20pp - Uma teoria evolucionaria

July 4, 2019 | Author: André Luís | Category: Economia, Macroeconomia, Ciência, Economias, Ciência cognitiva
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Economia...

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UMA TEORIA EVOLUCIONÁRIA DA MUDANÇA ECONÔMICA

Universidade Estadual de Campinas Reitor Fernando Ferreira Cost Co sta a Coordenador Geral da Universidade Edgar Salvadori De Decca

Conselho Editorial Presidente Paulo Franchetti Alcir Pécora – Christiano Lyra Filho – José A. R. Gontijo  José Robert Roberto o Zan – Marcelo Marcelo Knobel – Marco Marco Anto Antonio nio Zago Zago Sedi Hirano – Silvia Hunold Lara

Comissão Editorial da Coleção Clássicos da Inov Inovação ação Carlos H. de Brito Cruz – Sérgio Queiroz Américo Martins Craveiro – Tamás Szmrecsányi – Marcelo Knobel Conselho Consultivo da Coleção Clássicos da Inovação Tamás Szmrecsányi (coordenador) Szmrecsányi (coordenador) – Adriano Dias Batista – Eduardo Albuquerque Eliane Bahruth – Fábio Erber – Guilherme Ary Plonski – Jair do Amaral Filho – João Carlos Ferraz  José Carlos Ca Caval valcanti canti – José Mig Miguel uel Chaddad – Lui z Martins – Mári Mário o Po ssas – Monica Teixe Teixeira ira Paolo Saviotti – Roberto Vermulm – Ruy Quadros de Carvalho – Sergio Bampi

Richard R. Nelson Sidney G. Winter

UMA TEORIA EVOLUCIONÁRIA DA MUDANÇA ECONÔMICA

ficha catalográfica elaborada pelo sistema de bibliotecas da unicamp diretoria de tratamento da informação

N336t

Nelson, Richard R., 1930Uma teoria evolucionária da mudança econômica / Richard R. Nelson e Sidney G. Winter; tradutora: Cláudia Heller – Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2005. (Clássicos da Inovação) Tradução de: An evolutionary theory of economic change. 1. Economia. 2. Desenvolvimento econômico. 3. Desenvolvimento organizacional. I. Winter, Sidney G. II. Título. cdd

  isbn 85-268-0712-9  

330 338.9 658.406

Índices para catálogo sistemático:  

1. Economia 2. Desenvolvimento econômico 3. Desenvolvimento organizacional

330 338.9 658.406

An evolutionary theory of economic change Original work copyrigt © 1982 by the President and Fellows of Harvard College Published by arrangement with Harvard University Press Copyright da tradução © 2005 by Editora da Unicamp 1a reimpressão, 2012 Nenhuma parte desta publicação pode ser gravada, armazenada em sistema eletrônico, fotocopiada, reproduzida por meios mecânicos ou outros quaisquer sem autorização prévia do editor.

Editora da Unicamp Rua Caio Graco Prado, 50 – Campus Unicamp CEP 13083-892 – Campinas – SP – Brasil Tel./Fax: (19) 3521-7718/7728 www.editora.unicamp.br – [email protected] 

SUMÁRIO

PREFÁCIO................................................................................ Parte I



 – VISÃO GERAL E MOTIVAÇÃO

1

INTRODUÇÃO ....................................................................

17 

2

A NECESSIDADE DE UMA TEORIA EVOLUCIONÁRIA .............

45 

Parte II

 – FUNDAMENTOS TEÓRICO-ORGANIZACIONAIS

DA TEORIA ECONÔMICA EVOLUCIONÁRIA 3

OS FUNDAMENTOS DA ORTODOXIA CONTEMPORÂNEA ......

4

HABILIDADES ...................................................................... 115 

5

APTIDÕES E COMPORTAMENTO DAS ORGANIZAÇÕES ......... 149 

Parte III 6 7

85 

 – A TEORIA ECONÔMICA DO LIVRO-TEXTO REVISITADA

O EQUILÍBRIO SELECIONADO ESTÁTICO ............................. 209  RESPOSTAS DE FIRMAS E DE RAMOS A CONDIÇÕES ALTERADAS DE MERCADO ............................ 243

Parte IV 8

 – A TEORIA DO CRESCIMENTO

A TEORIA NEOCLÁSSICA DO CRESCIMENTO: UMA CRÍTICA.. 287 

9

UM MODELO EVOLUCIONÁRIO DE CRESCIMENTO ECONÔMICO ......................................... 303

10

O CRESCIMENTO ECONÔMICO COMO PURO PROCESSO DE SELEÇÃO ................................. 341

11

ANÁLISE ADICIONAL DA BUSCA E SELEÇÃO.......................... 357 

Parte V 12 13

14

 – CONCORRÊNCIA SCHUMPETERIANA

CONCORRÊNCIA DINÂMICA E PROGRESSO TÉCNICO ......... 399  FORÇAS GERADORAS E LIMITANTES DA CONCENTRAÇÃO SOB CONCORRÊNCIA SCHUMPETERIANA........................... 443 O TRADE-OFF SCHUMPETERIANO REVISITADO ................... 471

Parte VI

 – BEM-ESTAR E POLÍTICA ECONÔMICA

15

A ECONOMIA NORMATIVA DE UMA PERSPECTIVA EVOLUCIONÁRIA .......................................... 503

16

A EVOLUÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS E A FUNÇÃO DA ANÁLISE ..................................... 525 

Parte VII 17

 – CONCLUSÃO

RETROSPECTO E PERSPECTIVAS.......................................... 563

BIBLIOGRAFIA ......................................................................... 587  LISTA DE FIGURAS .................................................................... 611 LISTA DE TABELAS .................................................................... 613 ÍNDICE REMISSIVO ................................................................... 615 

PREFÁCIO

Demos início a este livro há mais de uma década. Nossas discussões sobre a promessa e os problemas da modelagem evolucionária da mudança econômica datam de anos antes disso. Este livro representa para nós dois o ápice de um trabalho que se iniciou com nossas dissertações. Nossas orientações iniciais foram diferentes. Para Nelson, o ponto de partida era a preocupação com os processos de desenvolvimento de longo prazo. No início, essa preocupação concentrou-se na mudança tecnológica como força motora chave e na função da política como uma influência sobre o poder e sobre a direção daquela força. Para Winter, os focos iniciais estavam no poder e nas limitações dos argumentos evolucionários que apoiavam as visões padronizadas do comportamento da firma. Isso logo se ampliou para incorporar as questões metodológicas gerais sobre “teoria e realismo” em economia, as contribuições de outras disciplinas para a compreensão do comportamento da firma e a reconsideração do ponto de vista evolucionário como arcabouço possível para uma teoria econômica mais realista do comportamento da firma e dos ramos de atividades. A existência de sobreposições e inter-relações significativas entre essas 7

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áreas de interesse de pesquisa nos foi aparente desde o início de nossos contatos. Os estudos de Nelson sobre os detalhados processos de mudança tecnológica levaram-no a considerar o caráter incerto, tentativo, desordenado e errático desses processos – e a dificuldade de fazer justiça a essa realidade dentro do esquema teórico ortodoxo. No caso de Winter, um estudo sobre os determinantes dos dispêndios da firma em pesquisa e desenvolvimento formou o cenário empírico em que, pela primeira vez, ficou aparente que muito do comportamento da firma poderia ser mais rapidamente compreendido como um reflexo de hábitos gerais e orientações estratégicas vindas do passado, em vez de resultar de uma pesquisa detalhada dos ramos remotos de uma árvore de decisões que se estende para o futuro. Foi, entretanto, somente quando a colaboração que levou a este livro estava bem avançada que percebemos que seu propósito e promessa estavam bem definidos por duas relações entre nossas áreas de interesse. Primeiro, dentre muitos obstáculos para a compreensão do papel da mudança tecnológica na vida econômica, emergiu um importante subconjunto das restrições intelectuais associadas ao tratamento do comportamento da firma e dos ramos de atividades, subconjunto que agora se tornou padrão na teoria econômica. Segundo, dentre os muitos benefícios que podem derivar de uma abordagem teórica que reconcilia a análise econômica com as realidades da tomada de decisões das firmas, o mais importante diz respeito à compreensão aprimorada da mudança tecnológica e da dinâmica do processo competitivo. Nosso empreendimento intelectual cooperativo começou quando estávamos na RAND Corporation em Santa Mônica nos anos 1960. Muitas pessoas daquele lugar marcantemente estimulante e intelectualmente diversificado influenciaram nosso pensamento. Burton Klein merece uma menção especial. Ele nos transmitiu um corpo de verdades que foi muitas vezes reconhecido na história das idéias, mas que de alguma forma sempre precisa ser redescoberto, reinterpretado e persuasivamente ilustrado.A inteligência criativa no 8

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âmbito da tecnologia, assim como em outros, é autônoma e errática, compulsiva e caprichosa. Não permanece placidamente entre as restrições prescritivas e restritivas impostas aos que estão de fora do processo criativo, sejam eles teóricos, planejadores, professores ou críticos. Para progredir na tarefa de compreender para onde o mundo pode ser levado pelo pensamento criativo é útil, portanto, antes de mais nada, reconhecer que essa tarefa nunca pode ser completada. Nossa teoria evolucionária da mudança econômica tem esse espírito; ela não constitui uma interpretação da realidade econômica como um reflexo de “dados” supostamente constantes, mas um esquema que pode ajudar um observador suficientemente bem informado a olhar os fatos do presente para ver um pouco além da névoa que obscurece o futuro. Comprometemo-nos a escrever este livro depois que Nelson se mudou para Yale e Winter para Michigan. Durante alguns anos os problemas de co-autoria a longa distância impuseram custos significativos quanto à taxa de progresso do esforço colaborativo, mas também houve alguns benefícios na forma de oportunidades para testar  as idéias em fóruns oferecidos pelas duas universidades. (Obviamente, as companhias aéreas e de telefonia também obtiveram benefícios substanciais desse arranjo.) Com a mudança de Winter para Yale em 1976, os custos de comunicação caíram e começamos a levar mais a sério a idéia de apresentar nosso trabalho conjunto na forma de um livro. Esforços importantes nessa direção foram feitos em 1978 e 1979. Como nossas famílias, colegas e editores bem sabem, a fase “quase pronta” do projeto durou aproximadamente três anos. Nesse prolongado processo de pesquisa, recebemos apoio e assistência de diversas formas e de uma variedade de fontes.Tentaremos assumir os principais elementos de nossa dívida sob diversos títulos gerais, mas estamos desconfortavelmente conscientes de que algumas das listas estão longe de ser completas. Nossas maiores dívidas intelectuais são para com Joseph Schumpeter e Herbert Simon. Schumpeter apontou para o problema 9

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correto – como compreender a mudança econômica – e sua visão abrangeu muitos elementos importantes da resposta. Simon ofereceu uma série de inspirações específicas sobre o comportamento humano e o das organizações, que estão refletidas nos nossos modelos teóricos; o mais importante porém é que seu trabalho nos encorajou a ver que há muito mais a ser dito sobre o problema do comportamento racional no mundo da realidade do que aquilo que pode ser estabelecido na linguagem da teoria econômica ortodoxa. O apoio financeiro para o nosso trabalho veio de várias fontes. Uma importante subvenção da National Science Foundation (NSF), por intermédio de sua Divisão de Ciências Sociais, deu um impulso decisivo no estágio inicial. Parte da pesquisa mais recente relatada neste livro também foi apoiada pela NSF, por meio de uma subvenção de sua Divisão de Pesquisa e Análise. A Sloan Foundation, mediante uma subvenção para o Applied Microeconomics Workshop em Yale, foi uma fonte importante de apoio para nossas pesquisas durante os anos de intervalo entre as subvenções da NSF. Além disso, recebemos apoio financeiro e de outro tipo do Institute of Public Policy Studies (IPPS) de Michigan e da Institution for Social and Policy Studies (ISPS) de Yale. Os diretores dessas organizações durante o período em questão – J. Patrick Crecine e Jack Walker no IPPS,Charles E. Lindblom no ISPS  – merecem agradecimentos especiais pelo encorajamento e pela habilidade no complicado empreendimento de promover contato intelectual entre as disciplinas das ciências sociais. Em nossos esforços para desenvolver modelos computacionais simulados como um tipo de teoria evolucionária formal, temos dependido intensamente das contribuições de vários programadores e assistentes de pesquisa habilidosos.Tivemos a boa sorte de atrair para essa função indivíduos que se tornaram intelectualmente comprometidos com a substância de nossa empreitada, e que contribuíram por  meio de suas especialidades técnicas, com sugestões e críticas referentes à teoria econômica subjacente. O primeiro deles foi Herbert Schuette; suas contribuições para grande parte do trabalho relatado 10

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no Capítulo 9 levaram à sua inclusão como co-autor da principal publicação prévia daquele trabalho. Gostaríamos de reconhecer essas contribuições novamente agora. Stephen Horner e Richard Parsons fizeram a maior parte da programação original do nosso modelo de simulação da concorrência schumpeteriana, contribuindo com várias sugestões úteis para sua formulação. Larry Spancake nos ajudou a transferir aquele modelo para o computador de Yale. Abraham Goldstein e Peter Reiss seguiram seus passos como mantenedores do monstro em Yale, alimentando-o e treinando-o em resposta às nossas solicitações, e ajudando igualmente na análise, o que nos auxiliou a compreender seu comportamento. Muitos estudiosos ouviram nossas apresentações, leram nossos rascunhos e artigos e ofereceram conselhos, encorajamento e críticas. Nos seminários e conversas em Yale, aprendemos em particular com Susan Rose Ackerman, Donald Brown, Robert Evenson, Lee Friedman, Eric Hanushek, John Kimberly, Richard Levin, Richard Murnane, Guy Orcutt, Sharon Oster, Joe Peck, John Quigley e Martin Shubik. Nos anos que Winter passou em Michigan, recebemos benefícios semelhantes da interação com Robert Axelrod, Michael Cohen, Paul Courant, J. Patrick Crecine, John Cross, Everett Rogers, Daniel Rubinfeld, Peter Steiner, Jack Walker e Kenneth Warner. Um grande número de amigos e colegas de outros lugares também nos deu os benefícios de suas reações e sugestões em várias ocasiões. Queremos agradecer em particular a Richard Day, Peter Diamond, Avinash Dixit, Christopher Freeman, Michael Hannan, Jack Hirshleifer, James March, Keith Pavitt, Almarin Phillips, Michael Porter, Roy Radner, Nathan Rosenberg, Steve Salop, A. Michael Spende, David Teece e Oliver Williamson. À medida que nossa pesquisa progredia, nós a relatamos por artigos publicados em The Economic Journal , The Quarterly Journal of Economics, Economic Enquiry, Research Policy, The Bell Journal of Economics e The American Economic Review . Agradecemos às comissões editoriais dessas revistas por permitirem a utilização de partes de artigos ante11

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riores em capítulos deste livro; as citações específicas foram fornecidas nos capítulos em questão. Somos igualmente gratos à NorthHolland Publishing Co. por permitir o uso, no Capítulo 12, de material previamente publicado. Três pessoas – Richard Levin, Richard Lipsey e B. Curtis Eaton – fizeram-nos o grande favor de ler grandes partes do nosso manuscrito e de fazer comentários detalhados. Somos muito gratos a eles, e gostaríamos de tomar o especial cuidado de isentá-los da responsabilidade sobre o resultado final. Muitas outras pessoas ofereceram comentários úteis sobre partes do manuscrito; queremos agradecer em particular a Katherine Nelson e a Georgie Winter. A preparação da última versão digitada do manuscrito foi um processo perseguido pelo fantasma dos prazos ultrapassados. Sob essas circunstâncias estressantes, tivemos a sorte de nos beneficiar da espetacular habilidade em digitação de Margie Cooke. Em sua fase final, o projeto se beneficiou da nossa decisão de submeter o livro à Harvard University Press. O editor geral, Michael Aronson, ofereceu sugestões e encorajamento. Nossa editora, Maria Kawecki, fez o que pôde para aprimorar nossa prosa. Ela o fez com grande tato e com marcante perspicácia com relação ao que estávamos tentando dizer. Quaisquer erros e expressões infelizes ainda remanescentes constituem uma diminuta fração dos originais apresentados, e essa fração é amplamente tributável à teimosia dos autores, e não a qualquer incapacidade por parte da editoria de texto. Cada capítulo do livro tem sua própria história, e cada uma é quase complexa. O leitor informado poderá considerar que alguns capítulos parecem ser predominantemente de Nelson, outros de Winter. Mas, na maioria dos capítulos, nossas contribuições individuais estão completamente misturadas, e cada capítulo foi moldado pelas mãos de ambos os autores. Compartilhamos a responsabilidade pelo trabalho como um todo. Juntos, queremos isentar todos os nossos amigos e críticos da responsabilidade pelo produto, enquanto novamente expressamos nossa gratidão por seu interesse. No caso deste 12

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livro, essa isenção é mais do que um ritual, pois certamente há entre os aqui mencionados aqueles que consideram nosso esforço extremamente mal direcionado. Nossa colaboração não tem sido um segmento separado e autocontido de nossas vidas.Ao contrário, constituiu um meio de vida para nós mesmos e nossas famílias. Nossos filhos, pequenos quando começamos, cresceram com “o livro”. No início, este forneceu oportunidades para visitas entre New Haven e Ann Arbor. Nos anos recentes, o livro tem sido o tema de pano de fundo para férias em Cape Cod – ou talvez, em algumas ocasiões, as férias é que foram o pano de fundo. Estabelecemos uma virtual tradição de jantares de celebração marcando a “finalização” (de alguma etapa) do livro. Nossas famílias compartilharam de tudo isso conosco; sabemos que compartilham um sentimento de satisfação, alívio e até mesmo de surpresa de que ele esteja pronto.A elas dedicamos este livro.

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PARTE I

VISÃO GERAL E MOTIVAÇÃO

1 INTRODUÇÃO

Neste volume desenvolvemos uma teoria evolucionária das capacidades e do comportamento das empresas que operam em um ambiente de mercado, e construímos e analisamos modelos consistentes com essa teoria. Propomos que a ampla perspectiva oferecida pela teoria evolucionária é útil para analisar uma ampla gama de fenômenos associados à mudança econômica, seja em decorrência de deslocamentos das condições de demanda pelo produto ou da oferta de fatores, seja como resultante da inovação por parte das firmas. Por sua vez, os modelos específicos que construímos focalizam diferentes aspectos da mudança econômica – as respostas das firmas e dos ramos de atividades às condições alteradas do mercado, ao crescimento econômico e à concorrência através da inovação. Deduzimos disso as implicações tanto normativas quanto positivas de uma teoria evolucionária. A primeira premissa da nossa empreitada não deveria ser controversa: resume-se ao fato de que a mudança econômica é importante e interessante. Dentre as principais tarefas intelectuais do campo da história econômica, por exemplo, a compreensão da grande complexidade da mudança cumulativa na tecnologia e na organiza17

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ção econômica, que modificou a situação humana no decurso dos últimos séculos, constitui certamente a que mais vale a pena destacar. Dentre as questões de política que dizem respeito à economia mundial de hoje, nenhuma apresenta um mix mais crítico de perspectivas e perigos do que aquelas que refletem a ampla disparidade dos níveis atuais de desenvolvimento econômico e os constrangimentos que afetam sociedades que lutam para alcançá-lo. Ao mesmo tempo, nas economias mais avançadas, a modernização bem-sucedida trouxe à tona novas questões sobre a viabilidade ecológica de longo prazo das sociedades industriais avançadas, bem como renovadas questões sobre a relação entre o sucesso material e os valores humanos mais fundamentais. Os papéis da informação, da formação de expectativas por  parte dos atores econômicos, da análise do funcionamento dos mercados dada a presença de várias “imperfeições”, e novas versões de velhas questões sobre a eficiência dos sistemas de mercado têm figurado entre as preocupações centrais da teoria econômica dos anos recentes. Boa parte deste trabalho procura compreender, através de arranjos teóricos estilizados, o desenrolar dos eventos econômicos ao longo do tempo. Assim, qualquer avanço significativo na compreensão dos processos de mudança econômica pode lançar novas luzes sobre um espectro de questões intelectualmente desafiadoras que têm importantes conseqüências sociais. Esperamos, entretanto, que muitos dos nossos colegas economistas relutem em aceitar a segunda premissa do nosso trabalho – a de que uma grande reconstrução dos fundamentos teóricos de nossa disciplina constitui uma precondição para um significativo crescimento da nossa compreensão da mudança econômica. A teoria ampla que desenvolvemos neste livro e seus modelos específicos incorporam supostos básicos que diferem da prevalecente teoria ortodoxa do comportamento da firma e dos ramos de atividades.As firmas de nossa teoria evolucionária serão tratadas como motivadas pelo lucro e comprometidas com a busca de maneiras de aprimorar seus lucros, mas não se supõe que suas ações sejam maximizadoras de lucros em 18

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um conjunto de escolhas bem definidas e dadas. Nossa teoria enfatiza a tendência das firmas mais lucrativas de expulsar as menos lucrativas; no entanto, não focalizamos nossa análise em hipotéticos estados de “equilíbrio coletivo”, em que todas as firmas não-lucrativas desaparecem, e em que as lucrativas têm o tamanho desejado. Com relação a isso, a abordagem modelística que empregamos não utiliza o familiar cálculo maximizador para derivar equações que caracterizem o comportamento das firmas. Em vez disso, nossas firmas são modeladas simplesmente como tendo, a qualquer momento dado, certas capacidades e regras de decisão. Essas capacidades e regras se modificam ao longo do tempo, como resultado de esforços deliberados para a superação de problemas e de eventos aleatórios.Ao longo do tempo, o análogo econômico da seleção natural opera à medida que o mercado determina quais firmas são lucrativas e quais não o são, tendendo a separar as segundas. Alguns dos nossos colegas economistas compartilham conosco um sentimento de mal-estar generalizado que aflige a teoria microeconômica contemporânea.1 Sente-se amplamente que a disciplina ainda não encontrou uma trajetória capaz de levá-la a um avanço coerente e sustentado para além do território intelectual reivindicado pela moderna teoria do equilíbrio geral.Acredita-se que a descoberta dessa trajetória irá requerer uma acomodação teórica com um Vale a pena notar que, desde 1970, várias das palestras presidenciais anualmente proferidas perante a American Economic Association têm lamentado o estado da teoria econômica.A palestra de Leontief  (1971) está explicitamente preocupada com a incapacidade da teoria microeconômica de lidar com realidades empíricas. A de Tobin (1972) e a de Solow (1980) focalizam a macroeconomia, mas também estão substancialmente preocupadas com a adequação dos fundamentos teóricos que a microeconomia ortodoxa oferece à macroeconomia.Temas semelhantes foram evocados em conferências proferidas em outras organizações profissionais; ver, por exemplo, Hahn (1970), Phelps Brown (1972) e Worswick (1972). Esse sentimento de mal-estar também se reflete numa série de artigos-resenha do Journal of Economic Literature . Shubik (1970),Cyert & Hedrick (1972), Morgenstern (1972),Preston (1975), Leibenstein (1979), Marris & Mueller (1980) e Williamson (1991) reclamam explicitamente da incapacidade da teoria prevalecente de lidar com a incerteza, com a racionalidade limitada, com a presença de grandes corporações, com a complexidade institucional, ou com a dinâmica dos processos reais de ajustamento. Não pretendemos, nesta nota de rodapé, ou no livro como um todo, identificar todas as almas que se irmanam ao menos em seus diagnósticos superficiais do problema. Sabemos que a esse respeito fazemos parte de uma multidão. 1

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ou mais dos principais aspectos da realidade econômica reprimidos pela teoria do equilíbrio geral. Muito do trabalho teórico mais interessante das duas últimas décadas pode ser interpretado em termos de investigações exploratórias guiadas por uma variedade de conjecturas a respeito de quais são os possíveis ajustes mais importantes a serem feitos.Tem-se dado uma atenção considerável às imperfeições das informações e da concorrência, aos custos de transação, às indivisibilidades e aos retornos crescentes, e a algumas de suas inter-relações. Tem-se reconhecido que a austera descrição das instituições do capitalismo, feita pela teoria do equilíbrio geral, tornar-se-á lamentavelmente inadequada assim que se fizer qualquer desses ajustes à realidade – e, por sua vez, que os instrumentos institucionais verdadeiros, empregados em sistemas reais de mercado, constituem um objeto complexo e desafiador para o estudo teórico. Os frutos desses esforços exploratórios incluem uma grande quantidade de trabalhos, intelectualmente impressionantes em seus próprios termos, muitos diretamente úteis para a compreensão de certas porções da realidade econômica, e alguns que parecem ser de valor duradouro independentemente do curso futuro a ser tomado pela economia. Mas a grande maioria dessas conjecturas exploratórias tem dado continuidade (ou ao menos procura dar continuidade) a quase toda a estrutura conceitual básica que a ortodoxia oferece para a interpretação do comportamento econômico. Encaramos essa estrutura como um excesso de bagagem que restringirá seriamente o progresso teórico a longo prazo, não importando o quanto sua familiaridade e seu avançado estado de desenvolvimento possam facilitar esse progresso a curto prazo. Aqui, obviamente, nossa avaliação da situação é muito mais radical do que qualquer coisa que se possa associar ao “mal-estar generalizado” já referido. Acreditamos que aquilo que oferecemos neste livro constitui uma promessa plausível de que a reconstrução fundamental na linha que defendemos pode vir a estabelecer o cenário para um avanço importante na compreensão da mudança econômica – e, ao mesmo 20

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