qua vis illa imprimitur. LEX III - Actioni contrariam semper et aequalem esse reactionem: sive corporum duorum actiones in se mutuo semper esse aequales et in partes contrarias dirigi.
Este capítulo tem como objetivo apresentar os princípios básicos da mecânica de Newton e sua aplicação no estudo do movimento de uma partícula em uma dimensão. Ao final do mesmo, o aluno deverá ser capaz de: • Enunciar as leis de Newton; • Reconhecer os limites de aplicabilidade da mecânica newtoniana; • Aplicar o teorema do momento linear e o teorema do trabalho-energia na solução de problemas; • Descrever qualitativamente o movimento unidimensional de uma partícula, conhecida a sua função energia potencial; • Obter a solução da equação de movimento unidimensional, pela conservação da energia mecânica, quando a força depende apenas da posição;
Introdução A evolução da vida em nosso planeta propiciou o surgimento do homem, ser dotado de uma mente investigadora com uma grande curiosidade sobre fenômenos naturais. No início, suas únicas fontes de informação eram os seus sentidos e, conseqüentemente, ele estabeleceu uma classificação para os fenômenos observados de acordo com os sentidos empregados para percebê-los. O ato de ver foi relacionado à Mecânica Newtoniana
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luz e, como resultado, desenvolveu-se a óptica como uma ciência praticamente independente relacionada à visão. Já a audição foi associada ao som e, assim, desenvolveu-se a acústica como ciência correlata. Da mesma maneira, a sensação física de calor deu surgimento à termodinâmica, que permaneceu um longo tempo como um ramo autônomo da física. Mas, seguramente, o mais comum dos fenômenos observados diretamente é o movimento, e a ciência do movimento, isto é, a mecânica, foi desenvolvida antes dos demais ramos da física. O movimento dos corpos celestes, de corpos em queda, as ondas do oceano, o vôo dos pássaros, as rajadas de vento, a corrida dos animais, são exemplos simples de fenômenos de movimento. O movimento dos corpos e suas causas foi objeto de investigação do homem desde os filósofos gregos na antiguidade, e as idéias de Aristóteles (384-322 aC), sobre o movimento dos corpos prevaleceram durante quase vinte séculos. O pensamento Aristotélico foi demonstrado como errôneo somente após os trabalhos e as idéias de Galileu Galilei (1564-1642) e Sir Isaac Newton (1642-1727), que desenvolveram uma abordagem para estudar o movimento dos corpos que conhecemos como a mecânica clássica. Esta abordagem mudou definitivamente a maneira com que descrevemos o movimento dos corpos. O desenvolvimento da mecânica foi um passo essencial para nosso entendimento de uma extensa gama de fenômenos físicos, pois praticamente todos os processos imagináveis têm como origem o movimento de certos objetos. Em nosso sistema solar, a Terra e os planetas movem-se em torno do Sol e o conjunto de estrelas que formam nossa galáxia gira em torno de seu centro. Os elétrons, em movimento nos átomos, dão origem à absorção e emissão de luz e seu movimento num metal produz corrente elétrica. As moléculas em movimento em um gás dão origem à pressão e, numa reação química, as colisões entre moléculas produzem novas moléculas, apenas para citar alguns exemplos. A mecânica clássica é devida, em grande parte, ao gênio de Isaac Newton, que sintetizou a mecânica por meio do que chamamos de princípios de Newton ou as leis de Newton da mecânica. E a ela nos referimos como mecânica newtoniana. Mas a mecânica tal como atualmente está estruturada deve-se também às contribuições iniciais de homens como Arquimedes, Galileu, Descartes, Huygens, bem como às contribuições posteriores de homens como Lagrange, Hamilton, Mach e Einstein. Neste curso, desenvolvemos a dinâmica de uma partícula e de um sistema de partículas com a mecânica newtoniana, explicitando suas aplicações e limitações, sem abordar as formulações de Lagrange e Hamilton da mecânica clássica nem a formulação relativística de Einstein.
1.1 Espaço e Tempo A Mecânica trata do movimento dos corpos no espaço e tempo. Mas quais são os conceitos de espaço e tempo a que nos referimos? Clara-
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mente, estes conceitos são vitais para o desenvolvimento da ciência denominada Mecânica Clássica e foram definidos nas primeiras páginas da obra de Sir Isaac Newton, Princípios Matemáticos de Filosofia Natural (Philosophie naturalis principia mathematica), em 1687:
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Espaço absoluto em sua própria natureza, sem relação com qualquer coisa externa, permanece sempre similar e imóvel. O Tempo absoluto, verdadeiro e matemático, por si mesmo e da sua própria natureza, flui uniformemente sem relação com qualquer coisa externa e é também chamado de duração.
Estes conceitos de espaço e tempo absolutos foram questionados desde então. As primeiras críticas foram lançadas por Gottfried Wilhelm Leibniz e George Berkeley, já na época da publicação da obra de Newton. Para Berkeley, apesar de ser admirador de Newton, o espaço e o movimento absoluto poderiam ser substituídos pelo sistema de estrelas fixas no céu e pelo movimento relativo a este sistema, sem que nada de importante se perdesse na teoria newtoniana. Ademais, tanto Leibniz como Berkeley criticaram a associação estabelecida por Newton entre Deus e o espaço absoluto. As críticas de maior influência à mecânica Newtoniana viriam em fins do século XIX, com o físico e filósofo austríaco Ernst Mach (1838-1916). Mach, cujas idéias influenciaram o ensino da Mecânica, em seu tratado, A ciência da Mecânica – Uma Apresentação Crítica e Histórica do seu desenvolvimento (The Science of Mechanics: A Critical and Historical Account of Its Development), publicado inicialmente em 1883, critica os conceitos Newtonianos de espaço e tempo absolutos. Em sua obra, Mach argumenta que Newton havia contradito sua intenção de não aceitar em uma teoria científica nada que não pudesse ser inferido diretamente do ‘fenômeno observável’ ou induzido a partir da argumentação.
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eia novamente as definições de tempo absoluto e espaço absoluto e perceba que o termo “sem relação com qualquer coisa externa” nos afirma que não pode ser observado, e que também não podemos chegar à conclusão de sua existência a partir de argumentos, pois não temos onde assentar ou justificar qualquer argumento que seja.
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Sugiro que, antes de começar o estudo desta disciplina, você leia os livros Física Básica A e B para revisar alguns conceitos importantes da mecânica.
Apesar de o próprio Newton ter plena consciência das dificuldades introduzidas pelas concepções de espaço absoluto e de tempo absoluto e do embate filosófico que se seguiu, você sabe que a mecânica de Newton permite predizer com precisão, como uma ciência exata que é, o movimento futuro dos corpos, dado que conhecemos as condições iniciais e as forças atuantes sobre estes corpos. A mecânica newtoniana vem sendo aplicada com sucesso no transcorrer dos últimos três séculos, possibilitando desde a previsão teórica da existência de planetas no nosso sistema solar até ao lançamento de satélites em órbita da Terra. A mecânica de Newton possibilitou ao homem ir à Lua e enviar robôs controlados a Marte. Neste curso de mecânica, vamos tratar do movimento dos corpos no espaço e tempo absolutos no sentido Newtoniano. Isto significa que não iremos considerar a Teoria Especial da Relatividade de Albert Einstein, em que o conceito de Tempo Absoluto deixa de existir estando as coordenadas espaciais e temporais conectadas de modo que, em vez de nos referirmos a espaço e tempo, devemos entender que o existente é um espaço-tempo contínuo (ou seja, algum tipo de união entre espaço e tempo é que tem realidade independente). Antes de prosseguir, devo lembrar que este é um curso de mecânica mais avançado e, por conseguinte, considero que você já tenha os conceitos de grandezas escalares (como comprimento, massa, tempo, temperatura e pressão) e grandezas vetoriais (como velocidade, aceleração, força, torque, momento linear e momento angular), bem como saiba produtos escalar e vetorial, diferenciação e integração de vetores. Também considero que você tenha de forma clara o conceito de partícula.
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embre-se, um corpo pode ser considerado como partícula desde que possamos ignorar a sua estrutura interna ou seus movimentos internos. Exemplo é a Terra, que tem uma estrutura e movimento de rotação em torno de um eixo, mas que em seu movimento em torno do Sol, pode ser tratada como uma partícula. Porém, devemos levar em conta que ela é um corpo extenso para entendermos o fenômeno das marés, que decorre de sua interação gravitacional com a Lua. Algumas vezes, é possível tratar um corpo complexo como uma partícula, se todas as partes do corpo movimentam-se da mesma forma, como um bloco atado a uma mola, ou um automóvel em movimento.
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Neste curso, primeiro abordamos a dinâmica de uma partícula e, posteriormente, aplicamos as leis de Newton a um sistema de partículas.
1.2 As Leis de Newton Em disciplinas anteriores, você teve contato com as idéias de Aristóteles, o pensamento de Descartes e a contribuição de Galileu, no que se refere ao estudo do movimento de corpos. Entretanto, foi Newton quem, com clareza, estabeleceu as leis do movimento, fazendo surgir uma nova forma de percebermos o mundo e jogando por terra as idéias de Aristóteles, as quais se assentavam em poderosos argumentos lógicos e perduraram por quase 20 séculos. Em sua obra publicada em 1687, o Principia Mathematica, a que já nos referimos, Newton formulou de maneira completa as três leis da mecânica, as quais podemos enunciar de forma breve e concisa como segue:
I – Todo corpo permanece em estado de repouso ou de movimento uniforme, em linha reta, a menos que seja obrigado a mudá-lo por forças aplicadas a ele. II - A taxa de variação do momento linear é proporcional à força aplicada, e na direção em que a força age. III - Para cada ação, existe sempre uma reação igual e oposta.
Observe que, na segunda lei, a quantidade física de interesse é o momento linear que é a grandeza associada ao produto da massa pelo vetor velocidade da partícula. Veja que, desta maneira, podemos considerar sistemas onde a massa é variável, sendo um bom exemplo o movimento de um foguete, assunto que iremos tratar no capítulo 5. Quando consideramos um corpo de massa constante, a segunda lei nos fornece a força como o produto da massa pela aceleração, sendo esta a maneira como a segunda lei é enunciada nos cursos iniciais de mecânica. Você deve perceber que Newton não descobriu que a força é o produto da massa pela aceleração, mas o que ele descobriu foi que as leis da física podem ser expressas mais facilmente através do conceito de força definido desta maneira (produto da massa pela aceleração). E as leis da física referem-se então às forças gravitacional, eletromagnética, fraca e nuclear, que são as quatro forças fundamentais conhecidas e nas quais nos baseamos para explicar os fenôme-
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A emissão beta, desintegração beta ou decaimento beta é o processo pelo qual um núcleo atômico instável pode se transformar em outro núcleo mediante a emissão de uma partícula beta. A partícula beta pode ser um elétron ( ) ou um pósitron , que é o anti-elétron, ou seja, tem a mesma massa do elétron e carga positiva.
nos físicos existentes no Universo observável. Assim, temos uma lei de força para a atração entre dois corpos (força gravitacional), uma lei de força para a força entre cargas (lei de Coulomb) e assim por diante. A procura da unificação das forças fundamentais em uma só já levou à unificação das forças eletromagnética e fraca, no que se denomina de força eletrofraca, sendo a força fraca responsável, por exemplo, pelo decaimento em reações nucleares. As leis de Newton do movimento podem ser pensadas como uma prescrição para calcularmos ou predizermos o movimento subseqüente de uma partícula (ou sistema de partículas) a partir do conhecimento da posição e da velocidade em um certo instante, que geralmente é tomado como o instante inicial. Isto é, conhecendo-se a força atuante sobre uma partícula (ou sistema de partículas), a sua posição e velocidade iniciais, pode-se predizer de forma precisa seu movimento futuro. Com Newton, a mecânica se estrutura solidamente como uma ciência exata, e sua aplicação com resultados precisos em situações práticas de estática, movimento de corpos na superfície da Terra e movimento dos corpos celestes, mostrou sua validade de maneira triunfal. Mas deve estar claro para você que a mecânica de Newton não se aplica sem restrições a todos os fenômenos físicos. Basta você lembrar o caso de um gás e de quantas partículas temos em questão. Está claro que não podemos resolver as equações de movimento para este sistema e calcular as coordenadas de todas as partículas do gás como função do tempo. Este problema é abordado corretamente com a mecânica estatística. Também não podemos aplicar a mecânica newtoniana para explicar a estrutura eletrônica dos átomos e moléculas ou explicar as contribuições eletrônicas para as propriedades físicas dos sólidos. Somente após os trabalhos iniciais de Max Planck, Albert Einstein, Niels Bohr e as contribuições posteriores de Louis de Broglie, Erwin Schrödinger, Werner Heisenberg e Max Born, que culminaram no desenvolvimento da mecânica quântica no início do século XX, foi possível alcançar um entendimento da estrutura atômica da matéria. Ademais, não podemos aplicar a mecânica newtoniana para estudar o comportamento de partículas extremamente energéticas, como em um acelerador de partículas, cujas velocidades chegam a ser próximas à da luz. Neste caso, devemos empregar a teoria especial da Relatividade, pois os efeitos relativísticos são agora apreciáveis, o que não acontece para baixas velocidades, pois neste caso a relatividade restrita se reduz à mecânica newtoniana. Veja que o mesmo se sucede com a teoria da Gravitação de Newton. Por exemplo, dela não podemos concluir sobre a existência de buracos negros nas galáxias, ao passo que a teoria Geral da Relatividade prevê a existência dos mesmos. Isto deixa claro que, à medida que crescia nossa
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capacidade de investigação durante os séculos XIX e XX e aumentava nossa compreensão do micro e macrocosmo, surgiam novas teorias mais gerais e abrangentes. Lembre-se, apesar das suas limitações, a mecânica de Newton é a base sólida sobre a qual se ergueram as novas teorias físicas no início do século XX.
1.2.1 Primeira lei e referenciais inerciais A primeira lei da mecânica Newtoniana descreve uma propriedade comum a toda matéria, que denominamos de inércia, isto é, a resistência que toda matéria oferece para alterar seu estado de movimento. Ou seja, se um corpo está em repouso em relação a você, é necessária a aplicação de uma força para movimentá-lo e, se o corpo está em movimento, é necessária uma força para colocá-lo em repouso. Portanto, o corpo não muda seu estado de repouso ou movimento uniforme por si só, uma força é necessária para que mude o seu estado de movimento. Obviamente, quando especificamos o estado de movimento de um corpo, devemos ser precisos em relação ao sistema de referência utilizado. Uma descrição matemática do movimento de uma partícula (ou sistema de partículas) requer um referencial, e adotamos um sistema de coordenadas que permite especificar o vetor posição da partícula. Os referenciais onde valem as leis de Newton são ditos referenciais inerciais e, portanto, são referenciais que ou estão em repouso ou em movimento retilíneo uniforme, pois em referenciais acelerados, o observador irá atribuir uma aceleração para uma partícula que esteja em repouso quando observada de um referencial inercial. A descrição do movimento de uma partícula a partir de referenciais não inerciais será efetuada no capítulo 6. Aqui é importante lembrarmos que a essência da primeira lei é que sempre podemos encontrar um referencial em relação ao qual um corpo isolado mova-se com velocidade uniforme. Isto é, a primeira lei nos assegura a existência de referenciais inerciais. Mas os referenciais inerciais, onde valem as leis de Newton, estão em repouso em relação a quê? Estão em movimento retilíneo uniforme em relação a quê? Vimos que, de início, Newton definiu o espaço e tempo e assim, para ele, os referenciais inerciais são aqueles que estão em repouso ou em movimento retilíneo uniforme em relação ao espaço absoluto. Como não podemos inferir o espaço absoluto de Newton de qualquer coisa observável ou de argumentação lógica, podemos aceitar ou não a idéia de Newton de espaço absoluto, pois como primeiro observou Berkeley, você pode substituir o espaço absoluto pelo sistema de estrelas fixas no céu e nada se altera na mecânica de Newton. Mas sabemos que a estrelas não estão fixas no céu, e então podemos perguntar se existe um referencial inercial perfeito. Para a maioria das situações Mecânica Newtoniana
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práticas, um referencial fixo na superfície da Terra é aproximadamente inercial. Isto decorre da baixa velocidade angular da Terra, mas, como veremos no capítulo 6, em várias situações somos forçados a levar em conta que um referencial fixo na Terra não é inercial, devido a sua rotação. Uma escolha melhor é um referencial cuja origem coincida com o centro da Terra, entretanto, neste caso também não temos um referencial exatamente inercial, pois a Terra está acelerada em seu movimento orbital em torno do Sol. Claro que um referencial cuja origem se localiza no Sol é um excelente referencial inercial, porém nossa estrela participa do movimento de rotação de nossa galáxia (a via-láctea) executando um movimento de rotação em torno do centro da galáxia com um período de aproximadamente 200 milhões de anos. Na busca de um referencial inercial perfeito, podemos escolher um cuja origem esteja no centro de nossa galáxia. Mas nosso objetivo não é alcançado, pois a via-láctea faz parte de um grupo local de galáxias, cuja vizinha mais próxima é Andrômeda, e que giram em torno do centro de massa. Este grupo local de galáxias faz parte de um grande agrupamento de galáxias (a Constelação de Virgem), cujo centro dista 60 milhões de anos-luz da terra e que também tem um movimento de rotação! Assim, não encontramos no Universo um referencial inercial perfeito. Podemos acreditar que o melhor referencial é aquele que tem como referência a distribuição de galáxias muito distantes, substituindo a antiga proposta de Berkeley, que tomava as estrelas “fixas” como referência. Mas mesmo galáxias muito distantes têm movimento acelerado e, assim, a melhor definição a que podemos chegar é, segundo Mach, que um referencial inercial é aquele em que a matéria do Universo não é, em média, acelerada, isto é, sistemas de coordenadas inerciais são os que se encontram em repouso, ou pelo menos não sofrem aceleração, em relação à média do movimento da matéria no Universo. Logicamente, nas aplicações práticas da mecânica de Newton, não necessitamos resolver questões filosóficas como a existência ou não de um referencial inercial perfeito, ou acerca da existência ou não de um espaço absoluto. Mas fica claro que devemos sempre escolher um referencial inercial adequado a cada situação, como veremos durante este curso.
1.2.2 Segunda e terceira leis: massa e força A medida quantitativa da inércia de um corpo é o que se denomina de massa. Nós estamos familiarizados com a noção de que quanto mais massivo um objeto, maior é sua resistência à aceleração. Existe uma diferença muito grande entre empurrar uma bicicleta e um carro – compare os esforços em cada caso. Pela experiência, sabemos que os movimentos dos corpos são controlados pela maneira como eles interagem com sua vizinhança. Quando empurramos um objeto so-
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bre uma superfície rugosa, o atrito faz com que ele rapidamente atinja o repouso, mas, se lubrificarmos as superfícies de contato, a distância percorrida até atingir o repouso é muito maior. As interações de um corpo com outros corpos implicam na variação de seu estado de movimento, o que significa que o corpo adquire uma aceleração (ou desaceleração) e partimos daí para quantificar a inércia, ou seja, através da aceleração adquirida pelo corpo. Considere dois corpos isolados e interagindo entre si, apenas por meio das forças gravitacionais que um exerce sobre o outro. Experiências cuidadosas mostram que as acelerações de dois corpos interagindo são sempre opostas e que a razão das acelerações é inversamente proporcional às suas massas inerciais. Isto é, a experiência mostra que se a A e aB são as acelerações dos corpos A e B de massas inerciais
mA e mB , temos:
(1.1)
aA m =− B. aB mA
O sinal menos indica que as acelerações têm sentidos opostos. Esta relação explicita o fato de que, quanto maior a massa do corpo, menor a sua aceleração. Assim, escolhendo-se um corpo-padrão como unidade de massa, pode-se determinar a massa de qualquer outro corpo medindo-se a razão entre a aceleração da unidade de massa e a aceleração do corpo. Portanto, fica estabelecida uma definição operacional de massa por meio da equação 1.1. Esta definição de massa, tendo por base a dinâmica do movimento, medindo-se as acelerações, foi proposta por Ernst Mach em seu livro The Science of Mechanics e se opõe à definição de Newton, que se referia a massa como a quantidade de matéria contida no corpo. O problema com esta definição é que ela significa dizer que a massa m de um corpo especificado pela sua densidade de matéria
e ocupando um volume V é dada
por , e aqui temos uma questão, pois a densidade é, na realidade, a massa por unidade de volume, e logo caímos em um círculo vicioso. Assim, evitamos qualquer dificuldade com relação à definição de massa usando um processo dinâmico para medi-la. Apesar de esta definição operacional de massa ser apresentada em todos os livros de mecânica são pouquíssimos os autores que se referem a Mach como autor desta definição operacional. A relação entre as acelerações, expressa na equação 1.1, mostra, pela experiência, a validade da terceira lei de Newton na interação entre corpos macroscópicos. Observe que podemos escrever a equação 1.1 como: (1.2) Mecânica Newtoniana
mAa A = −mB aB 19
A equação 1.2 quer dizer que, como resultado da interação entre os dois corpos, o produto massa vezes aceleração é constante e explicita a mudança no movimento. Este produto é definido como força e denota a interação entre os corpos. Considerando o movimento no espaço ao invés de numa linha e usando notação vetorial, definimos: , (1.3) . Sendo
a força que o corpo B exerce sobre A e
a força que o
corpo A exerce sobre B, assim a equação 1.2 significa: (1.4)
.
O que mostra que a definição operacional de massa (equação 1.1) é consistente com a terceira lei de Newton (ação e reação iguais e opostas). A equação 1.4 diz que as forças que resultam das interações entre os corpos sempre existem aos pares, ou seja, não existe uma ação sem haver uma reação. Assim, nunca vamos encontrar um corpo isolado que esteja acelerado. Observe também que a terceira lei pode ser encarada de duas formas: na forma fraca, em que a ação e reação são iguais e opostas; na forma forte, na qual a ação e reação são iguais e opostas estando elas orientadas segundo a reta suporte que une os corpos. Esta distinção será útil no estudo de um sistema de partículas no capítulo 5. A terceira lei, apesar de ser válida em situações físicas que encontramos na mecânica, apresenta dificuldades quando tratamos da eletrodinâmica de corpos em movimento. Para cargas aceleradas em movimento muito rápido, a ação e a reação não estão necessariamente segundo a reta suporte que une as cargas, e desde que a terceira lei pressupõe que a interação entre os corpos ocorra instantaneamente, ela naturalmente falha para interações que ocorram com velocidade finita. Como exemplo, temos as interações eletromagnéticas entre cargas aceleradas, cuja velocidade tem valor c =299.792.458 m/s. Assim, você deve estar ciente tanto da aplicação triunfal da mecânica de Newton em uma extensa gama de fenômenos como também de suas limitações (por exemplo, não podemos descrever átomos e moléculas usando a mecânica newtoniana), ficando claro que, neste curso, iremos tratar de situações físicas em que a mecânica newtoniana é plenamente aplicável.
20
A definição operacional de massa também é consistente com a segunda lei, pois como vimos, quando a massa é constante, a força é o produto da massa pela aceleração. Para se entender esta consistência, basta lembrar que o momento linear é definido como o produto da massa pelo vetor velocidade, →
→
P = mv ,
(1.5)
onde, de forma genérica, estamos considerando uma partícula de massa
→
m e velocidade v e, assim, escrevemos a segunda lei:
(1.6)
.
Quando a massa é constante, a equação 1.6 torna-se a expressão familiar da segunda lei, (1.7)
,
que concorda com as expressões de força para
→
→
F AB e F BA dadas na
equação 1.3. Usando a segunda lei expressa na equação 1.6, podemos escrever a equação 1.4 (a terceira lei) da seguinte maneira: (1.8)
,
ou, (1.9)
.
Como a derivada de uma constante é zero, temos, finalmente: (1.10)
→
→
→
PA + PB = PTotal = constante.
Em outras palavras, isto quer dizer que a terceira lei nos assegura que o momento linear total de dois corpos isolados e interagindo apenas entre si é constante no tempo. Perceba bem que neste caso nenhuma outra força está atuando, mas apenas as forças que expressam suas interações mútuas. Mais adiante neste curso, veremos como generalizar este resultado para um sistema de partículas que interagem mutuamente e estejam também sob a ação de forças externas. Agora você deve estar percebendo que, para determinarmos o movimento futuro de uma partícula, usamos as leis de Newton. Usamos a primeira lei ao estabelecermos um referencial inercial adequado à Mecânica Newtoniana
21
situação física, como o movimento de corpos na superfície na Terra → ou movimento dos planetas, e determinamos a posição r (t ) usando a segunda lei (equação 1.6 ou 1.7), isto é, resolvendo a equação diferencial de segunda ordem: (1.11) Você deve lembrar que a aceleração é a taxa de variação segunda da posição com o tempo.
.
Nesta equação, está explícito que a força
→
F é a resultante das forças
que atuam sobre a partícula e admite-se que conhecemos esta força. A solução desta equação apresenta duas constantes arbitrárias e, logo, para que tenhamos uma solução única, devemos conhecer as condições iniciais do estado de movimento da partícula, isto é, a sua posi→
→
r(t 0 ) e sua velocidade inicial v (t 0 ) , sendo t0 o instante inicial, que usualmente é tomado como o instante zero, t0 = 0 . Note que ção inicial
a equação 1.11 é uma equação vetorial, que na realidade sintetiza três equações, uma para cada direção no espaço. A solução analítica da equação de movimento (equação 1.11) só é possível em situações especiais em que a força ou é constante ou tem uma dependência simples com a posição, a velocidade e/ou o tempo. O importante é que, mesmo em situações práticas em que a força tem dependência complicada, podemos resolver as equações de movimento numericamente com o auxílio de computadores, os quais atualmente têm alta capacidade de processamento, permitindo a solução de problemas bastante complexos. Por exemplo, nós podemos obter de forma analítica a trajetória de um projétil incluindo a resistência do ar, mas o lançamento de um satélite em órbita exige uma solução numérica para o problema. Neste curso, iremos considerar problemas mecânicos simples que permitem um tratamento analítico, o que exige um conhecimento prévio de cálculo diferencial e integral. Iniciaremos com o estudo do movimento de uma partícula, assunto da próxima seção.
1.3 Movimento em uma Dimensão 1.3.1 Teorema do momento linear e da energia Nesta seção, estudar-se-á o movimento de uma partícula de massa
m ao longo de uma linha reta que será considerada o eixo x , sob a ação de uma força F dirigida ao logo do eixo, isto é, estudaremos o
movimento em uma dimensão. Neste caso, a equação 1.11 se reduz a uma única, isto é: (1.12)
22
••
•
m x = F ( x, x, t ) .
em que usamos a notação simplificada
e
••
2 x≡d x
dt 2
para a
velocidade e para aceleração da partícula. Observe que, mesmo para o movimento unidimensional, só podemos resolver analiticamente a equação de movimento em casos em que as forças não tenham uma dependência muito complicada com a posição, velocidade e tempo. Caso contrário, tendo-se as condições iniciais, resolve-se a equação (1.12) numericamente. Lembre-se de que a força
•
F ( x, x, t ) é a resultan-
te. Por exemplo, para um corpo que cai verticalmente, ela vai ser a soma da força peso mais a força de atrito devido à resistência do ar. Antes de resolvermos a equação de movimento unidimensional para algumas situações mais simples, vejamos os teoremas do momento linear e da energia para o movimento em uma dimensão. Como vamos analisar o movimento em uma dimensão, podemos omitir o caráter vetorial das grandezas físicas, como força, aceleração, momento linear e velocidade. Convencionamos que o movimento para a direita (ou para cima) é positivo e para esquerda (ou para baixo) é negativo. Reescrevemos a equação (1.6), a segunda lei de Newton, em uma dimensão: (1.13)
.
Esta equação estabelece que a taxa de variação do momento linear de uma partícula é igual à força aplicada, que é justamente o enunciado da segunda lei. Este teorema pode ser chamado Teorema do Momento Linear, na forma diferencial, e nos referimos à segunda lei como o teorema do momento linear. Seu corolário é de que, na ausência de uma força, o momento linear é constante no tempo. A integração desta equação diferencial entre os instantes t1 e t2 fornece o Teorema do Momento Linear na forma integral, t2
∆P = P2 − P1 = ∫ Fdt .
(1.14)
t1
Isto é, a variação do momento é dada pela integral da força no tempo. A integral é chamada de impulso, o qual é fornecido pela força durante este intervalo de tempo. A força deve ser conhecida como função do tempo apenas, de modo que possamos calcular a integral. Caso a força F dependa da posição, da velocidade e do tempo, ou seja, •
F ( x, x, t ) , o impulso pode ser calculado, para um movimento particular em que sejam conhecidos
•
x(t ) e x(t ) . Em muitas situações, não
temos informação de como a força varia no tempo, mas podemos medir a variação no momento linear e, portanto, determinar o valor do impulso (o valor da integral). Pense no exemplo em que se chuta uma bola em repouso e cuja massa é conhecida. Não conhecemos como a força atuante varia com o tempo enquanto o pé colide com a bola, Mecânica Newtoniana
23
mas podemos, de forma indireta, medir a velocidade que a mesma adquire e assim saber o valor do impulso. A partir do teorema do momento linear, podemos chegar a outro teorema relacionado ao conceito de energia, a energia associada ao movimento, denominada de energia cinética. Em uma dimensão, temos , reescrevemos a equação 1.13 e, multiplicando-se ambos os membros pela velocidade v da partícula, obtemos, (1.15)
,
ou, (1.16)
.
Sabemos que a quantidade entre parênteses é definida como a energia cinética da partícula, (1.17)
,
cuja unidade no MKS é o Joule e tem dimensões , ou seja, o produto de força por distância. Para se estabelecer uma relação entre energia de movimento, força aplicada e a distância percorrida, reescreve-se a equação 1.16, (1.18)
,
isto é, a taxa de variação temporal da energia cinética é igual ao produto da força aplicada pela velocidade da partícula no instante t , que chamamos de potência mecânica. Logo, a energia cinética pode permanecer constante ( F = 0 ), ou pode aumentar se a força tiver o mesmo sentido da velocidade, ou diminuir se a força tem sentido oposto, ou seja, se opondo ao movimento (força de resistência do ar, por exemplo). A equação 1.18 é conhecida como o teorema da energia (na forma diferencial) e, integrando-se esta equação entre os instantes t1 e t2 , obtemos este teorema na forma integral: t2
(1.19)
∆EC = EC 2 − EC1 = ∫ Fvdt . t1
A integral na equação 1.19 é denominada de trabalho realizado pela força durante este tempo. Isto é, a variação da energia cinética é igual ao trabalho realizado pela força aplicada. A equação 1.19 é conhecida como o teorema do trabalho-energia, sendo que o integrando é a potência significando a taxa de execução de trabalho com o tempo
24
pela força
F . Deve ficar claro que, se a força é conhecida como
•
F ( x, x, t ) , a integral só pode ser calculada para um movimento particular em que são conhecidos posição, isto é, que
•
x(t ) e x(t ) . Quando a força depende da
F = F (x) , podemos reescrever a integral, lembrando
, e assim:
(1.20)
,
sendo a força conhecida, podemos calcular diretamente a variação da energia cinética da partícula enquanto se desloca da coordenada
x1 até x2 calculando o trabalho (a integral) realizado por esta força. Você deve ter notado que a equação 1.20 mostra que chegamos a uma relação entre energia, força e distância como foi inferido a partir da análise dimensional da energia. A equação 1.20 explicita, então, o teorema do trabalho-energia, isto é, que a variação da energia cinética da partícula entre dois pontos de sua trajetória é igual ao trabalho realizado pela força para deslocá-la entre estes pontos. 1.3.2 Força constante e força dependente do tempo O problema mecânico mais simples é o caso da força constante. A equação 1.12 torna-se: ••
x=
(1.21)
F = a, m
e temos uma aceleração constante. Como
, integramos a
equação 1.21 para obter a velocidade, (1.22)
,
logo, (1.23)
v(t ) = v0 + a (t − t0 ) .
Sendo
, integramos agora a equação 1.23 para se obter a posição da partícula como função de tempo,
(1.24)
(1.25)
,
1 x = x0 + v0 (t − t0 ) + a (t − t0 ) 2 . 2
Os resultados expressos nas equações 1.23 e 1.25 certamente são fa-
Mecânica Newtoniana
25
miliares a você, como sendo as soluções para o movimento uniformemente acelerado. Vale frisar que a equação de movimento é de segunda ordem e na sua integração temos duas constantes arbitrárias, que, como você pode ver, referem-se à velocidade e posição iniciais da partícula, ou seja, x0 e v0 , no instante t0 , para o qual podemos atribuir qualquer valor. Na maioria dos casos, tomamos
t0 = 0 . O caso da força
constante tem aplicação, por exemplo, em corpos em queda livre próximos à superfície da Terra, quando desprezamos a resistência do ar. Uma outra situação em que podemos integrar diretamente a equação do movimento é quando a força atuante depende do tempo apenas, isto é, F = F (t ) . Neste caso, podemos ainda usar a equação 1.22 para determinar a velocidade, mas agora a aceleração,
a = F (t ) m , não é
constante e, assim, temos: (1.26)
.
A velocidade pode ser obtida na medida em que conhecemos a força
F (t ) . Uma vez determinado v(t ) , integramos para obter a posição da
partícula, isto é, (1.27)
.
O problema está agora formalmente solucionado. Tendo sido especificada a força, calculamos as duas integrais. Mesmo se a força depender do tempo de uma maneira muito complicada, podemos encontrar a solução por meio de integração numérica.
1.3.3 Forças dependentes da posição: energia potencial Em muitas situações, a força que atua sobre um corpo depende da posição. Lembre-se, por exemplo, da força gravitacional, ou da força restauradora de uma mola. Isto significa que a equação de movimento é: (1.28)
••
m x = F (x) .
Esta equação diferencial pode ser resolvida de várias maneiras. Uma solução pode ser alcançada usando-se a regra da cadeia para escrevermos a aceleração da seguinte forma: (1.29) Ou seja,
26
.
(1.30)
.
Equação que agora podemos integrar desde a posição tícula tem velocidade dade
v , isto é,
x0 , onde a par-
v0 , até a posição x onde a partícula tem veloci-
(1.31)
,
(1.32)
.
Resultado que permite obter a velocidade como função da posição
v(x) , a partir da qual obtemos a posição como função do tempo, pois , e assim, x
t
dx ∫x v( x) = t∫ dt . 0 0
(1.33)
Porém, em vez de se adotar o procedimento indicado nas equações 1.32 e 1.33, é mais conveniente observar que a equação 1.32 expressa o teorema do trabalho-energia, que já vimos na equação 1.20. Como vimos, a integral na equação 1.32 (ou 1.20) é o trabalho realizado pela força quando a partícula se desloca de x0 para x e é uma função da posição. Definimos a diferença de energia potencial como o trabalho realizado pela força quando a partícula se desloca de x para um ponto de referência
x0 , isto é,
(1.34)
.
Ou, na forma diferencial, (1.35)
,
e assim expressamos a força como a derivada da energia potencial. A energia potencial é, portanto, uma função das coordenadas da partícula cuja derivada negativa é a força. Note que a mudança da coordenada do ponto de referência (escolher outro valor para x0 ) significa
V (x) , o que não altera a equação de movimento, já que a força é a derivada de V (x ) , e a deri-
simplesmente adicionar uma constante à
vada de uma constante é zero. Logo, escolhemos sempre um ponto de referência mais conveniente para cada situação. Como , reescrevemos a equação 1.32:
Mecânica Newtoniana
27
Vamos representar a diferença de potencial por . Cuidado para não confundir com velocidade.
(1.36)
(1.37)
,
.
A quantidade no segundo membro depende apenas das condições iniciais e, assim, se mantém constante durante o movimento, isto é, a soma da energia cinética mais a energia potencial da partícula permanece constante no tempo e a denominamos de energia total ou energia mecânica E . Desta maneira, a equação 1.37 expressa a Citamos como exemplo de forças conservativas a força peso e a força elástica.
conservação da energia mecânica, que é válida quando a força aplicada só depende da posição (veja a definição para energia potencial na equação 1.34). Logo, no movimento em uma dimensão, forças que dependem só da posição são ditas forças conservativas, pois a energia mecânica é conservada (ou seja, é uma constante do movimento). Podemos usar a conservação da energia total para resolver o movimento, isto é, obter a velocidade e posição. Para isso, reescrevemos a equação 1.37, (1.38)
e resolvendo para
,
v , obtém-se,
(1.39)
.
A escolha dos sinais (mais ou menos) é arbitrária, mas convencionase o sinal mais ( + ) para movimento no sentido positivo do eixo x e o sinal menos (-) para o movimento no sentido negativo. Portanto, eliminaremos o sinal ± em frente à raiz quadrada, pois o sentido da velocidade deverá estar especificado em cada problema. A equação 1.39 especifica como a velocidade varia com a posição, v (x ) , à medida que conhecemos a função energia potencial. A função
x(t ) é
obtida integrando-se a equação 1.39,
(1.40)
.
Você deve notar que a equação (1.40) é, na realidade, a equação 1.33 reescrita de outra forma, ou seja, escrevendo-se a velocidade em termos da energia total e da energia potencial (equação 1.39). Ademais, as condições iniciais estão agora especificadas em termos da energia total E e da posição inicial x0 . Naturalmente, sendo especificadas as
28
condições iniciais e a energia potencial V (x ) , a equação 1.40 mostra que o problema está formalmente resolvido. Dependendo da forma de
V (x) , nem sempre podemos resolver a integral, mas quando possível, resolvemos diretamente a integral, achando x (t ) . Note que a equação 1.39 diz que para uma dada energia mecânica E , o movimento da partícula vai estar confinado às regiões no eixo x em que E ≥ V (x ) , caso
contrário a velocidade se torna uma quantidade imaginária. Assim, podemos discutir de forma qualitativa o movimento, fazendo-se um gráfico da energia potencial e considerando diversos valores possíveis para a energia total. Como exemplo, considere que a energia potencial de uma partícula tenha a forma apresentada na figura 1.1, onde estão também indicadas várias energias possíveis para a partícula.
V(x) E4 E3 E2 E1 E0
x5
x4 x2 x1 x0 x'1 x'2 x3 x6 x8
x8'
x6'
x7
x
Figura 1.1 - Função energia potencial para o movimento unidimensional.
Analisando a figura 1.1, você pode ver que, se E = E0 , então o único lugar em que a partícula pode estar é em x0 , pois em outros pontos
E ≤ V (x) , e obtemos a velocidade como uma quantidade imaginária. Como E0 = V ( x0 ) , a equação 1.39 fornece v = 0 , isto é, a partícula permanece em repouso em x = x0 . Se a energia for um pouco maior ' que E0 , digamos E1 , nas regiões x < x1 e x > x1 a velocidade será imaginária e a partícula não pode se encontrar nestas regiões. Assim, a partícula está restrita a se mover no vale da curva da energia ' potencial entre x1 e x1 . Uma partícula movendo para a direita será
x1' , passando a se deslocar para a esquerda, quando será então refletida em x1 . Portanto, dizemos que a partícula fica oscilando ' entre x1 e x1 , sendo estes pontos designados, obviamente, de pontos ' de retorno. Os pontos de retorno x1 e x1 são obtidos resolvendo-se refletida em
Mecânica Newtoniana
29
E1 − V ( x) = 0 , o que significa velocidade nula nestes pontos. O que é óbvio, pois para a partícula inverter sua velocidade, é necessário primeiro reduzi-la a zero. Podemos explicar brevemente os movimentos possíveis correspondentes à figura 1.1 como segue:
E0 : A partícula está em equilíbrio estável em x0 . E1 : A partícula move-se entre os pontos de retorno x1 e x1' . E2 : A partícula pode mover-se entre os pontos de retorno x2 e x2' , ou ' mover-se entre os pontos x6 e x6 , sendo que na região entre x8 e x8'
ela se move com velocidade constante (região de equilíbrio neutro ou indiferente). A partícula também pode se mover na região x > x7 .
E3 : Com esta energia, podemos encontrar a partícula em repouso em x3 , que é uma posição de equilíbrio instável. Ela também pode se deslocar entre x4 e x3 , ou se deslocar na região x > x3 . Logicamente, a partícula pode se deslocar na região x < x5 . Mas ela não pode se deslocar entre x4 e x5 , pois nesta região E ≤ V (x ) . Isto quer dizer que uma partícula deslocando-se na região x < x5 nunca poderá acessar a região x > x4 e vice versa. Dizemos que na região entre x4 e x5 temos uma barreira de energia potencial. E4 : Neste caso, a partícula tem energia suficiente para se mover ao longo de todo o eixo x , pois a energia potencial nunca é maior que a energia total. A partícula irá se deslocar aumentando ou diminuindo sua velocidade, na medida em que passa pelos vales e colinas da função energia potencial. Em muitas situações, é de interesse analisar o movimento da partícula em torno da posição de equilíbrio, isto quer dizer, energias levemente maiores que E0 . Assim, se V (x ) tem um mínimo em x = x0 , expandimos a função
V (x) em uma série de Taylor em torno deste
ponto:
(1.41)
A expansão em série de Taylor (equação 1.41) é bastante útil na obtenção de aproximações de fórmulas mais complicadas que expressam o resultado de um certo problema. Abaixo, mostramos a expansão de algumas funções f (x ) em torno da origem ( x0 = 0 ), que significa di-
30
zer que os valores atribuídos a x não devem se afastar muito de zero, portanto estas expansões são válidas para ,
1 = 1 − x + x 2 − ... 1+ x 1 x 3 = 1 − + x 2 − ... f ( x) = 2 8 1+ x x x2 f ( x) = 1 + x = 1 + − + ... 2 8 x2 + ... f ( x) = e x = 1 + x + 2 x 2 x3 f ( x) = ln(1 + x) = x − + − ... 2 3 3 x f ( x) = sen x = x − + ... 3 x2 f ( x) = cos x = 1 − + ... 2
f ( x) =
(1.42)
Estas expansões serão utilizadas durante este curso de mecânica, como você verá ainda neste capítulo. Quando nos interessar obter um caso particular a partir de um mais geral, por meio de aproximações adequadas, usaremos as expansões acima, e a elas vamos nos referir como conjunto de equações 1.42. Voltando agora à expansão dada na equação 1.41, vemos que a constante V ( x0 ) pode ser ignorada, pois não afeta o movimento, e lembrando que num ponto de mínimo de uma função temos e e
,
efetuamos
as
abreviações
, o que permite escrever a função poten-
cial na seguinte forma: (1.43)
.
Nesta equação, desprezamos os termos de ordem mais alta, pois es' tamos considerando valores pequenos de x , isto é, a partícula não se afasta muito do ponto de equilíbrio. A força é a derivada negativa da função energia potencial, logo , e a partícula, quando afastada da posição de equilíbrio, fica submetida a uma força que tende a retorná-la ao ponto de equilíbrio, força dita restauradora, como em molas que satisfazem a lei de Hooke. A equação 1.43 expressa uma aproximação parabólica para o potencial verdadeiro, e em muiMecânica Newtoniana
31
tas situações usamos esta aproximação. Por exemplo, para o movimento de átomos em uma molécula ou de átomos em uma rede cristalina, em torno da posição de equilíbrio, podemos usar esta aproximação parabólica para a energia potencial, o que significa tratar o problema de forma mais simples, como se os átomos em uma molécula ou numa rede cristalina estivessem ligados por molas, que satisfazem a lei de Hooke. Exemplo 1. Da discussão anterior, vê-se que é importante resolver, como exemplo, o problema de uma partícula submetida à força restauradora linear, como uma massa ligada a uma mola, ou num caso mais geral, quando a partícula oscila em torno da posição de equilíbrio, como discutido anteriormente, e submetida à força: (1.44)
.
Escolhendo o ponto de referência como a origem ( x0
= 0 ), a energia
potencial é: (1.45) e, escolhendo
,
t0 = 0 , a equação 1.40 torna-se:
(1.46)
.
x(t ) seria buscar o resultado da integral acima em uma tabela de integrais, mas neste caso podemos resolver diretamente a integral, a partir das substituições de variáveis (apenas com o objetivo de se efetuar a integração de forma elementar),
Um procedimento para se obter
(1.47)
,
de tal maneira que a integral fica: x
(1.48)
m 1 1 ( E − kx 2 ) −1/2 dx = ∫ 2 x0 2 0
y
1
∫ dy =
y0
( y − y0 ) = t .
0
E assim, (1.49)
y = 0t + y0 .
E, usando a substituição dada na equação 1.47, obtemos a posição da partícula como função do tempo:
(1.50)
32
.
A coordenada
x da partícula oscila harmonicamente no tempo com
A=
amplitude
2E e freqüência k
. Observe que as condições ini-
E e da posição x0 = A sen y0 . Devido ao fato de a partícula realizar oscilações
ciais estão especificadas em termos da energia total inicial
harmônicas, a aproximação parabólica para uma função energia potencial é dita também de aproximação harmônica para a energia potencial. Quando a energia mecânica da partícula é bem maior que V ( x0 ) , como a energia
E2 na figura 1, ela oscilará entre os pontos de retorno, mas as
oscilações não serão harmônicas (ou lineares), pois não poderemos desprezar termos de ordem mais alta na expansão para a energia potencial, dada na equação 1.41. Neste caso, as oscilações são ditas nãolineares. No capítulo 2 estudaremos oscilações lineares e não lineares. Um outro exemplo importante de força dependente da posição é a força gravitacional. De acordo com a lei de gravitação de Newton, a força entre um corpo de massa m a uma distância x + R do centro da terra (de massa
M ) é:
, onde consideramos a Terra como esférica de raio
R e a coordenada
x , obviamente, sendo medida a partir da superfície da Terra.
1.3.4 Forças dependentes da velocidade: velocidade limite Agora iremos considerar forças atuantes em um corpo e que dependem da velocidade deste corpo. Este é o caso da resistência viscosa exercida sobre um corpo que se desloca em um fluido. A resistência que o ar oferece ao deslocamento dos corpos também se inclui neste caso. Aqui não se incluem as forças de atrito de deslizamento ou rolamento entre superfícies sólidas e secas, as quais são aproximadamente constantes para um dado par de superfícies, havendo uma força normal conhecida entre elas, e dependem da velocidade somente quanto ao fato de serem sempre opostas à velocidade. Por outro lado, a dependência das forças resistivas em fluidos e gases com a velocidade só pode ser determinada, para cada situação, por meio de medidas. A experiência mostra que, em geral, estas forças de atrito são proporcionais a alguma potência da velocidade, isto é, (1.51)
,
onde b é uma constante positiva de proporcionalidade e n um inteiro positivo. Se n é ímpar, usamos o sinal negativo; se n é par, devemos Mecânica Newtoniana
33
usar o sinal negativo ou positivo de maneira que a força seja sempre oposta à velocidade, realizando trabalho negativo, isto é, convertendo energia mecânica em outra forma de energia (como calor gerado por atrito). A força de atrito que atua sobre um corpo que se desloca em um meio viscoso como o ar ou água é um exemplo de força de arrasto e a constante b é, por vezes, chamada de coeficiente de arrasto. As forças de arrasto implicam em efeitos importantes em uma grande variedade de objetos, desde gotas de chuva, bolas de beisebol, até (e principalmente) em aeronaves e embarcações. A constante b depende essencialmente da geometria do corpo, isto é, depende da área que o corpo oferece à resistência do ar, e da densidade do meio e sua viscosidade. Com relação à geometria do corpo, lembre-se da diferença que existe na resistência que o ar oferece à queda de uma caneta e à queda de uma folha de papel. Com relação à densidade do meio, lembre-se da resistência que a água oferece ao deslocamento de corpos, que é bem maior que aquela que o ar oferece. Destes fatos, fica claro que é por meio de medidas que obtemos a constante b e o valor de n . Para o movimento em fluidos, em geral, a força não tem uma forma simples como indicado na equação 1.51, e em cada caso a experiência é que possibilita obtermos informação sobre a força. Para corpos se deslocando no ar, a experiência mostra que, em muitos casos, temos uma boa aproximação para descrever a situação real, com n = 1 ou
n = 2 . Em geral, temos resultados melhores quando descrevemos a
força resistiva como a soma de dois termos:
F (v) = −b1v − b2v 2 ,
(1.52) Verifique as dimensões de e .
x . Veja que as constanb1 e b2 têm dimensões diferentes, isto é, [b1 ] = MT -1 e [b2 ] = L-1M .
sendo a velocidade no sentido positivo do eixo tes
Observe também que, para baixas velocidades, o termo linear é que domina, ao passo que, para velocidades altas, o termo quadrático domina. Para corpos como carros e aviões, as constantes de proporcionalidade (coeficientes de arrasto), em cada caso, são obtidas por meio de experimentos em protótipos em túneis de vento.
O
túnel de vento ou túnel aerodinâmico é um equipamento que testa a ação do ar sobre um objeto. A velocidade de deslocamento do ar pode ser controlada e é possível controlar também temperatura e pressão do ar, em sistemas mais sofisticados. Esses túneis são construídos sob muitas formas e para diferentes propósitos.
34
Nos túneis de vento, são feitos testes com o objetivo de otimizar as características aerodinâmicas de automóveis e aeronaves. Um túnel de vento pode testar veículos de diferentes pesos e formas e medir as forças de atrito resultantes de um escoamento de ar. Para realizar esse escoamento de ar, existe um ventilador de dimensões apreciáveis (o diâmetro das pás pode ultrapassar os dez metros), que consegue simular ventos equivalentes a velocidades superiores a 200 km/h. Alguns túneis têm dimensões que permitem testar aviões em tamanho real. Túneis de vento onde a velocidade do vento é menor que a velocidade do som são chamados subsônicos, e aqueles onde a velocidade é superior a do som são chamados supersônicos. E os que têm velocidade cinco vezes ou mais que a do som são chamados hipersônicos. Em alguns túneis, são estipuladas temperaturas muito baixas, a fim de simular condições de grande altitude. Em outros, a temperatura é muito elevada, de maneira a simular as condições existentes em um vôo de um míssil no ar. Devido à complexidade da interação escoamentocorpo, a determinação teórica das cargas aerodinâmicas (forças e torques) é, muitas vezes, imprecisa. Apesar do desenvolvimento da aerodinâmica computacional, certas configurações exigem o uso do túnel de vento para a medição das cargas em condições próximas àquelas em que o corpo será utilizado.
Iremos considerar primeiro a solução da equação de movimento para partículas submetidas a forças dadas pela equação 1.51.
v0 no x quando se desliga o motor. Esse instante é tomado como t0 = 0 e sua posição inicial sendo x0 = 0 . Uma outra siExemplo 2. Considere a situação de um barco cuja velocidade é sentido positivo do eixo
tuação, mas equivalente, é aquela em que colocamos a marcha no ponto neutro quando um automóvel está a 80 km/h e deslocando-se em uma longa estrada retilínea. Seu movimento subseqüente vai depender da resistência do ar. Toda a energia cinética inicial do automóvel irá se transformar em calor, devido principalmente ao atrito viscoso com o ar, e ele diminui lentamente sua velocidade até atingir o repouso. Veja que a taxa com que diminui a energia cinética é obtida usando-se a equação 1.18, e isto só pode ser feito depois de resolvido o movimento, isto é, conhecendo-se v (t ) . Vamos resolver a equação de movimento
Mecânica Newtoniana
35
admitindo que n = 1 , e usando a equação 1.51, temos: (1.53)
,
que integramos para obter a velocidade,
,
,
(1.54)
.
E, assim, v → 0 somente para t → ∞ , ou seja, o barco (ou o automóvel) nunca atingirá o repouso em tempo finito. Para obter a posição como função do tempo, integramos a velocidade no tempo,
,
. (1.55) Logo, apesar de levar um tempo infinito para atingir o repouso, a distância percorrida x p é finita, isto é, , para t → ∞ . Embora, de acordo com o resultado acima, equação 1.54, a velocidade nunca se torne efetivamente nula, para tempos suficientemente grandes a velocidade torna-se tão pequena que o corpo estará praticamente parado. Mas como explicamos o fato de que, na prática, o barco ou o automóvel deste exemplo atingem o repouso num tempo finito? A resposta está na dependência da força com a velocidade, isto é, para baixas velocidades o valor de n na equação 1.51 é, presumivelmente, me-
nor que um ( n < 1 ). Por quê? Ora, veja o comportamento de F (v) em altas e baixas velocidades na figura 1.2, onde temos gráficos de
F (v) versus v , para alguns valores de n .
36
F(v)
v Figura 1.2 - Força resistiva F (v) versus v para alguns valores de n .
Podemos observar das curvas na figura 1.2 que, para n < 1 , em baixas velocidades, temos forças mais elevadas do que forças com expoente
n ≥ 1 . Assim, para valores de n < 1 , as forças resistivas têm intensida-
de suficiente para que o corpo acabe percorrendo uma distância finita num tempo finito. Podemos perceber claramente que forças com n < 1 predominam em baixas velocidades. Em geral, um valor muito grande do expoente n resulta em um rápido decréscimo inicial da velocidade, mas demorará a atingir o repouso e vice-versa, isto é, um expoente pequeno resulta em um decréscimo gradual da velocidade, mas atinge o repouso mais rapidamente. Portanto, no caso real, temos a indicação de que o expoente n deve ser grande para velocidades elevadas, mas torna-se pequeno em baixas velocidades. Você percebe algo de prático nesta conclusão? Não? Pense em automóvel a alta velocidade e constante, digamos a 120 km/h. Neste caso o expoente é maior, por exemplo, n = 2 , do que quando o veículo está a uma velocidade constante
de 80 km/h, quando o expoente é menor, por exemplo, n = 1 . Logo, a força de atrito do ar aumenta muito à medida que n cresce e, assim, temos um acréscimo no consumo de combustível para manter o veículo com velocidade constante, não só porque a velocidade é mais elevada, mas também porque a força de atrito é agora bem maior.
Em relação aos resultados encontrados para a velocidade e posição, equações 1.54 e 1.55, é importante ressaltar que, se a constante de
Mecânica Newtoniana
37
proporcionalidade b for pequena, podemos obter uma solução aproximada para o movimento desde que os intervalos de tempo considerados sejam pequenos, isto é, os valores que t pode assumir sejam pequenos. Neste caso, podemos expandir as exponenciais nas equações 1.54 e 1.55, usando a expansão para a função exponencial que é fornecida na equação 1.42, obtendo assim: (1.56)
,
(1.57)
.
Resultados que expressam a posição e velocidade quando a força é constante. Isto significa que o movimento, nos primeiros intervalos de tempo, pode ser considerado como uniformemente desacelerado, sendo a desaceleração igual , onde é o valor inicial e máximo da força de atrito, pois a velocidade decresce com o tempo. Obviamente, quanto maior o valor da constante b , menores devem ser os intervalos de tempo considerados para que as aproximações dadas nas equações 1.56 e 1.57 sejam válidas. Você pode verificar isto fazendo os gráficos da velocidade e posição usando as equações 1.54 e 1.56 e as equações 1. 55 e 1.57. Exemplo 3. Agora vamos considerar que temos duas forças atuantes em um movimento unidimensional. Uma força constante e uma força dependente da velocidade. Você já deve ter percebido que queremos tratar de um corpo que cai próximo à superfície da Terra e onde levamos em conta a resistência do ar. Considerando positiva a direção para cima, escrevemos a equação de movimento, (1.58)
,
onde escolhemos uma força resistiva linear na velocidade ( n = 1 ). Observe que, como o corpo está caindo, a velocidade é negativa. Seja o caso em que o corpo foi largado de certa altura, assim v0 = 0 e, com
t0 = 0 , integramos a equação 1.58:
(1.59)
,
,
.
38
Para intervalos de tempo pequenos, podemos aproximar a função exponencial, de modo que: (1.60)
.
Se o intervalo de tempo considerado for muito pequeno
,
vem
, o que significa desprezarmos a resistência do ar nos primeiros intervalos de tempo. Após um intervalo de tempo maior ( ), a velocidade atinge um valor limite, isto é, (1.61)
,
que se denomina de velocidade limite ou terminal de um corpo em queda livre. Esta é a velocidade máxima que o corpo atinge, e isto acontece porque temos uma força resistiva que cresce com a velocidade, de modo que, em certo momento, a força resistiva se equipara à força peso e, logo, pela equação 1.58, vemos que a aceleração torna-se nula e o corpo passa a se mover com velocidade constante, que é a velocidade limite. Podemos obter o valor da constante b por meio da velocidade terminal obtida experimentalmente. Por exemplo, para gotas de chuva, a velocidade limite varia entre 3 a 7 m/s, enquanto que, para uma bola de basquete, ela está em torno de 20 m/s (ou ≈ 70 km/h) e, para uma pessoa, a velocidade limite pode atingir a 160 km/h ou mais de 200km/h, dependendo da posição do corpo durante a queda (área que se oferece à resistência do ar). Na figura 1.3, mostra-se a velocidade (o módulo) como função do tempo (equação 1.59) para três corpos de mesma massa, mas com coeficientes de arrasto diferentes.
v(t) v
b1 b2
L1
v L2
b3
v L3 b3 > b2 > b1 vL1 > vL2 > vL3 t Figura 1.3 - Velocidade como função do tempo para corpos em queda com uma força de arrasto proporcional à velocidade.
Mecânica Newtoniana
39
Tendo-se obtido a velocidade, na equação 1.59, integramos e obtemos a posição como função do tempo, admitindo-se que em t0 = 0 , o cor-
x0 , isto é:
po foi largado de uma altura x
t
x0
0
∫ dx´= ∫ v(t )dt ,
x − x0 = −
(1.62)
t
bt − mg m e (1 − )dt , ∫ b 0
.
Naturalmente, este resultado vale até o instante em que o corpo atinge o solo, isto é, x = 0 . A partir da equação (1.62), você deve perceber que o tempo para o corpo atingir o solo aumenta, mas não é possível expressar o tempo de queda de forma elementar, como no caso em que ignoramos o atrito com o ar, quando o valor para o tempo de queda de um corpo é
2 x0 . g
Você deve analisar os resultados dados nas equações (1.59), (1.61) e (1.62) para concluir que, se a constante b (ou coeficiente de arrasto) for grande, a velocidade terminal do corpo é pequena, sendo que ele percorre uma distância pequena até praticamente atingir esta velocidade. E, se o coeficiente de arrasto é pequeno, a velocidade limite vai ser alta e o corpo percorre uma distância razoável antes de atingir esta velocidade. Esta é a situação de um pára-quedista, em que, no início, antes de abrir o pára-quedas, o coeficiente de arrasto é pequeno e ele atinge uma alta velocidade terminal, mas quando abre o pára-quedas, a constante de arrasto cresce muito rapidamente, atingindo um valor bem mais elevado, reduzindo drasticamente a velocidade limite e fazendo com que o pára-quedista atinja o solo com segurança.
n , no exemplo 3 feito acima, ( n = 1 ), nos levou à conclusão que o corpo atinge uma velocidade limite (ou de arrasto) quando em queda livre, o que de fato se verifica pela experiência. Mas convém lembrar a você que, para corpos grandes e pesados como no caso de uma pessoa, a experiência mostra que uma descrição mais adequada para o movimento em queda livre é com uma força resistiva (ou força de arrasto) proporcional ao quadrado da velocidade, isto é, . Verifique, a partir da equação de mo-
Veja que nossa escolha para
vimento, que neste caso, a velocidade limite de um corpo em queda é
40
vL = mg / b . Lembre-se sempre que é por meio da experiência que se determina qual o melhor modelo para uma força de arraste em cada caso. Convém lembrar que o exemplo 3, resolvido acima, para um corpo em queda, serve igualmente para analisar o movimento de um veículo se deslocando em uma estrada retilínea sobre o qual o motor exerce uma força constante Fm e onde a resistência do ar é proporcional à velocidade (ou ao quadrado da velocidade).
Resumo A Mecânica de Newton fundamenta-se em três leis básicas para o movimento de corpos no espaço. A aplicação destas leis no estudo do movimento dos corpos pressupõe a escolha de um sistema de referência inercial, isto é, que não esteja acelerado. A escolha do referencial inercial é sempre feita de acordo com o problema mecânico abordado. Por exemplo, para o estudo do movimento de projéteis, a superfície da Terra é um ótimo referencial inercial, mas para o estudo do movimento planetário, devemos localizar a origem do sistema de coordenadas no Sol. Em uma dimensão, a segunda lei do movimento é: , que é conhecida também como teorema do momento linear, cuja forma integral é: ,
relacionando a variação no momento linear da partícula com o impulso transmitido pela força aplicada F . O teorema do momento linear permite obter o teorema da energia, na forma diferencial, , e a energia cinética se mantém constante somente na ausência de forças externas, mas podendo aumentar caso a força esteja no sentido do movimento, ou diminuir se a força é oposta ao mesmo. Para o movimento em uma dimensão, quando a força depende apenas da posição, podemos definir uma função energia potencial, .
Mecânica Newtoniana
41
A força fica expressa pela derivada desta função, . Neste caso, estas forças são ditas conservativas, pois a partir da forma integral do teorema da energia, obtém-se a conservação da energia mecânica (ou energia total, E ) isto é, .
V (x) , obter a velocidade como função da posição, o que nos leva à solução integral para x (t ) :
Podemos, sendo conhecido
.
Exercícios 1) Uma partícula de massa m está sujeita à ação de uma força em que k e
F = −kx + kx 3 / a 2 ,
a são constantes.
a) Determine
V ( x) e faça um gráfico da energia potencial, especi-
ficando os pontos de máximo e mínimo, caso existam, e discuta os tipos de movimento possíveis que a partícula pode executar.
1 2 ka , resolva o mo4 vimento pela conservação da energia e determine x(t ) , assumindo que em t = 0 a partícula esteja na origem dirigindo-se
b) Se a energia mecânica da partícula for
E=
para a direita. c) Quanto tempo a partícula irá levar para atingir o ponto
x = a?
Por que ela leva este tempo?
Respostas: a) V ( x) =
1 2 1 k kx − k ( x 4 / a 2 ) ; b) x = atgh( t) ; 2 4 2m
c) Infinito.
2) Uma partícula de massa m energia potencial é: sendo
42
a e b constantes.
acha-se sob a ação de uma força cuja
V ( x) = ax 2 − bx 3 ,
a) Faça um gráfico da energia potencial, especificando pontos de máximo e mínimo, caso existam, e determine os movimentos possíveis que a partícula pode realizar. b) Considere que a partícula esteja na origem com velocidade (para a direita ou para a esquerda), mostre que, se
v0
v0 < vc , onde
2 vc = (a / b) 2ma / 3 , a partícula permanecerá confinada à re3
gião próxima da origem.
3) Uma partícula de massa
m , cuja posição inicial é x(t = 0) = x0 , é
atraída para a origem das coordenadas por uma força dada por:
F =−
mk 2 , x3
onde k é uma constante. a) Usando a conservação da energia mecânica, ou resolvendo diretamente a equação de movimento, determine a velocidade como função da posição, v( x) . b) Calcule o tempo que a partícula leva para atingir a origem das coordenadas.
Respostas: a) v = − k
1 1 − 2 ; b) t = x02 / k . 2 x x0
4) Uma partícula se desloca em um meio resistivo que exerce uma força dada por: 3
F = −bv 4 , onde b é o coeficiente de arrasto. Admita que em t = 0 , a posição da partícula seja a origem das coordenadas e que ela esteja se deslocando da esquerda para a direita com velocidade v0 . a) Calcule a velocidade como função do tempo, escrevendo-a em termos do tempo, que a partícula leva até parar. b) Determine a posição como função do tempo e a distância percorrida até a partícula parar.
Mecânica Newtoniana
43
Respostas: a) v = v0 (1 − t / t p ) 4 ; t p = 4mv01/ 4 / b ; b) x = x p 1 − (1 − t / t p )5 ; Distância percorrida x p = 4mv05/ 4 / 5b .
5) Um meio resistivo se opõe ao movimento de uma partícula de massa
m com uma força:
F = −mk (v3 + a 2 v) , onde k e a são constantes. Admita que a partícula tenha velocidade v0 (para a direita) quando está na origem das coordenadas ( x0 = 0) . a) Use a equação de movimento para determinar a velocidade como função da posição. b) Que distância a partícula percorre até parar? Qual é a distância máxima que esta partícula pode percorrer?
v0 − atg (kax) ; v 1 + 0 tg (kax) a 1 1 1 b) x p = arctg (v0 / a ) = arcsen ; ka ka 1 + a 2 / v02
Respostas. a) v =
v0 → ∞ ⇒ x p →
π . 2ka
6) Um motor a jato desenvolve uma impulsão constante máxima
F0 ,
sendo usado para impulsionar um avião submetido à força de atrito proporcional ao quadrado da velocidade. a) Escreva a equação de movimento e diga qual é a velocidade limite. b) Se o avião iniciar seu movimento em t = 0 com velocidade inicial nula e acelerar à impulsão máxima, determine a sua velocidade como função do tempo.
Respostas. a) vL =
44
F0 / b ; b) v = vL tgh(
b vLt ) . m
2
Oscilações
2
Oscilações
Este capítulo tem como objetivo apresentar o estudo de oscilações lineares e não-lineares considerando o movimento em uma dimensão, sendo que, ao final do mesmo, o aluno deverá ser capaz de: - Identificar oscilações lineares e não-lineares; - Explicitar as condições em que o movimento de uma partícula pode ser tratado como harmônico; - Resolver o oscilador harmônico amortecido nos casos subamortecido, superamortecido e crítico, com condições iniciais previamente especificadas; - Resolver o problema do oscilador forçado com força externa dependente do tempo; - Identificar ressonância em osciladores forçados; - Resolver a equação do movimento para osciladores nãolineares pelo método de aproximações sucessivas.
2.1 Oscilações lineares e não-lineares No capítulo anterior, quando analisamos o movimento de uma partícula com energia potencial arbitrária V (x ) , vimos que, para certas energias, o movimento fica restrito entre os pontos de retorno, isto é, a partícula oscila entre estas posições. Na natureza, encontramos um número sem fim de sistemas oscilantes; as pequenas oscilações de um pêndulo, uma criança brincando num balanço, você descansando e balançando em uma rede, o movimento das marés, o balanço das árvores no vento ou as vibrações de uma corda de violino são alguns exemplos. Mesmo o que não podemos ver apresenta oscilações. Os átomos das moléculas que formam nosso corpo oscilam em torno de suas posições de equilíbrio, e os átomos de uma rede cristalina também estão continuamente oscilando. Aliás, se diz que não podemos falar a palavra vibração sem que a ponta de nossa língua oscile. A característica essencial que todos
Oscilações
47
estes fenômenos têm em comum é a periodicidade, isto é, um padrão de movimento, ou deslocamento, que se repete continuamente, sendo o período destas oscilações facilmente identificado como o tempo necessário para que ocorra um ciclo do movimento. É lógico que podemos encontrar sistemas físicos em que o movimento de oscilação é complexo, como no caso das marés, ou oscilações simples como num pêndulo de relógio, ou no clássico sistema massa-mola. Neste capítulo, iremos tratar das oscilações lineares e não-lineares, considerando o movimento em uma dimensão. Quando um sistema massa-mola está em equilíbrio e é levemente deslocado de sua posição, o movimento oscilatório resultante é dito harmônico, ou seja, as oscilações são lineares, e com isso queremos dizer que a força restaurada é uma função linear do deslocamento. Por outro lado, num caso mais geral, se o deslocamento for grande, a força restauradora pode depender de potências mais altas do deslocamento e, assim, as oscilações são ditas não lineares (ou anarmônicas). Para que isto fique mais claro, vamos considerar o caso de uma partícula cuja energia potencial V (x ) apresenta um mínimo em x0 , que está representada na figura 2.1.
V(x) Parábola
E2
E1 E0 x1
x0
x2
Figura 2.1 Energia potencial de uma partícula e a aproximação parabólica.
48
x
A expansão em série de Taylor em torno do mínimo ( x0 ) até quarta ordem fornece: (2.1)
1 d 2V dV 2 V ( x) = V ( x0 ) + ( x − x0 ) + 2 ( x − x0 ) + 2 dx x = x dx x = x0 0 1 d 3V 1 d 4V + 3 ( x − x0 )3 + 4 ( x − x0 ) 4 + .... 6 dx x = x 24 dx x = x 0 0
Vamos considerar, neste momento, energias potenciais que sejam simétricas em torno do mínimo, de modo que a derivada terceira no mínimo da função seja nula e, assim, com as substituições,
d 2V =k 2 dx x = x0 e localizando a origem em
,
1 d 4V =ε, 6 dx 4 x = x 0
x = x0 , isto é, x0 = 0 , a expansão para a
energia potencial torna-se: (2.2)
V ( x) =
1 2 1 4 kx + εx , 2 4
onde desprezamos termos envolvendo potências mais altas de
x , ou
x . Observe que ε é uma quantidade bem pequena comparada com k (que enseja, a equação 2.2 é uma expansão até quarta ordem em
tendemos como a constante de mola), já que a curva verdadeira não é muito diferente de uma parábola, para pequenos valores de x em tor-
no da origem. Como você estudou no capítulo anterior, F = − dV / dx (equação 1.35), sendo assim, a força que age sobre a partícula é: (2.3)
F ( x) = − kx − εx3 .
Você pode perceber que, se os deslocamentos são grandes (o que significa uma energia bem maior, como a energia E2 na figura 2.1), devemos considerar mais termos na expansão em série de Taylor. Veja na figura 2.1 que a parábola só se ajusta bem à curva definida por V (x ) para pontos em torno de
x0 (pequenos deslocamentos). Logo, quando muita
energia é cedida para a partícula, teremos oscilações que não são mais lineares. Isto quer dizer que, neste caso, devemos usar a equação 2.3 para a força e a equação diferencial do movimento não é mais uma 3 equação linear em x , pois contém um termo com x . Veja que, quando as energias envolvidas não são elevadas, ou seja, não são muito maiores que E0 , como a energia E1 , pode-se usar a aproximação parabólica
para a energia potencial e, assim, a força se reduz à F = − kx . Neste caso, a força é linear e as oscilações decorrentes são ditas oscilações
Oscilações
49
lineares e os sistemas físicos, cujos movimentos podemos descrever com esta força, seguem o que é chamada de lei de Hooke. Citamos, no início, vários sistemas físicos oscilantes e todos se enquadram na categoria de oscilações lineares, desde que os deslocamentos considerados não se afastem muito da posição de equilíbrio. Por exemplo, um sólido, ao sofrer deformação, resiste com uma força linear, desde que a deformação não ultrapasse o limite elástico do sólido.
O
limite elástico de um sólido é a deformação máxima a que ele pode ser submetido sem que fique deformado de maneira permanente. Quando o limite elástico é ultrapassado, inicia-se o fluxo plástico, em que as forças dependem de maneira complicada da forma do material, da velocidade de deformação e ainda de sua história anterior, de modo que não podemos mais especificar as forças por meio de uma função energia potencial.
Assim, deve ficar claro que um mesmo sistema físico pode executar oscilações lineares ou não-lineares, dependendo de quanta energia mecânica se fornece a este sistema. O exemplo mais simples é de uma criança num balanço: se você aplicar um pequeno impulso (cede pouca energia), o deslocamento máximo (a amplitude) das oscilações será pequeno e as oscilações serão lineares; caso contrário, o empurrão irá ocasionar oscilações não-lineares. Vamos estudar primeiro os sistemas oscilantes lineares.
2.2 Oscilações lineares 2.2.1 Oscilador harmônico simples Vamos tratar aqui da aproximação parabólica para a energia potencial, considerando pequenas amplitudes de oscilação, isto é, reduzi2 mos a equação 2.2 a V ( x) = kx / 2 (relação matemática já conhecida por você). O protótipo do oscilador harmônico simples é o sistema massa-mola, no qual, inicialmente, despreza-se qualquer atrito e a força restauradora é linear. Medimos a posição x a partir da posição de equilíbrio; assim, para uma mola de constante k e sendo
massa do corpo, escrevemos a equação de movimento,
(2.4)
50
••
m x = −kx ,
m a
ou ••
x + 02 x = 0 ,
(2.5) onde
02 = k / m é a freqüência angular natural de oscilação do sis-
tema (ou freqüência característica do sistema). A equação 2.5 é uma equação diferencial linear homogênea de segunda ordem. A ordem de uma equação diferencial é a da derivada de mais alta ordem que nela aparece. Ela é dita linear por não conter termos com potências maiores que um na variável independente x ou em suas derivadas. Logo, o tipo mais geral de equação diferencial linear de ordem
an (t )
(2.6)
n é:
dnx d n −1 x dx a t + ( ) + ... + a1 (t ) + a0 (t ) x = b(t ) , n −1 n n −1 dt dt dt
e esta equação é dita homogênea se
b(t ) = 0 ; caso contrário, é não-
homogênea. Equações diferenciais lineares são importantes porque descrevem o comportamento de muitos sistemas físicos e existem métodos gerais para resolvê-las, particularmente quando os coeficientes an são constantes. É fácil observar que a equação 2.5 é um caso particular da equação 2.6, com n = 2 ,
a2 = 1 , a1 = 0 e a0 = 02 .
Como iremos nos deparar com equações diferenciais lineares de segunda ordem na solução de inúmeros problemas de mecânica, vamos resumir algumas propriedades das soluções destas equações:
A C
solução geral de qualquer equação de segunda ordem depende de duas constantes arbitrárias. Sejam
1 e C2 estas constantes, assim escrevemos a solução na forma x = x (t ; C1 , C2 ).
- Se
x1 (t )
é uma solução qualquer da equação diferen-
cial homogênea, então Cx1 (t ) é também solução desta equação. - Se x1 (t ) e x2 (t ) são soluções de uma equação diferencial linear, então a soma x1 (t ) + x2 (t ) ou qualquer combinação linear C1 x1 (t ) + C2 x2 (t ) é também solução.
A última propriedade decorre exatamente da linearidade da equação diferencial. O fato de a superposição (ou combinação linear) de duas soluções também ser solução é denominado de princípio de superposição. Assim, sistemas físicos que são regidos por equações lineares satisfazem o princípio de superposição. Mais adiante, discuOscilações
51
É importante que você faça uma revisão das equações lineares de segunda ordem estudadas na disciplina Cálculo III. No estudo da mecânica, você observará várias aplicações das equações diferenciais.
tiremos com detalhes este princípio. A maioria dos fenômenos físicos é regida por equações lineares. Um exemplo: quando você calcula o campo elétrico devido a duas cargas pontuais, você soma os campos de cada carga. Por quê? Porque as equações que regem os campos eletromagnéticos são equações diferenciais lineares. Um contra exemplo: na explosão de uma granada, as ondas sonoras são regidas por equações não-lineares e não vale o princípio da superposição de ondas quando duas granadas explodem próximas.
Caso tenha alguma dúvida em relação à equação 2.7, retorne ao capítulo 1 e analise a equação 1.50
A solução da equação de movimento (equação 2.5) foi obtida no capítulo 1, usando-se a conservação da energia. A solução encontrada foi (veja equação 1.50):
x(t ) = A sen( 0t + ) ,
(2.7)
onde ≡ y0 é denominada de fase inicial. Aqui, as duas constantes arbitrárias, C1 e C2 , são expressas por meio da amplitude
A = 2 E / k (que é o deslocamento máximo e depende da energia total) e a fase inicial .≡ yO0 período do movimento ( T ) é o tempo
necessário para que ocorra um ciclo completo do movimento, e assim, T = 2 / 0 = 2 m / k . Para o movimento harmônico simples, o período das oscilações não depende da amplitude e dizemos que o movimento é isócrono. Isto quer dizer que dois ou mais osciladores iguais, oscilando com diferentes amplitudes, têm todos a mesma freqüência e as oscilações são isócronas. Mais adiante, veremos que as oscilações de um pêndulo simples são isócronas apenas para pequenas amplitudes. Ou seja, em geral, no movimento oscilatório o período depende da amplitude. Naturalmente, podemos verificar que a solução dada na equação 2.7 satisfaz a equação de movimento (equação 2.5), pois podemos obter a velocidade e a aceleração: •
v = x = 0 A cos( 0t + ) , ••
a = x = − 02 A sen( 0t + ) = − 02 x . Substituindo a relação anterior na equação 2.5, vem:
− 02 Asen( 0t + ) + 02 Asen( 0t + ) = 0 . Vale observar que podemos escrever a solução termos das constantes da equação 2.7:
52
x(t ) (equação 2.7) em
C1 e C2 , para isto reescrevemos a função seno
x = A sen 0t cos + A cos 0t sen , ou,
x = C1 sen 0t + C2 cos 0t ,
(2.8)
onde você pode identificar que:
A = C12 + C22 ,
(2.9)
tg =
(2.10)
C2 . C1
Ficando a nosso critério expressar a posição como função do tempo no movimento harmônico simples pela equação 2.7 ou equação 2.8. Existe uma outra maneira de você resolver equações diferenciais de segunda ordem lineares com coeficientes constantes (e que será útil mais adiante), para isto você deve procurar soluções na forma exponencial, isto é, soluções do tipo:
x = e t ,
(2.11)
onde omitimos as constantes pois não são necessárias agora. Derivando a solução 2.11, você encontra: •
••
x = e t ,
x = 2 e t ,
Substituindo a solução na equação 2.5, vem: (2.12) Como para qualquer (2.13)
( 2 − 02 )e t = 0 . t finito, e t ≠ 0 , logo: λ = ±iω0 = ±i
k . m
Assim, a solução geral é a combinação das soluções encontradas com as raízes 1 = +i 0 e 2 = −i 0 , isto é: (2.14)
x = A1ei0t + A2 e − i0t ,
onde A1 e A2 são constantes complexas. Note que a solução física será a parte real ou a parte imaginária da equação 2.14. Esta solução pode ser escrita de outra maneira, mas completamente equivalente, isto é, (2.15) Oscilações
x = Ae ± i ( t + ) . 53
Lembrando agora a fórmula de Euler para números complexos escritos na forma trigonométrica,
e ± i = cos ± i sen , a solução
x(t ) é, então, x = A cos( t + ) ± iA sen( t + ) ,
(2.16)
onde tanto a parte real como a imaginária satisfazem a equação diferencial para o movimento, como você mesmo pode verificar. Portanto, pode-se escolher como solução tanto uma como outra, pois entre as funções seno e co-seno existe apenas uma diferença de fase de / 2. A solução única para um determinado problema será obtida com as condições iniciais. Isto é, devemos especificar a posição e a velocidade iniciais para obtermos as constantes A e para uma dada situação. Uma vez determinado o movimento do oscilador harmônico, podemos explicitar a maneira como as energias, cinética e potencial, variam no tempo. Com a solução x = A sen( 0t + ) , vem, para a energia cinética: (2.17)
,
e, para a energia potencial, (2.18)
V=
1 2 1 2 1 kx = kA sen 2 ( 0t + ) = m02 A2 sen 2 ( 0t + ) , 2 2 2
de modo que a soma da energia cinética mais a energia potencial é: (2.19)
EC + V =
1 m02 A2 = E , 2
ou seja, a energia total é constante no tempo, e novamente obtemos a relação entre a amplitude do movimento e a energia mecânica,
A = 2 E / k . A equação 2.19 diz que a energia cinética e a energia
potencial variam continuamente no tempo, mas sua soma permanece sempre constante. Observe atentamente que só podemos explicitar estas energias como função do tempo depois de resolver a equação de movimento, achando assim x (t ) . Exemplo 1. Como aplicação elementar dos resultados acima, vamos obter a solução para uma situação em que um bloco atado a uma mola, numa superfície horizontal sem atrito, no instante inicial
t = t0 = 0 , é distendido de uma distância x0 , sendo neste instante
54
aplicado um impulso que o faz adquirir uma velocidade inicial − v0 (em direção à origem). Veja que a energia mecânica cedida ao bloco 2 2 é E = mv0 / 2 + kx0 / 2 e vai permanecer constante, pois não estamos levando em conta a existência de atrito. Como temos a solução geral, devemos aplicá-la neste caso específico, para determinarmos as constantes de integração A e da equação 2.7 (ou, caso se queira, as constantes C1 e C2 da equação 2.8). Escolhendo a solução geral
x = A sen( 0t + ) , aplicamos as condições iniciais: x0 = A sen , −v0 = 0 A cos ,
de onde,
A solução
tg = −
x(t ) para este problema é, então: v02 x = x + 2 sen( 0t + ) , 0 2 0
(2.20)
sendo
0 x0 v2 2 e A = x0 + 02 . v0 0
= −arctg( 0 x0 / v0 ) . Você deve ser capaz de mostrar que a
solução da equação 2.20 é completamente equivalente a:
(2.21)
v x = x0 cos 0t − 0 sen 0t . 0 x0
Faça isso usando a solução geral dada na equação 2.8 e determinando as constantes C1 e C2 .
Agora é a sua vez! Para completar este exemplo, use a equação 2.20 e calcule a energia cinética e a energia potencial como funções explícitas do tempo. Some 2 2 estas energias e mostre que o resultado é igual a mv0 / 2 + kx0 / 2 = E . Veja que a solução encontrada na equação 2.20 pode ser particularizada para as situações em que x0 = 0 ou em que v0 = 0 .
2.2.2 Oscilador harmônico amortecido Até agora consideramos situações em que a energia mecânica se conserva, isto é, tratamos o problema do oscilador de maneira idealizada, pois em sistemas físicos reais sempre temos forças de atrito agindo. A experiência de descansar balançando em uma rede é de curta duração, em pouco tempo a amplitude das oscilações tende a zero e é necessária a aplicação de uma força para balançarmos mais um Oscilações
55
pouco. Assim, para que nossos resultados estejam mais próximos de descrever uma situação real, devemos incluir forças de atrito. Naturalmente, uma força constante não é de interesse analisar, pois a adição de uma força constante não altera o movimento harmônico simples, alterando apenas a posição de equilíbrio em torno da qual ocorrem as oscilações. Para explicitarmos este fato, adicionamos uma força F0 constante na equação 2.4 e obtemos: ••
m x = −kx + F0 , ou, ••
x + 02 x =
(2.22) Fazendo-se a substituição
F0 . m
•
•
••
••
x ' = x − F0 / m02 , temos x' = x e x' = x e,
substituindo na equação 2.22, obtemos, para a equação de movimento: ••
x'+ 02 x ' = 0 ,
(2.23)
significando que as oscilações ocorrem em torno do ponto x ' = 0 , isto 2 é, em torno do ponto x = F0 / m0 . Um exemplo deste caso é um bloco pendurado em um teto por meio de uma mola, onde a força constante é o peso do bloco. Não iremos tratar dos casos em que a força de atrito depende explicitamente do tempo, como é o caso de um sistema massa-mola numa superfície horizontal rugosa. Nestes casos, a cada meio ciclo, a força de atrito inverte de sentido, o que leva a uma dependência explícita com o tempo. Na maioria dos casos, uma boa aproximação, particularmente quando a força de atrito é pequena, é considerar a força de atrito como linearmente dependente da velocidade, isto é,
Fa = −bv (veja que agora a força tem uma dependência implícita com
o tempo). Forças de atrito dependentes do quadrado da velocidade são mais realistas em alguns casos, mas não trataremos desse caso, pois as equações de movimento não são lineares e a solução destas equações, em geral, só podem ser obtidas por integração numérica. Com a inclusão de uma força de atrito proporcional à velocidade, a equação de movimento fica: ••
•
m x = −kx − b x , ou,
••
x+
b • x + 02 x = 0 . m
Definindo-se o coeficiente de amortecimento
56
= b / 2m , vem:
(2.24)
••
•
x + 2 x + 02 x = 0 .
Esta é a equação que descreve o oscilador amortecido. Note que o coeficiente de amortecimento depende fortemente do meio em que se encontra o oscilador. Pense em um pêndulo a oscilar no ar e outro oscilando no interior de um líquido. Como antes, procuramos uma t solução como a proposta na equação 2.11, x = e e, substituindo x , • ••
x = e t e x = 2 e t na equação 2.24, encontramos: e t ( 2 + 2 + 02 ) = 0 ,
o que significa que: (2.25)
2 + 2 + 02 = 0 .
Observe que esta equação fornece duas raízes: (2.26)
1 = − + 2 − 02 ,
(2.27)
2 = − − 2 − 02 .
Agora você tem a solução geral para o oscilador no caso de amortecimento, (2.28)
x = C1e − 1t + C2 e − 2t .
Para analisar movimentos possíveis a partir da equação 2.28, está claro que devemos analisar três situações distintas: Oscilador subamortecido, que ocorre quando Oscilador superamortecido, se
ω02 > γ 2;
ω02 < γ 2 ;
Oscilador criticamente amortecido, neste caso
02 = 2 .
Caso (a): Oscilador subamortecido No oscilador subamortecido você pode escrever as expressões para as
1 e 2 de forma abreviada, fazendo 1 = 02 − 2 e, assim, 1 = − + i 1 e 2 = − − i 1 . Logo, a combinação linear das soluções e 1t e e 2t fornece a posição como função do tempo,
raízes
(2.29)
x = e − t (C1ei1t + C2 e − i1t ) ,
solução que podemos reescrever com o auxílio da equação de Euler:
Oscilações
57
Lembre-se de que γ é o coeficiente de amortecimento γ = b / 2m e que ω02 = k / m é a freqüência angular natural de oscilação do sistema (ou freqüência característica do sistema).
x = e − t ( B sen 1t + C cos 1t ) ,
(2.30)
B = i ( A1 − A2 ) e C = A1 + A2 . Também podemos reescrever a solução x (t ) dada na equação 2.29 como: onde
x = Ae − t cos( 1t + ) ,
(2.31)
sendo que agora
A = B 2 + C 2 e tg = −
C . B
Observe que as duas maneiras convenientes de se expressar a posição como função do tempo no caso do oscilador subamortecido são as equações 2.30 e 2.31. Com as condições iniciais, determinamos as constantes
A e (ou B e C ). Note que a solução dada pela equação 2.31 mos-
tra claramente que o sistema oscila com uma freqüência angular natural
1 . Esta freqüência natural não é uma freqüência no sentido estrito da palavra, como é o caso de 0 , já que a partícula nunca passa pelo mesmo ponto duas vezes com a mesma velocidade (já que esta se comporta como um oscilador subamortecido). Como você pode observar pela equação 2.31, a amplitude de oscilação decresce exponencialmente com o tempo. E a amplitude da velocidade (derivada da posição), obviamente, também decresce com o tempo. E assim, diz-se que o sistema oscila com a freqüência 1 com uma amplitude exponencialmente decrescente. A figura 2.2 mostra a posição como função do tempo para osciladores subamortecidos. Nesta figura, a curva a mostra x (t ) quando o oscilador é afastado de sua posição de equilíbrio de um valor
x0 e liberado ( v0 = 0 );
x(t ) na situação em que o mesmo oscilador no instante inicial está em repouso ( x0 = 0 ), adquirindo uma velocidade v0 por meio de um impulso a ele aplicado. enquanto que a curva b mostra
x x0
a
b 0
t Figura 2.2 Posição como função do tempo para o oscilador subamortecido.
58
Você deve ser capaz de usar a equação 2.30 para mostrar que a solução representada pela curva a da figura 2.2 é:
x = x0 e − t (cos 1t +
sen1t ) , 1
enquanto que, para a curva b desta mesma figura, a solução é:
x=
v0 − t e sen1t . 1
Caso (b): Oscilador superamortecido 2 2 Quando 0 < , temos o chamado oscilador superamortecido. Agora as duas raízes dadas nas equações 2.26 e 2.27 são reais, isto é:
1 = − + 2 e 2 = − − 2 , em que abreviamos a notação, usando 2 = 2 − 02 . E a solução geral para a posição x(t ) é obtida novat t mente como combinação linear das soluções e 1 e e 2 , ou seja, x = C1e 1t + C2 e 2t , ou,
x = e − t (C1e 2t + C2 e − 2t ) .
(2.32)
Agora você tem um decrescimento exponencial da posição com o tempo. Observe que os dois termos decrescem no tempo, um com taxa de decrescimento maior que a do outro (não ocorrem oscilações, não é uma função que depende de seno ou co-seno). Note que 2 não é uma freqüência, pois não temos mais um movimento que se repete em ciclos. As constantes C1 e C2 são obtidas mediantes as condições iniciais em cada situação. Exemplo 2. Vamos determinar o movimento de um oscilador superamortecido considerando que, quando em equilíbrio ( x0 = 0) , aplicamos um impulso, de modo que ele adquire uma velocidade
v0 .
Usando a equação 2.32, obtemos a velocidade, •
x = − (C1e 2t + C2 e − 2t )e − t + e − t ( 2C1e 2t − 2C2 e − 2t ) . •
Em t = 0 você tem as condições x = x0 = 0 e x = v0 , que já foram enunciadas no início do exemplo, o que fornece duas equações (uma para posição e outra para velocidade):
0 = C1 + C2
→ C2 = −C1 ,
v0 = − (C1 + C2 ) + 2 (C1 − C2 ) . Oscilações
59
Compare a solução geral 2.32 com a solução 2.29 e 2.30 da oscilação subamortecida. Qual a sua análise?
Você pode verificar que neste caso é:
C1 = x=
v0 e a posição como função do tempo 2 2
v0 (e 2t − e − 2t )e − t . 2 2
Este resultado pode ser expresso em termos das funções seno hiperbólico e co-seno hiperbólico, cujas definições são:
e − e− senh = , 2
e + e− , cosh = 2
e a partir das quais definimos as demais funções hiperbólicas, como a tangente hiperbólica e a cotangente. Logo, a solução x (t ) que encontramos acima, neste exemplo, pode ser escrita como:
x=
v0 − t e senh2t . 2
Esta solução está representada na figura 2.3, para três coeficientes de amortecimento diferentes (por exemplo, osciladores idênticos mas em meios diferentes), em que podemos ver que o oscilador, devido ao impulso, se afasta da posição de equilíbrio até um valor máximo, o que acontece no instante t1 , retornando em seguida ao equilíbrio. Sabendo que o instante •
t1 corresponde ao máximo da função x(t ) e
x = 0 você deve ser capaz de mostrar que o instante 1 arctgh 2 , em que arctgh =arco tangente hipert1 é dado por t1 = 2
que neste ponto
bólico, é a função inversa da tangente hiperbólica.
t1 t2 t3 Figura 2.3 Posição como função do tempo para o oscilador superamortecido.
60
Este exemplo mostra claramente que podemos expressar a solução geral do oscilador superamortecido em termos de funções hiperbólicas, isto é, a solução dada pela equação 2.32 é completamente equivalente a:
x = e − t ( A cosh 2t + Bsenh 2t ) , em que
A = C1 + C2 e B = C1 − C2 .
Caso (c): Oscilador criticamente amortecido 2 2 O amortecimento crítico ocorre quando 0 = e assim, usando as equações 2.26 e 2.27, vemos que as raízes 1 e 2 são iguais: 1 = 2 = − . Isto quer dizer que a solução geral dada pela equação 2.28 é:
x = (C1 + C2 )e − t = B1e − t ,
(2.33)
C1 + C2 = B1 =constante. E temos apenas uma solução. Uma outra solução deve ser achada para a equação de movimento (equação 2.24) onde agora = 0 . Podemos provar que, neste caso, a segunda solução é:
em que fizemos
x = te − t , •
••
x= e − •t• − te − t e x = − e − t − e − t + 2te − t , e assim, substituin• do x , x e x na equação 2.24, ficamos com: pois
− e − t − e − t + 2te − t + 2 e − t − 2 2te − t + 02te − t = 0 , ou,
( 02 − 2 )te − t = 0 .
O que é verdade para qualquer
t , pois = 0 . A solução geral no
caso de amortecimento crítico é, então, a combinação linear das duas soluções encontradas: (2.34)
x = ( B1 + B2t )e − t .
B1 e B2 são determinadas a partir das condições iniciais. A solução encontrada mostra que não temos oscilação, mas sim um decrescimento exponencial da posição com o tempo, que agora é mais rápido que no caso de superamortecimento. Na figura 2.4, encontramos gráficos da posição como função do tempo para osciladores superamortecidos e criticamente amortecidos. A curva a da figura 2.4 mostra o caso do oscilador com amortecimento crítico e a curva b, o caso superamortecido.
Novamente, as constantes
Oscilações
61
x
x0
b
a
t
Figura 2.4 Posição como função do tempo para o oscilador criticamente amortecido (a) e superamortecido (b).
Os gráficos na figura 2.4 ilustram os resultados para a situação em que os osciladores têm como condição inicial uma determinada posição
x0 e velocidade nula. Veja que, no amortecimento crítico, o oscilador
retorna mais rapidamente à posição de equilíbrio, enquanto que, para o oscilador superamortecido, temos um decrescimento exponencial bem mais lento. Aplicamos este conhecimento sobre osciladores em problemas com mecanismos que se aproximam da posição de equilíbrio sob a ação de uma força de atrito de amortecimento, como ponteiros de medidores, molas pneumáticas ou hidráulicas de portas. Se você deseja uma porta do tipo vai-e-vem, ela deve ser construída de modo que se comporte como um oscilador subamortecido. Na maioria dos casos, deseja-se que, quando deslocado de sua posição de equilíbrio, o mecanismo retorne a esta posição de forma rápida, porém macia. Como no caso crítico o oscilador retorna mais rapidamente para a posição de equilíbrio, procura-se construir mecanismos em que 0 = , na medida do possível.
2.2.3 Energia do oscilador amortecido A existência de forças de atrito em osciladores harmônicos implica em uma diminuição contínua da energia mecânica. Para calcular a taxa com que a energia mecânica é transformada em calor devido ao trabalho realizado pela força de atrito, escrevemos a energia mecânica do oscilador, (2.35)
62
E=
1 2 1 2 mv + kx , 2 2
e calculamos a taxa de variação temporal,
dE dv dx dv = mv + kx = v(m + kx) . dt dt dt dt Se você usar a equação de movimento, isto é,
dE = −bv 2 , dt
(2.36)
m
dv = −kx − bv , você terá: dt
para a variação temporal da energia mecânica do oscilador. Vamos explicitar a variação da energia mecânica no caso do oscilador subamortecido, sendo que você já sabe que a energia mecânica do oscilador é dada na equação 2.35. Como você já tem a solução geral x(t ) na equação 2.31, vem:
x = Ae − t cos( 1t + ) , • v = x = − 1 Ae − t sen( 1t + ) + cos( 1t + ) . 1
Estas expressões podem ser usadas na equação 2.35 para obtermos E (t ) . Mas considere o caso do oscilador levemente amortecido
( / 1 1/ , ela é desprezível, e por isso chamada de, como vimos, solução transiente. Isto significa que a solução x (t ) dada pela equação 2.51 será independente das condições iniciais, exceto no início do movimento, quando a solução transiente apresenta alguma contribuição apreciável para x (t ) . Logo, para tempos posteriores ( t >> 1/ ), as oscilações do sistema são governadas pela solução particular, que é denominada solução estacionária, pois a amplitude do movimento se mantém constante. Quando dizemos que o oscilador está num regime estacionário, significa que um agente externo está fornecendo energia, por meio da aplicação de uma força, a uma taxa suficiente para manter a amplitude das oscilações constantes, compensando as perdas por atrito.
2.3.1 Amplitude das oscilações e ressonância No estado estacionário, a equação 2.51 fornece para a posição:
F0 / m
x=
2 0
( − 2 ) 2 + 4 2 2
cos( t − ) ,
e o movimento não depende das condições iniciais, sendo a amplitude e o ângulo de fase dados por:
A( ) =
(2.52)
F0 / m 2 0
( − 2 ) 2 + 4 2 2
( ) = arctg
(2.53)
Para uma dada freqüência natural pendência da amplitude
2 . 02 − 2
0 , a figura 2.5 mostra a forte de-
A com a freqüência da força aplicada.
A
2y 2y F /k Figura 2.5 Amplitude versus freqüência para dois valores de
68
,
.
Como você pode observar na figura 2.5, a amplitude exibe um máximo para uma freqüência r , que obtemos a partir de ( dA / d ) = = 0 , r
que, resolvendo-se, fornece: (2.54)
r = ( 02 − 2 2 )1/2 . r , a amplitude das osci= A( r ) , e substituindo r dada na
Quando a força aplicada tem a freqüência lações será máxima, isto é,
Amax
equação 2.54, na equação 2.52 obtemos: (2.55)
Amax =
Como a amplitude é máxima para
F0 / m 2 02 − 2
.
= r , dizemos que = r é a fre-
qüência de ressonância e uma força aplicada com esta freqüência produz oscilações ressonantes no sistema, isto é, a força produz amplitudes máximas das oscilações. A partir da equação 2.54, percebese que para amortecimento pequeno ( → 0 ), vem r ≅ 0 e a ressonância ocorre quando a força aplicada tem a freqüência natural de oscilações do sistema. Neste caso, a amplitude na ressonância é: (2.56)
Amax =
F0 , 2 m0
sendo, conseqüentemente, extremamente elevada. Para amortecimento nulo (sem atrito), temos Amax → ∞ , mas naturalmente, sistemas reais apresentam um coeficiente de amortecimento diferente de zero. Em algumas situações, forças aplicadas na freqüência ressonante podem produzir deformações irreversíveis no sistema oscilante, pois as oscilações na ressonância, dada pela equação 2.56, podem ultrapassar o limite elástico do sistema. Este é o caso de pontes com um grande vão central e altas edificações (arranha-céus), que são estruturas oscilantes e sobre as quais rajadas intensas de vento atuam como uma força externa. Mesmo uma coluna de soldados em marcha cadenciada sobre uma ponte pode levá-la a vibrar com uma amplitude grande o suficiente a ponto de destruí-la. De fato, ventos que atingiram a ponte Tacoma Narrows (Washington) em 1940 fizeramna oscilar até que o vão central principal rompeu-se, levando a sua destruição. A partir deste acontecimento, os projetos de pontes (bem como de altos edifícios) levam em conta a necessidade de elas serem aerodinamicamente estáveis, de maneira a oscilarem com grandes amplitudes, se necessário, sem rompimento de suas estruturas. Podemos relacionar a largura das curvas
A( ) na figura 2.5 com o
Q do oscilador. Primeiro, vamos obter uma expressão aproximada A( ) que seja válida para pontos próximos à fator de qualidade
Oscilações
69
ressonância, isto é, para freqüências ≅ 0 ; neste caso também podemos fazer a seguinte aproximação:
≅ 0 , e
02 − 2 = ( + 0 )( − 0 ) , 02 − 2 ≅ 2 0 ( − 0 ) . Substituindo esta aproximação na equação 2.52, e usando a equação 2.55 para Amax , vem para a amplitude,
A( ) =
(2.57)
Amax ( 0 − ) 2 + 2
.
0 − = , ou de forma equiva1 2 2 lente, se = 0 ± , então A = Amax , significando que é uma 2 2 medida da largura da curva A( ) , sendo que a curva A ( ) é deA equação (2.57) diz que quando
nominada de curva Lorentziana ou simplesmente de Lorentziana. Assim, 2 é chamado de largura de ressonância e significa a diferença na freqüência entre dois pontos para os quais a energia decresce pela metade (lembre-se que a energia é proporcional ao quadrado da amplitude). Na discussão sobre osciladores amortecidos, definimos o fator de qualidade, que para pequenos amortecimentos, podemos escrever como (equação 2.40) Q ≅ 0 / 2 . Assim, a largura da curva de ressonância,
∆ , é:
∆ = 2 ≅
(2.58)
0 , Q
deixando claro, que para osciladores com fator de qualidade alto, a curva de ressonância é bem estreita, sendo que no limite ideal Q → ∞ ,
logo, ∆ → 0 . Veja que a equação 2.58 permite uma outra definição de fator de qualidade, isto é,
Q=
0 freqüência de ressonância = , ∆ largura da curva de ressonância
mostrando mais uma vez que o fator de qualidade explicita as características do sistema oscilante. Torna-se claro que sistemas com uma curva de ressonância muito estreita (alto fator Q ) são altamente seletivos à freqüência da força aplicada. Ou seja, nestes casos o sistema só responde à força externa aplicada quando a freqüência desta força for igual à freqüência natural de oscilações do sistema. Na figura 2.6, temos a curva para a fase
( ) , equação 2.53, que
representa a diferença de fase entre a força aplicada e o movimento resultante, isto é, nos fornece o atraso entre a ação da força e a resposta que o oscilador apresenta. Para > 0 , deslocamos o gráfico
70
da função arco tangente, fazendo
= arctg
2 + . 02 − 2
φ
Figura 2.6 Fase versus freqüência para três valores de
.
Como é visível na figura 2.6, esta fase é nula para = 0 , crescendo para
= / 2 quando = 0 e atingindo o valor = para → ∞ .
Portanto, para baixas freqüências, as oscilações tendem a ficar em fase com a força e, para altas freqüências, as oscilações ocorrem 1800 fora de fase. É importante observar que, à medida que
→ 0 , a fase
= 0 , e no caso extremo em que = 0 , a fase muda abruptamente de 0 a em = 0 . Na
muda mais e mais bruscamente quando
figura 2.7a, mostra-se a amplitude, e na figura 2.7b, a fase para o caso ideal em que = 0 . Note que agora a amplitude é infinita na ressonância e a curva da fase é uma curva em degrau devido à mudança abrupta na ressonância.
A (ω)
φ(ω)
γ=0
π
γ=0
F /k
ω0
ω
ω0
Figura 2.7a Amplitude versus freqüência para o oscilador forçado sem amortecimento. Oscilações
71
A (ω)
φ(ω)
γ=0
π
γ=0
F /k
ω
ω0
ω
ω0
Figura 2.7b Fase versus freqüência para o oscilador forçado sem amortecimento.
Quando a freqüência da força aplicada é baixa,
> 0 , a fase tende a e a amplitude das oscilações torna-se: (2.60)
A( >> 0 ) ≅
F0 , m2
e agora a massa responde essencialmente como um corpo livre submetido a uma força que o empurra e puxa muito rapidamente, sendo que o efeito da mola é causar um atraso entre força e deslocamento de 1800.
2.3.2 Potência e dissipação da energia mecânica Em muitos casos envolvendo sistemas oscilantes, a quantidade de interesse é a energia, e não a amplitude. Neste caso, você abordará o movimento no estado estacionário, desta maneira as soluções para a posição e velocidade do oscilador forçado são: (2.61)
72
x = A cos( t − ) ,
•
(2.62)
v = x = − Asen( t − ) ,
onde
A e são dadas pelas equações 2.52 e 2.53, respectivamente.
Sendo conhecidas a posição e a velocidade, pode-se obter a energia mecânica do oscilador como função do tempo,
E=
1 2 1 2 1 2 mv + kx = A [m2sen 2 ( t − ) + k cos 2 ( t − )] . 2 2 2
Resultado que permite obter a energia mecânica média por período,
E =
(2.63)
onde usamos o fato de que
1 mA2 ( 2 + 02 ) , 4
sen 2 ( t − ) = cos 2 ( t − ) = 1/ 2 para
a média em um período. Usando equação 2.52 para a amplitude, vem: (2.64)
2 + 02 1 F02 E = . 4 m ( 2 − 02 ) 2 + 4 2 2
Como feito antes para a função
A( ) , podemos obter uma expressão
aproximada para a energia média do oscilador forçado, para freqüências aplicadas próximas da ressonância. Fazendo as mesmas aproximações que levaram à equação 2.57, obtemos:
E ≅
(2.65)
F02 1 . 8m ( − 0 ) 2 + 2
Este resultado mostra que, como você estudou na discussão sobre ressonância, a curva E ( ) é uma curva Lorentziana de largura 2γ . Obviamente, a energia mecânica do oscilador se deve à força externa aplicada, a qual deve também compensar a energia que é dissipada por atrito. Para explicitarmos a relação entre a potência mecânica e a taxa com que a energia mecânica é dissipada, parte-se da equação de movimento para o oscilador forçado, ••
•
m x + b x + kx = F0 cos( t + 0 ) . Multiplicando-se ambos os membros da equação acima pela velocidade, vem: • ••
• •
•
•
m x x + b x x + k x x = F0 x cos( t + 0 ) . Equação que podemos reescrever como:
•2 •2 • d m x m02 x 2 + + b x = [ F0 cos( t + 0 )] x , dt 2 2 Oscilações
73
ou, (2.66)
.
Em palavras, a equação 2.66 nos diz que: A taxa de variação da energia mecânica é igual à taxa com que ela está sendo dissipada por atrito mais a taxa com que a energia está sendo fornecida pela força externa aplicada (potência mecânica fornecida pela força). Logicamente, a energia mecânica permanece constante se a potência mecânica fornecida compensar as perdas por atrito. Como a velocidade • é x = − Asen( t − ) (equação 2.62), a taxa com que o trabalho é realizado sobre o oscilador pela força aplicada é: •
•
x F (t ) = x F0 cos t = − AF0sen( t − ) cos t ,
= AF0 (cos 2 tsen − cos tsent cos ) ,
(2.67)
e, como antes, considera-se por simplicidade que
0 = 0 . O primeiro
termo no lado direito é positivo, o que significa que a força cede energia ao sistema oscilante, enquanto que o segundo termo é negativo, indicando que agora o sistema oscilante está cedendo energia. Logo, o agente externo (ou mecanismo) que exerce a força está alternadamente fornecendo e recebendo energia. Entretanto, na média, a força externa cede mais energia do que recebe, pois a média de
cos 2 t é
1/ 2 , enquanto que a média de cos tsent é zero. Isto quer dizer que
a potencia média fornecida pela força aplicada é: •
P = x F (t ) =
(2.68)
Usando a equação 2.48 para
1 AF0sen . 2
sen e a equação 2.50 para a amplitude
A , respectivamente, vem para a potência média o resultado: P =
(2.69)
Assim,
F02 2 . m ( 02 − 2 ) 2 + 4 2 2
P ( ) também tem a forma de uma curva Lorentziana para
freqüências próximas da freqüência de ressonância, e vê-se que a potência mecânica fornecida é máxima na ressonância. A largura desta
2 , mostrando que quanto maior é o fator Q do oscilador, mais estreita é a curva de P ( ) em torno da ressonância. Na Lorentziana é
figura 2.8, mostram-se duas curvas da potência média para diferentes valores de (ou equivalentemente dois valores de Q ).
74
P
2γ
2γ
Figura 2.8 - Potência média transferida para oscilador como função da freqüência da força aplicada.
Usando
•
x dado na equação 2.62, você deve calcular
, e com
isso mostrar que, para o oscilador forçado no estado estacionário, a potência mecânica média fornecida pela força aplicada é igual à taxa com que a energia está sendo dissipada pelo atrito.
2.4 Analogias entre oscilações mecânicas e elétricas Quando iniciamos este capítulo, mencionamos que muitos sistemas físicos podem ser adequadamente tratados como sistemas oscilantes, como cordas de um piano, átomos em moléculas ou numa rede cristalina. Será apresentado brevemente que existe uma analogia completa entre as oscilações mecânicas discutidas até aqui e as oscilações de vários circuitos elétricos. Para se ressaltar as analogias a que nos referimos, devemos inicialmente escrever a equação para a carga q num circuito RLC série, submetido a uma força eletromotriz ••
onde
•
L q+ R q+
(2.70) •
••
(t ) ,
q = (t ) , C
q ≡ dq / dt (corrente) e q ≡ d 2 q / dt 2 . Esta equação é idêntica em
forma à equação 2.41, para o movimento de um oscilador forçado. Assim, as soluções são iguais em forma, e resolver um determinado problema mecânico significa tê-lo resolvido do ponto de vista elétrico e vice-versa. Os primeiros trabalhos sobre circuitos elétricos foram realizados levando-se em conta a sua analogia com o problema mecânico correspondente. Atualmente, a situação, muitas vezes, encontra-se invertida, isto é, engenheiros mecânicos e acústicos empregam métodos simples e efetivos desenvolvidos por engenheiros elétricos para resolver problemas de vibrações acústicas e mecânicas. A figura 2.9 mostra Oscilações
75
os três sistemas mecânicos discutidos (oscilador livre, oscilador amortecido e oscilador forçado) e os circuitos elétricos correspondentes.
L
m
k
c LQ + 1 Q = 0 C
mx + kx = 0
L
m
k
R
b
c LQ + RQ + 1 Q = 0 C
mx + bx + kx = 0
L
m
k
b
F
mx + bx + kx = F (t)
R c LQ + RQ + 1 Q = ε (t) C
Figura 2.9 Sistemas mecânicos e circuitos elétricos correspondentes.
Veja que toda a discussão sobre osciladores feita até aqui e as soluções encontradas aplicam-se para os circuitos elétricos mostrados na figura 2.9, desde que utilizemos a correspondência entre as quantidades elétricas e mecânicas como mostradas na tabela 2.1. MECÂNICA
ELÉTRICA
Deslocamento
x
→
q
Carga
Velocidade
v
→
i
Corrente
Massa
m
→
L
Indutância
Constante Elástica
k
→
1/ C
Capacitância
Amortecimento
b
→
R
Resistência
Força Aplicada
F
→
Força Eletromotriz
Tabela 2.1 Analogia entre quantidades mecânicas e elétricas.
76
Da tabela 2.1, observe que a freqüência natural de oscilações de um circuito LC é 0 = 1/ LC , o que também não é novidade para você. Para circuitos elétricos oscilantes, também definimos o fator de qualidade e pode ser provado que, para um circuito RLC série, o fator de qualidade é
Q ≅ 0 L / R , o que é natural, já que a resistência ôhmica
R no circuito elétrico é o coeficiente de amortecimento que no caso mecânico designa-se por .
2.5 Princípio de superposição Como você observou em nossa discussão, a equação de movimento para o oscilador harmônico é uma equação diferencial linear de segunda ordem. Uma das propriedades importantes do oscilador decorre desta linearidade. Isto é, devido a esta linearidade, o deslocamento x(t ) de um oscilador harmônico, quando submetido a uma
F (t ) , que pode ser a soma de duas ou mais forças F1 (t ), F2 (t ),..., é a soma dos deslocamentos x1 (t ), x2 (t ),..., que ele teria se cada uma das forças Fn (t ) , onde n = 1, 2,..., agisse sepa-
força aplicada
radamente. Esta propriedade é válida para qualquer sistema físico que seja descrito por equações diferenciais lineares. Dizemos que tais sistemas satisfazem o princípio de superposição, que podemos expressar mais corretamente por meio do seguinte teorema: Teorema: Seja o conjunto (finito ou infinito) de funções
n = 1, 2,3,..., soluções das equações ••
xn (t ) ,
•
m x n + b xn + kxn = Fn (t ) , onde
F (t ) = ∑ Fn (t ) . n
Então, a função
x(t ) = ∑ xn (t ) , n
satisfaz a equação ••
•
m x + b x + kx = F (t ) . Para demonstrar este teorema, basta substituir
x(t ) no primeiro
membro da equação acima, isto é,
Oscilações
77
••
•
••
•
m x + b x + kx = m∑ x n + b∑ x + k ∑ xn n
n
n
• •• = ∑ m xn + b xn + kxn = ∑ Fn (t ) n n = F (t ) .
Este teorema é sumamente importante, já que permite a determinação de x(t ) sempre que a força F (t ) pode ser escrita como uma soma
Fn (t ) . Um caso importante é a situação em que podemos escrever a força atuante F (t ) como uma soma de termos que oscilam
de forças
senoidalmente, ou seja,
F (t ) = ∑ F0 n cos( nt + n ) n
Onde
.
F0n são coeficientes constantes (são as amplitudes de cada
componente da força). Neste caso, ignorando-se a solução transiente, qual é a resposta do sistema à aplicação desta força? Ou seja, qual é a solução x (t ) ? Neste caso, usa-se o princípio de superposição e tomamos a solução estacionária na equação 2.51, assim a solução estacionária é:
x=∑ onde
F0 n 1 cos( nt + n − n ) , 2 2 m [( n − 0 ) + 4 2 2n ]1/2 n = arctg
2 n . 02 − n2
Você deve estar pensando: quando podemos escrever a força atuante no sistema como uma soma de forças que oscilam senoidalmente? A resposta é que podemos proceder desta maneira sempre que tivermos uma função periódica, isto é, sendo T o período, F (t + T ) = F (t ) . É possível provar, que neste caso,
F (t ) pode ser sempre escrita como a
soma (uma série) de funções senoidais. Estas séries são chamadas de séries de Fourier e a generalização do teorema das séries de Fourier aplicado a forças não periódicas é o teorema integral de Fourier, o qual permite representar qualquer função contínua (sujeita a certas limitações) como uma superposição de forças que oscilam harmonicamente. Por meio das séries e integrais de Fourier, pode-se resolver a equação de movimento para quase todas as forças F (t ) fisicamente razoáveis. Não discutiremos este tópico neste curso, mas é conveniente ressaltar que o princípio da superposição se aplica em vibrações mecânicas, oscilações elétricas, ondas sonoras, ondas eletromagnéticas e a todos os fenômenos físicos governados por equações diferenciais lineares. Mas, por outro lado, encontramos diversos fenômenos
78
físicos em que as equações que os regem não são lineares e, naturalmente, neste caso não é aplicável o princípio de superposição.
2.6 Oscilações não-lineares No início deste capítulo, fizemos uma distinção entre oscilações lineares, que discutimos até aqui, e oscilações não-lineares, as quais iremos discutir brevemente nesta seção. Como você certamente lembra, as oscilações deixam de ser lineares à medida que a energia do oscilador cresce, de modo que não podemos fazer a aproximação parabólica para a função energia potencial. Veja novamente a figura 2.1 para V ( x ) arbitrário e a expansão em série de Taylor correspondente dada pela equação 2.1. Se estamos tratando de sistemas nos quais não vale a expansão somente até segunda ordem, porque a energia do oscilador é alta, devemos reter mais termos da expansão em série, e assim para energias potenciais V ( x) simétricas em relação à origem (lembre-se que foi escolhido
x0 = 0 ), usamos a equação 2.2 para
a energia potencial, isto é, (2.71)
onde
V ( x) = d 2V 2 =k dx x =0
Em caso de dúvida volte ao início do capítulo.
1 2 1 4 kx + x , 2 4 1 d 4V = . 6 dx 4 x =0
Entretanto, esta simetria na energia potencial ( V ( x ) é uma função par) não se faz presente em todos os sistemas oscilantes, sendo que em alguns casos a função energia potencial pode ser assimétrica, ou seja, uma função que não é nem par nem ímpar. Isto significa que na expansão 2.1 para a energia potencial retém-se até o termo de terceira ordem, isto é, (2.72)
sendo
V ( x) =
1 2 1 3 kx + x , 2 3
1 d 3V = 3 , 2 dx x =0
uma quantidade pequena (como acontece com
na equação 2.71), de
modo que a parábola se ajusta bem à curva da energia potencial verdadeira para pequenos deslocamentos. Assim, quando a energia do oscilador é grande, podemos levar em conta os efeitos não-lineares mediante as expansões para a energia potencial fornecidas nas equações 2.71 e 2.72, para sistemas simétricos e assimétricos. Oscilações
79
2.6.1 Sistema não-linear simétrico Como um exemplo de oscilações não lineares, em que o sistema é simétrico, suponha uma massa m suspensa entre duas molas idênticas como se mostra na figura 2.10 As molas têm constantes elásticas iguais a k0 e estão fixas nos pontos A e B. Quando o sistema está em equilíbrio, a tensão em cada mola é
T0 , como indicado na figura 2.10a.
B
B l0
θ
T0
T
l
m
x T0
l0
θ
A (a)
A
l
m T
(b)
Figura 2.10 Corpo conectado a duas molas. a) Posição de equilíbrio. b) Deslocamento na direção horizontal.
Na figura 2.10b o corpo foi deslocado horizontalmente de uma distância x e, assim, as molas têm uma variação no comprimento de
(l − l0 ) ; logo, a força restauradora é k (l − l0 ) . Isto quer dizer que a tensão em cada mola após o deslocamento da massa m é: T = T0 + k (l − l0 ) .
(2.73)
Já que as componentes na vertical da tensão se anulam, o movimento da massa m ocorre na horizontal, e como a resultante nesta direção é 2Tsen , temos a equação de movimento, ••
m x = −2Tsen ,
(2.74)
ficando óbvio que ignoramos o amortecimento e supomos ausência de forças externas. Substituindo a tensão pela sua expressão dada pela equação 2.73, obtemos: ••
(2.75)
m x = −2[T0 + k0 (l − l0 )]sen .
Mas da figura 2.10b tiramos que:
l = l02 + x 2 = l0 1 +
80
x2 x x x e sen = = = 2 l0 l l02 + x 2 l0
1 1+
x2 l02
Logo, substituindo l e sen na equação 2.75, vem: (2.76)
•• x x2 1 m x = −2 T0 + k0l0 1 + 2 − 1 . 2 l0 l x 0 1+ 2 l0
Não se assuste com esta relação, mas procure analisar com calma. Veja que o segundo membro desta equação é a força F ( x ) que é exercida sobre a massa m , sendo, portanto, uma função bastante complicada da posição, o mesmo ocorrendo com a função energia potencial (que é menos a integral da força). Você deve estar percebendo que podemos procurar alguma solução analítica somente quando os deslocamentos considerados são pequenos. Nestes casos, x / l0 0 (mola dura, como vimos) ou < 0 (mola macia). PodeObserve que agora a freqüência das oscilações
mos continuar o método de aproximações sucessivas substituindo, no segundo membro da equação 2.78, x1 dado na equação 2.81, para determinarmos uma segunda solução ma para determinar primeira ordem.
82
x2 , procedendo como feito aci-
x1 . Aqui consideramos apenas a aproximação de
Na figura 2.11 mostram-se as oscilações anarmônicas expressas pela equação 2.81 para valores positivos e negativos de . Nesta figura a curva a é a função
cos t , a curva c é a função cos 3t , enquanto
que a curva b é a soma dada na equação 2.81.
x
x
a
ε 02 , com solução geral:
22 = 2 − 02 . Neste caso, uma vez deslocado, o sistema
retorna gradualmente à posição de equilíbrio, com decréscimo exponencial. c) Oscilador criticamente amortecido, quando
= 0 , que tem
como solução geral:
x = ( B1 + B2t )e − t , onde também temos um decrescimento exponencial da posição, mas de forma mais acentuada do que no caso do oscilador superamortecido.
86
Para que um determinado sistema físico permaneça executando oscilações, devemos ceder continuamente energia a ele de modo a compensar as perdas por atrito. Isto significa aplicarmos uma força sobre o oscilador que, em geral, pode depender do tempo, neste caso temos o oscilador forçado, que é descrito pela equação de movimento, ••
•
m x + b x + kx = F0 cos( t + 0 ) . Esta é uma equação diferencial linear de segunda ordem não-homogênea, cuja solução geral é obtida mediante a soma da solução da homogênea com uma solução particular. Considerando o oscilador subamortecido, a solução geral é:
x = Ah e − t cos( 1t + h ) +
F0 / m 2 0
( − 2 ) 2 + 4 2 2
cos( t − + 0 ) .
Como a solução da homogênea tende rapidamente a zero, ela é denominada de solução transiente, sendo a solução particular que determina o movimento do sistema. Ela não depende das condições iniciais e é denominada de solução estacionária. Portanto, depois de algum tempo, dizemos que o oscilador se encontra no regime estacionário. Quando as energias envolvidas nas oscilações de um sistema são elevadas, não podemos usar a aproximação parabólica, isto é, devemos considerar mais termos na expansão da energia potencial. Assim, dependendo do sistema oscilante, podemos ter energias potenciais anarmônicas simétricas,
V ( x) =
1 2 1 4 kx + x , 2 4
V ( x) =
1 2 1 3 kx + l x . 2 3
ou assimétricas,
Em ambos os casos, as equações de movimento não são lineares, não se aplicando nesses casos o princípio da superposição. Técnicas especiais são empregadas na solução das equações de movimento e, em geral, quando se inclui o atrito, as soluções só podem ser determinadas por integração numérica.
Exercícios 1) Duas molas de constantes elásticas k1 e k2 , respectivamente, são usadas na posição vertical para sustentar uma massa a freqüência angular das oscilações é Oscilações
m . Mostre que
(k1 + k2 ) / m se as molas estão
87
em paralelo e k1k2 /( k1 + k2 ) m se as molas estão em série. Quais são os circuitos elétricos equivalentes a estas duas situações?
2) Uma massa
m presa a uma mola de constante elástica k e com • um amortecimento −b x é afastada da posição de equilíbrio de um valor x0 e, por meio de um impulso, transfere-se a essa massa uma velocidade de módulo v0 em direção à origem. Considere que este sis2 2 tema massa-mola seja subamortecido ( 0 > ) e calcule a posição como função do tempo.
Resposta: x = x0 e − t [cos 1t + (
v − 0 )sen1t ] . 1 1 x0
3) Um vagão de carga pesando 104 kg rola livremente e chega ao final v0 = 4, 0 m / s . No final, 4 2 existe um batente que consiste numa mola com k = 1, 6 x10 kg / s . de sua linha a uma velocidade cujo módulo é
O vagão comprime a mola. Considere a posição em que o vagão atinge a mola como a origem das coordenadas. a) Considerando que a força de atrito seja proporcional à velocidade, determine a constante de amortecimento bc para que o amortecimento seja crítico. b) Deter-
x(t ) e faça um esboço. Determine a distância máxima xm em que a mola é comprimida. c) Mostre que, se b ≥ bc , o vagão irá parar, determinando x (t ) e considerando b = 2bc . Determine também a compressão máxima da mola. d) Mostre que, se b ≤ bc , o vagão será mine
lançado de volta e se deslocará em sentido contrário sobre os trilhos. (Note que o vagão não fica preso à mola). Neste caso, considere que
b = bc / 2 e determine: a posição como função do tempo, a com-
pressão máxima da mola e a velocidade com que o vagão passa pela origem ao retornar.
Respostas: a) = 0 = k / m = 1, 265 Hz; bc = 2m = 2,53 x104 kg/s . b) x = −v0te
− 0t
;
xm = −v0 / e ; xm = 1,16 metros.
c) Agora b = 2bc → = 2 0 → 2 = 0 e assim
x=−
v0 − e 0
metros .
20t
senh0t ; xm = −
v0 − e 0
2arctgh (1/ 2 )
; xm = 0,90
d) Com b = bc / 2 → = 0 / 2 → 1 = 0 / 2 e, assim,
2v0 − 0t / 2 0 t v0 − 4 ; xm = − x=− e sen e ; xm = 1, 44 0 0 2
metros. Velocidade com que passa pela origem ao retornar é v = v0 e − ≅ 0, 0432v0 = 0,17m/s .
88
4)
Um bloco de massa (considere que seja um elevador) m cai de uma altura h sobre uma plataforma de massa desprezível. O objetivo é se construir uma mola e um amortecedor, que constitua um oscilador superamortecido, sobre os quais a plataforma será montada, de tal forma que ela possa atingir uma nova posição de equilíbrio, 0,4 metros abaixo da posição original, depois de sofrer o impacto com o bloco. Pede-se para calcular a constante elástica da mola, k , e o
coeficiente de amortecimento b . Obtenha valores numéricos para m = 1000 kg e h = 20 metros.
Respostas: Origem na nova posição de equilíbrio: → x0 = 0, 4 metros. Velocidade inicial igual v0 = 2 gh . Nova posição de equilíbrio: → mg = kx0 , logo k = mg / x0 = 2, 45 x104 kg / s . Posição como função do tempo: x = ( x0 cosh 2t +
x0 − v0 senh2t )e − t 2
→ Para não ultrapassar a origem devemos ter no mínimo x0 = v0 e, assim, b = 2mv0 / x0 = 2m 2 gh / x0 = 9,9 x104 kg / s .
5) Um oscilador sem amortecimento
(b = 0) inicialmente em repouso é submetido a uma força F = F0sent . Determine o deslocamento x(t ) , considerando que a solução particular tenha a mesma forma da força aplicada.
Resposta: x =
F0 [ 0sent − sen0t ] . m0 ( 02 − 2 )
6) Um oscilador subamortecido que está inicialmente em repouso fica submetido a uma força
F = F0 e − at onde F0 e a são constantes. a)
Considerando que a solução particular tem a mesma forma da força aplicada, determine a posição como função do tempo. b) Qual é a solução para b = 2ma ? c) Neste caso, o que acontece se a = 0 ?
Respostas: a) x =
a− F0 ( sen1t − cos 1t )e − t + e − at ; 2 m(a − 2 a + 0 ) 1 2
1 = 02 − 2 b) x =
F0 e − at [1 − cos 1t ] . m( 02 − a 2 )
c) Se a = = 0 → oscilador crítico. Proponha, para este caso, − at 2 − at uma solução geral da forma x = (C1 + C2t )e + C3t e e mostre que C1 = C2 = 0 e C3 = F0 / 2m , logo, x = Oscilações
F0 2 − at t e . 2m
89
3
Movimento em Duas e Três Dimensões
3
Movimento em Duas e Três Dimensões
Este capítulo tem como objetivo aplicar a mecânica de Newton ao estudo do movimento de uma partícula em duas e três dimensões. Ao final do mesmo, o aluno deverá ser capaz de: • Expressar o vetor posição, o vetor velocidade e o vetor aceleração em coordenadas retangulares e em coordenadas polares para o movimento de uma partícula em um plano; • Explicitar os vetores posição, velocidade e aceleração em coordenadas retangulares para o movimento em três dimensões; • Calcular integrais de linha de funções vetoriais simples, o gradiente de funções escalares simples, o divergente e o rotacional de funções vetoriais simples; • Aplicar o teorema do momento linear, o teorema do trabalho-energia e o teorema do momento angular no movimento de uma partícula em duas e três dimensões; • Resolver o movimento de projéteis incluindo a resistência do ar; • Definir a função energia potencial para o movimento no espaço e identificar forças conservativas e não conservativas; • Calcular a força como o gradiente de uma função energia potencial dada; • Calcular a função energia potencial sendo conhecida a força que atua sobre a partícula.
Introdução Neste capítulo você aplicará a mecânica newtoniana para o movimento de corpos no plano e em três dimensões. Assim, é necessário que você tenha conhecimento prévio de álgebra vetorial. Vamos admitir que você já saiba adição e subtração de vetores, produto escalar e produto vetorial, bem como diferenciação e integração de vetores. Abordaremos o moviMovimento em Duas e Três Dimensões
93
mento no plano e no espaço tridimensional em diferentes sistemas de coordenadas, e em seguida trataremos de elementos de cálculo vetorial que são necessários ao estudo da dinâmica em três dimensões. Para se descrever a posição e o movimento de uma partícula no espaço, é necessário que se adote um sistema de coordenadas. Até este ponto tratamos do movimento unidimensional de uma partícula, assim o sistema de coordenadas retangulares (ou Cartesiano) que adotamos era apropriado, já que neste caso temos apenas uma coordenada. Entretanto, na descrição do movimento em duas e três dimensões nem sempre é conveniente ou possível se adotar coordenadas retangulares. Como você verá adiante, em muitas situações a descrição do movimento se faz mais adequadamente adotando-se outros sistemas de coordenadas, como coordenadas polares, coordenadas cilíndricas e esféricas. Mas antes de resolvermos a equação de movimento em diferentes sistemas de coordenadas, é importante que saibamos descrever o movimento em diferentes sistemas de coordenadas do ponto de vista da cinemática. Inicialmente trataremos da cinemática, a parte da mecânica que estuda os movimentos possíveis de uma partícula, mas onde não se leva em conta as leis da dinâmica que determinam estes movimentos.
3.1 Cinemática no Plano 3.1.1 Coordenadas retangulares A posição P de uma partícula no plano XY pode ser especificada em coordenadas retangulares pelas suas coordenadas ( x, y ) ou por meio do vetor posição r , onde r = r é a distância a uma origem especificada, conforme se ilustra na figura 3.1. O movimento da partícula no plano XY pode ser descrito especificando-se y como uma função de x ou vice-versa, isto é, y = y ( x),
(3.1)
x = x( y ) .
Y
P (x,y) y
r
^j
θ ^i
x
X
Figura 3.1 - Vetor posição e as coordenadas retangulares de um ponto P no plano.
94
Pode-se também especificar a curva que a partícula descreve (enquanto se movimenta no plano) fornecendo uma relação entre suas coordenadas x e y ,
f ( x, y ) = 0 .
(3.2)
Por exemplo, para uma partícula movimentando-se em círculo de raio
a , a trajetória é descrita por:
x2 + y 2 = a2 .
(3.3)
Entretanto, uma das maneiras mais convenientes para se representar a trajetória de uma partícula é em termos de algum parâmetro. Seja
s este parâmetro, assim especificamos, x = x( s ),
(3.4)
y = y(s) ,
ou
r = r (s) .
(3.5)
O parâmetro s pode ser a distância medida ao longo da curva a partir de um ponto fixo. Assim, a trajetória descrita pela equação 3.3 pode ser expressa em termos do parâmetro ,
y = asen , x = acos , é o ângulo formado pelo eixo dos x e o raio a até o ponto ( x, y ) . Ou, em termos da distância s medida ao longo da circunferência ( s = a) ,
onde
x = a cos
s s e y = asen . a a
Em mecânica, o parâmetro de interesse é o tempo e como exemplo pense no caso em que a partícula tem uma velocidade constante v em torno do circulo de raio partícula no instante
a . Portanto, s = vt , e assim a posição da
t é especificada por:
x = a cos
vt vt e y = asen . a a
Isto mostra que, em geral, quando uma partícula move-se num plano, podemos especificar seu deslocamento fornecendo s (t ) ou se fornecendo diretamente (3.6)
x(t ) e y (t ) ou r (t ) , isto é, r (t ) = x(t )iˆ + y (t ) ˆj .
Movimento em Duas e Três Dimensões
95
Sendo iˆ e ˆj os vetores unitários na direção x e y , respectivamente, indicados na figura 3.1. A partir da posição como função do tempo, equação 3.6, obtém-se a velocidade e aceleração da partícula em coordenadas retangulares, (3.7)
dr ˆ dx ˆ dy ˆ v= =i +j = ivx + ˆjv y , dt dt dt
(3.8)
dv d 2 r ˆ d 2 x ˆ d 2 y ˆ a= = = i 2 + j 2 = iax + ˆja y . dt dt 2 dt dt
3.1.2 Coordenadas polares Em muitas situações, como iremos comprovar adiante, é conveniente o uso de coordenadas polares ( r , ) em vez de coordenadas cartesia-
( x, y ) para se descrever o movimento de uma partícula no plano. Na figura 3.2 mostramos as coordenadas polares de um ponto P e os vetores unitários rˆ e ˆ . Note que estes vetores apontam no sentido em que r e crescem. ^j Y ^ r^ θ nas
^i P (x,θ) y
r
^j
θ ^i
x
X
Figura 3.2 - Vetor posição e coordenadas polares de um ponto P no plano.
As relações entre os dois conjuntos de coordenadas são: (3.9)
x = r cos , y = rsen ,
e as relações inversas são:
y . x
(3.10)
r = x 2 + y 2 , = tg −1
Os vetores unitários
rˆ e ˆ que formam o novo sistema de coordena-
das, que chamamos de coordenadas polares, são funções do ângulo
e estão relacionados (veja a figura 3.3) aos unitários iˆ e ˆj por:
(3.11)
rˆ = iˆcos + ˆjsen ,
(3.12)
ˆ = −iˆsen + ˆjcos .
96
Y
^j ^ θ
r^
^jcosθ -i^
^jsenθ θ
-i^ senθ
^icosθ
^i
X
Figura 3.3 - Decomposição dos vetores unitários
As derivadas destes vetores unitários em relação a
rˆ
ˆ .
e
são:
drˆ = −iˆsen + ˆjcos = ˆ , d d ˆ (3.14) = −iˆcos − ˆjsen = −rˆ . d ˆ Os resultados drˆ = ˆ e d = − rˆ podem também ser obtidos d d pela análise da figura 3.4, que mostra os vetores unitários rˆ e ˆ em dois ângulos particulares e + d , e seus incrementos drˆ e dˆ (3.13)
(lembre-se de que
^
θ
rˆ = 1 e ˆ = 1 ).
^ +d ) r( θ θ
dθ
^
dθ
^
dr
^ ) r( θ
θ (θ)
r^
^
θ (θ+ d θ) dθ
θ
θ
Figura 3.4 - Acréscimos infinitesimais em
rˆ
e
ˆ .
As derivadas expressas nas equações 3.13 e 3.14 são muito úteis, como veremos agora, no cálculo das componentes do vetor velocidade e vetor aceleração em coordenadas polares. Primeiro, observe que em coordenadas polares o vetor posição se expressa simplesmente como: (3.15)
r = rrˆ() .
Podemos assim descrever o movimento da partícula em coordenadas polares fornecendo-se r (t ) e (t ) e determinando-se, assim, o vetor posição
r (t ) (equação 3.15). O vetor velocidade será drˆ dr drˆ d dr dr v= = rˆ + r = rˆ + r , dt dt dt dt d dt
Movimento em Duas e Três Dimensões
97
e, desde que
drˆ
d
= ˆ , vem:
(3.16a)
• • v = r rˆ + r ˆ ,
(3.16b)
v = vr rˆ + v ˆ , •
Muitas dessas relações você já deve ter visto nas disciplinas de Física Básica. Em caso de dúvida, procure fazer uma revisão do movimento rotacional, que irá lhe ajudar.
•
onde identificamos vr = r e v = r como as componentes radial e angular do vetor velocidade. Naturalmente, a componente radial aponta na direção do vetor unitário rˆ , sendo perpendicular à trajetória, enquanto que a componente angular aponta na direção do vetor unitário ˆ sendo, portanto, tangente à trajetória, como se mostra na figura 3.5. Por exemplo, se a partícula executa um movimento circular de raio •
•
r constante, tem-se vr = r = 0 , e se a velocidade angular é
= , vem para a componente tangencial
vr
v
.
^
θ
vθ
r^
m
r θ
0
Figura 3.5 - Componentes da velocidade em coordenadas polares.
A aceleração em coordenadas polares é agora obtida a partir da equação 3.16a, isto é, • • ˆ d • • drˆ d • • d d r dr d dv d • a= rˆ + r ˆ + r = (r rˆ + r ˆ ) = + ˆ + r dt dt dt d dt dt dt d dt • • • • •• • • •• a = r rˆ + r ˆ + r ˆ + r ˆ − r rˆ .
Ou, juntando os termos comuns, (3.17a)
• •• • • •• a = ( r − r 2 )rˆ + (r + 2 r )ˆ ,
a = ar rˆ + a ˆ ,
(3.17b)
sendo as duas componentes da aceleração, radial e angular, dadas por: (3.18)
98
••
•
ar = ( r − r 2 )
••
• •
a = r + 2 r
• 2
2
O termo r = v / r é denominado de aceleração centrípeta e tem origem no movimento na direção angular ( ) . Se o movimento é circular de raio
•
••
r constante, vem r = r = 0 e assim a componente radial
do vetor aceleração é
• 2
ar = −r = −v2 / r . Você deve conhecer este
resultado dos cursos básicos de mecânica. O termo
• •
2 r é denomina-
do de aceleração de Coriolis, que discutiremos posteriormente no capítulo 6. Mais adiante, ao estudar movimento sob força central, você verá a utilidade de se escrever o vetor aceleração em termos de suas componentes em coordenadas polares expressas na equação 3.18.
3.1.3 Cinemática em três dimensões Agora que você já sabe sobre coordenadas polares e retangulares, vamos estudar como aplicar estes conceitos no movimento em três dimensões. Podemos descrever o movimento em três dimensões usando coordenadas retangulares ( x, y, z ) em relação a um sistema de eixos retangulares no espaço, ou pelo vetor posição
r = r ( x, y, z ) em rela-
ção à origem escolhida. Desta maneira, como no caso do movimento no plano, as componentes retangulares do vetor velocidade são: (3.19a)
dr ˆ dx ˆ dy ˆ dz v= =i + j +k , dt dt dt dt ˆ ˆ ˆ v = iv x + jv y + kvz ,
(3.19b) sendo
iˆ , ˆj e kˆ os vetores unitários segundo as direções x , y e z .
Para a aceleração, vem: (3.20a)
(3.20b)
dv ˆ dvx ˆ dv y ˆ dvz , a= =i +j +k dt dt dt dt a = ax iˆ + a y ˆj + az kˆ .
Você está verificando que não existe novidade até aqui. Naturalmente, em três dimensões muitos outros sistemas de coordenadas são úteis para a solução de problemas específicos. As mais usadas, além das retangulares, são as coordenadas polares cilíndricas e polares esféricas.
3.2 Elementos de Cálculo Vetorial 3.2.1 Integral de Linha Quando estamos descrevendo o movimento no espaço tridimensional, em geral, podemos encontrar grandezas escalares (como a energia cinética) e vetoriais (como força) com um valor definido em cada ponto do espaço. Tais grandezas geralmente são funções das coordeMovimento em Duas e Três Dimensões
99
nadas espaciais, usualmente ( x, y, z ) , ou podem ser funções do ve tor posição r . Um exemplo de função escalar de ponto é a energia potencial V ( x, y, z ) de uma partícula que se desloca em três dimensões, e o de uma função vetorial de ponto é o campo elétrico cujas componentes Ex , E y e Ez podem ser funções de x, y e z . Muitas vezes, funções escalares e vetoriais, além de dependeram da posição, são também funções do tempo. Algumas informações serão importantes para o estudo da mecânica, entre elas a integral de linha. Você compreenderá que, em Física, expressamos muitos resultados através da integral de linha. Consi dere agora uma dada curva C , no espaço, e uma função vetorial A definida em todos os pontos sobre esta curva. Definimos a integral de linha de A ao longo da curva C por:
∫
C
A • dr .
Para se definir esta integral de linha, subdivide-se a curva C em segmentos infinitesimais, onde cada um desses segmentos é representa do pelo vetor dr na direção do segmento e de comprimento igual ao do segmento. Assim, a curva consistirá em uma sucessão de vetores
dr de uma extremidade a outra. Desta maneira, para cada segmento, temos o produto A • dr , onde A é o valor da função vetorial na posição do segmento considerado.
A
integral de linha da relação matemática citada anteriormente é definida como o limite das somas dos produtos , quando o número de segmentos cresce sem limite, enquanto o módulo
de cada segmento se
aproxima de zero.
Um exemplo deintegral de linha em mecânica é o trabalho realizado por uma força F variável sobre uma partícula que se desloca ao lon-
go de uma curva C ,
W = ∫ F • dr . C
Observe que é uma generalização do resultado
W = F • s para uma
força constante sobre uma partícula que se move ao longo de um segmento de reta s . Outra forma de especificar a integral de linha é expressar o vetor posição em coordenadas retangulares, (3.21)
100
r = xiˆ + yjˆ + zkˆ ,
e cujo diferencial é:
ˆ ˆ . dr = idx + ˆjdy + kdz
(3.22)
A pode ser escrita em termos de suas compoˆ nentes cartesianas, A = Ax iˆ + Ay ˆj + Az k , de modo que podemos escrever para a integral de linha de A : Uma função vetorial
(3.23)
∫
C
A • dr = ∫ ( Ax dx + Ay dy + Az dz ) . C
Outra maneira de se expressar a integral de linha é considerar a distância s medida ao longo da curva a partir de algum ponto fixo, veja a figura 3.6. Sendo
ds = dr e o ângulo entre A e dr , podemos
escrever para a integral de linha: (3.24)
∫
C
A • dr = ∫ A cos ds .
Figura 3.6 - Elementos envolvidos na integral de linha de uma função vetorial.
Utilizamos a equação 3.24 para se efetuar uma integral de linha quando
A e sejam funções conhecidas de s . Uma das formas apropriadas de representar uma curva no espaço é fornecendo as coordenadas x, y e z , ou, de modo equivalente, o vetor posição r , como funções de um parâmetro s de valor bem definido em cada ponto da curva. Como você estudou anteriormente, s pode ser a distância ao longo da curva a partir de um ponto de referência, mas também pode ser o tempo no qual a partícula em movimento chega a cada ponto da curva. Sendo conhecidos A( r ) e r ( s ) , calculamos a integral de linha, como segue:
dr ∫C A • dr = ∫ ( A • ds )ds , (3.25)
dx dy dz A ∫C • dr = ∫ ( Ax ds + Ay ds + Az ds )ds .
Note que o segundo membro da equação 3.25 é uma integral comum sobre a variável s . Assim, você acabou de estudar que as equações 3.23, 3.24 e 3.25 são maneiras distintas de se efetuar uma integral de linha e podem lhe ajudar na solução de problemas específicos. Movimento em Duas e Três Dimensões
101
Exemplo 1. Para ajudar na sua compreensão sobre este assunto, você estudará, como exemplo de integral de linha, o trabalho realizado sobre uma partícula em movimento semicircular de raio a em
B (a, 0) até o ponto A(−a, 0) , por uma força que a atrai na direção do ponto A( x = − a, y = 0) e proporcional ao quadrado da distância entre a partícula e o ponto ( − a, 0) . No ponto (a, 0) a força tem módulo 4F0 . Na figura 3.7 estão indicadas as quantorno da origem, desde o ponto
tidades de interesse envolvidas no problema.
a a
a
Figura 3.7 - Elementos para o cálculo do trabalho ao longo de uma trajetória semicircular.
A partir da figura 3.7 podemos escrever as relações:
+
− = → = , 2 2 2
A força, conforme o enunciado, é
+ +−
= → = − . 2 2
F = −kr12 rˆ1 , sendo k uma constante
de proporcionalidade que determinamos usando o valor da força no 2 2 ponto ( a, 0) , isto é, 4 F0 = k (2a ) → k = F0 / a , de modo que rees-
F F = − 02 r12 rˆ1 . Para calcularmos o trabalho, a expressamos r1 em termos de ,
crevemos a força como
r12 = 2a 2 (1 − cos) = 4a 2sen 2 / 2 . O trabalho é:
W = ∫ F • dr = ∫ F cos ds . C
Como
ds = dr = ad , vem: 0
W = ∫ F cos( − )ad . 2 Substituindo o valor de
F , obtemos: 0
F0 2 4a (sen 2 cos )ad . 2 a 2 2
W = −∫ Fazendo
102
= 2 1 , d = 2d 1 , vem:
/2
2 2 W = 4 F0 a ∫ 2sen 2 1cos1d 1 = 4 F0 a sen 3 1 , 3 0 0 8 W = F0 a . 3
Para completar este exemplo, vamos obter o trabalho realizado pela força para deslocar a partícula desde o ponto B até o ponto A , ao
y = 0 (ao longo do eixo dos x ). Agora, r1 = x´= x + a com a ≥ x ≥ − a , de modo que: longo da reta
F W = − 02 a
−a
F0 ( x + a )3 x a dx ( + ) = − ∫a a2 3
−a
2
, a
8 W = F0 a . 3 Portanto, este exemplo mostra que o trabalho realizado pela força não depende do caminho percorrido pela partícula. Isto é, a integral de linha neste caso só depende do ponto inicial e do final. Mais adiante iremos diferenciar entre forças para as quais o trabalho realizado depende do caminho e forças cujos trabalhos realizados independem da trajetória, como estudado neste exemplo.
3.2.2 Gradiente Energia potencial, energia cinética, temperatura e pressão são exemplos de grandezas físicas escalares que, em geral, dependem das coordenadas. Isto é, são funções escalares do tipo u ( x, y, z ) cujas três derivadas parciais podem ser consideradas como componentes de uma função vetorial denominada de gradiente de u :
grad u = iˆ
(3.26)
∂u ˆ ∂u ˆ ∂u . +j +k ∂x ∂y ∂z
grad u de maneira geométrica, como sendo o vetor cuja direção é aquela em que u cresce mais rapidamente e cujo módulo é a derivada direcional de u , ou seja, a taxa de crescimento de u por unidade de distância naquela direção. Você percebePode-se também definir
rá que esta definição geométrica é equivalente à definição algébrica (equação 3.26), tomando-se o diferencial de u :
du =
(3.27) Já que
∂u ∂u ∂u dx + dy + dz . ∂x ∂y ∂z
ˆ ˆ , podemos escrever du como: dr = idx + ˆjdy + kdz du = (
∂u ˆ ∂u ˆ ∂u ˆ ˆ ˆ ) i+ j + k ) • (idx + ˆjdy + kdz ∂x ∂y ∂z
Movimento em Duas e Três Dimensões
103
du = ( grad u ) • dr .
(3.28)
Geometricamente, du é a variação de u , quando se desloca do ponto r = ( x, y, z ) para um ponto próximo r + dr = ( x + dx, y + dy, z + dz ) . A partir da equação 3.28, podemos escrever:
du = dr grad u cos ,
(3.29)
é o ângulo entre dr e grad u . Logo, a uma distância peque na fixa dr do ponto r , a variação de u será um máximo quando dr tiver a mesma variação do gradiente de u , assim, onde
grad u =
du , dr
resultado que confirma a descrição geométrica do gradiente de uma função escalar dada anteriormente. Para uma notação mais concisa do gradiente, introduz-se o símbolo nabla (∇) , isto é, reescrevemos a equação 3.26 como:
∂ ˆ ∂ ˆ ∂ + j + k )u = ∇u . ∂x ∂y ∂z
(3.30)
grad u = (iˆ
Isto significa que
∂ ∂ ∂ ∇ ≡ iˆ + ˆj + kˆ . Veja que ∇ não é um vetor ∂x ∂y ∂z
no sentido geométrico, mas sim uma operação sobre uma função
que resulta no vetor
u
∇u . Note que a forma de ∇ depende do sistema
de coordenadas utilizado. Por exemplo, em coordenadas cilíndricas, uma função escalar u ( , , z ) tem diferencial:
du = E como agora
∂u ∂u ∂u d + d + dz . ∂ ∂ ∂z
ˆ , reescrevemos a expressão ˆ d + ˆ d + kdz dr =
acima,
ˆ du = (
e identificamos
ˆ ∂u ˆ ∂u ∂u ˆ ) = ∇u • dr , ˆ d + ˆ d + kdz + + k )•( ∂ ∂ ∂z ˆ ∂ ˆ ∂ ∂ ˆ ∇ ≡ ( + + k ) para o cálculo do gradiente ∂ ∂ ∂z
de uma função em coordenadas cilíndricas.
104
3.2.3 Divergente A aplicação de ∇ em uma quantidade escalar gera um vetor. Por ou tro lado, é fácil perceber que, ao efetuarmos o produto escalar de ∇ com uma quantidade vetorial A( x, y, z ) , resultará em uma quantida de escalar. Este produto escalar denomina-se de divergência de A : ∂ ∂ ∂ ∇ • A = (iˆ + ˆj + kˆ ) • ( Ax iˆ + Ay ˆj + Az kˆ) , ∂x ∂y ∂z ∂A ∂Ay ∂Az . ∇• A= x + + ∂x ∂y ∂z
(3.31)
O significado geométrico da divergência de um vetor é fornecido pelo Teorema da Divergência ou Teorema de Gauss:
ˆ , ∇ • A dV = A ∫∫∫ ∫∫ • nds
(3.32)
V
S
onde V é um dado volume e S é a superfície que delimita este volume, sendo nˆ um vetor unitário perpendicular à superfície S , apon-
tando para fora do volume V em cada ponto de S (observe a figura 3.8). Isto quer dizer que A • nˆ é a componente de A normal a S .
n^
S V
ds
Figura 3.8 - Volume
V
limitado por superfície
S.
Literalmente, a equação 3.32 afirma que a divergência de um vetor no interior de um dado volume que é delimitado por uma superfície é igual ao fluxo total deste vetor através desta superfície. Podemos exemplificar o uso da divergência de um vetor no escoamento de um fluido. Seja a densidade do fluido, a massa num volume arbitrário V é
m = ∫∫∫ dV . V
E o fluxo de fluido através da área S que delimita o volume V 3 ˆ é v • nds (em m / s ) e a massa de fluido que sai através de S
∫∫ S
Movimento em Duas e Três Dimensões
105
ˆ (em kg / s ) e, portanto, deve ser igual à variação da − ∫∫ v • nds S dm ∂ = ∫∫∫ dV , ou seja, massa de fluido dentro do volume V , dt dt V
é
∂ ˆ = ∫∫∫ dV . − ∫∫ v • nds dt S V Usamos agora o Teorema da Divergência (equação 3.32), de modo que:
∫∫ v S
•
ˆ = ∫∫∫ ∇ •( v )dV , nds V
∂ − ∫∫∫ ∇ •( v )dV = ∫∫∫ dV , dt V V ou
∂
∫∫∫ ( ∂t + ∇
•
v )dV = 0 .
V
Como o volume é arbitrário, o integrando deve se anular,
∂ + ∇ • v = 0 , ∂t que é conhecida como a equação da continuidade para um fluido na ausência de fontes ou sumidouros de fluido dentro do volume considerado.
3.2.4 Rotacional Talvez você já tenha tido a oportunidade de andar pela margem de um rio e deve ter percebido que, em certas partes, a água flui placidamente, enquanto que em outras partes, ela agita-se, formando redemoinhos, isto é, apresentando movimento de rotação. Nestas partes do rio o movimento da água apresenta propriedades rotacionais. Observe que o divergente é o produto escalar de por uma função vetorial
Você estudará agora como expressar as propriedades rotacionais de uma função vetorial. Começamos observando que, de maneira similar à divergência de um vetor, pode-se também formar o produto vetorial de
por uma função vetorial , denominado rotacional de que se pode escrever na forma de determinante:
iˆ ∂ ∇× A = ∂x Ax ou
106
ˆj kˆ ∂ ∂ , ∂y ∂z Ay Az
A,
(3.33)
∂Ay ∂Ax ∂A ∂A ∂A ∂Ay ) + ˆj ( x − z ) + kˆ( ). ∇× A = iˆ( z − − ∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y
A interpretação geométrica do rotacional é obtida com o Teorema de Stokes: (3.34)
ˆ ∇× A • nds = A ( ) ∫∫ ∫ • dr , C
S
onde S é qualquer superfície no espaço limitada pela curva fechada C , como se mostra na figura 3.9.
^ n ds
S
C Figura 3.9 Superfície
S
limitada pela curva
C.
De acordo com a equação 3.34, o rotacional de um vetor em um ponto qualquer é a medida da extensão da circulação (ou rotação) deste vetor em torno daquele ponto. Você pode interpretar o rotacional de um vetor como o limite da circulação deste vetor por unidade de área. Pela equação 3.34 você verificará que, se a circulação do vetor ao longo de um percurso fechado for zero, o rotacional deste vetor também é nulo. E se o rotacional for nulo, também é nula a circulação do vetor. O rotacional, obviamente, diz respeito às propriedades de rotação de uma função vetorial. Podemos exemplificar voltando ao exemplo das águas em um rio, mas simplificando a situação, isto é, considerando um fluido onde a velocidade de suas partículas defina a função veto rial de velocidades dada por v = × r , onde é a velocidade angular
( = x iˆ + y ˆj + z kˆ) e r seu vetor posição ( r = xiˆ + yjˆ + zkˆ) . Calculamos o rotacional de v : constante de uma partícula do fluido
iˆ ∇× v = ∇× ( × r ) = ∇× x x
Movimento em Duas e Três Dimensões
ˆj y
kˆ z ,
y
z
107
ˆj iˆ kˆ ∂ ∂ ∂ ∇×v = , ∂x ∂y ∂z z y − y z x z − z x y x − x y ∇× v = 2 x iˆ + 2 y ˆj + 2 z kˆ = 2 , 1 = ∇×v . 2
ou
Este resultado deixa claro que o rotacional de v está relacionado às propriedades rotacionais desta função vetorial de velocidades. Isto é, a velocidade angular (constante) das partículas do fluido, ou seja, o movimento de rotação do fluido, é especificado pelo rotacional de v .
V
eremos mais adiante que, em mecânica, o rotacional � de uma força F ( x, y, z ) define se ela é conservativa
ou não. No eletromagnetismo as equações de Maxwell na forma diferencial se expressam mediante a divergência e o rotacional dos campos elétrico e magnético .
Você acabou de estudar, no tópico 3.2, os elementos de cálculo vetorial. É importante que você tenha claro o conceito e função da integral de linha, gradiente, divergente e rotacional para o estudo da mecânica.
3.3 Teoremas do Momento Linear e da Energia No estudo do movimento de uma partícula em uma dimensão, você estudou os teoremas do momento linear e da energia. Neste tópico você estudará o movimento em três dimensões. Escrevemos a segunda lei de Newton na forma vetorial,
d 2r m 2 =F, dt
(3.35) sendo
F a soma das forças que atuam sobre a partícula de massa m .
Em coordenadas cartesianas, a equação acima equivale a três equações, uma para cada direção no espaço: (3.36)
108
d 2x m 2 = Fx , dt
d2y m 2 = Fy , dt
d 2z m 2 = Fz . dt
Em uma dimensão, definimos o momento linear (ou quantidade de movimento) de uma partícula como px = mvx , de modo que, em três dimensões, teremos: (3.37)
p = mvx iˆ + mv y ˆj + mvz kˆ = mv .
A equação 3.35 pode ser reescrita como: (3.38)
d dr d (m ) = (mv ) = F , dt dt dt dp =F. dt
(3.39)
A equação 3.39 expressa o teorema do momento linear em três dimensões, ou seja, a taxa de variação temporal do momento linear é igual à força resultante aplicada sobre a partícula. Integrando-se a equação 3.39 ente os instantes t1 e t2 , obtém-se a variação do momento linear,
t2 p2 − p1 = ∫ Fdt .
(3.40)
t1
Esta forma integral do teorema do momento linear estabelece que a variação do momento entre dois instantes quaisquer é dada pelo impulso fornecido pela força aplicada (o segundo membro da equação acima). Para estabelecermos o teorema do trabalho-energia, partimos da equação 3.38, fazendo o produto escalar de ambos os membros com o vetor velocidade v :
d v • mv = F • v . dt
(3.41)
d dv dv dv Desde que (v • v ) = •v +v • = 2v • , podemos reescrever a dt dt dt dt
equação 3.41 como:
(3.42)
d 1 d 1 ( mv • v ) = ( mv 2 ) = F • v . dt 2 dt 2
Na expressão acima
v 2 = v • v = vx2 + v y2 + vz2 , e sendo a energia cinética
da partícula definida como
Ec =
1 2 mv , a equação 3.42 nada mais é 2
que o teorema da energia na forma diferencial, (3.43)
dEc = F •v , dt
Movimento em Duas e Três Dimensões
109
de onde você pode perceber que a energia cinética da partícula pode aumentar, diminuir ou permanecer constante. O exemplo clássico de uma força que não muda a energia cinética da partícula é a força magnética sobre uma partícula carregada. Nesta situação, a força é perpendicular à velocidade, e assim, F • v = 0 e, portanto, a energia cinética se mantém constante. Integrando-se a equação 3.43 no tempo, obtém-se o teorema da energia na forma integral, (3.44)
t 1 2 1 2 2 Ec2 − Ec1 = mv2 − mv1 = ∫ F • vdt . 2 2 t1
Como vdt = dr , se a força depender da posição, podemos escrever a integral na equação 3.44 como uma integral de linha, r2
Ec2 − Ec1 = ∫ F • dr ,
(3.45)
r1
que conhecemos como o teorema do trabalho energia. A variação da energia cinética é igual ao trabalho realizado pela força enquanto a partícula se desloca entre a posição r1 e a posição r2 .
3.4 Teorema do Momento Angular
A relação 3.46 não deve ser nenhuma novidade para você, pois este assunto foi desenvolvido na Física Básica.
Já é de seu conhecimento que, quando estudamos o movimento de rotação em torno de um ponto ou em torno de um eixo, o análogo à força no movimento de translação é o torque associado à força, ou momento da força. Para abrir ou fechar uma porta, você sabe que é necessário aplicar uma força bem mais intensa se a mesma for aplicada perto do eixo de rotação. A mesma força aplicada à borda da porta fará com ele se movimente facilmente. Isto demonstra que no movimento de rotação não só a força, mas também o ponto de aplicação da mesma, é que determina o movimento. O torque T , ou momento de uma força
F , em relação a um ponto (tomado como a origem
das coordenadas) ou a um eixo que passa por este ponto, sobre uma partícula de massa m , é definido pelo produto vetorial entre o vetor posição do ponto de aplicação da força e a força aplicada, (3.46)
T = r ×F .
Observe que se efetuarmos o produto vetorial de
r com ambos os
membros da equação 3.39,
dp d r× = r × (mv ) = r × F = T . dt dt dr Já que × mv = v × mv = 0 , podemos reescrever a equação anterior dt como: 110
d dr r × (mv ) + × (mv ) = r × F = T , dt dt o que é equivalente a:
d (r × mv ) = T . dt
ou
d (r × p) = T . dt
(3.47)
Definimos o momento angular
L como:
(3.48)
L = (r × p) .
Assim, a equação 3.47 expressa o teorema do momento angular na forma diferencial,
dL =T , dt
(3.49)
ou seja, a taxa de variação temporal do momento angular de uma partícula é igual ao torque que age sobre ela. A integração da equação 3.49 entre dois instantes fornece o teorema do momento angular na forma integral:
t2 L2 − L1 = ∫ Tdt .
(3.50)
t1
Logo, conhecido o torque exercido sobre a partícula, podemos obter a variação do momento angular e, na ausência de qualquer torque, o momento angular permanece constante. Vejamos agora o teorema do momento angular (equação 3.49) quando o movimento da partícula ocorre no plano. Você já sabe que uma maneira de especificar o movimento no plano é adotando-se coordenadas • polares. Na figura 3.5 mostram-se as componentes polares vr = r e • v = r do vetor velocidade v de uma partícula e seu vetor posição r em relação a uma origem O . Da definição do momento angular (equa-
ção 3.48), obtemos: •
L = rmv = mr 2 ,
(3.51)
para o módulo do momento angular. A direção de L é perpendicular ao plano no qual a partícula executa seu movimento e o seu sentido determinado pela regra do produto vetorial. Observe que o sentido de •
L é o mesmo sentido de . Movimento em Duas e Três Dimensões
111
Caso tenha alguma dúvida, retorne as tópicos anteriores deste capítulo.
Também devemos escrever a força que atua sobre a partícula em termos de suas componentes polares, (3.52)
ˆ r + ˆ F . F (r ) = rF
Usamos as componentes do vetor aceleração em coordenadas polares da equação 3.18 para escrever as equações de movimento correspondentes: ••
•
(3.53)
mar = m( r − r 2 ) = Fr ,
(3.54)
ma = m(r + 2 r ) = F .
••
• •
A seguir, multiplicamos ambos os membros da equação 3.54 pelo módulo do vetor posição, (3.55) sendo
••
• •
m(r 2 + 2 rr ) = rF ,
rF o módulo do torque T = rrˆ × ˆ F = rF (rˆ × ˆ ) = rF . Para
identificar o primeiro membro da equação 3.55, observamos que a equação 3.51 permite obter a taxa de variação temporal do momento angular, ou seja, (3.56)
• • •• •• • • dL = 2mr r + mr 2 = m(r 2 + 2r r ) . dt
Comparando as equações 3.55 e 3.56, você verificará que: (3.57)
dL = rF = T , dt
que é um caso particular da equação 3.49, quando aplicada ao movimento no plano e descrito em coordenadas polares. Você verificará que o teorema do momento angular (equação 3.57) e as equações de movimento 3.53 e 3.54 serão úteis na descrição do movimento de uma partícula submetida a forças, especificada pela equação 3.52, onde F = 0 , isto é F ( r ) = Fr ( r ) rˆ , denominadas de forças centrais.
3.5 Movimento de Projéteis Um dos problemas mais antigos e importantes na história da mecânica é a determinação do movimento de projéteis, que serve com um exemplo da dinâmica de uma partícula em duas dimensões. Se ignorarmos a resistência do ar, durante a trajetória o projétil fica sob a ação da força gravitacional apenas, que no caso de um movimento próximo à superfície da Terra, é constante e igual a mg , tendo a direção vertical, que escolhemos como sendo o eixo de movimento para o projétil é:
112
Z . Assim, a equação
d 2r m 2 = − mgkˆ , dt
(3.58)
que expressamos em termos de suas componentes,
d 2x m 2 = 0, dt
d2y m 2 = 0, dt
d 2z m 2 = −mg . dt
As soluções destas equações são: (3.59)
x = x0 + v0 x t ,
(3.60)
y = y0 + v0 y t ,
(3.61)
z = z0 + v0 z t − gt 2 .
1 2
Ou, na forma vetorial,
1 r = r0 + v0t − gt 2 kˆ .
(3.62)
2
A posição inicial do projétil pode ser tomada como a origem das coordenadas, o que significa x0 = y0 = z0 = 0 . Admita agora que o vetor
xz , de maneira que v0 y =0. Neste caso, a equação 3.60 mostra que y (t ) = 0 e, logo, a trajetória vai ocorrer no plano xz. Assim, o projétil efetua sua trajetória no plano definido pelo vetor velocidade inicial e o eixo z , veja a figura 3.10. Portanto, escolher v0 y = 0 é completamente equivalente a uma escolha velocidade inicial esteja no plano
conveniente do sistema de coordenadas. Note na figura 3.10 que esta escolha é equivalente a uma rotação dos eixos coordenados em torno do eixo z, de modo que o eixo x coincida com o eixo x´.
Z
Y´
θ
Z
Y θ
X
X
X´ Figura 3.10 - Trajetória do projétil: a) No espaço b) No plano xz.
Escolhendo então o plano da trajetória como o plano xz , as equações 3.59 e 3.61 fornecem as coordenadas como função do tempo,
x = v0 x t ,
Movimento em Duas e Três Dimensões
1 2
z = v0 z t − gt 2 . 113
Estas duas equações descrevem o movimento do projétil e dizemos que a trajetória está sendo fornecida de forma paramétrica, onde o tempo é o parâmetro. Para se obter a trajetória em coordenadas retangulares, isto é, z ( x) , devemos eliminar o parâmetro tempo, fazemos isto substituindo
t = x / v0 x na equação para z (t ) , o que fornece:
z=
(3.63)
v0 z 1 g 2 x− x , v0 x 2 v02x
que é a equação de um a parábola, cuja concavidade é para baixo, cruzando o eixo dos x na origem e em:
xA = 2
(3.64)
v0 z v0 x . g
Logo, x A é o alcance do projétil na horizontal. A altura máxima atingida pelo projétil pode ser obtida calculando o máximo da função z ( x) , equação 3.63, cujo ponto de máximo obtém-se de (dz ) x = x = 0 , o que fornece o valor de
x1 =
(3.65) A altura máxima é
dx
x1 :
1
v0 x v0 z . g
z ( x1 ) , relacionando 3.65 com 3.63, ou seja,
(3.66)
z ( x1 ) = zm =
v02z . 2g
Observe que os resultados expressos nas equações 3.63 a 3.66 podem ser colocados em termos do módulo do vetor velocidade inicial v0 , e o ângulo de inclinação e
v0 z = v0sen 0 .
0 em relação à horizontal, pois v0 x = v0 cos 0
O movimento de qualquer projétil é alterado devido à resistência do ar. Você deve estar pensando que como o ar é pouco denso, talvez ele seja incapaz de frear de modo sensível o rápido movimento de uma bala de fuzil. Para ver como isto é um grande engano, considere um tiro de fuzil com uma inclinação de 45°, o que, pela equação 3.64, fornece um alcance máximo. Se o fuzil dispara a bala com uma velocidade de 650m/s, m / s então o seu alcance seria, conforme a equação 3.64, algo em torno de 43 km. E a bala atingiria uma altura, conforme a equação 3.66, de quase 11 km. Naturalmente, nada disso acontece, pois devido à resistência do ar a bala de um fuzil tem um alcance em torno de 4 km, atingindo uma altura em torno de mil metros. Como podemos admitir que, em geral, a força de resistência do ar é proporcional à velocidade ou ao seu quadrado, percebe-se que quanto maior
114
a velocidade do projétil, maior é a resistência do ar e seu efeito tornase apreciável, não podendo mais ser desprezada. A maneira mais simples de se levar em conta a resistência do ar é considerar uma força resistiva proporcional à velocidade, e a equação de movimento do projétil fica:
d 2r dr ˆ , m 2 = −mgk − b dt dt
(3.67)
onde a constante de proporcionalidade b depende da geometria do projétil e da densidade do meio, no caso, o ar. Vamos supor o movimento do projétil no plano xz , de modo que em componentes, temos as equações:
m
(3.68)
m
(3.69)
d 2x dx = −b , 2 dt dt
d 2z dz = − mg − b . 2 dt dt
As soluções destas equações de movimento já foram obtidas no capítulo 1, sendo que a equação 3.68 é a equação 1.53, cuja solução é expressa na equação 1.55, ou seja,
x=
(3.70)
mv0 x (1 − e − bt / m ) . b
x → z ), cuja solução está na equação 1.62, mas agora tem-se uma velocidade inicial v0 z . Va-
A equação 3.69 é a equação 1.58 (trocando
mos, portanto, integrar a equação 3.69, o que fornece: vz
∫
v0 z
t
dvz b = − ∫ dt , mg m0 + vz b
mg + vz b b ln =− t, mg m + v0 z b vz = (
(3.71)
mg mg + v0 z )e − bt / m − . b b
Integre a velocidade para obter a posição z
∫ dz = ( 0
t
z (t ) , t
mg mg dt , + v0 z ) ∫ e − bt / m dt − b b ∫0 0
Movimento em Duas e Três Dimensões
115
m 2 g mv mg z = 2 + 0 z (1 − e − bt / m )− t. b b b
(3.72)
Note que, como antes, supomos que o projétil foi lançado da origem das coordenadas com velocidade v0 = v0 x iˆ + v0 z kˆ . Podemos obter a trajetória
z ( x) a partir das equações 3.70 e 3.72, eliminando o parâ-
metro tempo,
mg v0 z mv0 x m2 g z = + ). x − 2 ln( b mv0 x − bx bv0 x v0 x
(3.73)
z ( x) não é uma parábola, sendo que quando x se aproxima de mv0 x / b , a função z ( x) tende a me-
De acordo com esta equação, a curva
nos infinito, ou seja, a trajetória termina como uma queda vertical em
x = mv0 x / b , e pela equação 3.71, a sua velocidade nesta queda vertical será − mg / b . Na figura 3.11, mostram-se algumas trajetórias para projéteis com diferentes velocidades iniciais. Nesta figura tornamos evidente o fato de que os projéteis, em alguns casos, podem atingir o solo antes de atingir a parte da trajetória correspondente à assíntota vertical.
z
x Figura 3.11 - Trajetórias para o alcance máximo de projéteis com diferentes velocidades iniciais.
Na figura 3.11 você pode observar que, para trajetórias de curto alcance, o que significa baixas velocidades e pequena resistência do ar, a curva se aproxima bastante de uma parábola. Podemos comprovar isto reescrevendo a equação 3.73,
mg v0 z m2 g 1 z = + x − ln , 2 b bv0 x v0 x 1 − bx / mv0 x
(3.74) ou
mg v0 z z = + bv0 x v0 x
(3.75)
m2 g bx x + ln 1 − 2 b mv0 x
.
Quando a resistência do ar é pequena e temos pequenos alcances, signi2 3 fica que y = bx / mv0 x 0) e o movimento não é periódico em r , sendo
Força Central
155
que a partícula vindo de r = ∞ alcança um ponto de máxima aproximação (ponto de retorno) chamado de periélio, voltando para o infinito. Para um dado valor de energia e momento angular, o ponto de retorno ocorre em valores maiores de r do que quando não existe for-
( K = 0) , e a partícula segue em linha reta. Se a força for atrativa ( K < 0) com L ≠ 0 e a energia for positiva ( E > 0) , o movimento
ça
também será ilimitado, mas agora o ponto de retorno ocorrerá num valor de r menor do que para K = 0 . Estas órbitas abertas estão esquematizadas na figura 4.7.
K>0 K= 0
0
K< 0
Figura 4.7 - Esboço das órbitas não limitadas para a força inverso do quadrado.
( K < 0) e as energias são negativas, − mK / L < E < 0 , a coordenada r oscila entre os pontos de re1 2 2 torno r1 e r2 . Para E = E0 = − 2 mK / L , que corresponde ao míQuando a força é atrativa 1 2
2
2
nimo da energia potencial efetiva (figura 4.6), a partícula tem mo-
L2 . Por último, se K < 0 e para mK energias negativas E < 0 , na ausência de momento angular, L = 0,
vimento circular de raio
r0 = −
o movimento se reduz ao de queda livre, já analisado no capítulo 1. Para se obter o raio da trajetória circular, usamos:
d K L2 Vef (r ) =0=− 2 − 3 dr r0 mr0 r = r0 Ou
r0 =
L2 mK
L2 → r0 = − . mK
, pois K < 0 . O mínimo da energia potencial efetiva
1 2
2
2
é Vef ( r0 ) = − mK / L . O período da órbita circular pode ser obtido da equação 4.30: (4.34)
T=
2m 2 L3 r0 = 2 . L mK 2
Aqui, como no caso do oscilador isotrópico, podemos considerar pequenas oscilações radiais em torno da posição de mínimo, para ener-
156
gias da partícula levemente superiores a E0 . Usamos a equação 4.28 para calcular a freqüência r das pequenas oscilações radiais, 2 k 1 d Vef (r ) 2 K 3L2 m 2 K 4 . = + = = = m m dr 2 r = r r03 mr04 L6 2 r
0
Sendo o período correspondente
Tr =
2 L3 = 2 e, portanto, igual r mK 2 r0 . Isto significa E0 , a aproximação de peque-
ao período de revolução da órbita circular de raio que, para energias pouco maiores que
nas oscilações mostra que a órbita é uma curva fechada, com a origem deslocada levemente do centro. Para energias negativas entre zero e
E0 e para valores arbitrários de L ,
as informações essenciais sobre o movimento podem ser obtidas a partir da equação diferencial para a órbita, equação 4.24, onde agora
F (r ) = F (1/ u ) = Ku 2 , e logo,
d 2u m mK = −u − 2 2 Ku 2 = −u − 2 , 2 d Lu L d 2u mK +u = − 2 . 2 d L
(4.35)
u tem a mesma forma que a equação para um oscilador harmônico em uma dimensão de freqüência unitária e sub-
A equação 4.35 para
mK ), sendo que a variável L2 substitui a variável tempo t ( x → u , t → ) . A solução desta equação metido a uma força constante (o termo
−
consiste na soma da solução da equação homogênea mais uma solução da não-homogênea. A solução da homogênea você já conhece,
uh = A cos( − 0 ) ,
(4.36)
enquanto que uma solução particular, solução da equação não-homogênea, procura-se na forma de uma constante, u p = C . Substituindo na equação 4.35, obtém-se
(4.37)
u=
C = −mK / L2 e a solução geral é:
1 mK = − 2 + A cos( − 0 ) . r L
Esta é a equação de uma cônica, podendo ser uma elipse, uma hipérbole ou uma parábola, com o foco em r = 0 , como você verificará logo a seguir. Uma cônica é obtida pela interseção de um plano com um
Força Central
157
cone, sendo que o ângulo entre o plano e o eixo do cone determina o tipo de cônica. Por exemplo, se o ângulo é de , a cônica resultante é um círculo. As constantes sendo que
A e 0 dependem das condições iniciais,
0 determina a orientação da órbita no plano, enquanto
que A especifica os pontos de retorno do movimento na direção radial. Usando a equação acima, os pontos de retorno são:
(4.38)
1 mK =− 2 +A r1 L
e
1 mK = − 2 − A. r2 L
mK (condição necessária se K > 0 ), existe soL2 mente um ponto de retorno, ou seja, r1 , pois r não pode ser negativo. mK Também não se pode ter A < 2 , pois não teríamos nenhum valor L positivo de r para qualquer valor de . O quanto a partícula se afas-
Observe que se
A>−
ta e se aproxima do centro de força depende de quanta energia ela tem e de seu momento angular, de modo que a constante A deve depender diretamente da energia e do momento angular. Nos pontos de retorno, tem-se E = Vef ( r ) , e usando 4.19, vem, (4.39)
Vef (r ) =
K L2 + = E. r 2mr 2
A maneira mais simples de se obter as raízes
do u = 1/ r ,
1/ r1 e 1/ r2 é substituin-
L2 2 u + Ku − E = 0 . 2m
As soluções desta equação de segundo grau são: 1/2
(4.40)
2 1 mK mK 2mE = − 2 + 2 + 2 , r1 L L L
(4.41)
2 1 mK mK 2mE = − 2 − 2 + 2 . r2 L L L
1/2
Comparando com a equação 4.38 obtém-se a constante da energia e momento angular, 2
(4.42)
158
mK 2mE A = 2 + 2 . L L 2
A em termos
Resultado que devemos substituir na equação 4.37 para fornecer a órbita em termos das condições iniciais. Você já sabe que fornecer a posição e a velocidade iniciais é equivalente a fornecer a energia total e o momento angular. Antes, afirmamos que a equação 4.37 é a equação geral de uma cônica com a origem em um dos focos. Veremos agora as equações da elipse, da hipérbole e da parábola em coordenadas polares. A curva que é obtida por um ponto que se move de tal maneira que a soma de suas distâncias a dois pontos fixos F e F ´ é constante, é denominada de elipse. Os pontos
F e F ´ são chamados de focos da elipse. A
figura 4.8 mostra a geometria da elipse.
r´
r 0
aε
F´ b
F
x
a Figura 4.8 - Geometria da elipse.
A definição de elipse é tal que:
r´+ r = 2a ,
a o semi-eixo maior da elipse. Usando coordenadas polares com a origem no foco F e com o eixo dos x negativo passando por F´ , como se mostra na figura 4.8, a lei dos co-senos fornece: sendo
(4.43)
r´2 = r 2 + 4a 2 2 + 4a cos ,
a é a distância a partir do centro da elipse até o foco, sendo denominada de excentricidade da elipse. Observe que para = 0 ,
onde
os focos coincidem e a elipse torna-se uma circunferência, e quando
→ 1 a elipse, degenera em uma parábola, ou num segmento de reta, dependendo de o foco F ´ se deslocar para o infinito ou permanecer em uma distância finita de
F . Substituindo na equação 4.43 r´= 2a − r ,
acha-se a equação da elipse:
(4.44) ou,
Força Central
r=
a (1 − 2 ) , 1 + cos
159
1 1 cos . = + 2 r a (1 − ) a (1 − 2 )
(4.45)
Já a hipérbole é definida como a curva descrita por um ponto que se move de tal maneira que a diferença entre as distâncias a dois focos fixos F e F ´ é constante. A geometria da hipérbole está na figura 4.9.
r´ r
θ
a
F
α aε
Ramo +
F´
x
Ramo -
Figura 4.9 - Geometria da hipérbole
Como a figura 4.9 mostra, a hipérbole tem dois ramos definidos por:
r´−r = 2a
(ramo +)
Pela figura 4.9, temos agora
r´−r = −2a
(ramo -)
> 1 e podemos aplicar a lei dos co-senos
(equação 4.43), e usando as definições acima para os dois ramos da hipérbole, obtemos: (4.46)
1 1 =± + cos , 2 2 r a ( − 1) a ( − 1)
onde o sinal positivo (+) refere-se ao ramo (+) e o sinal negativo (–) ao ramo (–). Da figura 4.9, tiramos também que as assíntotas da hipérbole (linhas tracejadas na figura) fazem um ângulo com o eixo que passa pelos focos, e como este ângulo corresponde ao valor do ângulo
160
quando r tende ao infinito, isto é, → para r → ∞ , a equação 4.46 fornece:
1 cos = ± .
(4.47)
A parábola, por sua vez, é uma curva descrita por um ponto de maneira que a sua distância a uma linha fixa D (a diretriz) é igual a sua distância a um foco fixo
F . Verifique que na figura 4.10 mostra-se a
geometria da parábola.
D
r r F θ
x
a
Figura 4.10 - Geometria da parábola.
Da definição apresentada e pela figura 4.10, obtemos:
r + r cos = a , de modo que a equação da parábola com a origem no foco é:
1 1 1 = + cos . r a a
(4.48)
As equações 4.45, 4.46 e 4.48 permitem escrever as três cônicas, de maneira geral, como:
1 = B + A cos . r
(4.49)
Para uma elipse (verifique 4.45), teremos
(4.50) Força Central
B=
1 , a (1 − 2 )
A=
B>A e . a (1 − 2 ) 161
B=A e
Para uma parábola (verifique 4.48),
B=
(4.51)
1 , a
A=
1 . a
Para uma hipérbole (verifique 4.46), podemos ter 0 < B < A (ramo +), e (4.52)
B=
1 2
a ( − 1)
A=
,
2
a ( − 1)
,
ou − A < B < 0 (ramo -), e (4.53)
B=−
1 2
a ( − 1)
A=
,
2
a ( − 1)
.
B < − A não pode ocorrer, pois r seria negativo para qualquer valor de . Comparando a trajetória obtida (equação 4.37) com Note que
a expressão 4.49, pode-se ver que a solução para o movimento é uma cônica cuja orientação no plano é definida pelo ângulo 0 , isto é, 0 é o ângulo entre o eixo dos x e a linha que parte da origem até o periélio (ponto de maior aproximação da curva à origem). Para a elipse e a hipérbole, as equações 4.50, 4.52 e 4.53 mostram que a excentricidade é:
A , B
=
(4.54)
enquanto que o semi-eixo maior para as duas curvas se expressa como:
a=
(4.56)
B . A − B2 2
Assim, para o movimento sob a ação de uma força central que varia com o inverso do quadrado da distância, vê-se, por meio das equações 4.37 e 4.42, que: (4.57)
B=−
mK , L2
A = B2 +
2mE . L2
De onde se pode obter o semi-eixo maior para órbitas elípticas e hiperbólicas, (4.58)
a=
K . 2E
Logo, o semi-eixo maior só depende da energia (e vice-versa), não dependendo do momento angular da partícula. Por outro lado, a ex-
162
centricidade da órbita depende da energia e do momento angular. Usando as equações 4.54 e 4.57, obtém-se:
= 1+ ou (4.59)
2mE , B 2 L2
= 1+
2 EL2 , mK 2
enquanto que a equação 4.44 fornece os raios mínimo e máximo da elipse como sendo r1 = a (1 − ) e r2 = a (1 + ) , onde a e são obtidos a partir da energia e momento angular (equações 4.58 e 4.59). Os pontos ( r1 , 0) e ( r2 , ) são denominados de periélio e afélio para o movimento de planetas e cometas em torno do Sol, e denominados de perigeu e apogeu no caso de satélites naturais (luas) e artificiais. Note que a equação 4.59 é um resultado importante porque mostra diretamente que para uma força atrativa ( K < 0) , temos: a) Para momento angular nulo
( L = 0) , temos que = 1 e a traje-
tória é uma linha reta que passa pelo centro de força; b) Se
( L ≠ 0) mas a energia total é zero ( E = 0) , temos que = 1 ,
e a trajetória é uma parábola com o foco no centro de força; 1
2
2
c) Quando − mK / L < E < 0 , temos 0 < < 1 e as órbitas são 2 elipses com o centro de força em um dos focos; 1
2
2
d) Para E = − mK / L , vem = 0 , e a partícula descreve uma 2 órbita circular em torno do centro de força; e) Se as energias são positivas
> 1 , a trajetória será o ramo posi-
tivo (+) da hipérbole. Se a força for repulsiva
( K > 0) , só podemos ter energias positivas
( E > 0) , então > 1 e as trajetórias são hipérboles (o ramo negativo
da hipérbole). Todos os resultados apresentados anteriormente quantificam os resultados qualitativos obtidos por meio da análise da energia potencial efetiva da figura 4.6, mostrando mais uma vez que o mero conhecimento da energia potencial pode fornecer conclusões importantes a respeito do movimento de uma partícula quando sob a ação de uma força central.
m é lançado com velocidade v0 a partir da superfície da Terra, fazendo um ângulo com a direção raExemplo 3. Um míssil de massa
Força Central
163
dial. Veja a figura 4.11. Descreva o movimento do míssil, determine a altura máxima atingida e a distância em que ele cairá de retorno a Terra 2 medida ao longo da superfície. Considere que v0 = GM / R , sendo M e
R a massa e o raio da Terra, respectivamente, e que
v0 φ A
A
θ´
B
R
θ2
Terra
B
α
h
.
θ1
α= θ2−θ1 θ2= π + θ´
Figura 4.11 - Lançamento de um míssil a partir da superfície da Terra.
Como queremos uma solução simplificada, devemos ignorar o movimento de rotação da Terra e a resistência do ar. Observe que dizer que o míssil foi “lançado” a partir da superfície da Terra significa que a altura em que ele se encontra ao atingir a velocidade v0 é pequena, comparada ao raio da Terra. Isto significa que temos o movimento de uma partícula sob a ação de uma força do tipo inverso do quadrado. Como a energia total do míssil é:
E = 12 mv02 − GMm / R , e seu momento angular vale:
L = (mv0sen) R , então a excentricidade de sua órbita é: 2
v Rsen GM = 1− 0 − v02 . 2 GM R Como
v02 < 2GM / R , a excentricidade é menor que um, e assim a tra-
jetória é uma elipse com o centro da Terra em um dos focos. Você deve estar lembrado que a velocidade de escape é 2GM / R e deve saber o que acontece se o míssil for lançado com esta velocidade. A equação da trajetória é:
a (1 − 2 ) r= , 1 + cos
com o semi-eixo maior dado pela equação 4.58,
164
a=
GM . 2GM / R − v02
Logo, a equação da trajetória fica:
r= Com
v02 = GM / R e
R 2 v02sen 2 . GM (1 + cos )
, vem
r=
= 23 , e assim: R
4(1 + 23 cos )
.
A altura máxima h atingida pelo míssil é h = r2 sendo r2 o apogeu, que corresponde a = ,
r2 = e logo,
h=
3 2
− R (veja a figura 4.11),
R , 2(2 − 3)
R ≅ 5.500km . Para calcularmos a distância, medida ao
longo da superfície, em que o míssil retorna à Terra, devemos calcular o arco AB = R . O ângulo é dado por = 2 − 1 , conforme mos-
1 e 2 correspondem aos dois valores de r = R . Usando a equação da trajetória, R = R / 4(1 + 3 cos 1 ) , 2 e logo cos 1 = − 3 , assim 1 = / 2 + / 3 . Para obter 2 , ob2 serve a figura 4.11 e veja que podemos escrever 2 = ´+ , e logo R = R / 4(1 + 23 cos( + ´) , fornecendo cos ´= 23 , de modo que 2 = / 6 + . Portanto, o ângulo vale = / 3 , de modo que o arco AB é AB = R / 3 ≅ 6.700km . trado na figura 4.11. Os ângulos
O exemplo que acabamos de fazer será útil no capítulo 5, quando tratarmos do movimento de foguetes e de como enviar à Lua um satélite utilizando um foguete de três estágios.
4.4 As Leis de Kepler para o Movimento dos Planetas Durante o transcorrer dos séculos, os povos antigos observaram os cinco planetas visíveis (Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno) em seu movimento lento e quase regular através das constelações fixas do zodíaco. Mas ocasionalmente, de tempos em tempos e de forma bastante previsível, estes astros invertiam seu movimento durante um tempo (algumas semanas), para em seguida, avançar retomando a direção inicial do movimento. Este comportamento de avançar e re-
Força Central
165
troceder para em seguida avançar recebeu a denominação de movimento retrógrado. A tentativa de explicar este comportamento dos planetas dentro de um modelo geocêntrico (a Terra como centro do Universo com os planetas e o Sol girando ao redor) surgiu com a teoria dos epiciclos, desenvolvida pelo grego Apolônio (246 a 221 a.C.), a qual mostrava que um arranjo de movimentos circulares podia gerar um movimento elíptico. Posteriormente, Hiparco de Nicéia (130 a.C.) apontou algumas falhas na teoria de epiciclos de Apolônio. Mais tarde, o astrônomo alexandrino Ptolomeu (100 d.C. a 170 d.C) – baseando-se nas observações de Hiparco, bem como nas observações de Aristilo e Timocaris, que foram dois astrônomos de Alexandria, e também nas evidências de dados gregos e babilônicos – desenvolveu uma descrição matemática detalhada, baseada também na teoria dos epiciclos, do movimento dos cinco planetas visíveis, do sol e da Lua, que serviu de base para toda a astronomia ocidental durante os quatorze séculos seguintes. Na verdade, o que Ptolomeu conseguiu, de um ponto de vista atual, foi dar aos planetas órbitas ligeiramente elípticas centradas na Terra, junto com uma grande aproximação do movimento variável que eles apresentavam. Somente com Nicolau Copérnico (1473-1543) é que o movimento retrógrado foi explicado como decorrente do movimento relativo entre a Terra e os outros planetas, cada qual se movendo em órbitas heliocêntricas. Entretanto, foi com o trabalho do astrônomo Johannes Kepler (1571-1630) que o movimento planetário foi descrito de modo preciso, usando o modelo heliocêntrico de Copérnico, por meio de leis derivadas das observações astronômicas. As leis de Kepler do movimento planetário se constituem em um dos marcos da física, tendo sido crucial para que Newton estabelecesse sua lei de gravitação. Após quase vinte anos analisando os dados astronômicos - principalmente referentes ao movimento de Marte cuja órbita é altamente elíptica - coletados pelo astrônomo Tycho Brahe (1546-1601), do qual fora assistente, Kepler verificou que existiam importantes regularidades nos movimentos dos planetas. A partir daí Kepler estabeleceu três leis empíricas, que descreviam o movimento observado dos planetas (mas sem qualquer explicação teórica). As duas primeiras leis foram publicadas em 1609, e a terceira em 1619. As leis de Kepler são enunciadas como segue:
166
Leis de Kepler Lei das Elipses: A órbita de cada planeta é uma elipse com o sol localizado em um dos focos. Lei das Áreas iguais: O raio vetor do sol ao planeta varre áreas iguais em tempos iguais. Lei dos Períodos: O quadrado do período de revolução de qualquer planeta é diretamente proporcional ao cubo do semi-eixo maior de sua órbita.
Dos resultados obtidos na seção anterior do movimento sob forças centrais, podemos concluir que a primeira lei de Kepler é decorrente de a força gravitacional depender do inverso do quadrado da distância. A segunda lei decorre da conservação do momento angular, mostrando que a força gravitacional é uma força central, isto é, a força sobre o planeta é dirigida para o Sol. A terceira lei está relacionada a dois fatos. Primeiro, devido à conservação do momento angular no movimento sob força central, para órbitas fechadas existe uma proporcionalidade entre a área da órbita e o período (equação 4.30). Segundo, a força gravitacional depende da massa do planeta. Vejamos isto em detalhes. A área de uma elipse é ab , onde a é o semi-eixo maior e b é o semi-eixo menor. Da figura 4.8, vemos que modo que a equação 4.30 torna-se: (4.60)
T=
b = a 1 − 2 , de
2m 2 a 1 − 2 . L
Usando as equações 4.58 e 4.59, obtém-se (lembre-se que E < 0 e K < 0 ): (4.61)
T 2 = 42
m 3 a . K
Note que, aparentemente, o período depende da massa
m , o que iria
contrariar a terceira lei de Kepler. Entretanto, para a força gravitacional a constante K é K = −GmM s , sendo m a massa do planeta e M s a massa do Sol. Substituindo (4.62)
K na equação 4.61, vem:
T2 =
42 3 a . M sG
E, portanto, a constante de proporcionalidade entre
T 2 e a 3 é a mes-
ma para todos os planetas, o que concorda com a terceira lei de Kepler, deduzida a partir dos dados astronômicos acerca do movimento
Força Central
167
dos planetas em nosso sistema solar. O resultado de 4.62 permite determinar a massa do Sol, uma vez determinado o valor da constante de gravitação G . O valor de G pode ser obtido em laboratório medindo-se a de maneira extremamente precisa a força gravitacional entre dois corpos de massa conhecidas. Experimentos para se determinar o valor da constante de gravitação são difíceis de realizar, pois as forças gravitacionais são extremamente pequenas, motivo pelo qual G é uma das constantes físicas conhecidas com menor precisão. Note que todo o nosso conhecimento atual sobre as massas de corpos astronômicos (incluindo a Terra) é baseado no valor da constante de gravitação. Por exemplo, assumindo que a órbita da Terra seja cir11 cular de raio a = 1,5 x10 m e usando o seu período orbital, a massa do Sol é obtida a partir de
M s = 4 2 a 3 / GT 2 ≅ 2 x1030 kg . Da mesma
maneira, podemos determinar a massa da Terra a partir do movimen24 to orbital da Lua, o que fornece M T ≅ 5,97 x10 kg . Naturalmente a massa da Terra pode ser obtida do valor medido de de gravitação,
M T = gRT2 / G .
g e da constante
No que diz respeito ao nosso sistema solar, a tabela 4.1 apresenta o período, o semi-eixo maior e a excentricidade da órbita dos planetas. Período
Semi-eixo
Excentricidade
Planeta
T
T2
a
a3
Mercúrio
0, 241
0, 0581
0, 387
0, 0580
0, 206
Vênus
0, 615
0,378
0, 723
0,378
0, 007
Terra
1, 000
1, 000
1, 000
1, 000
0, 017
Marte
1,881
3,538
1, 524
3,540
0, 093
Júpiter
11,86
140, 7
5, 203
140,8
0, 048
Saturno
29, 46
867,9
9,539
868, 0
0, 056
Urano
84, 01
7.058
19,18
7.056
0, 047
Netuno
164,8
27.160
30, 06
27.160
0, 009
Plutão
247, 7
61.360
39, 44
61.350
0, 249
Tabela 4.1 Períodos, semi-eixos e excentricidades dos planetas do sistema solar.
A tabela 4.1 apresenta os períodos expressos em anos terrestres e
168
os semi-eixos em unidades astronômicas Neste sistema de unidades, temos que
(1UA = 1,50 x108 km) .
42 = 1 , e assim T 2 = a 3 , GM s
como você pode verificar na tabela 4.1. Note que os planetas com órbitas mais elípticas são Mercúrio, Marte e Plutão, sendo que os demais, principalmente Vênus e Netuno têm órbitas aproximadamente circulares. Os cometas, em geral, têm órbitas bastante elípticas. Por exemplo, a velocidade orbital do cometa Halley no periélio é de
v1 = 196.441km/h e no afélio é apenas v2 = 3.281km/h . Chamando v1 / v2 = n e usando a conservação do momento angular, você deve
ser capaz de mostrar que a excentricidade da órbita pode ser obtida a partir de = ( n − 1) / (n + 1) , o que, no caso do cometa Halley, fornece uma órbita bastante excêntrica,
≅ 0,967 .
Plutão A partir do fim do século XIX, muitos astrônomos propuseram a existência de planetas no sistema solar em órbitas mais distantes que a de Netuno. A tarefa monumental de analisar visualmente centenas de placas fotográficas coube ao jovem astrônomo Clyde Tombaugh (1906-1997). Ao estudar duas exposições fotográficas feitas em janeiro de 1930, Tombaugh descobriu o nono planeta, que receberia o nome de Plutão. Sabe-se agora que o diâmetro de Plutão é de 2320 km (menor que a Lua) e sua massa é apenas 0,2% da massa da Terra. Devido a estas características, a 26a Assembléia Geral da União Astronômica Internacional (IAU), realizada em agosto de 2006, classificou este astro não como um planeta, mas como sendo um dos membros mais internos do cinturão de Kuiper (em homenagem a Gerard Kuiper (1905-1973), que propôs a existência, em 1950, de corpos (cinturão de asteróides) em órbitas em torno do sol mais distantes que Netuno).
A tabela 4.2 mostra a velocidade orbital dos planetas (considerando órbitas circulares), a duração do dia (em termos do dia terrestre), a velocidade rotacional (no equador) e o valor local da aceleração da gravidade (em termos do valor de g , na Terra).
Força Central
169
Planeta
Velocidade orbital
Velocidade rotacional
Valor de g
(km/h)
Dia
Mercúrio
172.305, 0
58, 6
10, 9
0, 27
Vênus
126.051, 0
24,3
6, 6
0,86
Terra
107.206, 0
1
1.673, 0
1
Marte
86.852, 0
1d 37 min 23s
867, 0
0,37
Júpiter
47.041, 0
9h55m
45.633, 0
2, 64
Saturno
34.777, 0
10h38m
36.997, 0
1,17
Urano
24.602, 0
10h 42m
9.313, 0
0,92
Netuno
19.715, 0
15h 48m
9.656, 0
1, 44
Plutão
17.088, 0
12,4
49, 0
(km/h)
Tabela 4.2 - Velocidades orbitais e rotacionais dos planetas do sistema solar.
Da discussão anterior, você já deve ter concluído que as leis de Kepler são obtidas a partir das leis de movimento de Newton e da lei de gravitação. Mas, historicamente, sucedeu-se o inverso. Newton, usando suas leis do movimento, deduziu, a partir das leis de Kepler, a lei de gravitação. Newton publicou sua lei de gravitação universal em sua obra Principia Mathematica, sendo seu enunciado: Lei da Gravitação Universal Todo corpo no universo atrai outro com uma força cuja intensidade é proporcional ao produto de suas massas e inversamente proporcional ao quadrado da distância entre eles. Esta força tem a direção da reta suporte que conecta estes dois corpos.
Enunciado que podemos expressar vetorialmente pela equação
mi m j Fij = G 2 rˆij rij
Fij a força que o corpo de massa mi exerce sobre o corpo de m j . Aqui, rˆij é um vetor unitário segundo um segmento de reta que une o corpo j ao corpo i . Como rˆji = − rˆij , a força gravitacional entre dois corpos satisfaz a terceira lei do movimento Fij = − F ji . É Sendo massa
importante observar que os corpos são tratados como partículas.
170
Se desejarmos determinar a força entre dois corpos extensos, deve-se supor cada corpo como constituído de partículas e calcular a força entre elas. Com este objetivo, Newton desenvolveu o Cálculo Integral. Vejamos como Newton chegou à lei de gravitação. Durante os anos de 1665-1666, Newton afastou-se da Universidade de Cambridge devido à peste bubônica que assolava Londres. Nesta época, em sua casa em Woolsthorpe, Newton envolveu-se com estudos que o ocupariam pelo resto de sua vida: Matemática, Mecânica, Óptica e Gravitação. A interpretação do peso de um corpo como uma força de atração entre ele e a Terra foi uma idéia que ocorreu a Newton e a alguns de seus contemporâneos, como Robert Hooke (1635-1703) e Edmond Halley (1656-1742). A tradicional imagem de Newton sentado sob uma macieira com uma maçã caindo-lhe na cabeça serve, na realidade, para ilustrar como Newton refletiu acerca da natureza da gravidade, perguntando a si mesmo se a força que causa a queda de um corpo (a maçã) não seria a mesma que mantém a Lua em sua órbita em torno da Terra. Newton foi o primeiro a perceber que a Lua devia ter uma aceleração em seu movimento orbital, uma aceleração dirigida para a Terra, aceleração esta devido a uma força centrípeta. Ele percebeu que esta força era a mesma com que a Terra atrai os corpos em direção a sua superfície, pois o comportamento cinemático da Lua é diferente de um corpo que cai em direção à Terra. A Lua caindo não atinge a superfície da Terra, pois ela tem velocidade tangencial suficiente para que, à medida que cai de uma distância h , se afaste da superfície curva da Terra da mesma quantidade, mantendo assim a mesma distância da superfície da Terra, como mostra na figura 4.12.
Lua x h R-h
h R
Terra RT
Figura 4.12 - Duas posições da trajetória circular de um satélite. Força Central
171
Ninguém havia suspeitado, até aquela época, que a aceleração centrípeta da Lua e a aceleração gravitacional de uma maçã caindo na superfície da Terra tinham a mesma origem. Newton demonstrou que se uma maçã caindo tivesse uma componente horizontal da velocidade suficientemente grande, seu movimento seria o mesmo que o da Lua. Isto é, a maçã entraria em órbita próxima à superfície da Terra. Obviamente este é um experimento hipotético, onde não haveria a resistência do ar e nem obstáculos. Saiba que a velocidade necessária é extremamente alta. Para uma órbita circular de raio R , onde R
é o raio da Terra, vem v = 2 R / T . Usando a terceira lei de Kepler, T 2 = (4 2 / MG ) R 3 , obtemos v = GM / R ≅ 28.500 km/h ≅ 8 km/s e a maçã daria a volta na Terra em pouco menos de uma hora e meia. Note que usar a terceira lei de Kepler fornece a velocidade de um planeta ou satélite em órbita circular de modo bem simples. Newton raciocinou então que a aceleração centrípeta da maçã em órbita seria igual a sua aceleração gravitacional em queda livre. A questão crítica seria determinar como a força gravitacional exercida pela Terra sobre a Lua e sobre a maçã dependeria da distância. Newton sabia que a intensidade desta força era proporcional à aceleração dos objetos em queda. A aceleração centrípeta ac da Lua em dire-
ac = v 2 / r , onde v é sua velocidade e r o raio de sua ór2 bita assumida como circular. Com a terceira lei de Kepler, v = GM / r , 2 de modo que ac = GM / r . Logo, a aceleração da Lua (ou da maçã) ção à Terra é
varia com o inverso do quadrado da distância. Assim, Newton estabeleceu como hipótese que o valor da aceleração da gravidade variasse 2 dessa maneira, isto é, o valor local de g sendo g = GM / r . Para confirmar esta hipótese, Newton calculou a aceleração centrípeta da Lua e a comparou com a aceleração g de uma maçã caindo, para verificar se a razão entre elas era igual ao inverso do quadrado de suas respectivas distâncias ao centro da Terra. A distância entre a Lua e a Terra é 60 vezes o raio da Terra. Assim, a força sobre a Lua deveria ser 3600 vezes menor do que sobre a maçã. Ou seja, a taxa com que uma maçã cai é 3600 vezes maior do que a taxa com que a Lua cai. Em outras palavras, a distância que uma maçã cai em um segundo deve ser igual à distância que a Lua cai em 1 minuto, com a distância sendo proporcional ao quadrado do tempo. Quando Newton realizou este cálculo pela primeira vez, ele cometeu um engano, pois assumiu que o ângulo de 1 grau subtendesse um arco de 60 milhas na superfície terrestre
(1milha = 1, 609 km) . Esta distância, na realidade, é igual a 60 milhas náuticas (60 x1,852 km) . Assim, ele calculou que a Lua cairia em um minuto, uma distância de 13 pés (1pé = 0,3048 m) . Os experimentos de 172
Galileu, que foram repetidos posteriormente com maior precisão, forneciam uma distância de 15 pés em um segundo para um corpo em queda próximo à superfície da Terra. Esta pequena diferença fez Newton abandonar esta brilhante idéia. Mais tarde, usando o valor correto do arco na superfície da Terra subtendido pelo ângulo de um grau, ele chegou ao valor correto, estabelecendo a lei universal da gravitação. Newton concluiu que a força gravitacional atuando em um corpo deveria ser proporcional a sua massa (em oposição, por exemplo, ao quadrado da massa ou alguma outra dependência). Esta conclusão é derivável da segunda lei do movimento e do resultado obtido por Galileu, de que a taxa de queda de todos os corpos é a mesma, independente do peso ou da forma do corpo. Assim, se a força gravitacional
FG sobre um corpo de massa inercial
m for proporcional a sua massa, então de acordo com a segunda lei 2 2 do movimento FG = Km / r = ma = mg , logo, g = K / r . Portanto, sendo a força gravitacional proporcional à massa inercial do corpo, a aceleração dos corpos em queda só depende da constante K e da distância ao centro da Terra. Isto significa uma equivalência entre massa inercial e gravitacional, isto é, não fazemos distinção entre massa gravitacional mg e massa inercial mi , mg = mi = m . Para Newton, esta equivalência permaneceu como um mistério durante toda sua vida. Newton percebeu que se a força gravitacional sobre um corpo era proporcional à massa do corpo, então ela deveria ser proporcional também à massa do corpo que exerce esta força. Tal exigência nos leva, de forma inevitável, à conclusão de que a lei da gravitação seja universal, isto é, cada objeto no universo deve atrair cada um dos outros corpos do universo. Se o corpo 1 atrai o corpo 2 com 2 um a força F12 = K1m2 / r e o corpo 2 atrai o corpo 1 com uma for-
F21 = K 2 m1 / r 2 e, pela terceira lei do movimento, elas devem ser iguais ( e opostas), vem K1 / K 2 = m1 / m2 . Esta igualdade fica satisfeita se K1 = Gm1 e K 2 = Gm2 . Mostra-se, assim que a força gravitaça
cional é proporcional ao produto da massa do corpo que atrai pela massa do corpo que é atraído. Deste modo, Newton estabeleceu a lei de gravitação universal, que foi aplicada de maneira triunfal na descrição do movimento planetário. Talvez você tenha percebido que a partir da lei de gravitação, devese esperar que os planetas apresentem pequenos desvios das leis de Kepler. Primeiro, porque o problema de força central, resolvido acima nesta seção, admite que o Sol (como o centro de força) permanece
Força Central
173
fixo no espaço, o que não é verdade, devido à atração gravitacional que os planetas exercem sobre ele. Como a massa do Sol é muito maior do que a massa de qualquer dos planetas, este efeito é pequeno e pode ser corrigido, como veremos no capítulo 5, quando analisarmos o problema de dois corpos. Segundo, porque cada planeta é atraído pela força gravitacional dos outros planetas, assim como pelo Sol. As forças gravitacionais entre os planetas, apesar de serem pequenas, produzem desvios pequenos, porém mensuráveis, das leis de Kepler. Os desvios esperados podem ser calculados por métodos apropriados, e eles concordam com observações astronômicas muito precisas. Por exemplo, um dos primeiros triunfos, senão o primeiro da mecânica de Newton, deve-se a seu colega Edmond Halley. Halley percebeu que o aparecimento dos cometas em 1531 e 1607 parecia ter alguma ligação com o cometa de 1682. Halley presumiu que era o mesmo cometa e calculou seu regresso para 1758, usando a lei de gravitação de Newton para calcular o retardo devido à atração gravitacional de Júpiter. E, de fato, ele reapareceu na data prevista, embora com o atraso de alguns dias, pois o efeito de Júpiter foi um pouco maior que o calculado por Halley. Também o planeta Netuno foi descoberto, antes de ser observado, a partir dos efeitos causados na órbita de outros planetas. Observações do planeta Urano, realizadas durante quase sessenta anos após sua descoberta, em 1781, mostraram desvios inexplicáveis em sua órbita prevista, mesmo depois de se incluírem as correções devidas aos efeitos gravitacionais causados por outros planetas conhecidos. Por meio de análise matemática cuidadosa e elaborada dos dados disponíveis, John Couch Adams (1819-1892) e Urbain Jean Leverrier (1811-1877) foram capazes de demonstrar, por volta de 1846, que os desvios poderiam ser explicados caso se admitisse a existência de um planeta desconhecido, mais afastado do que Urano. Eles calcularam a órbita do planeta desconhecido e naquele mesmo ano Leverrier solicitou ao astrônomo Johann Galle (1812-1910), do observatório de Berlim, que examinasse o céu na área provável da localização do planeta desconhecido. Esta observação mostrou que lá estava Netuno, na órbita prevista. A contínua observação do movimento dos planetas do nosso sistema solar trouxe novos fatos. A observação do planeta Mercúrio, desde 1631, mostrou a precessão do eixo maior de sua órbita, com velocidade angular de 41 segundos de arco por século, além de perturbações atribuídas
174
aos efeitos gravitacionais dos outros planetas. Pensou-se, anteriormente, que este resultado poderia ser obtido considerando-se os efeitos gravitacionais causados por poeiras no sistema solar, mas pode-se demonstrar que a quantidade de poeira é muito pequena para produzir tal efeito. Atualmente, acredita-se que o efeito se deve a pequenas correções introduzidas na teoria da gravitação, requeridas pela teoria da Relatividade Geral. Mas, o mais importante é que, excluindo-se situações especiais de campos gravitacionais muito intensos ou distâncias extremas que requerem o uso da relatividade geral, a observação de corpos celestes a distâncias incrivelmente grandes tem mostrado que seus comportamentos são consistentes com as leis da mecânica newtoniana. Portanto, a dinâmica de corpos celestes é completamente descrita pela mecânica newtoniana, revelando a universalidade da lei de gravitação. A firme convicção na validade universal da lei de gravitação de Newton pode ser ilustrada pela procura da matéria escura no Universo. Uma das razões para se pensar que uma enorme quantidade de matéria não visível preenche o universo, numa quantidade talvez dez vezes a matéria visível, está na dinâmica das galáxias espirais (aglomerados girantes de mais de cem bilhões de estrelas na forma de um disco). As observações indicam que as velocidades de rotação das estrelas mais afastadas do centro são muito maiores que as previstas pela mecânica de Newton, admitindo-se apenas a existência da matéria visível. Por exemplo, o Sol está a uma distância de 28.000 anos-luz (distância que a luz percorre em um ano) do centro de nossa galáxia e sua velocidade orbital em torno do centro é 217km/s ≅ 782.000 km/h , que é um valor muito superior ao calculado usando-se o resultado obtido, como já vimos, pela terceira lei de Kepler, v = GM gal / r , onde M gal é a massa da galáxia e
r o raio da órbita circular do Sol (a distância
do Sol ao centro da galáxia). Este resultado para a velocidade é obtido admitindo-se que quase toda a massa da galáxia esteja concentrada num raio pouco maior que três mil anos-luz. Na verdade, na maioria das galáxias espirais, a maior parte da matéria luminosa concentra-se em um núcleo central cujo raio é da ordem de vários mil anos-luz. O resto da matéria luminosa situa-se nos braços da espiral. Assim, se admitimos a validade universal da lei de gravitação, somos levados a supor a existência de uma enorme quantidade de matéria escura permeando toda a galáxia e além, o que explicaria a velocidade de rotação das estrelas em galáxias espirais como a nossa.
Força Central
175
4.5 Força do Inverso do Quadrado Repulsiva – O Problema de Rutherford Após a descoberta do elétron por J. J. Thomson (1856-1940) em 1897, surgiu um modelo para a constituição atômica da matéria, com os átomos sendo entendidos como uma bolha de carga positiva onde se encontravam embebidos os elétrons. Este modelo foi sugerido inicialmente por Lorde kelvin (1824-1907), sendo posteriormente refinado por Thomson, motivo pelo qual este modelo atômico é conhecido por modelo atômico de Thomson. Em 1907, Ernest Rutherford (1871-1937) e o físico experimental Hans Geiger (1882-1945) iniciaram uma série de medidas para testar a validade do modelo de Thomson. A idéia era dirigir um feixe de partículas recentemente descobertas e emitidas por núcleos radiativos, as partículas alfa, em direção a uma fina folha de metal. Uma análise detalhada do espalhamento destas partículas deveria fornecer informações acerca da estrutura atômica. Com a colaboração do aluno Ernest Marsden, os experimentos foram realizados por Geiger durante alguns anos. Os resultados mostraram que havia ângulos de espalhamento muito grandes que o modelo de Thomson não podia explicar. De fato, algumas partículas alfa eram espalhadas de volta, ou seja, um ângulo de espalhamento de 1800. Como um modelo que explicasse os resultados para o espalhamento das partículas alfa, Rutherford propôs que os átomos se constituíssem de pequenos núcleos massivos com elétrons girando em órbitas elípticas, em completa analogia com os planetas girando em torno do Sol. Este modelo, apesar de explicar o espalhamento das partículas alfa, tinha um grave defeito. O eletromagnetismo, desenvolvido por James Clerk Maxwell (1831-1879), prevê que cargas aceleradas irradiam energia eletromagnética, de modo que os elétrons em órbitas em torno de núcleos atômicos iriam perdendo energia continuamente e suas órbitas seriam espiraladas em direção ao núcleo, levando ao colapso atômico. Isto é, os átomos não seriam estáveis. A solução para o problema da estabilidade atômica foi proposta por Niels Bohr, que postulou que os elétrons, em suas órbitas, não irradiavam energia e que a passagem de uma órbita para outra se daria mediante a absorção ou emissão de uma determinada quantidade de energia eletromagnética. Surgia, assim, a percepção que a mecânica de Newton não era aplicável no nível atômico e molecular e uma nova mecânica era necessária, que posteriormente se denominaria de mecânica quântica.
176
Nosso interesse aqui é verificar como Rutherford analisou o espalhamento das partículas alfa por núcleos atômicos. Como o núcleo atômico tem massa muito maior do que a massa da partícula alfa, ele se mantém praticamente fixo durante o espalhamento, de modo que podemos utilizar os resultados da seção 4.4, onde, para energias positivas, obtivemos trajetórias hiperbólicas para forças que dependem do inverso do quadrado da distância (forças atrativas ou repulsivas). Assim, a partícula alfa segue uma trajetória hiperbólica ao passar próximo a um núcleo atômico. Como temos o espalhamento de partículas atômicas, a região em que a trajetória se afasta de uma assíntota para outra é muito pequena, isto é, alguns poucos Angströns
(1A = 10−10 m) . Logo, o que se mede é o ângulo de deflexão entre as
trajetórias da partícula incidente antes e depois da colisão. A figura 4.13 mostra o caso em que o núcleo atômico está situado no foco ( F ) , sendo considerado como um centro de força repulsivo.
Θ
b aε
F
α a
F
mv0 Figura 4.13 - Órbita hiperbólica.
Pela figura 4.13, é fácil de ver que o ângulo de deflexão é Θ = − 2 , e pela equação 4.47, temos: (4.63)
tg
Θ = cot g = 2
1 2 − 1
.
Fazendo uso da equação 4.59, obtemos:
(4.64)
Θ mK 2 tg = , 2 2 EL2
de onde vemos a dependência com a energia e o momento angular da partícula alfa. A partícula alfa tem uma velocidade v0 quando muito Força Central
177
afastada do núcleo e se desloca numa direção tal que, se não for desviada, passará a uma distância b do centro de força ( F ) , como se mostra
na figura 4.13. A distância b é denominada de parâmetro de impacto para a colisão (note que o espalhamento da partícula alfa é um processo de colisão, sobre o qual retornaremos a falar no capítulo 5). Logo, a 1 2 energia da partícula é E = mv0 e seu momento angular é L = mv0b .
2
q1 e o núcleo carga q2 , temos K = q1q2 / 4 0 , de modo que substituindo os valores de E , L e K na equação 4.64, obtém-se:
Considerando que a partícula alfa tenha carga
(4.65)
tg
qq Θ 1 =( 1 2 ) 2 . 2 4 0b mv0
Note que se o parâmetro de impacto for nulo, temos uma colisão frontal e a equação 4.65 mostra que o ângulo de deflexão será de 180 graus (Θ = ) . Em experiências de espalhamento típicas, um feixe de partículas carregadas pode ser lançado numa direção definida através de uma folha muito fina de metal. Muitas das partículas emergem da folha em direções diferentes da incidente, depois de serem defletidas de um ângulo Θ pela colisão com os núcleos atômicos. Para se colocar a equação 4.65 numa forma que possa ser comparada com a experiência, é preciso eliminar o parâmetro de impacto b , que não pode ser determinado experimentalmente. Na experiência, pode-se observar a fração de partículas incidentes que são espalhadas em vários ângulos Θ . O resultado é expresso em termos da seção de choque, que é definida como segue. Se N partículas incidentes colidirem com uma folha fina de metal contendo
n centros de espalhamento por unidade de área, o número médio de partículas dN espalhadas entre os ângulos Θ e Θ + d Θ é dado em termos da seção de choque d definida por: (4.66)
dN = nd . N
Desta maneira, d é a seção de choque para o espalhamento entre os ângulos Θ e Θ + d Θ , podendo ser considerada como a área efetiva que envolve o centro de espalhamento, que a partícula incidente deve atingir para ser espalhada entre os ângulos Θ e Θ + d Θ , conforme se mostra na figura 4.14.
178
Θ
F b db dσ
Figura 4.14 - Seção de choque de espalhamento.
Considere agora uma partícula incidente aproximando-se de um centro espalhador F , como na figura 4.14. Se o parâmetro de impacto
estiver entre b e db , a partícula será espalhada num ângulo entre Θ e Θ + d Θ . Assim, tomando-se derivada de Θ em relação à b na equação 4.65, vem: (4.67)
qq dΘ = − 1 2 2 2 db . 2 2 cos (Θ / 2) mb v0
A área do anel em torno do centro espalhador (figura 4.14) é d = 2 bdb . Usamos agora b dado pela equação 4.65 e db dado na equação 4.67 para chegar a: 2
(4.68)
q1q2 2 senΘ d = dΘ . 2 4 8 0 mv0 sen (Θ / 2)
A equação 4.68 foi deduzida por Rutherford e é conhecida como a fórmula de espalhamento de Rutherford. Este resultado pode ser comparado com o resultado para a seção de choque experimental e foi assim que Rutherford explicou o espalhamento de partículas alfa por folhas finas de metal. Ele mostrou que a equação 4.68 concorda com a experiência, quando q1 = 2e , que é a carga da partícula alfa ( e é o valor da carga eletrônica) e
q2 = Ze (carga do núcleo atômico).
Para que possamos ter uma idéia das dimensões nucleares, devemos usar algum resultado experimental. Considere partículas alfa emitidas
Força Central
179
−19
por núcleos de rádio com energias de E = 5MeV (1eV = 1, 602 x10 J) e incidindo numa folha fina de ouro. Se a medida mostra que algumas partículas são defletidas de , podemos obter o parâmetro de impacto e a distância de maior aproximação ao núcleo. Como para o ouro Z = 79 , usamos a equação 4.65, pois conhecemos a energia e o ângulo Θ . Substituindo os valores na equação 4.65, encontramos
b = 2,1x10−12 cm . O ponto de maior aproximação da partícula alfa ao
núcleo de Au corresponde ao raio mínimo da hipérbole e, portanto, usamos as equações 4.46, 4.58 e 4.59 para obter:
r1 = a ( + 1) =
(4.69)
r1 =
K 2 EL2 (1 + 1 + ), 2E mK 2
32 2 02 EL2 q1q2 1 + 1 + 8 0 E mq12 q22
.
Note que determinamos em 4.69 o valor do parâmetro de impacto, de modo que agora já conhecemos o valor do momento angular
L = mv0b , sendo a velocidade obtida a partir de E = mv02 / 2 = 5MeV . -12 Substituindo os valores na equação 4.69, obtemos 5,1x10 cm . A
maior aproximação ao núcleo acontece quando ocorre uma colisão frontal, isto é, b = 0 ( L = 0 ) e neste caso dem de
r1 =
q1q2 , que é da or4 0 E
10−12 cm . Estes resultados mostravam que a carga positiva
do átomo deveria estar concentrada numa região de raio menor que
10−12 cm e surgia, assim, a teoria nuclear do átomo.
O cálculo realizado anteriormente para se obter a seção de choque (equação 4.68) só é estritamente válido quando a partícula alfa é espalhada por um núcleo de massa muito maior, pois foi admitido que o núcleo permanecesse fixo durante o processo de espalhamento, se comportando como um centro de força. Se esta condição não é satisfeita, deve-se tratar o problema como um processo geral de colisão, como veremos no capítulo 5. As partículas alfa também colidem com os elétrons nos átomos, mas estes têm massa muito menor, de maneira que praticamente não afetam a trajetória das partículas alfa. É importante que você saiba que, na realidade, colisões de partículas alfa com núcleos devem ser tratadas com métodos inerentes à Mecânica Quântica. O conceito de uma trajetória com um parâmetro de impacto definido não é válido na mecânica quântica, mas o conceito de seção de choque permanece válido, como é de se esperar, pois a seção de choque é definida em termos de grandezas determinadas experimentalmente.
180
O resultado quanto-mecânico para a seção de choque é o mesmo dado pela equação 4.68, mostrando que a mecânica clássica fornece o resultado correto para este problema.
Resumo Forças centrais são forças dirigidas sempre para um centro fixado O , cujo módulo só é função da distância entre a partícula e a origem O . A força central F em coordenadas esféricas se expressa como:
ˆ (r ) . F (r ) = rF
Forças centrais constituem um exemplo importante de forças conservativas e podemos expressá-las como o gradiente de uma função energia potencial V , que depende apenas da coordenada radial r ,
F = −∇V , e a energia potencial obtém-se de: r
V (r ) = − ∫ F (r )dr . rr
No movimento sob força central, o torque em relação à origem é nulo, e pelo teorema do momento angular, temos:
dL =0. dt
Logo, o momento angular é uma constante do movimento, assim como a energia mecânica da partícula. Desde que o vetor momento angular é num plano perpendi constante, o movimento deve ocorrer cular a L , isto é, o plano definido por r e p . Em coordenadas polares, podemos escrever: •
L = mr 2 = CONSTANTE, para o movimento sob força central. A energia mecânica é uma constante do movimento, que em coordenadas polares fica expressa como:
E=
•
•
1 1 m r 2 + mr 2 2 + V (r ) = CONSTANTE. 2 2
Estas duas constantes permitem, em princípio, determinar a solução completa do problema. Introduzindo a energia potencial efetiva,
Vef (r ) = V (r ) + As soluções
Força Central
L2 . 2mr 2
r (t ) e (t ) são obtidas usando a conservação da energia e 181
do momento angular. A trajetória, em alguns casos, pode ser obtida por:
.
Em outros casos, pode-se obter a trajetória num movimento sob força central diretamente da equação de movimento,
d 2u m = −u − 2 2 F (1/ u ) . 2 d Lu Equação diferencial que fornece a trajetória (ou a órbita) em termos de
u () =
1 . r ()
No movimento sob ação de uma força central, se a trajetória é uma curva fechada simples, a área subtendida pela curva se relaciona ao período de forma simples, devido à conservação do momento angular,
A=
L T. 2m
As forças gravitacionais e eletrostáticas são exemplos importantes de forças centrais que dependem do inverso do quadrado da distância ao centro de força:
F=
A energia potencial é:
K rˆ . r2
V (r ) =
K . r
Forças repulsivas entre cargas, originando trajetórias hiperbólicas, foram observadas por Rutherford e Geiger em experimentos com feixe de partículas alfa incidindo em uma folha fina de metal. A seção de choque deduzida por Rutherford é 2
q1q2 2 senΘ d = dΘ . 2 4 8 0 mv0 sen (Θ / 2) Expressão que concorda com os resultados experimentais.
Exercícios 1) Mostre que o raio da órbita circular de um satélite cujo período de revolução é 24 horas é
182
r=
3
g RT ≅ 6, 7 RT , onde é a freqüência RT 2
angular de rotação da Terra.
2) Uma partícula de massa unitária (m = 1) é lançada com uma velo-
v0 , formando um ângulo reto com o raio vetor e a uma distância r = 3a / 2 de um centro de força central dado por: cidade
4 6a 2 F (r ) = −k 3 + 5 . r 3r a são constantes. Considerando que a velocidade da partí8 k / 6 , pede-se para calcular: cula é v0 = 3a Onde k e
a) O momento angular. b) A energia total. c) A energia potencial efetiva. Faça um gráfico da energia potencial efetiva. d) A trajetória em coordenadas polares. e) O tempo que a partícula leva para atingir a origem. a) A distância percorrida até atingir a origem.
Respostas: a) L = 4 k / 6 ; b) E = Ec + V = 0 ;
2 3a 2 2 c) Vef (r ) = k ( 2 − 4 ) ; máximo em r = 3 a; 3r 2r 2 d) r =
3 9 a 2 a cos ; e) t = 2 32 2
3 ; f) s = 3a / 2 . k
3) Para um planeta movendo-se em uma órbita elíptica, mostre que o produto da velocidade no afélio pela velocidade no periélio é igual a
(2 a / T ) 2 , onde a é o semi-eixo maior e T o período orbital.
4) Uma partícula de massa m move-se sob a ação de uma força central cuja energia potencial é
V (r ) = Kr 4 , onde K > 0 é uma constante.
a) Para que energia e momento angular a órbita será um círculo de raio a em torno da origem? b) Qual é o período deste movimento? c) Deslocando-se ligeiramente a partícula deste movimento cir-
Força Central
183
cular, qual será o período das pequenas oscilações radiais em torno de r = a ?
Respostas: a) E = 3Ka 4 ; L = 2a 3 mK ; b) T = c) Tr =
1 6 a
5) Uma partícula de massa
m 1 T. = K 6
a
m ; K
m e momento angular L se desloca ao
longo das trajetórias: a) onde k , K e
r = k 2 (espiral),
b)
r = Ke ,
são constantes. Ache a força central F (r ) em cada caso.
Respostas: a) F (r ) = −
L2 6k 1 (1 + 2 ) L2 / m + ; b) . F ( r ) = − m r4 r3 r3
6) Uma partícula movendo-se sob influência de uma força gravitacional descreve uma órbita circular de raio
r0 . Mostre que se a partí-
cula for subitamente parada, ela irá atingir o centro de força depois de um tempo
t=
T
4 2
, onde
T é o período da órbita circular.
7) Considere que uma partícula esteja sob a ação de uma força cenF (r ) = −k / r n . Se a órbita da partícula é circular e passa pelo centro de força, mostre que n = 5 .
tral dada por
8)
Se n é a razão entre a máxima e mínima velocidade angular de uma partícula em sua órbita elíptica, sob ação de uma força central
F (r ) = −k / r 2 , mostre que a excentricidade da órbita é: =
184
n −1 . n +1
5
Dinâmica de um Sistema de Partículas
5
Dinâmica de um Sistema de Partículas
Este capítulo tem como objetivo estudar o movimento de um sistema de partículas sob a ação de forças internas e forças externas. Aplica-se a mecânica de Newton em processos de colisão e sistemas de massa variável. Para isso, no final deste estudo, o aluno deverá ser capaz de: • Definir centro de massa de um sistema de partículas; • Explicitar os vetores posição, velocidade e aceleração do centro de massa de um sistema de partículas; • Enunciar o teorema do momento linear para um sistema de partículas; • Enunciar os teoremas do momento angular e da energia para um sistema de partículas; • Aplicar o teorema do momento linear, o teorema da energia e o teorema do momento angular no movimento de um sistema de partículas; • Enunciar os princípios da conservação do momento linear, do momento angular e da energia para um sistema isolado de partículas; • Resolver a equação de movimento para sistemas de massa variável; • Utilizar os princípios da conservação do momento linear e da energia para resolver problemas de colisão entre dois corpos; • Reduzir o problema de dois corpos a dois problemas de um corpo.
5.1 Conservação do Momento Linear Até este momento, você estudou a dinâmica de uma partícula e isto permitiu lhe mostrar uma vasta gama de situações físicas onde um exemplo contundente é a Terra em sua trajetória elíptica em torno do Sol, que pode ser tratada como uma partícula sob ação de uma força central. Mas, você sabe que na verdade o Sol exerce força gravitacional Dinâmica de um Sistema de Partículas
187
sobre a Terra e a Terra sobre o Sol. Isto é, temos um problema de dois corpos que foi reduzido ao problema de um único corpo sob ação de uma força central. Então, como se resolve o problema de dois corpos? Este problema será resolvido neste capítulo, quando tratarmos do problema específico de dois corpos. Outro fato importante é que com a dinâmica de uma partícula, não podemos resolver situações físicas em que a massa do sistema é variável, onde o exemplo clássico é o foguete. Logo, fica claro que é necessário estender o estudo da mecânica para um sistema de partículas submetidas a forças internas, que as próprias partículas exercem umas sobre as outras, e a forças externas que as partículas podem estar submetidas. As forças externas são causadas por agentes externos ao sistema de partículas considerado. Para iniciar o nosso estudo, considere um sistema de N partículas de massas m1 , m2 ,..., mN , cujas posições são especificadas pelos vetores
r1 , r2 ,..., rN . O centro de massa deste sistema de partículas é definido por: m1r1 + m2 r2 + ... + ... + mN rN rcm = = m1 + m2 + ... + mN
(5.1)
Onde
N
∑m r i =1
i i
M
.
M = ∑ mi é a massa total do sistema. Até aqui, não deve ser
nenhuma novidade para você. O vetor posição que especifica o centro de massa é obtido pela média ponderada do vetor posição de cada uma das partículas. A média é ponderada pelas massas, de modo que o vetor posição centro de massa depende de como as massas estão distribuídas em relação à origem do referencial adotado. Por exemplo, se temos uma partícula de massa igual a 1kg a 1, 0 m da origem e outra de mente a
10 kg a 10, 0 m da origem, o centro de massa estará pratica9, 2 m da origem. Naturalmente, a definição dada na equação
5.1 é equivalente às três equações: N
(5.2)
xcm =
∑ mi xi i =1
M
N
,
ycm =
∑ mi yi i =1
M
N
,
zcm =
∑m z i =1
M
i i
.
As equações 5.2 definem as coordenadas do centro de massa de um sistema de partículas em relação a uma origem escolhida. O momento linear total de um sistema de partículas é definido como a soma dos momentos lineares individuais de cada partícula,
(5.3)
N N P = ∑ pi = ∑ mvi . i =1
188
i =1
A partir da equação 5.1, obtemos a velocidade do centro de massa, N
r cm = vcm = •
(5.4)
N
•
∑m r ∑m v i =1
i i
M
=
i i
i =1
M
.
Comparando com a equação 5.3, obtemos:
P = Mvcm ,
(5.5)
e o momento linear de um sistema de partículas é igual à velocidade do centro de massa multiplicado pela massa total do sistema. O que é equivalente a dizer que: o momento total do sistema é igual ao de uma partícula de massa M localizada no centro de massa, rcm , tendo velocidade
vcm . Iremos agora analisar a dinâmica deste sistema de
partículas e você verá que as definições apresentadas anteriormente serão bastante úteis. Vamos supor agora a existência de forças externas
F1e , F2e ,..., Fi e ,..., FNe
atuando sobre as respectivas partículas do sistema e também a existência de forças internas que as partículas exercem umas sobre as outras e que designamos por Fij , significando a força que a j-ésima partícula exerce sobre a i-ésima partícula. É importante que fique claro para você que nestemodelo não existe força de uma partícula sobre ela mesma, isto é, Fii = 0 . A equação de movimento para a i-ésima partícula é:
N •• mi ri = Fi e + ∑ Fij ,
(5.6)
j =1
e onde Fi significa a força externa total sobre a partícula. A somatória na equação (5.6) representa a soma vetorial de todas as forças internas sobre a partícula i. Temos, assim, N equações de movimento, uma para cada partícula. Podemos somar as equações de movimento para todas as partículas, o que resulta em: N N N •• N • e m r = p = F + ∑ i i ∑ i ∑ i ∑∑ Fij . N
(5.7)
i =1
i =1
i =1
i =1 j =1
Ao efetuarmos 5.7, vamos encontrar para a soma dupla na equação cada força Fij a correspondente F ji . Desde que consideramos a validade das leis de movimento para as partículas que compõem o sistema, as forças internas que atuam de partículas devem em pares satisfazer a terceira lei de Newton, Fij = − F ji . Logo, as forças internas na equação 5.7 se cancelam em pares e a soma dupla é nula.
Dinâmica de um Sistema de Partículas
189
N
ote que usamos a terceira lei na forma denominada fraca. Na forma fraca, a terceira lei diz que as forças são iguais e opostas, mas não se impõe que sua ação se faça sentir ao longo da reta suporte que une as duas partículas.
Assim, como a soma dupla na equação 5.7 é nula e usando a equação 5.3, obtemos: N N • P = ∑ p i = ∑ Fi e . •
(5.8)
i =1
i =1
N e Agora, definimos F = ∑ Fi como sendo a força externa total atuani =1
do sobre o sistema, o que permite escrever a equação 5.8 como:
dP =F. dt
(5.9)
Este é o teorema do momento linear para um sistema de partículas. Isto é, a taxa de variação do momento linear total é igual à força externa total atuando sobre o sistema. Se a força externa total for nula, o momento linear do sistema será constante. A equação 5.9 pode ser reescrita ainda como:
dvcm dP d = Mvcm = M =F, dt dt dt
ou
•• M r cm = Macm = F .
(5.10)
E
quação que expressa um resultado importante: a aceleração do centro de massa de um sistema de partículas é a mesma que a de uma única partícula de massa igual à massa total do sistema, sob a ação da soma de todas as forças externas que atuam no sistema de partículas.
Portanto, se a força externa total é nula,
F = 0 , a aceleração é nula e
o centro de massa ou estará em repouso ou estará se deslocando com velocidade vcm = constante, e o momento total será:
dP =0 dt
190
→
P = Mvcm = constante.
Este é o principio da conservação do momento linear, que afirma que o momento linear total de um sistema isolado permanece constante. Note que chegamos a estabelecer este princípio com base na validade da terceira lei de Newton, a qual é suficiente na sua forma fraca. Consideremos alguns exemplos. No caso da Terra em seu movimento orbital, o centro de massa da Terra move-se como se fosse uma partícula de massa igual à da Terra e submetida a uma força igual à soma das forças exercidas pelo Sol, a Lua e o os outros planetas. Quando lançamos uma corrente no ar, o centro de massa da corrente move-se como uma partícula de mesma massa que a corrente, sujeita a uma força igual ao peso da corrente, portanto o centro de massa da corrente descreve uma trajetória parabólica (desprezando-se a resistência do ar). Quando lançamos uma granada no ar e ela explode em certo ponto de sua trajetória, o centro de massa dos fragmentos continuará a se mover sobre a trajetória parabólica original, pois o centro de massa se comporta como uma partícula de massa igual à massa total de todos os fragmentos. O peso dos fragmentos não varia com a explosão porque a força da gravidade é constante próximo à superfície da Terra. Devemos notar, entretanto, que se a força não fosse constante, mas dependesse da posição, os fragmentos resultantes da explosão estariam sujeitos a forças diferentes daquelas que atuam ao longo da trajetória original. E a trajetória do centro de massa não continuaria a ser a mesma de antes da explosão porque a soma das forças externas seria diferente. Por exemplo, se um planeta explode devido a algum cataclisma cósmico, o centro de massa dos fragmentos não irá seguir a trajetória elíptica original do planeta, pois as forças sobre os fragmentos seriam diferentes. Na verdade, o princípio da conservação do momento linear de um sistema isolado tem validade mesmo quando a terceira de lei Newton não se aplica, como acontece com as forças magnéticas entre cargas elétricas em movimento. Quando as cargas acham-se em movimento, seus campos elétricos e magnéticos propagam-se com a velocidade da luz, de maneira que se o movimento relativo entre as cargas for rápido, as forças existentes entre elas podem, ou não, em cada instante, serem iguais e opostas. Neste caso, a lei de conservação do momento linear permanece válida se levarmos em conta o momento linear total das partículas e o momento linear associado aos campos eletromagnéticos. Não iremos considerar este tipo de situação neste curso. Exemplo 1. Como uma aplicação simples do princípio da conservação do momento linear, considere a situação em que um míssil de massa
m , em certo ponto de sua trajetória, explode em três fragmentos de massa iguais a m / 3 . Um dos fragmentos continua na mesma direDinâmica de um Sistema de Partículas
191
ção inicial do míssil com velocidade v0 / 2 , onde v0 é a velocidade do míssil imediatamente antes de explodir. Os outros dois fragmentos seguem com velocidades iguais, formando um ângulo reto entre si, como se mostra na figura 5.1. Ache a velocidade destes dois fragmentos.
v1 v0
φ v0
Q
2
φ v2 Figura 5.1 - Direções dos fragmentos do míssil do exemplo 1.
A primeira observação que se faz é se existe ou não alguma força externa atuando. Se o míssil está próximo à superfície da Terra, temos a força peso atuando, além da resistência do ar. Porém, o tempo durante o qual ocorre a explosão do míssil é extremamente curto, de modo que a variação do momento linear devido às forças externas durante o intervalo de tempo correspondente a explosão é completamente desprezível. Assim, tratamos este problema como o de um sistema isolado de partículas e usamos a conservação do momento linear. O momento linear do sistema antes da explosão deve ser igual ao momento linear imediatamente após a explosão:
m m m mv0 = v1 + v2 v3 , 3 3 3 sendo fornecidos v1 = v0 / 2 e v2 = v3 com v2 • v3 = 0 , pois estes dois fragmentos fazem um ângulo reto entre si. Substituindo v1 na equação acima, vem:
5 v0 = v2 + v3 . 2 Efetuando-se o produto escalar em cada membro por ele mesmo, obtém-se:
25 v0 • v0 = (v2 + v3 ) • (v2 + v3 ) = v22 + v32 + 2v2 • v3 , 4
192
e, portanto:
v2 = v3 =
5 2 2
v0 .
Note que este exemplo pode ser resolvido decompondo-se as velocidades segundo os eixos ortogonais da figura 5.1. Você deve resolver este exemplo dessa maneira, mostrando que o ângulo na figura 5.1
é igual a / 4 e obtendo as velocidades v2 e v3 . É importante notar primeiro que, se o míssil estiver descrevendo uma trajetória parabólica próximo à superfície da Terra, o centro de massa dos fragmentos continua sua trajetória original. Em segundo lugar, observe que encontramos a solução do problema porque foram fornecidos dados a respeito do movimento dos fragmentos depois da explosão. Sem estas informações, não podemos resolver o problema, pois não conhecemos as forças internas que atuam durante a explosão, de modo que não podemos determinar, por meio da solução das equações de movimento, as velocidades dos fragmentos imediatamente após a explosão. Note também que neste exemplo não ocorre a conservação da energia mecânica, pois durante a explosão ocorre a conversão de energia química em energia cinética. Some a energia cinética dos três 2 fragmentos após a explosão e mostre que é igual a 6,5( mv0 / 2) , enquanto que a energia cinética inicial é
(mv02 / 2) .
5.2 Conservação do Momento Angular No capítulo 3, definimos o momento angular de uma partícula como o produto vetorial entre o vetor posição e vetor momento linear, ou seja, Li = ri × pi = ri × mvi . Para um sistema de partículas, definimos o
momento angular total como a soma dos momentos angulares individuais,
N L = ∑ Li , i =1
(5.11)
N L = ∑ (ri × mi vi ) . i =1
Quando estudamos a dinâmica de uma partícula, vimos que a taxa de variação temporal do seu momento angular é igual ao torque aplicado sobre a partícula. Logo, para um sistema de partículas, calculamos a derivada temporal do momento angular total, (5.12)
N dL N = ∑ (vi × mi vi ) + ∑ (ri × mi ai ) . dt i =1 i =1
Dinâmica de um Sistema de Partículas
193
A primeira soma se anula, pois vi × vi = 0 e mi ai é igual à força total sobre a partícula dada na equação 5.6, de modo que se pode reescrever a equação 5.12 como: (5.13)
dL N e N = ∑ ri × ( Fi + ∑ Fij ) , dt i =1 j =1
(5.14)
dL N e N N = ∑ ri × Fi + ∑∑ ri × Fij . dt i =1 i =1 j =1
A soma dupla na equação 5.14 consiste de uma soma de pares da forma:
(ri × Fij ) + (rj × Fji ) .
(5.15)
A figura 5.2 define o vetor deslocamento da partícula j relativo à partí cula i e podemos ver que, por definição: rij = rj − ri .
mj rij
rj o Figura 5.2 Definição do vetor
ri
mi
rij .
Considerando que as forças internas satisfazem a terceira lei de Newton, Fij = − F ji , podemos reescrever a equação 5.15 como: (5.16)
−(rj − ri ) × Fij = −rij × Fij .
Fij estiver orientada segundo a linha que une o par de partículas i e j, o produto vetorial de 5.16 é nulo, pois rij / / Fij . Por-
Se a força interna
tanto, agora estamos usando a terceira lei de Newton na sua forma forte, isto é, ação e reação iguais e opostas e estando segundo a reta suporte que une a duas partículas. Satisfeita esta condição, a soma dupla na equação 5.14 é nula, e assim a taxa de variação temporal do momento angular é: (5.17)
194
dL N e = ∑ ri × Fi = T . dt i =1
A
equação 5.17 mostra que para um sistema de partículas, a taxa de variação temporal do momento angular total é igual ao torque externo total atuando sobre o sistema. Este é o teorema do momento angular expresso para um sistema de partículas.
Se o torque externo total for nulo, vem:
dL = 0 → L = Constante . dt
(5.18)
Logo, se o sistema é isolado, ou seja, não submetido a torques externos, o momento angular é constante no tempo, o que é conhecido como o princípio da conservação do momento angular para um sistema isolado. É importante ressaltar que no caso de cargas elétricas em movimento rápido, mesmo não se aplicando a terceira lei de Newton para as forças entre estas cargas, o principio da conservação do momento angular permanece válido se levarmos em conta o momento angular associado aos campos eletromagnéticos. Não iremos discutir este tipo de problema neste curso. A conservação do momento angular tem aplicação importante na dinâmica de corpos rígidos. Um corpo rígido é um caso especial de um sistema de muitas partículas onde a distância relativa entre elas permanece fixa (corpo rígido ideal). Se um corpo rígido estiver livre de torques externos, seu momento angular permanece constante e, logo, seu movimento de rotação em torno de um eixo qualquer de simetria é constante. Esse fato tem aplicação no movimento giroscópico.
O
giroscópio é um sistema em que, basicamente, um disco girante (o rotor) pode mudar livremente a direção de seu eixo de rotação. O rotor é montado em um eixo horizontal e é contrabalançado por um peso de tal modo que o torque sobre o sistema em relação ao ponto de apoio seja zero. Assim, quando o rotor tem uma velocidade angular girando em torno do eixo horizontal,
seu momento angular
, paralelo ao eixo do rotor, será constante, e quando movemos o giroscópio no espaço, o eixo do rotor permanece apontando sempre na mesma direção, pois não muda de direção. Isto tem uma conseqüência importante. Quando um giroscópio está girando com seu eixo apontando na direção leste-oeste se
Dinâmica de um Sistema de Partículas
195
observa que seis horas depois seu eixo está na direção vertical apontado para baixo. Mas, você sabe por quê? Note que é constante, não mudando sua direção no espaço, e esta aparente rotação do eixo do giroscópio é, na realidade, devida à rotação da Terra. A figura 5.3 mostra claramente o que acontece.
A
ϖ
B
ϖ 1 2 ϖ
3 N ϖ A
B
4
Figura 5.3 - O eixo de rotação de um giroscópio permanece fixo no espaço e, portanto, tem um movimento de rotação aparente em relação à Terra.
O eixo AB do giroscópio aponta inicialmente na direção lesteoeste, como a Terra embaixo dele gira na direção oeste-leste, nós, que giramos junto com a Terra, observamos que, aparentemente, o eixo AB gradualmente se inclina de maneira que seis horas depois aponta na direção vertical. Mas, na verdade, o eixo de rotação permanece fixo no espaço. A tendência do giroscópio em manter o eixo de rotação fixo no espaço é um princípio usado em estabilizadores de navios e pilotos automáticos de aviões. Uma aplicação do movimento giroscópico associada com a rotação da Terra é a bússola giroscópica. O giroscópio é montado de tal modo que seu eixo permaneça sempre num plano horizontal; isto pode ser feito colocando-se o giroscópio flutuando num líquido. A bússola giroscópica tem a vantagem especial de apontar para o norte verdadeiro, pois não está sujeita a anomalias magnéticas locais.
196
O popular pião é uma espécie de giroscópio que fica submetido a um torque externo devido à força peso. Este é um exemplo em que o torque é perpendicular ao vetor momento angular, fazendo com que o eixo de rotação do pião gire ao redor de um eixo fixo no espaço. Este movimento é denominado de precessão. Quando um corpo rígido gira em torno de um seu momento angular eixo principal (em geral, um eixo de simetria),
L é proporcional à velocidade angular , L = I , onde a constante I é
o momento de inércia, quantidade que depende de como a massa do corpo está distribuída em relação ao eixo de rotação. O momento de inércia 2 pode ser escrito como I = MRG , sendo M a massa e RG é denominado de raio de giração do corpo. Assim, em situações de rotação em torno de um eixo de simetria, podemos considerar o corpo como uma partícula de massa total M girando a uma distância RG do eixo de rotação. No exemplo a seguir, mostra-se como utilizar a conservação do momento angular em uma situação simples.
M = 60kg em uma cadeira giratória, girando com velocidade angular i , estando com os braços esticados e tendo em cada mão uma esfera de massa m = 1kg .
Exemplo 2. Considere uma pessoa cuja massa é
Qual é a velocidade angular dessa pessoa após ela rapidamente encolher os braços, trazendo as esferas para junto do corpo? Admita que inicialmente, cada esfera esteja a uma distância a = 1m do eixo de rotação e que após a pessoa encolher os braços, esta distância seja reduzida para a /10 = 0,1m . Suponha a pessoa, antes e depois de encolher os braços, como uma partícula de massa distância
RG = 0,3m do eixo de rotação.
M girando a uma
A solução aproximada para este exemplo se obtém considerando que as esferas sejam aproximadas do eixo de rotação num intervalo de tempo muito curto, de modo que a variação do momento angular devido a qualquer torque externo seja desprezível. Assim, podemos usar a conservação do momento angular. Como temos três partículas girando com velocidade angular i , o momento angular inicial do sistema antes da pessoa encolher os braços é:
Li = ( MRG2 + 2ma 2 ) i . Enquanto que o momento angular após a pessoa encolher os braços é:
L f = ( MRG2 + 2m
a2 ) f . 100
Como o momento angular é conservado
Dinâmica de um Sistema de Partículas
Li = L f , obtemos para f : 197
Caso você tenha dúvida em relação à definição de momento de inércia, sugerimos uma revisão dos conteúdos estudados nas disciplinas básicas.
f =
MRG2 + 2ma 2 i . a2 2 MRG + 2m 100
Substituindo os valores, encontramos
f = 1,36 i , significando um
acréscimo de 36% na velocidade angular do sistema. Note que este é um resultado aproximado, pois desprezamos qualquer atrito e também a variação do momento angular da pessoa ao encolher os braços. Algumas vezes, é conveniente se expressar o momento angular de um sistema de partículas em termos do movimento do centro de massa. A figura 5.4 mostra que podemos escrever o vetor posição da i-ésima partícula como:
ri = rcm + ricm ,
(5.19) onde
ricm é o vetor posição da partícula i em relação ao centro de
massa.
riCM
ri
CM
Figura 5.4 Definição do vetor
ricm .
rCM
Derivando a equação 5.19 em relação ao tempo, temos que:
vi = vcm + vicm ,
(5.20)
e, portanto a velocidade da partícula em relação à origem O pode ser dada como a velocidade do centro de massa do sistema mais a velocidade desta partícula em relação ao centro de massa. Isto permite escrever o momento angular deste sistema de partículas (equação 5.11) como:
N L = ∑ (rcm + ricm ) × mi (vcm + vicm ) , i =1
198
N N = ∑ (rcm × mi vcm ) + ∑ (rcm × mi vicm ) i =1
i =1
N
N +∑ (ricm × mi vcm )+∑ (ricm × mi vicm ) i =1
i =1
ou N N L = rcm × (∑ mi )vcm + rcm × ∑ mi vicm
(5.21)
i =1
i =1
N
N
i =1
i =1
+∑ (mi ricm ) × vcm +∑ (ricm × mi vicm ) Agora, a partir da equação 5.19, vem: N
(5.22)
N N N m r = m ( r − r ) = m r − ( ∑ i icm ∑ i i cm ∑ i i ∑ mi )rcm = 0 , i =1
i =1
i =1
i =1
onde usamos a definição de centro de massa (equação 5.1). Similarmente, obtemos: N
(5.23)
∑m v i =1
i icm
N N N = ∑ mi (vi − vcm ) =∑ mi vi − (∑ mi )vcm = 0 , i =1
i =1
i =1
e estes dois resultados permitem reescrever a equação 5.21 como: (5.24)
N L = rcm × Mvcm +∑ (ricm × mi vicm ) . i =1
Ou ainda (5.25)
L = Lcm +Licm .
Portanto, o momento angular pode ser expresso em termos de uma parte orbital (o movimento do centro de massa) mais uma parte correspondente ao movimento em torno do centro de massa. O exemplo mais contundente é o movimento da Terra (tratada como um sistema de partículas), onde temos o momento angular devido ao movimento orbital em torno do Sol mais o momento angular intrínseco, devido à rotação da Terra em torno de um eixo que passa pelo centro de massa.
5.3 Conservação da Energia Não deve ser novidade saber que a energia cinética total de um sistema de partículas é dada pela soma das energias cinéticas individuais, (5.26)
N 1 Ec = ∑ mi vi2 . i =1 2
Dinâmica de um Sistema de Partículas
199
Como no caso do momento angular da seção anterior, podemos expressar a energia cinética em termos do movimento do centro de massa mais o movimento das partículas em relação ao centro de massa. Usando a equação 5.20, podemos escrever: N N 1 1 Ec = ∑ mi vi • vi = ∑ mi (vcm − vicm ) • (vcm − vicm ) , i =1 2 i =1 2 N N N 1 1 2 2 Ec = ∑ mi vcm − ∑ mi (vcm • vicm ) + ∑ mi vicm , i =1 2 i =1 i =1 2
Ec =
N N 1 1 2 2 Mvcm − vcm • ∑ mi vicm + ∑ mi vicm . 2 i =1 i =1 2
Usando o resultado 5.23, obtemos:
Ec =
(5.27)
N 1 1 2 2 Mvcm + ∑ mi vicm , 2 i =1 2
Ec = Ecm + Eicm .
(5.28)
O primeiro termo expressa a energia cinética de translação do sis tema como um todo (uma partícula de massa M localizada em rcm com velocidade vcm ) e o segundo expressa a energia cinética devido ao movimento relativo ao centro de massa. A separação do momento angular e da energia cinética em parcelas correspondentes ao movimento do centro de massa e o movimento relativo ao centro de massa tem importantes aplicações em física atômica e molecular, como também em astrofísica. Para generalizarmos o teorema da conservação da energia mecânica para um sistema de muitas partículas, iremos considerar como ocorre em muitos casos, que a força exercida sobre qualquer partícula do sistema dependa da posição das partículas do sistema. Assim, admitindo-se que as forças internas possam ser derivadas de uma função i energia potencial interna V , mas que as forças externas não possam ser expressas mediante uma energia potencial, a equação de movimento para a k-ésima partícula é:
dvk mk = −∇ kV i + Fke dt ,
(5.29) sendo
Fke
a
força
externa
sobre
a
partícula
k
e
onde
∂ ∂ ∂ ∇ k ≡ iˆ + ˆj + kˆ . Multiplicando ambos os membros da ∂xk ∂yk ∂zk equação 5.29 pela velocidade, vêm:
200
d 1 dv mk vk • k = ( mk vk • vk ) = −vk • ∇ kV i + vk • Fke . dt dt 2 Somamos agora sobre todas as partículas, N d 1 i N e 2 ( m v ) v = − ∑ ∑ k k k • ∇ kV + ∑ vk • Fk . k =1 dt 2 i =1 i =1 N
(5.30)
Desde que
(5.31)
V i = V i ( xi , yi , zi ) , sua derivada total é:
N N dV i ∂V dxk ∂V dyk ∂V dzk = ∑( + + ) = ∑ vk • ∇ kV i . dt ∂yk dt ∂zk dt k =1 ∂xk dt k =1
O primeiro membro da equação 5.30 é a derivada da energia cinética total do sistema de partículas, e usando a equação 5.31, podemos escrever: (5.32) ou (5.33)
dEc d N 1 dV i N e 2 m v ( ) = = − + ∑ vk •Fk , ∑ k k dt dt k =1 2 dt k =1 N d ( Ec + V i ) = ∑ vk • Fke . dt k =1
A equação 5.33 é o teorema do trabalho-energia para um sistema de partículas. Este resultado mostra que na presença de forças externas não conservativas, a energia mecânica do sistema não irá permanecer constante. Por outro lado, se não temos forças externas atuando, a energia mecânica do sistema de partículas será constante, isto é, (5.34)
Ec + V i = E = Constante .
Assim, para um sistema isolado de partículas a energia mecânica se conserva. Obviamente, se as forças externas também forem conservativas, suas energias potenciais podem ser somadas à energia poi tencial interna V e a energia total E = Ec + V será constante.
5.4 Sistemas de Massa Variável A maioria dos sistemas mecânicos pode ser considerada como tendo massa constante. Entretanto, em certos casos a massa é variável. Um exemplo simples é uma gota de chuva. Enquanto a gota está caindo sob ação da gravidade, pode haver condensação de umidade sobre a superfície da gota, ou evaporação de água, o que acarreta na variação de sua massa. Naturalmente, a solução da equação de movimento para uma gota que cai exige algumas hipóteses com relação à variação de sua massa com o tempo. Dinâmica de um Sistema de Partículas
201
Outro exemplo que podemos caracterizar é o foguete. Foguetes propulsionam a si mesmos queimando combustível de forma explosiva e ejetando os gases resultantes a altas velocidades e, portanto, eles perdem massa à medida que aceleram. Nesta seção, iremos considerar alguns exemplos de sistemas com massa variável. Exemplo 3. Um exemplo típico de massa variável é o da esteira ro lante. Neste problema, deve-se obter a força F necessária para manter uma esteira rolante com velocidade constante enquanto deixa-se cair continuamente material de um reservatório em repouso como se mostra na figura 5.5.
v
m
F
Figura 5.5 - O problema da esteira rolante.
Observe que, como o reservatório está em repouso, o momento linear do sistema é a soma do momento linear da esteira mais o momento linear do material que ela transporta. Caso o reservatório estivesse em movimento, deveríamos incluir o momento linear do reservatório e de seu conteúdo. Sendo M a massa (constante) da esteira e m(t ) a massa do material transportado num certo instante, o momento linear do sistema é:
P = ( m + M )v . Aplicando o teorema do momento linear, vem: (5.35)
F=
dP dm =v . dt dt
Portanto, a força, para uma determinada velocidade, depende da taxa com que o material é despejado na esteira. Em geral, a taxa com que o material é despejado na esteira é constante e, logo, devemos aplicar uma força constante para manter o sistema com velocidade v constante. Já que conhecemos a força que deve ser aplicada, é de interesse
202
também saber que potência é suprida por esta força. Como a potência é dada pelo produto Fv , obtém-se:
Pot = Fv = v 2
(5.36)
Pot = 2
(5.37)
dm d d 1 = mv 2 = 2 ( mv 2 ) , dt dt dt 2
dEc d 1 2 . ( m + M )v = 2 dt 2 dt
Este resultado mostra que a potência necessária é duas vezes a taxa com que a energia cinética do sistema está aumentando, de modo que o teorema da conservação da energia mecânica não se aplica neste caso. Então, para onde está indo o excesso de energia suprida pela força F ? Este excesso de energia é necessário para realizar trabalho contra a força de atrito que existe entre o material que cai e a esteira. Quando o material atinge a esteira, ele é acelerado horizontalmente a partir do repouso até atingir a velocidade da esteira, e durante este tempo, algum deslizamento ocorre entre a esteira e o material. Para um observador em repouso na esteira, a qual se move para a direita, uma quantidade dm de material que cai tem uma velocidade horizon-
v0 = −v , para a esquerda. Entretanto, a esteira exerce uma força de atrito horizontal dFa para a direita sobre
tal inicial oposta à da esteira, o material,
dFa = − (dm) g , é o coeficiente de atrito cinético entre o material e a esteira. E a desaceleração para a direita da quantidade dm do material é a = dFa / dm = − g . Assim, a distância percorrida pelo material até
onde
atingir o repouso em relação à esteira é:
2ad = 0 − v02 = −v 2 , pois a velocidade final é zero e a inicial é
v0 = −v . Substituindo o valor
da desaceleração, vem:
d = v 2 / 2 a = v 2 / 2 g . O trabalho
(dWFa ) realizado contra a força de atrito é: 1 dWFa = dFa d = ( gdm)v 2 / 2 g = (dm)v 2 , 2
e a potência é:
Dinâmica de um Sistema de Partículas
203
(5.38)
PFa =
dWFa
dE 1 dm d 1 2 = v2 = ( mv ) = c . dt dt 2 dt dt 2
Logo, pelas equações 5.36 e 5.38, podemos ver que quanto que a equação 5.37 nos diz que
(5.39)
PFa = Pot / 2 , en-
dEc = Pot / 2 , de modo que: dt
dEc dWFa + = Pot . dt dt
Desta maneira, fica claro por que não temos conservação da energia mecânica, pois a potência suprida pela força F é igual à taxa com que a energia cinética do sistema cresce mais a taxa do trabalho realizado contra a força de atrito. A equação 5.39 explicita a conservação da energia, incluindo aqui outras formas de energia além da mecânica, como calor e/ou energia associada às deformações microscópicas devido às forças de atrito entre o material e a esteira. Assim, metade da energia empregada é dissipada sob forma de calor e deformações microscópicas e metade é empregada para o aumento da energia cinética do sistema. Note que, independentemente do valor da desaceleração do material que cai na esteira (podendo ser 1 segundo ou (1/50) segundo), a potência desenvolvida pelas forças entre o material e a esteira é sempre exatamente igual à metade da potência suprida pela força aplicada F .
v
Iremos analisar agora um exemplo importante de sistema de massa variável, o foguete. A tecnologia de foguetes é baseada no princípio da conservação do momento linear. Um foguete adquire movimento em uma direção ejetando massa na direção contrária, o que se consegue com a explosão contínua do combustível. Nosso objetivo é obter a velocidade do foguete em um instante qualquer após o lançamento. Como se mostra na figura 5.6, num certo instante t , o foguete tem
m
uma massa
m , movendo-se com velocidade v em relação a um sis-
tema de coordenadas fixo (como, por exemplo, a Terra). Seja
ve dm
ve a velocidade de exaustão dos gases (velocidade de escape dos
gases) em relação ao foguete, logo a velocidade dos gases em relação à Terra será v + ve . Considere que durante o intervalo de tempo entre
t e t + dt uma quantidade de combustível dm = −dm (sinal menos
Figura 5.6 - Movimento de um foguete.
para indicar que o sistema perde massa) seja expelida. A massa do fo guete será, então,m + dm e sua velocidade v + dv . O momento linear no instante
t é P (t ) = mv , enquanto que no instante t + dt , o mo-
mento linear do sistema será a soma do momento linear do foguete
PF mais a o momento linear dos gases expelidos Pgas :
204
P(t + dt ) = PF (t + dt ) + Pgas (t + dt ) , P(t + dt ) = (m + dm)(v + dv ) + (−dm)(v + ve ) .
Desprezando-se o termo de segunda ordem, dmdv , obtemos a variação do momento linear do sistema,
dP = dP(t + dt ) − dP ≅ mdv − ve dm . Pelo teorema do momento linear, a força externa total aplicada é igual à taxa de variação temporal do momento, (5.40)
dP dv dm F= = m − ve . dt dt dt
Equação que podemos reescrever como: (5.41)
m
dv dm = ve +F , dt dt
que é a equação de movimento para o foguete. O primeiro termo do segundo membro é denominado impulso do motor do foguete. Note que
à direção da velocidade dm / dt < 0 , de modo que o impulso será oposto de escape dos gases de exaustão. A força F pode ser a força gravitacional, se ignoramos o atrito com o ar, ou pode ser a soma da força gravitacional mais a força de resistência do ar. Para medirmos a potência do motor do foguete, devemos medir a força F0 para mantê-lo estacioná
rio, ou seja, com aceleração nula, e neste caso com
F = 0 , vem:
dm −ve = F0 , dt
e assim, medindo-se te
ve dm / dt .
F0 , determinamos o impulso do motor do fogue-
Vamos encontrar agora a solução da equação de movimento para o foguete (equação 5.41) para a situação em que o foguete se movimenta no espaço, livre de forças gravitacionais. Assim, devemos resolver:
m
dv dm = ve . dt dt
Considerando que a velocidade inicial seja
v0 e a massa inicial do
foguete sendo m0 , integramos a última equação, admitindo que a velocidade de exaustão dos gases seja constante, v
∫ dv = ve
v0
Dinâmica de um Sistema de Partículas
m
dm , m m0
∫
205
m v = v0 − ve ln 0 . m
(5.42)
A velocidade do foguete num certo instante depende da velocidade de escape dos gases e da fração de massa descarregada, até aquele instante ( m0 / m) , e não depende da taxa com que o combustível é quei-
(dm / dt ) . O foguete atinge a maior velocidade no instante em que todo combustível é queimado. Se m f é a massa final do foguete mado
após todo o combustível ser queimado, a velocidade atingida depende da razão ( m0 / m f ) . Quanto maior esta razão, maior a velocidade final do foguete, porém isto significa uma grande carga de combustível. Uma solução para o lançamento de satélites foi a construção de foguetes com vários estágios, de modo a se queimar uma grande quantidade de combustível e se obter uma razão ( m0 / m f ) elevada. Próximo à superfície da Terra e ignorando-se a resistência do ar, a equação 5.41 fornece:
dv dm m = ve + mg . dt dt
(5.43)
Considerando o instante inicial como zero, integramos a equação 5.43, v
∫ dv = ve
v0
m
t
dm ∫m m + g ∫0 dt , 0
m v = v0 − ve ln 0 + gt . m
(5.44)
ve (dm / dt ) , deve ter um valor maior ou igual à força gravitacional inicial m0 g . Seja o exemplo nuInicialmente, o impulso do foguete,
mérico onde a massa inicial do foguete for 3 x 106 kg e a velocidade de escape for 50 x 103 m/s, então para que a velocidade inicial do foguete seja zero, devemos ter
dm / dt = 3x107 / 5x104 = 600kg/s .
Considerando a velocidade inicial como zero (impulso igual à força peso), a equação 5.44, na forma escalar, é:
v = ve ln
(5.45)
m0 − gt . m
Tomamos a direção vertical como sendo eixo
z e integramos a velo-
cidade para obter a altura do foguete em cada instante, (5.46)
z=
m0 ve m m 1 (1 + ln 0 ) − gt 2 , 1 − dm / dt m0 m 2
onde consideramos que dm / dt seja constante e explicitamos que esta taxa é negativa dm / dt → − dm / dt . No exemplo numérico dado
206
acima, suponha que a massa final após a queima do combustível seja 2,4 x 106 kg e que a velocidade de escape seja a mesma, porém com
dm / dt = −1200kg/s . Neste caso, o combustível queimará em 500 se-
gundos, a velocidade do foguete neste instante será 22.165 km/h e sua altura será de 1.435 km. Se você calcular a energia cinética do foguete neste instante, verá que mais de 45 milhões de megajoules de energia química foram transformados em energia cinética pela queima do combustível. Vimos no capítulo anterior que a velocidade orbital de um satélite a uma distância R do centro da Terra é v = GM T / R . Próximo à superfície da Terra, digamos a apenas algumas centenas de quilômetros ( R = RT + h ≅ RT , pois RT = 6.400 km ), a velocidade necessária é em torno de 8 km/s. Os satélites são lançados na direção leste para aproveitar a velocidade de rotação da Terra, que é (no Equador) . Na maioria dos foguetes a velocidade de exaustão é da ordem de 2 a 4 km/s . Se admitirmos ve = 2,5 km/s , a razão
m0 / m f para que o satélite (com v0 = vT ) alcance a velocidade orbital
a partir do solo é:
v − v0 m0 7,5 3 = exp = exp = e ≅ 20 , mf 2,5 ve onde usamos a equação 5.42 para obter a razão
m0 / m f de forma
aproximada. Isto significa que, neste caso, 95% da massa inicial é de combustível! Veja no próximo exemplo como colocar um satélite em órbita com foguetes de dois estágios e como atingir a Lua com um foguete de três estágios! Exemplo 4. Um satélite é colocado em órbita circular por meio do lançamento de um foguete de dois estágios. O foguete é lançado com velocidade inicial v0 , fazendo um ângulo com a direção radial. Ao atingir o apogeu da órbita elíptica, é feita a ignição dos foguetes do segundo estágio, de modo que a velocidade aumenta de uma quantidade ∆v necessária para que o satélite descreva uma órbita circular a
uma altura h acima da superfície da Terra. Calcular o valor de ∆v .
A situação está esquematizada na figura 5.7. Admita, como no exemplo 3 do capítulo 4, que v0 = GM / R e = 30° , sendo M e R a
Dinâmica de um Sistema de Partículas
207
massa e o raio da Terra, respectivamente.
vc
R
h v 0 φ
Terra
Figura 5.7 - Órbita elíptica de um satélite (no lançamento) sendo convertida em circular no apogeu.
Neste exemplo estamos ignorando a rotação da Terra e a resistência do ar, como fizemos no exemplo 3 do capítulo 4. Veja que a situação é a mesma que a daquele exemplo do míssil. Estamos admitindo que através dos motores do primeiro estágio, o satélite tem energia suficiente para descrever uma órbita elíptica. Quando dizemos que o foguete é “lançado” a partir da superfície da Terra, queremos dizer que a altura que ele sobe até queimar o combustível do primeiro estágio ainda é pequena, comparada ao raio da Terra. Mas agora no apogeu, via os motores do segundo estágio, o satélite ganha energia mecânica, de sorte a estabelecer uma órbita circular. Usando a conservação do momento angular durante a trajetória elíptica, determinamos a velocidade v1 no apogeu,
L = (mv0sen) R = mv1 ( R + h) , v1 = A energia mecânica
R v0sen . R+h
ES do satélite no apogeu é: ES =
1 2 GMm . mv1 − 2 R+h
A energia mecânica necessária para uma órbita circular de raio R + h é:
E=−
GMm . 2( R + h)
Com a ignição dos motores do segundo estágio, no apogeu, o satélite 2 ganha uma quantidade de energia cinética ∆Ec = 1 m( ∆v) , que so2
208
mada a ES , deve ser igual à energia circular de raio R + h , isto é,
ES + ∆Ec = ou
E necessária para uma órbita
1 2 GMm 1 GMm mv1 − + m(∆v) 2 = − , 2 R+h 2 2( R + h)
1 2 1 GMm 1 mv1 + m(∆v) 2 = = mvc2 , 2 2 2( R + h) 2 vc = GM / ( R + h) é a velocidade para a órbita circular. Note 2 2 2 que podemos escrever v1 + ( ∆v) = vc . Substituindo o valor de v1 obtido acima e resolvendo para ∆v , encontramos: onde
(∆v) 2 = Com
GM R R 2 2 v0 sen . 1 − R + h GM R + h
v02 = GM / R e = 300 , vem: ∆v =
GM 1 R 1 − . R+h 4 R+h
No exemplo 3 do capítulo 4 encontramos, para estes valores de
h=
3 R , e assim obtemos, para ∆v , 2
v0 e ,
GM 1 1 1 1 − . ∆v = R 3 4 3 1+ 1+ 2 2 GM = 0, 68v0 . Note que este incremento é grande, R 1 1 v0 ≅ 0, 27v0 . Como fizepois a velocidade no apogeu é v1 = 2 3 1+ 2 Ou
∆v ≅ 0, 68
mos acima, antes deste exemplo, podemos estimar a massa de combustível necessária para que, com o auxílio dos foguetes do segundo estágio, o satélite permaneça em órbita circular. A velocidade inicial (antes da ignição) é v1 ≅ 0, 27v0 , enquanto que a final é a velocidade
vc = v12 + ∆v 2 = GM / ( R + h) ≅ 0, 73v0 , de modo que usando a equação 5.42, obtemos a razão m0 / m f de forma
para a órbita circular, ou aproximada,
Dinâmica de um Sistema de Partículas
209
0, 73v0 − 0, 27v0 0, 46v0 m0 = exp = exp . mf ve ve Se admitirmos, como antes, que a velocidade de escape seja da ordem de
m0 = e1,47 ≅ 4,35 . mf
2,5 km/s , e como v0 é da ordem de 8 km/s , obtemos
E, portanto, no segundo estágio ainda teríamos aproximadamente 77% de massa como sendo de combustível. Como já vimos, para o foguete atingir a velocidade v0 , 95% da massa deve ser de combustível, isto significa que dos 5% restantes de carga, 77% deve ser de combustível do segundo estágio, de modo que a carga útil do foguete, ou seja, a massa do satélite deve representar apenas 1,15% da massa total. Podemos finalizar este exemplo verificando como atingir a Lua. Para isso, vamos considerar que o nosso foguete seja de três estágios. Como proceder? Na figura 5.8 mostramos a continuação deste exemplo. Quando o foguete atingir a posição B , que está em oposição à Lua, aciona-se pela terceira vez os foguetes, de modo que o acréscimo de energia cinética seja suficiente para que sua trajetória se torne elíptica, com a posição B sendo o perigeu e a posição da lua,
A , o apogeu de sua trajetória. v2 Terra
B
A Lua Figura 5.8 - Conversão de uma órbita circular em elíptica com o apogeu na lua. (A figura não está em escala).
Para calcularmos o incremento na velocidade, que chamaremos de
∆v1 , usamos o procedimento citado anteriormente,
1 2 1 GMm GMm , mvc + m(∆v1 ) 2 − =E=− 2 2 r1 2a sendo e
vc a velocidade na órbita circular, r1 a distância do perigeu
a o semi-eixo maior da elipse. Você deve estar lembrado do ca-
pítulo 4 que o semi-eixo da elipse se relaciona com a energia total
210
por a = K / 2 E e K = −GMm . Sabemos que 2a = r1 + r2 , r1 = R + h e como a distância Terra-Lua é sessenta vezes o raio da Terra, vem
r2 = 60 R , e assim como vc = GM / ( R + h) , obtemos para ∆v1 : ∆v1 =
Em nosso caso,
GM 1 2 − . R 1 + h / R 61 + h / R
h = 23 R , e como v0 = GM / R , o resultado é
∆v1 = 0, 71v0 , o que significa uma velocidade v2 = vc2 + ∆v12 ≅ 1, 02v0 no perigeu. Agora podemos calcular a quantidade de combustível necessária para o terceiro estágio. Como a velocidade inicial é vc ≅ 0, 73v0 e a final, após a queima do combustível, é
v2 ≅ 1, 02v0 , a razão m0 / m f é:
1, 02v0 − 0, 73v0 0, 29v0 m0 = exp = exp . mf ve ve Considerando
como
antes,
ve = 2,5 km/s
e
v0 = 8 km/s , vem
m0 / m f = 2,53 . Ou seja, 60% da massa do terceiro estágio deve ser de combustível. Como o terceiro estágio representa apenas 1,15% da massa total, isto significa que a carga útil neste foguete de três estágios, utilizado para se atingir a Lua, deve representar apenas 0,46% da massa total. É lógico que, para se aumentar a carga útil, deve-se usar um combustível mais explosivo, ou seja, que libere os gases de exaustão numa velocidade de escape maior. No exemplo que analisamos anteriormente, se dobrarmos a velocidade de escape, ve = 5 km/s , a carga útil final será de 6% da massa total. Isto é, dobrando-se a velocidade de escape, aumentamos treze vezes a carga útil!
5.5 Colisões entre Dois Corpos Problemas sobre colisões são importantes, pois muitas questões a respeito de colisões de partículas podem ser respondidas aplicandose as leis de conservação. Como as leis de conservação são válidas também na mecânica quântica, os resultados obtidos com estas leis são válidos em partículas atômicas e subatômicas, e não apenas em problemas de colisões envolvendo corpos macroscópicos, como na colisão entre bolas de bilhar ou numa colisão entre duas galáxias. Na maioria dos problemas sobre colisão, as partículas movem-se com velocidade constante, livres de forças, durante algum tempo antes e
Dinâmica de um Sistema de Partículas
211
depois da colisão. Durante o processo de colisão, as partículas ficam sob a ação de forças internas, que umas exercem sobre as outras. Se estas forças internas satisfazem a terceira de lei Newton, o momento linear total é o mesmo antes e depois da colisão (princípio da conservação do momento linear para um sistema isolado). Se as forças internas durante a colisão satisfazem a terceira lei na forma forte, então o momento angular total do sistema também será conservado. Ademais, se as forças internas forem conservativas, a energia cinética será conservada. Caso contrário, usa-se a conservação de toda a energia, incluindo-se qualquer energia que seja transformada de energia cinética para outras formas ou vice-versa. Se numa colisão entre duas partículas, o momento linear total e a energia cinética são conservados, a colisão é dita elástica. Numa colisão entre duas partículas, aplicamos a conservação do momento linear e da energia cinética, (5.47)
p1 f + p2 f = p1i + p2i ,
(5.48)
Ec1 f + Ec 2 f = Ec1i + Ec 2i .
Pode-se escrever a energia cinética em termos da massa e do mo2 2 mento linear, pois Ec = mv / 2 e v = p / m , logo Ec = p / 2m , assim a equação 5.48 fica: (5.49)
p12f 2m1
+
p22 f 2m2
=
p12i p2 + 2i . 2m1 2m2
A equação 5.47 é uma equação vetorial correspondendo a três equações escalares, uma para cada direção no espaço. Assim, as equações 5.47 e 5.49 representam quatro equações que dependem da razão entres as duas massas e das doze grandezas necessárias para especificar os quatro momentos lineares envolvidos. Logo, é necessário se conhecer nove das quantidades envolvidas para poder se determinar as quatro restantes. Isto significa que devemos efetuar as medidas que forem possíveis antes e depois do processo de colisão, de modo a se determinar quantidades que não podemos medir de maneira simples. Por exemplo, em uma situação típica, podemos conhecer (através de medidas) as massas, o momento linear inicial de uma das partículas e a direção final do movimento de uma das partículas. Assim, se co nhecemos m1 , m2 , p1i e a direção de p1 f , podemos determinar p2 f e o módulo do momento linear
p1 f . Por outro lado, pode ser que não se
conheça a massa de uma das partículas, e como veremos adiante, as equações 5.47 e 5.49 permitem determinar a massa de uma das partí-
212
culas envolvida no processo de colisão. Por que precisamos conhecer (medir) várias quantidades antes e depois da colisão? A resposta é simples. Podemos conhecer as condições iniciais do sistema, mas em praticamente todos os casos não se conhecem as forças que atuam durante o processo de colisão, logo não temos como resolver as equações de movimento para determinar o movimento subseqüente das partículas. Um exemplo de colisão em que sabemos as forças internas é a colisão de partículas alfa com núcleos atômicos, que conhecemos como espalhamento de Rutherford, estudado no capítulo anterior. Já numa colisão entre bolas de bilhar, não temos como conhecer as forças que atuam durante a colisão.
m1 e mo mento p1i com uma partícula de massa m2 em repouso. A colisão é Vamos considerar a colisão entre uma partícula de massa
mostrada na figura 5.9.
p1f m1
p1i
θ1 m2
m1
θ2 m2
p2f
Figura 5.9 - Colisão de uma partícula em movimento com outra em repouso.
Como mostrado na figura 5.9, admitimos que a partícula incidente seja espalhada de um ângulo 1 em relação à direção inicial. Logo, a momento linear final
p2 f deve estar no mesmo plano que p1i e p1 f , pois
não existem componentes do momento linear perpendicular a este plano antes da colisão e, portanto, não pode haver depois da colisão. Escrevemos a equação 5.47 em termos de componentes, (5.50)
p1i = p1 f cos 1 + p2 f cos 2 ,
(5.51)
0 = p1 f sen1 + p2 f sen 2 .
A conservação da energia cinética, neste caso, pode ser escrita como: (5.52)
p12i − p12f 2m1
=
p22 f 2m2
.
Digamos agora que, por meio de medidas, determinamos as massas,
Dinâmica de um Sistema de Partículas
213
o momento inicial p1i e o ângulo de espalhamento da partícula incidente 1 . Assim, podemos calcular p1 f , p2 f e 2. Para tanto, reescrevemos as equações 5.50 e 5.51 como:
( p1i − p1 f cos 1 ) 2 = ( p2 f cos 2 ) 2 , ( p1 f sen1 ) 2 = ( p2 f sen 2 ) 2 . Desenvolvendo o quadrado e somando-se estas duas equações, vem:
p22 f = p12i + p12f − 2 p1i p1 f cos 1 .
(5.53)
p22 f na equação 5.52 e ficamos com uma equação de segundo grau para p1 f , que se resolvendo, fornece: Substituímos agora
(5.54)
1/2
m 2 m1 m2 − m1 2 1 . cos 1 ± = cos 1 + p1i m1 + m2 m1 + m2 m1 + m2
p1 f
p2 f usando a equação 5.53, e 2 por meio das equações 5.50 e 5.51. É interessante analisar-
Este resultado permite então se obter obter
mos alguns casos particulares da equação 5.54. A primeira observação que podemos fazer é que, se na raiz se anula quando
(5.55)
1 = m , onde: cos 2 m = 1 −
m1 > m2 , o termo
m22 , m12
0 ≤ m ≤ / 2 , em que os valores limites de m correspondem ao limites m1 → ∞ e m1 = m2 , respectivamente. Note que, se 1 > m , e menor que , você verificará que p1 f será imaginário ou negativo, que não representam soluções físicas. Isto quer dizer que m representa o ângulo máximo através do qual m1 pode ser espalhado. Quando m1 >> m2 , o ângulo m é muito pequeno e a partícula incicom
dente é muito pouco espalhada, praticamente seguindo sua trajetória inicial depois da colisão, o que é observado na prática. A equação 5.54 mostra que, quando 1 < m existem dois valores de p1 f , o maior corresponde a uma colisão de raspão, onde a partícula incidente quase não transfere momento para a partícula em repouso, e o menor corresponde a uma colisão mais próxima de uma colisão frontal, quando a partícula incidente transfere boa parte de seu momento linear para a partícula que estava em repouso. Deve ser lembrado que o caso
1 = 0 pode significar que não houve colisão. Se não há colisão, de214
vemos ter p1 f = p1i . Note que a equação 5.54 fornece este resultado com a escolha do sinal ( + ) em frente ao radical. Havendo colisão com
1 = 0 , significa colisão frontal e a equação 5.54 fornece a solução com sinal ( −) em frente ao radical, (5.56)
p1 f
=
p1i
p2 f
m1 − m2 , 2 = 0 , m1 + m2
p1i
=
2m2 , m1 + m2
2 e a equação 5.53 para obp2 f . Quando m1 = m2 , você poderá verificar que os resultados em 5.56 se reduzem a p1 f = 0 e p2 f = p1i , a partícula incidente fica em
onde usamos a equação 5.51 para obter ter
repouso transferindo todo seu momento para a partícula que estava em repouso. Se as massas forem iguais e o ângulo 1 for diferente de zero, as equações 5.54, 5.53 e 5.51 fornecem: (5.57) e
p1 f p1i
p2 f
= cos 1 ,
p1i
= sen1 , 2 =
− 1 , 2
1 varia entre zero (sem colisão) até / 2 (colisão frontal), quando
a partícula incidente transfere todo seu momento para a partícula em repouso.
m1 < m2 , a equação 5.54 mostra que todos os valores de 1 entre zero e são permitidos, fornecendo sempre um valor positivo para p1 f / p1i , com a escolha do sinal positivo em Na situação oposta, isto é,
frente ao radical. Neste caso, não podemos escolher o sinal negativo, pois irá fornecer um valor negativo para p1 f / p1i e, já que estamos calculando o módulo do momento linear, este não pode ser negativo. Se 1 = 0 , vem p1 f = p1i e, neste caso, não haverá colisão. E no caso extremo de 1 = , a colisão é frontal e encontramos: (5.58)
p1 f p1i
=
m2 − m1 , m1 + m2
2 = 0 ,
p2 f p1i
=
2m2 . m1 + m2
Estes resultados são importantes, pois podem ser usados para a determinação da massa de uma das partículas. Considere que a massa m1
p1i (ou sua energia cinética inicial Ec1i ), na qual a medida da energia cinética Ec 2 f , 2 em uma colisão frontal, permite determinar m1 . Como Ec1i = p1i / 2m1 , 2 usamos a conservação da energia Ec1i − Ec 2 f = p1 f / 2m1 e a equação 5.58 para p1 f / p1i , de modo que:
seja desconhecida, mas que possamos medir seu momento
2
Ec1i − Ec 2 f
Chamando
A = 1−
Ec 2 f Ec1i
m − m1 = p / 2m1 = 2 Ec1i . m2 + m1 2 1f
, obtemos a equação de segundo grau para
Dinâmica de um Sistema de Partículas
215
m1 / m2 : 2
m1 A + 1 m1 + 2 +1 = 0 . A − 1 m2 m2 Resolvendo e substituindo o valor de
E m1 = 2 c1i − 1 ± m2 Ec 2 f
(5.59)
A , obtém-se: 2
Ec1i − 1 − 1 . 2 Ec 2 f
Como a solução apresenta dois valores possíveis para
m1 , pode-se
determiná-la de forma unívoca a partir da colisão com outra partícula de massa m2 diferente (conhecida), ou cujo ângulo de espalhamento seja diferente, porém conhecido. Este método é essencialmente o mesmo que James Chadwick (1891-1974) usou para estabelecer a existência do nêutron.
N
o início da década de 1920, o elétron e o próton eram partículas cujas existências já haviam sido amplamente confirmadas e suas propriedades eram bem conhecidas. Rutherford lançou, nesta época, a hipótese da possibilidade da ligação de um elétron com um próton, dando origem a uma partícula sem carga, de massa praticamente igual à do próton, que ele denominou de “nêutron”. Foram realizadas várias tentativas, sem sucesso, para se detectar experimentalmente estas partículas. O fato de ela não ter carga dificultava a verificação de sua existência. Em 1932, Chadwick realizou experiências em que um feixe de partículas alfa incidindo sobre uma amostra de berílio provocava a emissão, por esta substância, de algum tipo de “radiação invisível”, sem carga elétrica, que os físicos suspeitaram tratar-se de raios gama. Porém, por meio de medidas cuidadosas e cálculos, verificou-se que se essa hipótese fosse verdadeira, os princípios de conservação do momento linear e da energia não estariam sendo satisfeitos. Chadwick recusou-se a admitir que as leis de conservação estivessem sendo violadas e formulou a hipótese de que as leis de conservação eram válidas e que a “radiação invisível”, proveniente do berílio, fosse constituída de partículas, os nêutrons, e não de raios gama. Para
216
testar a validade de sua hipótese, Chadwick fez a “radiação invisível” incidir em uma amostra de hidrogênio, observando assim a emissão de um grande número de prótons, que ele considerou como o resultado das colisões dos nêutrons com os núcleos dos átomos de hidrogênio. De forma simplificada, podemos considerar uma colisão frontal e, assim, o momento linear do próton será . Contudo, o momento linear do nêutron era desconhecido, e assim Chadwick contornou esta dificuldade substituindo a amostra de hidrogênio por nitrogênio, de forma que o momento linear dos núcleos de nitrogênio, depois de uma colisão, é , o que permite se determinar a massa
do nêutron medindo-se os momento lineares dos prótons e dos núcleos de nitrogênio, o que é simples, pelo fato de serem partículas carregadas. Os resultados destes experimentos forneceram um valor para a massa do nêutron muito próximo da massa do próton, como Rutherford havia sugerido. Estes experimentos foram de tamanha importância para o desenvolvimento da física nuclear que Chadwick recebeu, em 1935, o prêmio Nobel de Física.
Até o momento, discutimos colisões em que ocorre a conservação da energia cinética, porém, em muitos casos a energia cinética não se conserva, como no caso de duas bolas de bilhar. Nestas situações, pode ocorrer a transformação de energia mecânica em térmica ou em deformação plástica dos corpos que colidem. Pode ocorrer também a transformação de energia química em energia cinética, se no momento da colisão ocorre uma explosão. Ademais, átomos, moléculas e núcleos atômicos possuem energia potencial interna que pode ser convertida em cinética ou vice-versa. As colisões entre corpos ou partículas atômicas onde ocorre transformação de energia são ditas inelásticas. Seja Q a quantidade que indica a energia cinética ganha ou perdida no
Q > 0 , a energia cinética do sistema aumenta desta quantidade e a colisão é dita exoérgica. Se Q < 0 a energia cinética diminui processo. Se
desta quantidade e a colisão é dita endoérgica. Como vimos antes, a colisão elástica corresponde a Q = 0 . Logo, para colisões inelásticas, aplicamos a conservação do momento linear total do sistema (equação 5.47) e a conservação da energia (equação 5.49) é escrita como:
Dinâmica de um Sistema de Partículas
217
p12f p22 f p12i p2 . + 2i + Q = + 2m1 2m2 2m1 2m2
(5.60)
As colisões entre corpos macroscópicos são sempre inelásticas e endoérgicas, sendo que parte da energia cinética é convertida em calor e outras formas de energia. A energia cinética de translação pode ser convertida em energia cinética de rotação e vice-versa. As variações de energias cinéticas de rotação estão incluídas no fator Q , na equação 5.60. As colisões podem variar desde as aproximadamente elásticas, como colisões com balas de aço, desde que rotações não estejam envolvidas, até as completamente inelásticas, em que os dois corpos permanecem juntos após a colisão. Numa colisão completamente inelástica, em que uma bala de massa
m e de velocidade v1 colide penetrando em um bloco de massa M ,
inicialmente em repouso, em uma superfície horizontal, a conservação da quantidade de movimento fornece:
mv1 = (m + M )v2 ,
(5.61)
onde v2 é a velocidade do sistema bala+bloco imediatamente após a colisão. Observe que admitimos um tempo de colisão extremamente curto, isto é, a bala rapidamente atinge o repouso em relação ao bloco. Caso contrário, deve-se levar em consideração a variação no momento linear devido à força externa (força de atrito). Se é o coeficiente de atrito cinético entre o bloco e a superfície horizontal e
o tempo que a bala leva até atingir o repouso em relação ao bloco, a variação na quantidade de movimento será:
ou
∆p = (m + M )v2 − mv1 = − ∫ (m + M ) gdt ,
(5.62)
0
(m + M )v2 = mv1 − (m + M ) g ,
mostrando que podemos usar a equação 5.61 se o tempo de colisão for muito pequeno. Para que você compreenda onde queremos chegar, podemos ilustrar isto através do seguinte exemplo numérico. Considere que = 0,85 , m = 15g e que a massa do bloco seja de M = 3kg , tendo a bala uma velocidade de
v1 = 300m/s . Se o tempo de colisão
t = 0,1s , a variação no momento linear do sistema será de ∆p = −2,51Ns ; ora, o momento linear inicial é 4,5Ns for grande, digamos
e vemos que a variação é grande. Logo, não existe conservação do momento linear nesta colisão. A velocidade do sistema imediatamente após a colisão será dada pela equação 5.62, em que v2 = 0, 66m/s . Se usarmos a equação 5.61, obtém-se um resultado incorreto e igual a
218
v2 = 1, 49m/s . Por outro lado, se o tempo de colisão, o que geralmente acontece, for da ordem de 1milisegundo ( t = 0, 001s ), a variação no momento linear será de apenas ∆p = −0, 025Ns e agora a equação 5.62 fornece v2 = 1, 48m/s , praticamente o mesmo valor que a equação 5.61 fornece (1, 49m/s) , e podemos dizer que o processo ocorre com a conservação do momento linear do sistema. Note que, por mais curto que seja o tempo de colisão, nunca teremos a conservação exata do momento linear devido à existência de uma força externa atuando sobre o sistema (a força de atrito). A quantidade de energia cinética da bala que é transformada em calor e deformação do bloco, à medida que a bala penetra no mesmo, é:
1 1 Q = (m + M )v22 − mv12 . 2 2
Admitindo-se a conservação do momento linear no processo, temos, (5.63)
1 M Q = − mv12 . 2 m+M
No exemplo numérico que você estudou anteriormente, o valor de
Q é aproximadamente 671, 6 Joules, enquanto que a energia cinética inicial da bala era de 675 Joules. O que mostra que praticamente toda a energia cinética da bala é convertida em outras formas de energia. Isaac Newton estudou a colisão frontal entre dois corpos, em situações em que não havia movimento de rotação, e verificou experimentalmente que a razão entre a velocidade relativa antes do impacto e depois do impacto era aproximadamente constante para dois corpos quaisquer. Considere uma colisão com as partículas se movendo ao longo do eixo x com velocidades iniciais v1i e v2i . As partículas colidem e voltam ao longo do mesmo eixo com velocidades
v1 f e v2 f . Os
resultados experimentais de Newton se expressam por: (5.64)
v2 f − v1 f = e(v1i − v2i ) ,
onde e é denominado de coeficiente de restituição tendo valores entre zero e um. Se e = 1 , a colisão é perfeitamente elástica; se e = 0 , completamente inelástica. Em ambos os casos, a conservação do momento linear fornece: (5.65)
m1v1i + m2 v2i = m1v1 f + m2 v2 f .
Se forem conhecidas as velocidades iniciais, determinamos as velocida-
Dinâmica de um Sistema de Partículas
219
des finais resolvendo o sistema composto pelas equações 5.64 e 5.65,
(m1 − em2 )v1i + m2 (1 + e)v2i , m1 + m2
(5.66)
v1 f =
(5.67)
v2 f =
O cálculo do valor de
(m2 − em1 )v2i + m1 (1 + e)v1i . m1 + m2
Q para a colisão é laborioso. O resultado é:
mm 1 Q = − (1 − e 2 ) 1 2 (v1i − v2i ) 2 . 2 m1 + m2
(5.68)
Observe que a equação 5.63 é um caso particular da equação 5.68 para uma colisão completamente inelástica (e = 0) , com m1 = m , m2 = M ,
v2i = 0 e v1i = v1 . Estudos experimentais recentes têm mostrado que o
coeficiente de restituição não é realmente constante, dependendo das velocidades iniciais, do meio em que ocorrem as colisões e da história passada dos corpos. Um corpo que não tenha sido submetido a colisões tem uma superfície diferente (pelo menos do ponto de vista microscópico) de um corpo idêntico submetido a inúmeras colisões, pois em cada uma delas ocorrem deformações microscópicas que alteram a sua superfície.
5.6 O Problema de Dois Corpos Iremos considerar agora o problema específico de dois corpos que estão submetidos a forças internas que satisfazem a terceira lei de Newton. Não devemos esquecer que o centro de massa é governado pela equação 5.10, que tem a formada equação para uma partícula de massa total M submetida à força F , que é soma das forças externas que atuam no sistema. Vamos detalhar o problema de dois corpos e mostrar que ele pode ser reduzido a dois outros de um único corpo. Considere duas partículas de massas m1 e m2 com vetores posição r1 e
r2 , como indicado na figura 5.10.
m2 r2 0
r c.m. r1
Figura 5.10 - Coordenadas para o problema de dois corpos.
220
m1
e e
i i
Seja F1 , F2 e F1 , F2 as forças externas e internas atuantes nas partículas 1 e 2, respectivamente, e i i admitimos que as forças internas satisfaçam a terceira lei, F1 = − F2 . As equações de movimento para as duas partículas são:
(5.69)
•• m1 r1 = F1i + F1e ,
(5.70)
•• m1 r2 = F2i + F2e .
A figura 5.10 mostra que podemos introduzir agora o vetor do centro de massa rcm e o vetor que dá a posição da partícula 1 relativa a partícula 2, isto é, (5.71)
m1r1 + m2 r2 , rcm = m1 + m2
(5.72)
r = r1 − r2 .
A transformação inversa é: (5.73)
r1 = rcm +
m2 r, m1 + m2
(5.74)
r2 = rcm −
m1 r. m1 + m2
Somando-se as equações de movimento 5.69 e 5.70 e usando a equação 5.71, obtemos: •• (m1 + m2 ) r cm = F1e + F2e = F ,
(5.75)
onde se usou a terceira lei de Newton para as forças internas. A equa ção de movimento para r é obtida multiplicando-se ambos os membros da equação 5.72 pelo produto
m1m2 e derivando-se em relação
ao tempo duas vezes. Em seguida, ao usarmos as equações 5.69 e 5.70 e a terceira lei de Newton, obtemos: (5.76)
F1e F2e i m1m2 r = (m1 + m2 ) F1 + m1m2 ( − ) . m1 m2 ••
Admitindo-se que as forças externas sejam proporcionais às massas, como no caso gravitacional, isto é, (5.77)
F1e F2e , = m1 m2
a equação 5.76 fica: Dinâmica de um Sistema de Partículas
221
(5.78)
m1m2 •• r = F1i . m1 + m2
Introduzindo as quantidades,
m1m2 , m1 + m2
(5.79)
=
(5.80)
M = m1 + m2 ,
as equações de movimento 5.75 e 5.78 podem ser escritas como: (5.81)
•• M r cm = F ,
(5.82)
•• r = F1i .
A equação 5.81 já é a conhecida equação para o movimento do centro de massa (equação 5.10), enquanto que a equação 5.82 é a equação de movimento para uma partícula de massa (chamada de massa reduzida do sistema) submetida à força interna que a partícula 2 exerce i sobre a partícula 1 ( F1 ) . Logo, o movimento da partícula 1, observado a partir da partícula 2, é o mesmo que se obteria caso a partícula 2 estivesse fixa e a massa da partícula 1 fosse . Note que, se a partícula 2 tem massa muito maior que a massa da partícula 1, a massa reduzida será ligeiramente menor que a massa da partícula 1. Porém, se as massas forem iguais, a massa reduzida será a metade da massa de uma das partículas. Assim, fica claro, através das equações 5.81 e 5.82, que pela introdução das coordenas rcm e r , reduzimos o problema de dois corpos a dois problemas de um corpo. Quando não existe força externa resultante, o centro de massa permanece em repouso, ou em movimento retilíneo uniforme em relação a algum referencial inercial previamente escolhido. Agora fica claro que foi este o procedimento adotado quando aplicamos o movimento sob força central ao movimento dos planetas. A massa do Sol é muito maior que a massa dos planetas, e assim podemos resolver o problema como de uma partícula de massa reduzida submetida à força gravitacional do Sol. Devido às grandes distâncias envolvidas, podemos tratar cada planeta separadamente, pois as forças gravitacionais entre os planetas são pequenas. Seus efeitos são pequenos, acarretando leves alterações (mensuráveis) nas órbitas dos planetas. Da mesma forma, podemos tratar separadamente o problema Terra-Lua, pois a distância entre a Terra e a Lua é extremamente menor que as distâncias destes dois astros ao Sol. Portanto, neste caso a Terra é o centro de força gravitacional em torno do qual a Lua descreve seu movimento orbital. Neste momento, é importante explicitarmos como o período orbital
222
dos planetas, dado pela terceira lei de Kepler, é afetado pelo fato de que o Sol, tendo uma massa finita, realmente não está estacionário na origem das coordenadas, como foi suposto implicitamente no capítulo 4. Devemos levar em conta o movimento do Sol em torno do centro de massa. Para isso, escrevemos a equação de movimento (equação 5.81) para o caso de um planeta de massa m p sob a ação da força gravitacional do Sol de massa
Ms ,
•• GM s m p r = − rˆ , r2
ou
•• G ( M s + m p )m p mp r = − rˆ , r2
de modo que na terceira lei de Kepler (equação 4.62), devemos substituir
T2 =
42 3 a , M sG
M s → M s + m p , e assim de forma mais precisa, a
lei de Kepler se expressa como:
T2 =
42 a3 . G(M s + mp )
Resultado que dá o período orbital para dois corpos quaisquer interagindo sob a influência mútua de suas forças gravitacionais, isto é, levando-se em conta a massa reduzida do sistema. Note que, como os planetas têm massa muito menor que a massa do Sol, a diferença entre calcular os períodos com a equação anterior ou com a equação 4.62 é muito pequena. Note que o período, considerandose a massa reduzida, T , difere do período sem levá-la em conta por
T2 ≅ T 2 (1 − m p / M s ) . Mesmo no caso do planeta Júpiter, esta diferen-
ça é mínima. Entretanto, se as massas dos dois corpos forem iguais, temos
T =
2 T e a diferença agora é apreciável. Esta é uma situ2
ação comum nas galáxias, pois se sabe que quase a metade das estrelas constituem sistemas duplos ou binários, ou seja, elas ocorrem aos pares, mantidas juntas pela força gravitacional que uma exerce sobre a outra. Logo, cada estrela gira em uma órbita elíptica em torno da outra, cujo período é dado por T . Um exemplo típico é a brilhante
2,1M s , e sua companheira, uma pequena e pálida estrela (uma anã branca), cuja massa é 1, 05M s e cujo tamanho é de um grande planeta, o que significa que sua densidade é extremamente alta (30.000 vezes a densidade da água). A distância entre Sirius e sua acompanhante é de 20UA (como a distância de
estrela Sirius, cuja massa é
Urano ao Sol) e o período orbital calculado é
T = 50 anos terrestres,
o que concorda com o que é observado. Note que este período é bem diferente do período orbital de Urano (84 anos terrestres).
Dinâmica de um Sistema de Partículas
223
Para finalizar, vale lembrar que, como vimos antes, para um sistema de muitas partículas, tanto o momento angular como a energia cinética podem ser expressos em termos de uma parcela correspondente ao movimento do centro de massa e outra devido ao movimento em relação ao centro de massa, equações 5.25 e 5.28. Para duas partículas, separamos estas quantidades físicas em termos da velocidade • relativa v = r = v1 − v2 e da velocidade do centro de massa, (5.83) Resolvendo para
m v + m2 v2 . vcm = 1 1 m1 + m2
v1 e v2 , vem:
(5.84)
v1 = vcm + v , m1
(5.85)
v2 = vcm − v. m2
O momento angular do sistema é: (5.86)
L = m1 (r1 × v1 ) + m2 (r2 × v2 ) .
Usando agora as equações 5.73, 5.74, 5.84 e 5.85, podemos reescrever a equação 5.86 como: (5.87)
L = M (rcm × vcm ) + µ(r × v ) .
Equação que é um caso particular da equação 5.25 para um sistema de duas partículas, uma de massa M e outra de massa . De maneira similar, a energia cinética do sistema é:
(5.88)
Ec =
1 1 m1v12 + m2 v22 . 2 2
Usando agora as equações 5.84 e 5.85, obtemos:
(5.89)
Ec =
1 1 2 Mvcm + v 2 , 2 2
e, igualmente, a energia cinética do sistema fica expressa como a soma das energias cinéticas de duas partículas. Note que, se o sistema de partículas é isolado, podemos localizar um referencial inercial no centro de massa do sistema, de modo que as equações 5.87 e 5.89 reduzem apenas a parcela correspondente ao movimento relativo, isto é,
1 L = (r × v ) e Ec = v 2 . 2
224
É conveniente lembrar a você que se pode resolver o problema de dois corpos como feito nesta seção, mas que se adicionarmos mais um corpo e tentarmos resolver o problema geral de três corpos, veremos que não é possível se achar uma solução analítica. Isto é, até o presente, não se conseguiu resolver as equações de movimento para três corpos de diferentes massas sob a ação de suas forças gravitacionais mútuas. As dificuldades matemáticas são insuperáveis, pois as equações de movimento correspondem a um sistema de nove equações diferenciais de segunda ordem. Mesmo depois de uma redução na complexidade matemática, por meio de uma escolha criteriosa de um sistema de coordenadas adequado, e invocando-se as leis de conservação para se achar constantes do movimento e com o emprego de modernas técnicas analíticas, o problema continua insolúvel. Uma maneira de atacar o problema de três corpos é considerando sua forma restrita. Na forma restrita do problema de três corpos, consideram-se dois corpos massivos e um terceiro corpo de pequena massa. Uma análise cuidadosa deste problema fornece alguns critérios para a estabilidade de algumas órbitas do corpo de pequena massa, mas mesmo neste caso os cálculos são laboriosos. Atualmente, dadas as condições iniciais, podemos encontrar soluções numéricas para o problema de três ou mais corpos com o grau de precisão desejado. Naturalmente, quanto mais complexo for o sistema considerado, maior será o tempo computacional exigido para se resolver as equações de movimento.
Resumo O momento linear total de um sistema de partículas é definido como a soma dos momentos lineares individuais de cada partícula, N N P = ∑ pi = ∑ mvi . i =1
i =1
Que pode ser escrito como P = Mvcm , sendo vcm a velocidade do centro de massa do sistema. A equação de movimento para um sistema de partículas submetidas à força externa total F e a forças internas que satisfazem a terceira lei de Newton é:
ou
dvcm dP =M =F, dt dt •• M r cm = Macm = F .
Dinâmica de um Sistema de Partículas
225
Portanto, se a força externa total é nula, o momento total é:
dP =0 → dt
P = Mvcm = constante.
Este é o princípio da conservação do momento linear, que afirma que o momento linear total de um sistema isolado permanece constante. Para um sistema de muitas partículas, definimos o momento angular total como a soma dos momentos angulares individuais,
N L = ∑ (ri × mi vi ) . i =1
Se as forças internas satisfazem a terceira lei de Newton na sua forma forte, isto é, ação e reação iguais e opostas, e estando segundo a reta suporte que une as duas partículas, a taxa de variação temporal do momento angular é:
dL N e = ∑ ri × Fi = T . dt i =1
Sendo igual ao torque externo total atuando sobre o sistema de partículas. Este é o teorema do momento angular expresso para um sistema de partículas. Se o torque externo total for nulo, vem:
dL = 0 → L = Constante . dt
Logo, se o sistema é isolado, ou seja, não submetido a torques externos, o momento angular é constante no tempo, o que é conhecido como o princípio da conservação do momento angular para um sistema isolado. Se, num sistema de muitas partículas, as forças internas são conservativas, e sobre cada partícula atuam forças externas, a taxa de variação da energia mecânica será: N d ( Ec + V i ) = ∑ vk • Fke . dt k =1
Logo, na presença de forças externas não conservativas, a energia mecânica do sistema não irá permanecer constante. Por outro lado, se não temos forças externas atuando, a energia mecânica do sistema de partículas será constante, isto é,
Ec + V i = E = Constante . Se as forças externas também forem conservativas, suas energias po-
226
tenciais podem ser somadas à energia potencial interna gia total E = Ec + V será constante.
V i e a ener-
Numa colisão elástica entre duas partículas, aplicamos a conservação do momento linear e da energia cinética,
p1 f + p2 f = p1i + p2i , Ec1 f + Ec 2 f = Ec1i + Ec 2i . Para colisões inelásticas aplicamos a conservação do momento linear total do sistema e a conservação da energia,
p12f p22 f p12i p2 . + 2i + Q = + 2m1 2m2 2m1 2m2 Q > 0 , a energia cinética do sistema aumenta e a colisão é dita exoérgica. Se Q < 0 a energia cinética diminui e a colisão é dita endoérgica. A colisão elástica corresponde a Q = 0 . As colisões entre Se
corpos macroscópicos são sempre inelásticas e endoérgicas, sendo que parte da energia cinética é convertida em calor e outras formas de energia. O problema de dois corpos pode ser reduzido a dois problemas de um corpo, cujas equações de movimento são dadas por: •• M r cm = F , •• r = F1i .
Sendo
F a força externa total sobre as partículas.
Exercícios 1) Despeja-se água num barril a uma taxa de 60 kg por minuto de uma altura de 5 metros. O barril tem uma massa de 10 kg e está em repouso sobre a balança. Determine a leitura (em Newtons) da balança depois que a água foi despejada no barril durante um minuto 2 ( g = 10 m / s ).
Resposta: 710 N.
2) Um pêndulo balístico usado para medir a velocidade de uma bala Dinâmica de um Sistema de Partículas
227
é construído suspendendo-se um bloco de madeira de massa M por uma corda de comprimento l . O pêndulo encontra-se inicialmente em repouso na vertical. Uma bala de massa
m é disparada, atingin-
v e se incrusta nele. O pêndulo se desloca até que a corda faça um ângulo máximo m com a vertical. Determine a velocidade v da bala ao atingir o bloco. do o bloco com uma velocidade
Resposta: v = 2(1 +
M ) gl sen m . m 2
3) Uma bala de massa
m e velocidade v colide com o bulbo de um pêndulo de comprimento l de massa M e emerge do outro lado com velocidade v / n , onde n > 1 . Admita que o tempo de colisão seja extremamente curto e que o pêndulo quase não se desloque durante a colisão (tempo necessário para que a bala atravesse o bulbo). O pêndulo pode girar livremente no plano vertical. a) Qual é o menor valor de
v para que o bulbo do pêndulo gire de
uma volta completa? b) Se n = 4 , m = 20 gramas,
M = 1kg e l = 0,8 metros, qual a ve-
locidade da bala em metros por segundo? ( g
Respostas: a) v = 5 gl
4) Uma caixa de massa
M n . m n −1
= 9,8 m/s 2 )
b) 417 m/s .
m cai sobre uma esteira que se move com
v . O coeficiente de atrito de deslizamento entre a caixa e a esteira é .
velocidade constante
a) Em que distância a caixa desliza sobre a esteira, antes que seu movimento atinja a mesma velocidade da esteira?
F deve ser aplicada à esteira para mantê-la em movimento com velocidade constante depois que a caixa cai sobre ela.
b) Que força
c) Por quanto tempo deve a força ser aplicada? d) Calcule o trabalho
WF realizado pela força F para puxar a es-
teira. e) Calcule o trabalho
W fa realizado pela força de atrito entre a cai-
xa e a esteira. f) Verifique se a energia fornecida à esteira pela força
F é exata-
mente igual ao acréscimo da energia cinética da caixa mais a energia dissipada por atrito.
228
Respostas: a) d = v 2 / 2 g ; b) F = mv / ∆t ; c) ∆t = v / g ; d) WF = mgv∆t = mv 2 ; e) W fa = mv 2 / 2 ; f) WF = 12 mv 2 + W fa . A energia fornecida à esteira é igual ao acréscimo da energia cinética mais a energia dissipada por atrito.
5) Um bloco de massa
M fixo a uma mola de constante elástica k
está em equilíbrio sobre um plano inclinado, cujo ângulo de inclinação é . O atrito entre o bloco e o plano inclinado é desprezível. Veja a figura abaixo. Um projétil de massa
m é disparado ao longo do plano
inclinado, indo colidir com o bloco. Considere que o tempo de colisão seja extremamente curto e que o sistema bloco mais projétil praticamente não se desloque durante o tempo de colisão. a) Ache a expressão que fornece a velocidade necessária do projétil para que o ponto mais alto atingido pelo sistema bloco mais projétil corresponda à situação em que a mola não se encontra distendida nem comprimida. b) Calcule
a
velocidade
do
projétil,
k = 150N/m , = 30° e m =15 gramas.
supondo
M = 3, 0kg ,
c) Qual é a velocidade necessária se = 90° (bloco fixo na mola pendurada no teto)?
k M
m
v θ
Figura 5.11 - Colisão de uma bala com bloco fixo por uma mola em um plano inclinado.
Respostas: a) v = (1 + c) v ≅ 279 m/s .
M M ( M + 2m) )gsen ; b) v =≅ 140 m/s ; m k ( M + m)
6)
Uma granada de massa M é lançada verticalmente a partir do solo com velocidade v0 . No ponto mais alto de sua trajetória, ela explode em duas partes de massas
m1 e m2 (m1 + m2 = M ) , sendo que
imediatamente após a explosão estas duas partes têm movimento na horizontal. A explosão da granada libera uma quantidade de energia Dinâmica de um Sistema de Partículas
229
Q igual a quatro vezes a energia cinética inicial da granada. a) Obtenha uma expressão que fornece a distância d entre as duas partes da granada no momento em que atingem o solo. b) Calcule esta distância para e
v0 = 15 m/s .
Respostas: a) d =
m1 = 100 gramas, m2 = 300 gramas
v02 m2 m1 + ; b) d ≅ 106 metros. g m1 m2
7) a) Calcule a perda de energia cinética Q para uma colisão frontal m1 com velocidade de inciv1 , com outra bola de massa m2 em repouso. O coeficiente de restituição entre as bolas é e . entre uma bola de bilhar de massa
dência
b) Para m1
= 127 gramas com v1 = 3m/s e m2 = 105 gramas e onde e = 0, 75 , qual é o valor de Q ?
c) Compare este valor com a energia cinética inicial.
Respostas: a) Q = − 12 (1 − e 2 )
m1m2 2 v1 ; b) Q = 0,113 Joules. m1 + m2
c) Quase 20 % da energia cinética inicial.
8) Um foguete lançado verticalmente a partir do solo expele massa a uma taxa que é proporcional a sua massa em cada instante, sendo a −2 −1 constante de proporcionalidade igual a 10 s . Suponha que a velocidade de escape dos gases de combustão seja de quartos
9800 m/s e que três
(3 / 4) da massa do foguete seja de combustível.
a) Quanto tempo leva para o foguete consumir todo o combustível? b) Quais são os valores da velocidade e a altura do foguete no instante em que todo o combustível é consumido? c) Qual é a altitude máxima atingida por este foguete? Quanto tempo ele leva para atingir esta altitude? Admita que g seja constante e igual a
9,8 m/s 2 . Note que a aceleração deste foguete é
a máxima aceleração suportável pelo homem.
Respostas: a) 138, 6 segundos b) 44.017,8 km/h ; 847,5 km c) 8.475, 2 km ; 23,1 minutos.
230
9) Um foguete de brinquedo consiste numa garrafa de plástico rígido, parcialmente cheia de água e contendo também ar a uma alta pressão p . A água tem densidade e é ejetada através de um pequeno orifício de área
A.
a) Calcule a velocidade de exaustão
ve , admitindo que as perdas
de energia por atrito sejam desprezíveis, de forma que a energia cinética da água que escapa é igual ao trabalho realizado pela pressão do gás para empurrar a água para fora. b) Qual é o empuxo deste foguete?
500 gramas, se contiver 500 gramas de água e o orifício de saída de água tendo uma 2 área de A = 5 mm , qual é a pressão necessária para que ele
c) Se o foguete vazio tem uma massa de
possa se sustentar contra a gravidade? d) Se ele então for largado, de maneira a ser acelerado para cima, quanto tempo levará até que toda água seja expelida? Que velocidade máxima o foguete atingirá? (admita que a pressão não mude) e) Qual a altura do foguete no instante em que atinge a velocidade máxima? Qual a altura máxima que este foguete atinge? Na prática, o foguete atingirá esta altura?
Respostas: a) ve2 = 2 P / ; b) 2 pA ; c) p = mg / 2 A = 98 x104 N/m 2 ; d) 2,27 segundos, 8,45 m/s ; e) 5,65 metros, 9,30 metros. Não! Por quê?
10)
Um bloco de massa M está suspenso por meio de uma corrente que passa por uma polia fixa. Veja a figura abaixo. A corrente tem massa total m e densidade linear de massa (massa por unidade de
comprimento) e seu comprimento total é d .
a) Se o bloco está inicialmente a uma distância d do centro da polia, qual é sua velocidade quando a corrente começa a abandonar a polia? b) Mostre que, se a massa total da corrente for igual à metade da massa do bloco e = 1/ 2 , a velocidade ao abandonar a polia será
v=
5 gd . Neste caso qual é o resultado para = 0 ? 6
Dinâmica de um Sistema de Partículas
231
m v Figura 5.12 - Bloco suspenso por corrente passando por uma polia fixa.
Respostas:. a) v = 2 gd (1 − )
232
M M
m m
+ +1
;
b) v = 2
gd . 3
6
Sistemas de Coordenadas em Movimento
6
Sistemas de Coordenadas em Movimento
Este capítulo tem como objetivo apresentar a aplicação da mecânica de Newton em sistemas de coordenadas em movimento – tanto em movimento uniforme (referenciais inerciais) como em movimento acelerado (referenciais nãoinerciais). Ao final do mesmo, o aluno deverá ser capaz de: • Definir referenciais inerciais e não-inerciais; • Enunciar o princípio da relatividade newtoniana; • Explicitar as transformações de Newton-Galileu entre referenciais inerciais; • Definir forças inerciais ou fictícias; • Aplicar a mecânica newtoniana em referenciais nãoinerciais com a introdução de forças inerciais; • Escrever a equação de movimento em um referencial não-inercial dotado de movimento de rotação, explicitando as forças inerciais, denominadas de força transversa, força de Coriolis e força centrífuga; • Identificar os efeitos estáticos e dinâmicos devido à rotação da Terra; • Descrever o efeito produzido no movimento de um pêndulo devido à rotação da Terra.
6.1 Referenciais Inerciais e Não-inerciais Nos capítulos anteriores, vimos que as equações de movimento para uma partícula, um sistema de partículas ou corpos rígidos são sempre estabelecidas em um sistema de referência que, ou está em repouso ou em movimento retilíneo uniforme. Para estudar o movimento de projéteis, escolhemos um referencial fixo na Terra. Para estudar o movimento da Terra no espaço, escolhemos um referencial com origem no Sol, considerado como estando fixo.
Sistemas de Coordenadas em Movimento
235
É importante lembrar que a essência da primeira lei de Newton é que sempre podemos encontrar um referencial em relação ao qual um corpo isolado esteja em repouso ou mova-se com velocidade uniforme, isto é, um referencial inercial. E podemos considerar referencial inercial como aquele que está em repouso ou tem movimento retilíneo uniforme em relação ao espaço absoluto. Isto é, a primeira lei nos assegura a existência de referenciais inerciais que devemos adotar para descrever o movimento dos corpos, aplicando-se a segunda lei do movimento. Entretanto, em alguns casos, o sistema físico no qual queremos fixar nosso referencial está acelerado (um exemplo é a Terra, que gira em torno do seu eixo, ou um trem acelerado) e um referencial fixo neste sistema é chamado de referencial não-inercial. Ou em outras palavras, um sistema de coordenadas acelerado é denominado de referencial não-inercial. Estritamente falando, qualquer referencial fixo na Terra é não-inercial devido, à rotação da Terra. Da mesma forma, um referencial localizado no Sol também é não-inercial, devido à rotação do Sol em torno do centro da galáxia. Isto nos remete à discussão feita no capítulo 1, acerca da existência de um referencial inercial perfeito. Vimos que mesmo as galáxias muito distantes estão aceleradas. Desta maneira, podemos ou adotar a postura de Newton e definir um referencial inercial como aquele que ou está em repouso ou em movimento uniforme em relação ao espaço absoluto. Ou procedemos como Mach, e consideramos que um referencial inercial é aquele em que a matéria do Universo não é, em média, acelerada, isto é, referenciais inerciais são os que se encontram em repouso, ou pelo menos não sofrem aceleração, em relação à média do movimento da matéria no Universo. Porém, para fins práticos, sabemos que na maioria das situações, podemos considerar referenciais localizados na Terra e no Sol como inerciais. Mas, se estivermos em um foguete acelerado, ou em um trem acelerado, não podemos desprezar a aceleração do sistema. Como fazer para estudar o movimento de corpos num sistema de coordenadas acelerado? E se nosso interesse for estudar o movimento dos corpos levando em conta a aceleração da Terra? Por exemplo, será que o fato de a Terra ser um sistema girante afeta a trajetória de projéteis? Para que você seja capaz de responder a esta e outras questões, veremos agora como aplicar a mecânica newtoniana em sistemas de coordenadas acelerados. Primeiro, iremos tratar de sistemas de coordenadas com movimento de translação acelerado em relação a algum referencial inercial. Vamos considerar dois sistemas de coordenadas, um sistema linha,
S´ , especificado pelos eixos x´, y´, z´ , que tem movimento de transla-
236
ção em relação ao sistema S , com eixos so, como se mostra na figura 6.1.
x, y, z , e que está em repou-
Y Y’ P
0’
r r0
r’
X’
Z’
0
X
Z Figura 6.1 - Relações entre vetores de posição para dois sistemas de coordenadas com movimento de translação relativo.
Em um instante t qualquer, um ponto P no espaço é especificado pelo vetor r em relação à origem O do sistema e pelo vetor r ´ em relação à origem O´ do sistema S´ . A origem O´ em relação à O é especificada pelo vetor
ro (veja figura 6.1) e a relação entre r e r ´ é: r = r ´+ r0 .
(6.1) Em componentes, (6.2)
x = x´+ xo ,
y = y´+ yo ,
z = z´+ zo .
Supomos que durante o movimento, os eixos
x´, y´, z´ do sistema de
coordenadas S´ permaneçam sempre paralelos aos eixos x´, y´, z´ do sistema S em repouso. Portanto, temos apenas um movimento de translação do sistema S´ . Note que, no caso mais geral, pode haver também um movimento de rotação do sistema S´ em torno de algum eixo, situação que vamos considerar mais adiante. Derivando ambos os membros da equação 6.1 em relação ao tempo, temos:
dr dr ´ dro v= = + , dt dt dt Sistemas de Coordenadas em Movimento
237
e como a velocidade do referencial S´ em relação ao referencial S é vo = dro / dt , obtemos: (6.3)
v = v´+vo .
Derivando novamente obtemos a relação para as acelerações,
(6.4)
d 2 r d 2 r ´ d 2 ro , a= 2 = 2 + 2 dt dt dt a = a´+ ao ,
ao é a aceleração do sistema de coordenadas S´ em relação à S . Assim, se temos uma partícula de massa m no ponto P sob a ação de uma força F , no sistema de coordenadas em repouso (referencial inercial) S , escrevemos a segunda lei de Newton, d 2r m 2 =F. (6.5) dt onde
Usando a equação 6.4, podemos escrever a equação de movimento no sistema S´ , (6.6)
d 2r´ m 2 = F − mao . dt
O que mostra que no sistema S´ a equação de movimento (equação 6.6) é diferente da equação no sistema S (equação 6.5) devido à pre-
−mao .Isto é, no sistema S temos F = ma , mas no sistema S´ , F ´= ma´= F − mao . Se o sistema S´ tem movimento uni forme, ao = 0 , e assim, d 2r´ m 2 =F. (6.7) dt sença do termo
Verifique que a equação 6.7 tem a mesma forma da equação 6.5. Isto permite concluir que a forma da segunda lei de Newton é a mesma em todos os sistemas de coordenadas que se deslocam com velocidades relativas uniformes. Este é o Princípio da Relatividade Newtoniana, o qual estabelece que não há um sistema de referência único; todos os sistemas de referência movendo-se com velocidades uniformes são equivalentes. Tais sistemas de referência, que estão em repouso ou se deslocam com velocidade uniforme, são denominados de referenciais inerciais. Logo, se as equações de movimento são válidas em um referencial inercial, também serão válidas em qualquer outro sistema de coordenadas que se mova com velocidade constante em relação a este referencial. Podemos expressar esta propriedade da equação 6.6, dizendo que as equações do
238
movimento de Newton permanecem invariantes na forma, ou covariantes em relação a translações uniformes dos sistemas de coordenadas. Se o referencial S´ tem velocidade uniforme na direção x e, em t = 0 , as origens das coordenadas eram coincidentes, a transformação do sistema S´ para o sistema S obtém-se a partir das equações 6.2,
x´= x − vot , (6.8)
y´= y, z´= z , t´= t.
Note que os intervalos de tempo medidos nos dois referenciais são iguais (t´= t ) , independentemente do movimento relativo entre eles, pois adotamos a definição Newtoniana de tempo absoluto. Ou seja, se você estiver em um avião com velocidade uniforme, quando seu relógio acusar a passagem de 1 minuto, o relógio de seu colega que está em terra também irá marcar a passagem de 1 minuto. O movimento uniforme do avião não afeta medidas de intervalo de tempo para quem está nele, em relação a quem ficou em terra. As equações 6.8 são conhecidas como as transformações de Newton-Galileu, que fornecem as transformações de coordenadas entre dois referenciais inerciais. E podemos enunciar o Princípio da Relatividade Newtoniana dizendo que as leis do movimento (as leis da mecânica) são invariantes frente a uma transformação de coordenadas de Newton-Galileu. O Princípio da Relatividade especial, proposto por Einstein, assegura que este princípio não está restrito à Mecânica, mas que é válido para todos os fenômenos físicos. Mais precisamente, a Relatividade especial é baseada em dois postulados; o postulado da invariância das leis da física em relação a referenciais inerciais e o postulado de que a velocidade da luz é constante (independe do referencial escolhido para medila), ou seja, a velocidade da luz é invariante em relação a referenciais inerciais. Não iremos considerar as conseqüências dos postulados da Relatividade especial neste curso. Outro fato importante é que, se analisarmos com cuidado as equações 6.8, iremos concluir que nenhuma experiência inteiramente realizada dentro de um referencial inercial será capaz de determinar a velocidade vo deste referencial. Se você estiver dentro de um avião com velocidade uniforme, nenhuma experiência inteiramente realizada lá dentro vai permitir determinar a velocidade do avião em relação à Terra. É necessário se comparar as medidas com outra realizada em outro referencial. Ou seja, se você conhece, na equação 6.8, por meio de medidas, apenas x´ no tempo t , mas não consegue
conhecer x por meio de medidas, não é possível determinar
Sistemas de Coordenadas em Movimento
v0 .
239
Quando o sistema S´ tem movimento acelerado a segunda lei de Newton torna-se
F = ma´+ mao , ma´= F − mao .
ou (6.9)
Que é a equação de movimento no sistema de referência acelerado. Podemos escrever no referencial acelerado,
F´= ma´= F − mao .
(6.10)
F ´= ma´ no sistema S´ , é similar à equação 6.5, F = ma , porém F ´≠ F devido ao termo −mao na equação 6.10. As-
A equação 6.10,
sim, a aceleração do sistema de referência é levada em conta pela adi ção do termo inercial − mao à força F . Termos inerciais nas equações de movimento são denominados de forças inerciais ou forças fictícias. Tais “forças” não têm origem na interação entre corpos, como forças gravitacionais, forças de atrito etc. A origem destas “forças” está na aceleração do sistema de referência adotado para se estudar o movimento dos corpos. Sistemas de referência que estejam acelerados são denominados de referenciais não inerciais, e nestes sistemas a segunda lei de Newton tem a forma da equação 6.10. Exemplo 1. Um bloco de madeira está em repouso sobre a superfície rugosa de uma mesa. Se a mesa for acelerada na direção horizontal, sob que condições o bloco deslizará? O sistema S´ é um referencial fixo na mesa e o sistema S é um referencial fixo no solo. Seja o coeficiente de atrito estático entre o bloco e a mesa. A força de atrito
F tem um valor máximo mg , onde m
é a massa do bloco. Para um observador que se desloca junto com a mesa, a condição para que ocorra deslizamento do bloco ( a´≠ 0) é que a força inercial
−mao exceda a força de atrito máxima, sendo ao a ace-
leração da mesa. Logo, a condição para que ocorra deslizamento é:
− mao > mg , ou
ao > g .
Assim, um observador que se desloca junto com a mesa vê o bloco deslizar no sentido oposto ao deslocamento da mesa. E para quem está em repouso no solo, o que acontece? Ora, se a aceleração da mesa for menor que g , quem está em repouso no solo vê a mesa e o bloco se moverem juntos. Mas, se
ao > g , quem está em repouso no solo vê o
bloco permanecer em repouso enquanto a mesa desliza de forma acelerada por baixo dele. Este exemplo deve lembrar a você o truque de se
240
puxar rapidamente uma toalha sobre uma mesa sobre a qual temos alguns objetos. Se imprimirmos uma aceleração à toalha maior que g , removemos a toalha sem movimentar os objetos sobre ela. Exemplo 2. Um pêndulo de massa
m está fixo no teto de um vagão
de trem, como se mostra na figura 6.2. Admita que o trem tenha uma aceleração ao para a direita (direção + x ). Um observador não-inercial, alguém dentro do vagão (figura 6.2a), vê o pêndulo suspenso, formando um ângulo com a vertical. Ele acredita que o pêndulo permanece
Fx ´ que atua a0 em todos
suspenso dessa maneira devido à força inercial
os objetos em seu sistema de referência (figura 6.2b). Um observador inercial, isto é, em repouso em relação ao trem, percebe também que o pêndulo está suspenso, formando um ângulo com a vertical. Entretanto, este observador sabe que o pêndulo está suspenso dessa maneira porque uma força é necessária para fornecer ao pêndulo uma θaceleração ao . Pede-se, então, para calcular a aceleração Y` ao do trem segundo
F`x
o ponto de vista do observador inercial e, em seguida, que se mostre que, de acordo com o observador não-inercial, a força Fx ´= − mao é a X` responsável pelo fato do pêndulo formar um ângulo com a vertical. a) a0
b)
Y`
F`x
θ
T
T
a0
F`x
(b)
Y` X`
mg
X`
mgX`
X`
T
Y Figura 6.2 - (a) Pêndulo suspenso em um trem T acelerado conforme visto por: (b) um Y observador não inercial e (c) um observador inercial. a0 Primeiro, resolvemos o problema para a0 o observador inercial. Para este (c) figura 6.2c): observador, a segunda lei de Newton fornece (veja (c) mg Ou, em componentes,
∑XF = ma .
mgi
Tsen = mao ,
Sistemas de Coordenadas em Movimento
i
X`
T
Y Y`
Y`
mg c)
a0
θ
T
Y`
X
T cos − mg = 0 .
241
mg (b)
(c) X
Logo, ao = gtg , e, portanto, o observador inercial conclui que o pêndulo faz um ângulo com a vertical devido à aceleração do trem na horizontal e uma força é necessária para acelerá-lo. Esta força é a componente x da tensão T no fio de suspensão do pêndulo. A aceleração é, então, proporcional à tangente do ângulo de deflexão e o pêndulo serve, assim, como um acelerômetro linear. Já o observador não-inercial simplesmente verifica que o pêndulo está em repouso, fazendo um ângulo com a vertical. Ele conclui que (veja figura 6.2b):
∑ F ´ = ma´= 0 , i
i
Tsen − Fx ´= 0 ,
ou
e, portanto,
T cos − mg = 0 ,
Fx ´= mgtg . Isto é, para este observador, as forças estão
equilibradas e o pêndulo faz um ângulo com a vertical devido à força inercial Fx ´( = − mao ) . De fato, se o observador dentro do trem efetuar alguns experimentos dentro do vagão, ele irá concluir que em todos os casos haverá sempre uma força atuando sobre os objetos, deslocando-os para a esquerda com uma aceleração ao , além da força gravitacional na direção vertical. Exemplo 3. Dois astronautas estão de pé em uma espa çonave cuja aceleração é ao e na ausência de qualquer campo gravitacional. Veja a figura 6.3. O astronauta 1 joga uma bola de massa m diretamente para o astronauta 2, que está afastado 10 metros do primeiro. Qual deve ser a velocidade inicial da bola para que ela atinja o astronauta 2 antes de atingir o chão da espaçonave? Admita que o astronauta 1 jogue a bola de uma altura h = 2 metros em
h
a0
Y`
Y X
X`
relação ao chão da espaçonave. Resolva este problema do ponto de vista de um observador no interior da espaçonave (observador não-inercial) e do ponto de vista de um observador fora da espaçonave (observador inercial). Para qualquer observador no interior da espaçonave, exis te uma força − mao atuando sobre os objetos (inclusive sobre o próprio observador). Logo, para um observador na espaçonave, temos: ••
m x´= 0 , Figura 6.3 - Dois astronautas jogando uma bola em uma nave acelerada.
242
••
m y´= −mao .
Integrando-se com as condições iniciais, velocidades iniciais
•
x´(t = 0) = 0 , y´(t = 0) = h e
•
y´(t = 0) = 0 e x´(t = 0) = v0 x , vem: x´(t ) = v 0 x t ,
y´(t ) = h − 12 aot 2 .
De modo que a equação da trajetória neste sistema é,
x´ y´= h − 12 ao v
0x
2
.
Assim, no sistema S´ , a trajetória da bola será uma parábola, já que não há forças atuando na horizontal. Considerando que y´= 0 quando x´ é igual a 10 metros, vem:
v0 x = 10
ao . 2h
Se a aceleração da espaçonave é de é
ao = g = 9,8 m/s 2 , o resultado
v0 x = 15, 6 m/s . Note que, para os astronautas no interior da es-
paçonave, tudo se passa como se existisse um campo gravitacional
g = −ao . E neste caso, sobre cada astronauta atua uma força inercial −mA ao = −mA g (onde mA é a massa do astronauta).
Já para um observador inercial, a descrição do que ocorre é diferente. Para ele, a bola segue em linha reta após ser lançada, e o chão da espaçonave, que está acelerado para cima, intercepta a bola depois de algum tempo. Na figura 6.4 mostra-se a posição vertical da bola e do chão do foguete como função do tempo. Tanto a bola como o foguete têm a mesma velocidade inicial para cima, v0 y , no instante que o astronauta 1 lança a bola para o astronauta 2.
y
y = voy t + 0,5aot² y = h + voy t
tF
t
Figura 6.4 - Posição vertical da bola e posição vertical do chão do foguete, segundo um observador inercial.
Sistemas de Coordenadas em Movimento
243
A interseção das duas curvas fornece o instante em que a bola atinge o chão do foguete. A posição vertical da bola em cada instante é
yb = h + v0 y t , enquanto que a posição vertical do chão do foguete é 1 yF = v0 y t + aot 2 . A bola atinge o chão do foguete ( yb = yF ) no ins2 tante t F , 1 h + v0 y t F = v0 y t F + aot F2 2 . t F = 2h / ao , e como durante este tempo a bola percorre na horizontal a distância x =10 metros, obtemos,
Logo,
v0 x = x / t F = x / 2h / ao = 10 ao / 2h . Portanto, os dois observadores calculam a mesma velocidade horizontal de lançamento da bola. Note que a análise é mais simples para um observador não-inercial (dentro da espaçonave). De fato, como comentamos anteriormente, os astronautas estão sob a ação da força inercial
−mao , que gera a mesma sensação física da força peso. Disso, podemos
perceber que um campo gravitacional pode ser simulado por um sistema de referência acelerado. Este fato foi enunciado por Einstein como o princípio da equivalência, o qual estabelece que a força gravitacional experimentada por qualquer corpo próximo de uma grande massa (como a Terra) é a mesma que a força inercial experimentada pelo corpo em um referencial não-inercial (sistema de coordenadas acelerado). Ou seja, como você já sabe de capítulos anteriores, isto significa a equivalência entre massa inercial e massa gravitacional ( mi = mg = m) .
6.2 Sistemas de coordenadas em rotação Para que possamos discutir os efeitos devidos à rotação de um sistema de coordenadas, vamos considerar um sistema de referência fixo
S e um sistema S´ em rotação, de maneira que as origens O e O´ dos
dois sistemas sejam sempre coincidentes. Os vetores unitários dos dois sistemas são iˆ, ˆj , kˆ para o sistema S e iˆ´, ˆj´ , kˆ´ para o sistema
S´ , como se mostra na figura 6.5.
244
Y
P X`
r=
r`
Y` ˆj ` ˆj
Z
iˆ ` X
0 ˆ kˆ ` i ˆ k Z`
Figura 6.5 - Sistema de coordenadas fixo S e sistema girante S´ .
P no espaço é dada pelo vetor r no sistema S e pelo vetor r ´ no sistema S´ . Mas, como as origens dos dois siste mas coincidem, o vetor r é o mesmo nos dois sistemas, isto é, r = r ´ . A posição de um ponto
Somente as componentes são diferentes ao longo dos diferentes eixos. Escrevendo estes vetores em termos dos vetores unitários, temos:
r = xiˆ + yjˆ + zkˆ e Como
r ´= x´iˆ´+ y´ ˆj´+ z´kˆ´ .
r = r ´ , isto significa que: xiˆ + yjˆ + zkˆ = x´iˆ´+ y´ ˆj´+ z´kˆ´ .
(6.11)
Ao efetuarmos a derivada com relação ao tempo nos dois membros da equação 6.11, devemos levar em conta que os vetores unitários iˆ´, ˆj´ ,
kˆ´ não são constantes, pois eles acompanham a rotação do sistema de coordenadas S´ . Assim, tomando-se a derivada temporal da equação 6.11, vem:
(6.12)
dx dy dz dx´ dy´ dz´ diˆ´ djˆ´ dkˆ´ iˆ + ˆj + kˆ = iˆ´ + ˆj´ + kˆ´ + x´ + y´ + z´ . dt dt dt dt dt dt dt dt dt
O primeiro membro desta equação é o vetor velocidade no sistema
S , e o primeiro termo do segundo membro é o vetor velocidade no sistema S´ , ou seja, (6.13)
dx v = iˆ + dt
ˆj dy + kˆ dz dt dt
e
dx´ dy´ dz´ v´= iˆ´ + ˆj´ + kˆ´ , dt dt dt
assim, podemos escrever a equação 6.12 como:
Sistemas de Coordenadas em Movimento
245
diˆ´ djˆ´ dkˆ´ v = v´+ x´ + y´ + z´ . dt dt dt
(6.14)
Os últimos três termos no lado direito desta equação representam a velocidade devida à rotação do sistema de coordenadas S´ e devemos determinar como as derivadas temporais dos vetores unitários
kˆ´ estão relacionadas a esta rotação.
iˆ´, ˆj´ ,
Em qualquer instante, a rotação do sistema S´ é especificada pelo eixo de rotação e pela velocidade angular em torno deste eixo. Considere que o eixo de rotação seja especificado pelo vetor unitário nˆ e
seja velocidade angular em torno deste eixo. O produto nˆ é o vetor velocidade angular de rotação do sistema:
= nˆ .
(6.15)
O sentido do vetor velocidade angular é dado pela regra da mão direita, similar à definição do produto vetorial, como se mostra na figura 6.6.
ω Z` k` 0 i`
Y`
n
X`
Figura 6.6 Vetor velocidade angular de um sistema de coordenadas girante.
Para
que
possamos
determinar
as
derivadas
temporais
diˆ´/ dt , djˆ´/ dt , e dkˆ´/ dt , considere a figura 6.7, que mostra a variação ∆iˆ´ devido a uma pequena rotação ∆ do vetor unitário iˆ´ em torno
do eixo de rotação.
ω ∆θ ^ ∆i`
φ 0` Figura 6.7 - Variação no vetor unitário
246
iˆ´
^ i` devida a uma pequena rotação
∆ .
Para facilitar a visualização, na figura 6.7 omitimos os vetores ˆj´ e kˆ´ . A partir desta figura, pode-se ver que o módulo de ∆iˆ´ é, aproximadamente,
∆iˆ´ ≅ (sen)∆ ,
(6.16)
o ângulo entre os vetores iˆ´ e . A rotação de um ângulo ∆ ocorre num intervalo de tempo ∆t , e assim,
sendo
diˆ´ ∆iˆ´ d = lim = sen = (sen) . dt ∆t →0 ∆t dt A figura 6.7 mostra que ∆iˆ´ é perpendicular a ambos os vetores e iˆ´ e, conseqüentemente, a partir da definição do produto vetorial, (6.17)
podemos escrever a equação 6.17 na forma vetorial, isto é, a taxa de variação temporal do vetor unitário iˆ´ como sendo igual ao produto vetorial entre o vetor velocidade angular e o próprio vetor
iˆ´ ,
diˆ´ ˆ = ω× i ´ . dt
(6.18)
Usando o mesmo procedimento para os outros dois vetores unitários, encontramos:
djˆ´ ˆ = ω× j´ , dt
dkˆ´ ˆ = ω× k´ . dt
Agora podemos reescrever o segundo termo do segundo membro da equação 6.14 como:
x´
diˆ´ djˆ´ dkˆ´ + y´ + z´ = x´( × iˆ´) + y´( × ˆj´) + z´( × kˆ´) dt dt dt = × ( x´iˆ´+ y´ ˆj´+ z´kˆ´)
(6.19)
= × r´ .
Esta é a velocidade do ponto
P devida unicamente à rotação do siste-
ma de coordenadas S´ . Usando o resultado dado na equação 6.19 na equação 6.14, podemos reescrever a vetor velocidade como: (6.20)
v = v´+ × r ´ .
Que podemos escrever de forma mais explícita:
(6.21)
d dr dr ´ = + × r ´= + × r ´ . dt S dt S ´ dt S ´
Sistemas de Coordenadas em Movimento
247
Este resultado mostra que a operação de diferenciação do vetor posição com respeito ao tempo no sistema fixo ( S ) é equivalente a esta
( S´) mais a operação x . A equação 6.21 é facilmente demonstrável para qualquer vetor Q , isto é,
operação no sistema em rotação
dQ dQ = + × Q . dt S dt S ´
(6.22)
Podemos aplicar o resultado 6.22 para o vetor momento linear, vetor momento angular, vetor velocidade etc. No caso do vetor velocidade, vem:
d dv dv (6.23) = + ω× v = (v´+ ω× r ´) + ω× (v´+ ω× r ´) , dt S dt S ´ dt S ´ onde usamos a equação 6.20. A equação 6.23 pode ser escrita como:
dv dv´ d = + ( × r ´) + × v´+ × ( × r ´) , dt S dt S ´ dt S´ ou
dv dv´ d dr ´ (6.24) = + × r ´+ × + × v´+ × ( × r ´) dt S dt S ´ dt S ´ dt S ´ Agora lembramos que:
d • d d = + × = = , dt S dt S ´ dt S ´
(6.25)
isto é, a equação 6.25 mostra que não existe distinção entre calcularmos a derivada temporal do vetor velocidade angular no sistema fixo ou no sistema em rotação.
Como v´= dr ´/ dt e a´= dv´/ dt , a equação 6.24 pode ser reescrita como: (6.26)
• a = a´+ × r ´+2 × v´+ × ( × r ´) ,
equação que fornece a aceleração no sistema fixo em termos da posição, velocidade e aceleração no sistema em rotação. Naturalmente, se as origens O e O´ dos sistemas S e S´ não forem coincidentes e
o sistema S´ , além do movimento de rotação, tiver também um movimento de translação acelerado, as equações 6.20 e 6.26 incluirão a velocidade ( vo ) e aceleração ( ao ) do sistema S´ , isto é, (6.27) (6.28)
248
v = v´+ × r ´+vo , • a = a´+ × r ´+2 × v´+ × ( × r ´)+ao .
Na equação 6.26 o segundo membro contém, além da aceleração a´ da • partícula no sistema S´ , mais três termos. O termo × r ´ é denominado de aceleração transversa, pois é perpendicular ao vetor posição
r ´ e só está presente se o sistema girante apresentar uma aceleração • • angular . Iremos tratar apenas de situações em que = 0 . O termo 2 × v´ é conhecido como aceleração de Coriolis, que é perpendicular a v´ , e o termo × ( × r ´) é o termo centrípeto que aponta para o
centro da trajetória. Na figuras 6.8, se mostram as várias componentes da equação 6.26 para uma partícula movimentando-se no plano
xy , em um sistema de coordenadas em rotação não-uniforme. Z` ω
ω o`
Y` ω×(ω×r`)
2ω×v`
r`
X`
v`
-ω×r´
Figura 6.8 - As componentes transversa, de Coriolis e centrípeta da aceleração.
Exemplo 4. Um disco de raio R0 rola em linha reta em uma superfície horizontal, deslocando-se com velocidade vo . Qual é a aceleração de
P qualquer da borda do disco em relação ao solo? A figura 6.9 mostra o disco e o sistema de coordenadas S´ fixo no disco que rola. um ponto
Z`
Z
P r` 0`
v0 0
ω
X`
Y`
R0 Y
X Figura 6.9 Sistema de coordenadas girante fixo em um disco que rola em um plano. Sistemas de Coordenadas em Movimento
249
Como podemos escolher qualquer ponto, escolhemos o ponto P sobre o eixo Z ´ , como indicado na figura 6.9. No sistema S´ , temos r ´= R0 kˆ´ ,
vo ˆ • • •• ˆ v´= r ´= 0 e a´= v´= r ´= 0 , e a velocidade angular é = i ´= i ´ . No R0 sistema S , fixo no solo, calculamos a aceleração do ponto P do disco
usando a equação 6.28, que agora se reduz a:
a = × ( × r ´) , pois os demais termos são nulos. Assim,
v2 a = iˆ´× (iˆ´× R0 kˆ´)=iˆ´× (iˆ´× kˆ´) o , R0 vo2 vo2 ˆ ˆ ˆ a =(i ´× (− j´)) = − k´ R0 R0 Ou seja, como esperado, a aceleração centrípeta aponta para o centro do disco. Exemplo 5. Vamos considerar agora que o disco, em vez de se deslocar em uma linha, esteja descrevendo uma trajetória circular de raio
R , conforme se ilustra na figura 6.10. Qual é a aceleração do ponto P
em relação a um referencial fixo no solo com origem O no centro da trajetória circular do disco? Z`
P
� v0
v0 2 R0
o` ω1 R0
X`
Y` � v0 ˆ ω1 = i ` R
R � ω
�� v ω = o kˆ` R
Figura 6.10 - Disco rolando em um plano ao longo de uma trajetória circular.
Agora, o sistema girante S´ descreve uma trajetória circular de raio
vo2 ˆ R , de modo que sua aceleração é ao = i ´ e sua velocidade angular R
250
v = o kˆ´ . Do exemplo 4, sabemos que qualquer ponto da borda do R v2 disco tem uma aceleração o apontado para a origem O´ (veja figuR0 ra 6.10) e isto significa que, no sistema S´ , a aceleração a´ do ponto v2 •• P é a´= r ´= − o kˆ´ e a velocidade deste ponto é v´= −vo ˆj´ . Portanto, R0 o termo de Coriolis é:
v v2 2 × v´= 2 o kˆ´× (−vo ˆj´) = 2 o iˆ´ , R R
e a parte centrípeta é:
v2 × ( × r ´)= o2 kˆ´× (kˆ´× Rkˆ´) = 0 . R Como a aceleração angular é nula, a equação 6.28 aplicada para a aceleração do ponto P em relação ao solo se reduz a:
v2 v2 v2 a = a´+2 × v´+ ao = − o kˆ´+2 o iˆ´+ o iˆ´ , R0 R R ou
v2 v2 a = 3 o iˆ´− o kˆ´ . R R0
Note que, se o raio da trajetória circular for muito maior que o raio do disco ( R >> R0 ) , isto é, se a trajetória é praticamente retilínea
( R → ∞) , o resultado acima se reduz ao do exemplo anterior.
6.3 Dinâmica em Sistemas em Rotação Para se obter a força sobre uma de massa m em um refe partícula rencial não-inercial, usamos F = ma , onde a aceleração é dada pela equação 6.28, isto é, (6.29)
• F = ma = ma´+ m × r ´+2m × v´+ m × ( × r ´)+mao ,
e, portanto, no referencial em rotação, (6.30)
• ma´= F − m × r ´−2m × v´− m × ( × r ´) − mao .
O que mostra de forma clara que, para um observador no referencial não-inercial a força ma´ é devida à força F , que tem origem na interação entre corpos (quer dizer força gravitacional, força de atrito, força elétrica, força magnética etc) e também é devida a forças inerciais Sistemas de Coordenadas em Movimento
251
que não têm origem na interação entre corpos, sendo que sua origem está no fato de que o sistema de referência está acelerado. Podemos escrever a equação 6.30 como:
ma´= F + Ft + FCo + FCe − mao ,
(6.31) onde:
F → Força devida a interações entre corpos. • Ft = −m × r ´ → Força transversa, perpendicular ao vetor r ´ . Só está presente quando o sistema tem aceleração ou desaceleração angular.
FCo = −2m × v´ → Força de Coriolis, perpendicular ao vetor v´ . Sua
origem está no deslocamento da partícula, com velocidade v´ , no sistema em rotação.
FCe = −m × ( × r ´) → Força Centrífuga, com direção radial,
apontando para fora do eixo de rotação.
−mao → Força inercial devido à aceleração do sistema em seu movimento de translação. Na figura 6.11, estão indicadas as forças inerciais que atuam em uma partícula num sistema girante. Nesta figura, o sistema em rotação tem uma desaceleração angular
•
( < 0) e a partícula está se deslocando
em um plano, como indicado. Observe que a força de Coriolis deflete a partícula segundo um ângulo reto com a direção do movimento.
Z` ω
ω> v´) , podemos tomar d ≥ g / 2 . Por exemplo, se a velocidade do inseto for de 2 mm/s e o disco girar a 30 rotações por minuto ( radianos por segundo), com um coeficiente de atrito de = 0, 4 , o inseto irá percorrer uma distância aproximada de 40 cm antes de começar a 2 deslizar. Note que, como d depende de 1/ , se dobrarmos a velociSe a velocidade do inseto for baixa aproximadamente
dade do disco, a distância será reduzida quatro vezes.
6.4 Efeitos Estáticos e Dinâmicos devido à Rotação da Terra Devido à rotação da Terra, um sistema fixo nela é um sistema girante e, portanto, um referencial não-inercial. Entretanto, a velocidade an-5 gular da Terra é ω = 2π / 86.400 = 7, 27 x10 rad/s e, logo, os efeitos esperados devem ser pequenos. Iremos considerar, de início, efeitos estáticos e, em seguida, dinâmicos.
6.4.1 Efeitos estáticos Vamos analisar, como exemplo de efeito estático resultante da rotação da Terra, o fio de prumo, que usualmente é utilizado para definir a direção “vertical”, isto é, perpendicular à superfície da Terra. Vamos descrever esta situação estática usando um sistema de referência girante com origem no centro da Terra e analisando as forças sobre o ‘peso’ do fio de prumo, cujo ‘peso’ tem massa m e que gira com a
Terra. Assim, escolhemos o referencial girante S´ para descrever as forças que atuam sobre o fio de prumo. A figura 6.13 a e b mostram as forças atuantes no peso do fio de prumo no hemisfério norte e hemisfério sul, respectivamente. Nesta figura, é a latitude geocêntrica e especifica a posição do fio de prumo em relação ao Equador.
Sistemas de Coordenadas em Movimento
257
ω T
N
- mω (ω r)
Rcosλ
mg λ
ο mg
(a) HN
mge Equador
mge - mω (ω r )
S
T (b) HS
Figura 6.13 - Forças atuantes no peso do fio de prumo: (a) HN - Hemisfério Norte (b) HS - Hemisfério Sul.
As forças são as forças peso mg , a tensão atuantes no fio de prumo no fio T e a força centrífuga − m × ( × r ´) , onde r ´= Rrˆ´ , sendo R o
rˆ´ um vetor unitário na direção radial. Como no siste-
raio da Terra e
ma girante o fio de prumo está em repouso, a equação 6.31 fornece:
ma´= 0 = T + mg − m × ( × Rrˆ´) ,
(6.33)
T = −m( g − × ( × Rrˆ´)) .
(6.34)
E assim, a direção do fio de prumo (na vertical) tem a direção da ace leração efetiva da gravidade, g e = g − × ( × R rˆ´) , e não a radial, que é a direção de
g . A superfície de um líquido em equilíbrio é perpen-
g e e um corpo largado de certa altura tem aceleração inicial g e . Também a superfície da Terra tende a ser perpendicular a g e , o
dicular a
que colabora para a sua forma de um elipsóide achatado nos pólos (o raio equatorial da terra é apenas 21km maior que o raio polar). Podemos ver, entretanto, que a correção é pequena, pois:
× ( × r ´) = 2 R cos .
(6.35) No 2
Equador,
-2
esta 2
contribuição -3
tem
valor
máximo,
ω R = 3,38 x10 m/s = 3, 45x10 g , ou seja, uma correção que cor2 responde a apenas 0,34% do valor local (9,80 m/s ) da aceleração da gravidade. Isto acarreta numa pequena diferença entre a direção radial
258
e a direção vertical. Na figura 6.13a, vê-se claramente que este desvio é para o sul no hemisfério norte, enquanto que a figura 6.13b mostra que este desvio é para o norte no hemisfério sul. Note que, no Equador e nos pólos, a direção vertical coincide com a direção radial. Nos pólos, porque r ´/ / , e no Equador porque o termo centrífugo é antiparalelo a
g . Para se obter o desvio, considere o ângulo entre os vetores g e
g e , como mostra a figura 6.14.
ε
mg
mge
λ
Rω2cosλ Figura 6.14 - Desvio
na linha do fio de prumo.
Aplicando-se a lei dos senos, vem: (6.36)
sen sen = , R cos ge
(6.37)
2 Rsen2 sen = . 2 ge
2
( = ± / 2) e no Equador ( = 0) , tendo um valor máximo para = / 4 . Como o
Note que, como esperado, o desvio anula-se nos pólos
ângulo é muito pequeno, podemos aproximar o seno do ângulo pelo ângulo (em radianos), de modo que para = / 4 , temos somente
ε ≅ ω2 R / 2 g ≅ 1, 7 x10−3 radianos ≅ 0,10 de desvio. Note que, por último, ignoramos a pequena diferença entre g e g e no cálculo do ângulo de desvio. Obviamente, esta não é uma análise precisa, pois consideramos que o valor local de g seja constante, o que não é verdade, pois a Terra não tem a forma esférica, e assim o valor local de
g varia com a latitude.
Ademais, grandes depósitos de minérios e/ou montanhas podem afetar o valor local da gravidade, logo, não é possível, sem esta informação, obter o desvio preciso de forma teórica. Porém, estas variações acarretam em diferenças muito pequenas nos desvios, de maneira que, para fins práticos, a equação 6.37 fornece o desvio com precisão suficiente.
6.4.2 Efeitos dinâmicos Para analisarmos os efeitos dinâmicos devido à rotação da Terra no movimento de uma partícula, vamos escolher um referencial na su-
Sistemas de Coordenadas em Movimento
259
perfície da Terra com o eixo z´ na vertical, o eixo x´ na direção leste e o eixo y´ na direção norte. A figura 6.15a mostra o referencial adotado quando se analisa o movimento da partícula no hemisfério norte. Para considerarmos o movimento no hemisfério sul, basta trocar → − .
ω Norte Y`
N
Equador
R o λ
ω Z` Vertical
o`
N
X` Leste
ω2Rcosλ = ao o`
ο
Equador
λ R
S (a)
S
Y` Nor te
Z`
ω ωco
sλ
λ
nλ ωse
(b)
te
Les X`
(c) Figura 6.15 - (a) Referencial S´ fixo na superfície da Terra. (b) Aceleração centrípeta do referencial S´ . (c) Componentes de no referencial S´ .
Como o referencial S´ escolhido está na superfície da Terra, ele tem uma aceleração ao = × ( × Rrˆ´) em relação a um referencial inercial com origem no centro da Terra e que está fixo (que não gira com a Terra). Isto é, a origem O´ do referencial S´ está descrevendo uma trajetória circular de raio R cos e tem, portanto, uma aceleração
ao = 2 R cos . Veja a figura 6.15 b. Assim, a equação 6.31 fornece a equação de movimento para uma partícula de massa m no referencial S´ : centrípeta
(6.38) onde
•• • m r ´= F + mg − mao − 2m × r ´− m × ( × r ´) ,
F é alguma força de interação, como por exemplo, a força devido
à resistência do ar. Note que a equação 6.38 se reduz à equação 6.34
260
para o fio de prumo. Basta colocar aorigem O´ no peso do fio de prumo (r ´= 0) e, no caso, F é a tensão T no fio de prumo. E como ele está
em repouso no referencial S´ ( r ´= 0 e r ´= 0) , vem T = − m( g − ao ) , que é a equação 6.34. Isto mostra que a direção vertical (eixo ) do sistema S´ tem a direção de superfície da Terra, vem que
g e . Considerando o movimento próximo à r ´