18 - Guilhardi, J. H. (2006). Sobre Comportamento e Cognição (Vol. 18). Expondo a Variabilidade

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Sobre Comportamento e Cognição Expondo a variabilidade

• Hélio José Quilhardi Noreen Campbell de Aguirre

ESETèc

Sobre Comportamento e Cognição

Associação Brasileira dc Psicotcrapia e Medicina Comportamental Diretoria gestão 04/05 Presidente: I Iclio José Quilhardi Vice-presidente: Maria Martha da Costa i lübner 1asecretária: Patrícia Piaz/on Queiroz 2- secretária: Lilian R. Medeiros 1atesoureira: Marisa Isabel dos Santos dc Brilo «“ tesoureira: latiana l.ussari Ex-presidentes:

Bernard Pimentel Ran#è i lélio josc t/uilhardi Roberto Alves Banaco Rachel Rodrigues Kerbauy Maria Zilah da Silva Brandão

Sobre Comportamento e Cognição Expondo d Variabilidade

Volume 18 Organizado por I Iclio josc Quilhardi Norccn Campbell dc Aguirrc

ESETec Editores Associados

2006

Copyright O desta edição:

ESETec Editores Associados, Santo André, 2006. Todos os direitos reservados

Gu/lhardi, Hélio José, et ai. Sobre Comportamento e Cognição: Expondo a Variabilidade. - Org. Hélio José Guilhardi, Noreen Campbell de Agulrre 1* ed. Santo André, SP: ESETec Editores Associados, 2006. v. 18 450 p. 23cm 1. Psicologia do Comportamento e Cognição 2. Behavlorlsmo 3. Análise do Comportamento CDD 155.2 CDU 159.9.019.4

ISBN-85-88303-74-6

ESETec Editores Associados

A liSHTcc agradece a Ana Curolin» (•'iicrlo* Kclicio peln enorme colaborado na organi/avüo e preparação deste volume.

Solicitação de exemplares: [email protected] Santo André-SP Tel. (11) 4938 6866/ 4990 5683 www.esetec.com.br

Sumário Modelo cognitivo-comportamental do transtorno do estresse pós-traumático e da culpa relacionada ao trauma.................................................. 11 Leticia Sant’Anna, Holono Shinohara

Medindo e promovendo a qualidade na interação familiar..................... 25 Lidia Natalia Dobrlanskyj Weber, Ana Paula Viezzer Salvador, Olivia Justen Brandonburg

Qualidade de interação familiar: uma análise da percepção de adoles­ centes sobre os conflitos em suas famílias...........................................41 Lidia Natalia Dobrianskyj Weber, Josafá Moreira Cunha

Regras e auto-regras: um estudo sobre o comportamento de mulheres no relacionamento amoroso......................................................................55 Maria Cecilia de Abreu e Silva, Lidia Natalia Dobrianskyj Weber

Variabilidade Comportamental e Adaptabilidade: da Pesquisa à Análise 71 Comportamental Clinica.............................................................................71 João Viconte de Sousa Marçal,Paula Carvalho Natalino

A análise do comportamento no trabalho psicopedagógico em grupo .... 86 Márcia da Rocha Pitta Ferraz

Transtornos de Ansiedade e sua relação com repertórios de leitura, escri­ ta e cálculo, numa abordagem multidisciplinar....................................92 Márcia da Rocha Pitta Ferraz, HildebertoTavares, Cátia da Rocha Pitta

Análise Quantitativa do Comportamento: Funções Matemáticas na Descri­ ção de Funções Comportamentais......................................................*100 Mareio Cruz, Gerson Yukio Tomanari

Comportamento social................................................................................124 Maria Amalia Pie Abib Andery, Tereza Maria de Azevedo Pires Sério

Prevenção primária de abuso sexual em ambiente escolar....................133 Maria da Graça Saldanha Padilha, Lúcia Cavalcanti de Albuquerque Williams

Algumas considerações sobre o conceito de tempo no behaviorismo radical e na análise do comportamento............................................... 138 Maria de Jesus Dutra dos Reis

Estudo esperimental da depressão....................... .....................................149 Maria Helena Leite Hunziker

Comportamento Criativo e Análise do Comportamento I: variabilidade comportamental.....................................................................................156 Maria Helena Leite Hunziker

interações verbais durante o treino de assertlvidade: Análise de Compor­ tamento Verbal referente a eventos privados....................................... 166 Maria Júlia Ferreira Xavier Ribeiro, Elvira Aparecida Simões de Araújo, Patrícia Rivoli Rossi 5

A compreensão do paciente sobre a expectativa da terapia : relações com a construção do contrato terapêutico...........................................174 Maria Júlia Ferreira Xavier Ribeiro

Variáveis significativas ao comportamento pró-ambiental...................... 180 Maria Julia Ferreira Xavier Riboiro, Ana Carla Barreto de Oliveira, Ana Beatriz Garcia Costa Rodrigues

Relações entre comportamento verbal e não verbal: ilustrações a partir de situações empíricas.......................................................................... 191 Maria Martha Costa Hübnor, Paola Espósito de Almeida, Pedro Bordini Faleiros

Intervenções preventivas no transtorno de estresse pós-traumático e sua eficácia................................................................................................... 220 Felipe Corchs, Mariângola Gentil Savoia

O stress emocional: prevalência eimplicações.........................................229 Marilda Emmanuol Novaes Lipp

^•icoterapia no tratamento da Fibromialgia: Mesclando FAP e ACT.......238 Marilene de A. Martins, Luc Vandenberghe

Clinica Integrada - A Psicologia e a Fisioterapia em trabalho interdisciplinar desaúde comunitária....................................................249 Marilza Mestre, Simone Murara, Rosana Portes, Janine Antonio, Adriana Paredes, Ariana Mamcarz, Eduardo Andrade, Izabel Silva, Juliane Ulbrich, Mariana Monteiro, Micheli Meira, Raphael Amaral, Rodrigo Ribeiro, Tânia Voss

Behaviorismo Sklnnerlano em Contraponto à Psicanálise e à Ciência Cognitiva................................................................................................ 261 Rodrigo Cruvinel Salgado, Maura Alves Nunes Gongora

O Show de Truman - A escolha por um “ controle mais livre"1 .............280 Michela Rodriguos Ribeiro

Imobilidade no Teste do Nado Forçado: depressão ou estratégia de sobre­ vivência? .............................................................................................. 286 ......................................................... Mônica Geraldi Valentim, Katsumasa Hoshino

Psicoterapia Comportamental: Análise de questões teóricas relevantes ao desenvolvimento da tecnologia..........................................................292 Naione dos Santos Pimentel

Estresse Ocupacional................................................................................297 Nancy Julieta Inocente, Clara Odilia Inocente, Janine Julieta Inocente, Rubens Reimâo

Formação de classes de estímulos equivalentes e as operações de soma e subtração............................................................................................. 300 Rafaella Donini, Daniel Del Roy, Nilza Micheletto

O desenvolvimento sócio-emocional nos primeiros anos de vida e as contingências em operação na interação pais-criança......................315 Patrícia Alvarenga

Imagem Corporal e Transtornos Alimentares..........................................325 Patrícia Guillon Riboiro, Eliane Padilha da Silva , Glauce Costa, Denise Cerqueira Leite Holler 6

A prática do analista do comportamento: contribuições passadas e recentes para a educação.......................................................................................................................... 331

Paulo André Barbosa Panotta, Maria Auxiliadora de Lima Wang, Lígia Valladares Oda Kurokawa , Roberto Alves Banaco

Comportamento criativo & Análise do Comportamento I: Insight............. 345 Paulo Elias Gotardolo Delago, Marcus Bontos do Carvalho Neto

Urgôncia e emergência com crianças em UTI NEONATAL: Contingências atuais e futuras. É possível uma intervenção?..................................... 352 Queila Piorro Fernandes, Diana Tosello Laloni

Controle e autocontrole, seu papel na cooperação social........................ 359 Rachel Rodrigues Kerbauy*

Registros esparsos de uma supervisora para terapeutas em formação: intervenção sobre fatores de estresse na terapia..................................366 Regina Christina Wielenska

Proposta de práticas clinicas: um estudo exploratório.............................. 371 Roberto Alves Banaco, Luciana Roberta Donola Cardoso, Daniel Carvalho de Matos, Mariana São Thiago Bezerra do Menezes, Mariana Ribeiro de Souza.Renata Huallem Pasquinelli

Lista de Desempenhos: um possível primeiro passo para uma sistematiza­ ção do ensino da Análise do Comportamento na graduação...............382 Roosevelt R. Starling

Urgência e emergência com crianças em UTI Pediátrica: Contingências de avaliação e intervenção.....................................................................401 Rosana Righetto Dias, Diana Tosello Lalon, Makilim Nunes Baptista

Uma história da História Comportamental................................................. 409 Carlos Renato Xavier Cançado, Paulo Guerra Soares, Sérgio Dias Cirino, André Luiz Freitas Dias

Queixas......e queixas! Como focalizá-las na Terapia Comportamental 417 Sônia dos S. Castanheira

A relação entre comportamento alimentar, auto-imagem e personalidade: que variáveis podem predispor uma pessoa aos transtornos alimenta­ res? .........................................................................................................431Talita Lopes Marques, Denise Corqueira Loito Heller

Avaliação de fontes de stress em pacientes esquizofrênicos: percepção de familiares................................................................................................438 Thania Mello Gomes de Matos

Teoria do Conhecimento:Epistemologiae Behaviorismo RadicaM............447* Tiago Alfredo da Silva Ferreira

Novas Diretrizes Curriculares,Metacontingências e o Plano K eller....... 456 João Claudio Todorov, Ricardo Corrôa Martone, Márcio Borgos Moreira

Comportamento criativo & análise do comportamento III: Comportamento Verbal......................................................................................................465

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Tony Nelson

A tomada de decisões nas intervenções psicoterápicas: da teoria à prática 472 Vera Regina Lignelll Otoro, Heloisa Helena Ferreira da Rosa

Psicologia do Desenvolvimento, Análise do Comportamento e a Clínica Psicológica............................................................................................. 479 Yara Kuperstoin Ingberman, Roseli Hauer

Terapia familiar: um enfoque de vanguarda?........................................... 490 Vara Kuperstein Ingberman

intervenção de acompanhantes terapêuticos em caso de transtorno bipolar e comportamentos evitativos no trabalho e perante outras responsabilidades................................................................................. 496 Maria Zilah da Silva Brandão,Camila Carmo de Menezes, Fernanda Marques Jacovozzi, Jóferson Simomura, Ligia Betencurt, Renata Cristina Alves da Rocha , Maria Gabriela Santana

Comportamento de esquiva nocontexto clinico........................................509 Maria Zilah da Silva Brandão,Camila Carmo de Menezes, Fernanda Marques Jacovozzi, Jóferson Simomura, Ligia Bitencourt, Renata Cristina Alves da Rocha , Maria Gabriela Santana

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Apresentação Os capítulos que compõem os volumes 17 e 18 da coleção Sobre Comportamento o Cognição oferecem uma amostra representativa dos trabalhos apresentados no XIV Encontro Anual da ABPMC, realizado em Campinas em 2005. Os artigos de pesquisa, de aplicação e de conceitos abrangem o que se tem produzido no Brasil nas áreas de Análise do Comportamento e Cognitivo-comportamental. Pode-se dizer que ambas mantêm preocupações e objetivos comuns, mas, com o passar dos anos, se afastaram quanto aos pressupostos, metodologia e conceitos que as caracterizam e as definem. Tal afastamento não constituí uma perda, mas um refinamento de identidades. Há que se louvar a convivência harmoniosa de áreas teóricas, procedimentos de ação profissional e metodologia de investigação que não se fundem, mas coexistem como alternativas prósperas, consistentes e eficientes. Os estudiosos de uma ou outra área encontrarão nos dois volumes textos inovadores, didáticos e desafiadores para aprofundar e consolidar conhecimentos, que aumentam de abrangência e se atualizam anualmente, escritos pelos mais lídimos representantes da área. As maneiras de abordar o comportamento humano têm se justaposto, expondo aspectos que se superpõem, ao lado de outros que se diferenciam. O conjunto não é um todo homogêneo. O produto compõe, como metáfora, um grande painel, em cuja composição foram usadas diferentes técnicas de expressão, aplicadas por diferentes artistas. Não é correto falar em comportamentalismo (no singular); mas em comportamentalismos. Acrescentar aos comportamentalismos adjetivos para identificálos produz um resultado peculiar. Os adjetivos não se limitam a justificá-los; mudamlhes a essência. A presente Introdução ó um alerta. Cada capítulo ó um produto em si. Tal ó uma maneira de estudá-los: ficar sob controle de cada texto. Por outro lado, o conjunto de capítulos revela processos diferenciados no desenvolvimento de vínculo com os behaviorismos. Tais processos vêm se explicitando e se personalizando através dos anos. Tal ó uma outra maneira de ler os textos: organizá-los em sistemas, conforme vêm sendo selecionados pela comunidade que responde a eles. Hélio José Guilhardi Noreen Campbell de Aguirre

Sobre Comportamento e Cofiniçflo

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Capítulo 1 Modelo cognitivo-comportamental do transtorno do estresse póstraumático e da culpa relacionada ao trauma Lelicid S anfA nna I lelencShinohara PUC-RJ

O Transtorno de Estresse Pós-traumático De acordo com Kaplan e Sadock (1984), o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) é uma psicopatologia que se desenvolve como resposta a um estressor traumático externo de significado emocional suficiente para desencadear eventos psicológicos e neurobiológicos relacionados. O transtorno consiste em um tipo de revivência, onde há uma recorrência do sofrimento original sentido durante o trauma. Esta ó a definição recente do TEPT, a qual foi sendo elaborada ao longo do último século, junto com novas classificações, critérios diagnósticos e características. Segundo Rangé e Masci (2001), podemos rastrear as conseqüências do trauma desde o inicio da humanidade, sejam estas causadas por guerras, violência ou acidentes. O estresse pós-traumático sempre existiu, mas só recentemente foi considerado um transtorno psíquico. De acordo com Caminha (2004), existem registros deste transtorno desde o século XIX, quando o médico alemão Eulenberger introduziu o conceito de trauma psíquico. Já Margis e Kapczinski (2004) apontam para descrições feitas por Kraepelin em 1896 como sintomas ansiosos que surgem em situações como incêndios, acidentes, catástrofes etc. Outros relatos sobre o transtorno também foram feitos por diversos autores durante guerras. Da Costa, um módico que trabalhou durante a Guerra Civil Americana, fala de uma slndrome do coração irritável, que já mostrava sintomas característicos do TEPT. Mais tarde esta mesma slndrome foi apresentada como "neurose de guerra". Freud observou durante a Primeira Guerra Mundial que veteranos de guerra traumatizados experimentavam a revivência do evento traumático e também a negação do mesmo. Apenas mais tarde ela foi observada na população civil, fora do contexto da guerra. Em 1941, após um incêndio ocorrido em uma boate em Boston, pessoas relataram nervosismo, fadiga e pesadelos recorrentes. Segundo Garcia (2004, citado em Pereira, 2004), outros relatos semelhantes a este corroboraram para que estes sintomas não fossem apenas relacionados à guerra, mas a um fator estressante grave.

Sobre Comportamento c CognlçJo

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Apesar de todas essas descrições do transtorno, apenas em 1980 ele foi apresentado no DSM-III e definido como “desenvolvimento de sintomas característicos após a experienciação de um acontecimento psicologicamente traumático, ou de acontecimentos situados fora do campo da experiência humana habitualmente considerada normal" (p.38). Mas foi no DSM-IV que se retirou a exigência de que o evento estivesse fora do campo da experiência humana habitual, acrescentado-se que a resposta da pessoa envolvesse sentimentos de medo intenso, impotência e horror. Foi também no DSM-IV que o Transtorno de Estresse Agudo foi acrescentado, no qual a pessoa desenvolveria os sintomas do estresse pós-traumático, mas por um curto espaço de tempo (até quatro semanas após o evento). Caminha (2004) diz que "o grande probJema que ocorre na formação do TEPT é que a pessoa não consegue controlar ou interferir no curso do evento traumático" (p.268). Durante o evento a pessoa pode perder o controle fisico e psicológico da situação, apresentando níveis enormes de ansiedade, alterando os padrões normais da neuroqulmica e, conseqüentemente, das cognições, dos afetos e dos comportamentos, manifestando-se fora do nlvel controlável e suportável pelo sujeito. Kolk e Mcfarlane (1996) falam de uma subjugação da vitima a uma realidade inacreditável, na qual é provocada um grande estresse, e este gera desconforto e sofrimento. Independente do trauma sofrido, as pessoas que apresentam o TEPT sofrem conseqüências que interferem no seu funcionamento normal, seja afetando a saúde física ou mental, o trabalho ou seus relacionamentos, e até muitas vezes adquirindo outros transtornos. Segundo Silva (2000), existem estudos de crianças que apresentaram o transtorno devido a abuso sexual e que, mais tarde na adolescência, apresentaram bulimia ou anorexia. Obviamente, não são todas as pessoas que passam por um evento traumático que desenvolvem o TEPT, algumas pessoas apresentam alguns sintomas do transtorno durante um curto período de tempo, mas à medida que este tempo se alonga e que os sintomas persistem ou se agravam, poderemos estar diante de um quadro de Transtorno de Estresse Pós-Traumático. Segundo o DSM-IV (1993), para ser diagnosticado o Transtorno de Estresse Pós-traumático, a pessoa tem que ter sido exposta a um evento traumático, no qual esta vivenciou, testemunhou ou foi confrontada com um ou mais eventos que envolveram morte ou grave ferimento, sendo estes reais ou ameaçadores, ou mesmo confrontada com um evento que tenha apresentado ameaça à integridade física própria ou a de outros. Além disso, a pessoa deve ter apresentado uma resposta que envolvesse medo intenso, Impotência ou horror. Este evento traumático também precisa ser revivido com freqüência, seja através de recordações aflitivas, sonhos, flashbacks díssocíatívos, sensação de que o evento esteja ocorrendo novamente, ou por sofrimento psicológico ao ser exposto a situações ou Indícios que sejam diretamente ou indiretamente associados ao evento traumático, ou reatlvldade fisiológica a estas mesmas situações ou indícios. Outro critério é a esquiva persistente de estímulos associados ao trauma e entorpecimento da responsividade geral. Este critério pode ser identificado pelos seguintes quesitos, sendo que três ou mais devem estar presentes: esforços para evitar pensamentos, sentimentos ou conversas relacionadas ao trauma, assim como evitação de lugares, pessoas ou atividades; incapacidade de se recordar de aspectos importantes relacionados ao trauma; sensação de distanciamento ou afastamento em relação a outras pessoas, estreitamento da afetividade e sentimento de futuro abreviado.

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L rtid d Sdnt'A nnd, í ic lcn f Shinohard

É necessário que sejam encontrados dois ou mais sintomas do excitabilidade que não estavam presente antes do trauma. Estes sintomas podem ser insônia, irritabilidade ou surtos de raiva, falta de concentração, hipervigilância, e resposta de sobressalto exagerada. Todos estes sintomas acima tôm que ter uma duração acima de um mês, o ó necessário que haja um sofrimento significativo, e prejuízo no funcionamento normal da pessoa, seja na área social, no trabalho, ou em qualquer outra área que seja importanto para o indivíduo. De acordo com Rangó e Masci (2001), tanto o aparecimento quanto o curso do transtorno de estresse pós-traumático pode variar de acordo com as exporiôncias vividas, histórico do outros transtornos mentais, ocorrência do transtorno na família e variáveis de personalidade, mas é importante deixar claro que pode ocorrer em pessoas que não possuam qualquer predisposição, dependendo de quão forte foi o trauma vivido. Normalmente os primeiros sinais de estresse pós*traumático ocorrem em ató três meses, mas existem casos em que há um intervalo assintomático de meses ou ató anos. O transtorno pode aparecer em pessoas de qualquer idade. Caminha (2004) comenta um estudo recente feito na população norte-americana que demonstra que o estresse pós-traumático é o quarto transtorno mais comum e atinge em módia 10,3% dos homens o 18,3% das mulheres ao longo de sua vida. Outro estudo sugere que grande parte das pessoas vive algum tipo de evento traumático em sua vida e cerca de 25% destas irão desenvolver o transtorno. Já Rangó e Masci (2001) apresentam um estudo feito na população geral mostrando que o TEPT varia entre 1,3 a 9% da população e, em paciontes psiquiátricos, este número aumenta para 15%, portanto podemos ver variações de acordo com a população examinada. Em populações de risco, a incidência do transtorno pode variar de 3% ao surpreendente número de 58%. Segundo Margis e Kapczinski (2004), o impacto que a pessoa terá irá variar de acordo com o trauma vivido, então para se entender as conseqüências é necessário examinar os diferentes grupos de vitimas do transtorno. Pessoas que foram vítimas do seqüestro estão muito mais propensas a desenvolverem o transtorno do que pessoas que sofreram agressões físicas, por exemplo. Calhoun e Resick (1999) apresentam um estudo feito por Kilpatrick, Edmunds e Seymour em 1992 em mulheres vitimas de estupro. Neste ostudo a incidência do transtorno chega a 31%. Outros estudos apresentaram taxas mais elevadas, como 94% das mulheres apresentaram sinais de TEPT nas primeiras duas semanas e aproximadamente 50% em 12 semanas. Contudo, tomos quo considerar que aproximadamente 13% das mulheres foram vítimas do estupro, sendo que destas, 39% foram estupradas mais de uma vez, podendo variar entre estes dois grupos do mulheres o índice do TEPT. O terrorismo tem contribuído para que o número do estudos sobre o transtorno de estresse pós-traumático aumente. Ballone (2002) chega ao número de 54% em um estudo feito por Weisaeth em 1987 em vítimas de atentado e de torturas. De acordo com este autor os números têm aumentado significadamente nos últimos anos com a maior incidência de atentados, como o do World Trade Center, e outras ameaças, como o bioterrorismo. O autor ainda apresenta outras pesquisas mostrando o índice do estresse póstraumático de acordo com seu estímulo estressante. O seqüestro (Torr, 1981) possui a prevalência de aproximadamente 99%, a agressão física (Reinherz, 1993) do 25%, os furacões

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(Shaw, 1996) de 70%, os terremotos (Najarian, 1996) de 32%, os incêndios (March, 1997) de 12%, a guerra (Sack, 1999) de 50% e a violência doméstica (McCIoskey, 2000), de 24%. É importante observar que, de acordo com Rangó o Masci (2001), podemos observar o curso crônico do Transtorno de Estresso Pós-Traumático, já que 50% das possoas com TEPT apresentam remissão ospontânoa nos primoiros dois anos, mas o restanto podo apresentar sintomas por 15 anos ou mais. Entre os transtornos psiquiátricos, encontramos uma grande co-morbidade com a doprossão, pânico, ansiedade social e com o abuso de substâncias. Ainda é muito importante destacar os custos sociais de pessoas com esse transtorno, já que elas estão muito propensas a ter dificuldade no trabalho, na escola o nos relacionamentos. Helzer, Robins & McEvoy (1987, citado por Rangó e Masci, 2001) encontram uma co-morbidade em 80% do pessoas diagnosticadas com TEPT. As pessoas com o transtorno apresontam duas vezes mais risco de ter outro transtorno mental. Kessler (1995, citado por Rangó o Masci, 2001) em outra pesquisa encontrou prevalência comórbida de pelo menos um outro transtorno em 88,3% dos homens e 79% das mulheres. Segundo Ballone (2002), a depressão se destaca como umas das maiores comorbidades do TEPT. Ambos os transtornos apresentam algumas características semelhantes. O estresse pós-traumático gera angústia e sofrimonto psicológico intenso, que conseqüentemente podem causar isolamonto social, problemas no trabalho e deterioração da qualidado de vida o, então, a depressão. Pessoas com TEPT geralmente apresentam sintomas de desinteresse, visão negativa o pessimista do futuro, apatia afetiva, que são sintomas muito similares ao da depressão. Ainda de acordo com o autor, podemos observar que o estresse pós-traumático sensibiliza a vitima, a isola, baixa sua resistência, tornando-a mais propensa à depressão. Assim como o contrário também pode ocorrer, já que pessoas deprimidas estão mais vulneráveis a serem traumatizadas. Ballone ainda destaca que alguns sintomas como o sentimento de estar permanentemente em perigo ou ameaçado, que ó encontrado em aproximadamente 77 % dos paciontes de TEPT, podo vir a causar ataques de pânico, assim como ansiedade social. É comum ver pessoas que foram vítimas de bombas, incêndios, assaltos violentos, apresontarem um grando medo de sair de casa, freqüentar lugares públicos ou similares. Yehuda e McFarlane (1995, citado por Rangó e Masci, 2001) destacam que a maior razão para que o transtorno de estresse pós-traumático aprosente uma comorbidado tão grande é sua evolução crônica, de duração maior que dois anos, que facilita a ocorrência de transtornos secundários ao TEPT.

O Modelo Cognitivo A teoria cognitiva é baseada na idéia que nossos sentimentos têm, em parto, grando relação com as avaliações que fazemos dos eventos a nossa volta, podendo estes serem interpretados de diversas maneiras. Vários acontecimentos podem gerar emoções negativas, mas poucas vezes há reações oxageradas que nos conduzem a um funcionamento emocional inadequado. No caso do TEPT, as pessoas teriam seus pensamentos dominados pela idéia do porigo o culpa, intorpretando acontecimontos, antoriormonte tidos como inofensivos o aleatórios, como ameaçadores e auto-reforenciados. De acordo com Caminha (2004), aparece na metade dos anos 70 um modelo cognitivo criado por Horowitz para explicar a formação das respostas automáticas em pacientos com TEPT. Segundo ele, o sujeito se torna incapaz de processar as informações 14

I eliii.i S«int'Ami.i, f Idene Sliinokir.i

adequadamente, gerando assim respostas de ansiedade e esquiva Horowitz aponta os sintomas de revivência e os sintomas de esquiva e diminuição de responsividade como fundamentais para a formação dos sintomas encontrados em um paciente com TEPT. Calhoun e Resick (1999) também fazem referência ao modelo do Horowitz. Os autores explicam que para havor um ajustamento ao evonto traumático ó necessária a incorporação destes aos esquemas cognitivos já existentes, ou que se desenvolvam novos esquemas. Para que isso aconteça, a memória do evento traumático ó repetida várias vezes, na tontativa de processá-lo ou integrá-lo, resultando em flashbacks. Mas quando isto ocorre de maneira descontrolada, ocorre a retraumatização. Isto pode gerar respostas de esquiva e fuga, e estas podem impedir que haja o processamento cognitivo completo do evento traumático. Outras teorias surgiram para explicar o TEPT. Rachman (1980, citado por Rangé e Masci) fala do processamento omocional, enfatizando “a possível existência de processos subjacentes á diminuição da intensidade do uma experiência emocional, pois, quando estes processos normais ficam prejudicados, surge a psicopatologia” (p.261). Assim, a persistência de obsessões, pesadelos o fobia seria um sinal do que este processarnonto não fora feito corretamente. Foa e Kozak (1986) também explicam o transtorno através desta teoria de processamento emocional. Usando o conceito de "medo”, os autores tentam explicar a diferença de como um acontecimento traumático é representado na memória de uma vítima que adquire o TEPT e em outra que não. Para a maioria das pessoas o medo real ocorre quando elas estão frente a um estimulo ameaçador e desaparece quando este estímulo não está mais presente. Mas esse medo pode tornar-se patológico a partir do momonto que se torna destrutivamente intenso. A estrutura inclui elementos irrealistas, as associações entre estímulos não-perigosos e respostas de fuga o ovitação também estão presentes e vários tipos de erros de avaliação ou de interpretação acontecem. Segundo Rangé o Masci (2001), pessoas com TEPT apresentam memórias de medo contondo avaliações e associações erradas, onde frente à intensa manifestação de ansiedade estímulos neutros (EN) passam a ser estímulos condicionados (EC), capazes de gerar respostas condicionadas (RC) de ansiedade. Em um modelo normal, as respostas condicionadas seriam extintas após um corto tempo, caso não houvesse outra exposição ao evento traumático, mas em pessoas com TEPT, ocorre o nãoprocessamento da experiência traumática pela evitação de lembranças o reações afetivas decorrentes do trauma, permanecendo assim as respostas de ansiedade. A pessoa não consegue mais separar situações ameaçadoras de outras situações. Outros modelos cognitivos foram descritos por diversos autores, mas todos semelhantes aos descritos acima. O não-procossamento da experiência traumática, o que Caminha (2004) chama de “digestão mental", é que faz com que a memória traumática fique em destaque e seja revivida em flashbacks, sendo reforçada polas respostas do fuga e esquiva. Segundo Kolk e Mcfarlane (1996), indivíduos que agem sob uma situação oxtremamente estressante dosenvolvem internamente uma alteração nos hormônios, uma grande secreção neuro-hormonal que afeta a consolidação da memória. Por causa da "força hormonal" ocorrida durante o trauma, quando a vítima so encontra em um ostado de excitação semolhante, seu acesso se toma fácil. Ainda de acordo com os autores, foram feitos estudos gráficos em cérebros de pacientes com TEPT, que mostraram grande envolvimento do sistema límbico. Então realizou-se divorsas pesquisas e chogou-se a duas importantes conclusões: pessoas

Sobre l'omport«imenlo e t ofinlçilo

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quo passam por um trauma sofrem diminuição do volume do hipocampo; e existe uma ativação excessiva da amígdala e estruturas relacionadas a ela, lateralização anormal e aumento da área e da atividade da Broca quando o indivíduo reexperimenta o trauma. Depois de outras pesquisas a conclusão mais significativa foi a comprovada diminuição do hipocampo em pessoas traumatizadas. Rangó e Masci (2001) falam ainda de mudanças no funcionamento neuroadrenórgico e serotoninórgico, no eixo hipotálamo-pituitário-adrenal e no sistema dopominórgico/opióide endógeno, que provocam mudanças de longo termo no córebro. Kolb (1987, citado por Figueiredo, 2004) tambóm mostra uma importante mudança causada pela estimulação excessiva que ocorre durante o trauma, que são os danos e alteraçõos das rotas neurais. Outro importante ponto colocado pelo autor é que, durante a ativação do trauma (lombrança), a pessoa é capaz de sentir, ver ou ouvir elementos traumáticos, mas ao mosmo tempo pode ser incapaz de comunicar o que está acontecendo. Durante osta revivência, a pessoa podo sofrer um grande terror e não ser capaz de comunicá-lo por linguagem verbal. Desta maneira, Kolk e Mcfarlane (1996) concluíram que a rosposta ao trauma "ó extremamente complexa e pode incluir hipermnésia, hiper-roatividade a estímulos o experiências traumáticas, que coexistem com entorpecimento psíquico, evitação, amnósia e anedonia” (p.258).

Avaliação e tratamento Os dois objetivos principais da avaliação são o diagnóstico e o planejamento terapêutico. A Entrevista Clinica Estruturada para Transtornos de Ansiedade IV (ADIS-IV) é melhor instrumento para o diagnóstico, e também para identificar as co-morbídades ligadas ao transtorno. Para medir o impacto da experiência traumática ó indicada a escala do Impacto de Evontos de Horowitz, Wilnes e Alvarez feita em 1979. Outros instrumentos tambóm são amplamente utilizados para o diagnóstico, Calhoun e Resick (1999) destacam a Escala Clínica Administrada ao TEPT (Blake, 1990), a Entrevista Diagnostica Planejada (Robbins, Helzer, Crougham o Ratcliff, 1981) e a Entrevista Planejada para Transtornos de Ansiedade (Di Nardo e Barlow, 1988). Em termos de instrumentos psicométricos além da Escala do Impacto de Eventos, oles destacam a Lista do Sintomas 90-R (Derogatis, 1977), a Escala para o TEPT Relacionado ao Crime SLC-90R (Saundersa, Mandoki e Kilpatrick, 1990), o Teste de Sintomas Rosultantes de Estupro (Kílpatríck, 1988) e a Escala de Sintomas do TEPT (Foa, Ríggs, Dancu e Rothbaum, 1991). De acordo com Margis e Kapczinski (2004) o tratamento do TEPT objetiva reduzir sintomas, melhorar a qualidade de vida, aumentar a capacidade de lidar com o estresse e diminuir a co-morbidade. Já Rangó e Masci (2001) e Calhoun e Resick (1999) colocam como principal finalidado do tratamento a recuperação do senso pessoal de controle e estabilidade, movendo o paciente do papel de dominado e controlado para o de detentor pleno de suas capacidades. Segundo Blako (1993), o tratamento do TEPT começa apenas depois que a pessoa já foi removida da situação de crise. Se um sobrevivonte ainda está sendo exposto ao trauma, está severamonte deprimido ou suicida, está experimentando pânico e pensamento desorganizado, ou está precisando de desintoxicação de álcool ou drogas, ó importante que se dê atenção a esses problemas na primoira fase do tratamento. Vários tipos de tratamentos são sugeridos por diversos autores, o variam de acordo com a intensidade e o tipo de transtorno:

'1 6

l c tld .1 S a n fA m n i, I lelcnc Sltinoh.ir. Wcbcr, A 11.1 P.tul.i V. S«ilv«idor, Ollvui I. Br.iiulcnburH

entre o pai e a mãe porque a literatura mostra que tal relação interfere na forma como estes interagem com seus filhos. Quando pais possuem dificuldade no relacionamento conjugal normalmente apresentam comportamentos parentais ineicazes (Erel & Burman, 1995). O instrumento acessa os aspectos de interação familiar por meio do relato dos filhos, estes respondem separadamente sobre o pai e sobre a mãe. São 50 questões om sistema Llkert de 5 pontos (nunca, quase nunca, às vezes, quase sempre, sempre), agrupadas em 10 escalas. Sete delas abordam aspectos da interação familiar considerados positivos: relacionamento afetivo, envolvimento, regras e monitoria, comunicação positiva dos filhos, modelo, sentimento dos filhos e clima conjugal positivo. Trôs escalas abordam aspectos negativos: comunicação negativa, punição corporal e clima conjugal negativo. Os escores sâo obtidos com a soma dos pontos de cada questão, podem ser somados de forma independente em cada uma das escalas e pode-se obter um escore total. A Tabela 1 apresenta quais são as questões de cada escala, com as respectivas numerações (a numeração corresponde à ordem das questões para aplicação). Tabela 1: Questões de cada escala do instrumento EQIF (1) Meu* pala coatumam dlzor o quanto ou sou knportantu paru elos (4) Mau* pala moatram alegria quando eu faço alguma coita legal (13) Mau« pala flcam feNzee quando aatâo comigo (16) Maua pala me elogiam quando au cumpro as minhim obrigações (36) Maua pala demonstram orgulho da mim (26) Quando a|udo meus pala. eles me agradecem (38) Maua pala coatumam ma (azar carlnhoa quando eu me comporto barn (43) ~ Mau» Mi paia coatumam me dar baHoa. abraçoa ou outroa carinho» (?) Eu Ipoaao contar com o apoio doa meoa pala quando tenho algum problema (0) Mau» paia dâo importância para mlnhaa opinlAea (14) Maua pala ma a|udam nua aatudoa quando au praclao (24) Maua pal» procuram saber o que aconteceu comigo quando oatou triato (26) Maua pala ma ouvem a ma respondam quando mi pnrgunlo alguma cotaa (34) Meua pala coatumam moatrar que ae preocupam comigo (44) Meu» pal» coatumam perguntar o que eu eatou sontlndo (47) Meua pal» converaam comigo quando faço alguma coisa urrada, mu oxpllcando porque eu nâo deveria ter feito daquele (alto (3) Mau» paia coatumam ver »e eu |á fiz a» minha» übrigaçâes (15) Meu» pala me dizem o que é certo e o que é errado (25) Meus pais sabem onde eu eatou quando nâo aatou em caaa (36) Meu» paia sabem o que faço com o mau tampo livra (45) Meus pala coatumam me dar conaaihoa (49) Meua pal» pedem para au lâzer para onda au aatou Indo (6) Eu coatunto contar a» col»aa boa» que ma acontecem para meu pulAninha m ie (10) Eu costumo cantar aa colaaa njlna que me acontecem para meu pai/minha mâe (30) Eu coatumo falar aobra meua sentlmentoa para mau pai/minha mâe (5) Meu» pala brigam comigo por qualquer coisa (9) Maus pais coatumam falar alto ou gritar comigo (17) Meua pais coatumam daacontar em mim quando aatâo com problemas (20) Meus pais coatumam ma xingar ou falar (lalavrAes para mim (40) Meua pal» coatumam ma criticar da forma negativa (27) Meua pala coatumam ma bater quando faço alguma oolaa errada (30) Maus pala coatumam ma bater »em au tar feito nada de errado (46) Meua pal» coatumam ma bater por colaaa sem Importância (11 )0 que meua pala ma ensinam da bom eles também fa/am (22) Meus pais também fazem aa ohrigaçAes que me ensinam (32) Eu acho lega» aa cotaaa que meua pala fazem (12) Eu penso que meu pal/rmnha mâe sâo os melhoro« pais quo eu cxinheço (23) Eu me sinto amado peloa meus pala (33) Meua pal» «âo um bom axemplo para mim (42) Sinto orgulho de meus pais (50) Qual a nota que vncâ dé para seu» paw, de um a cinco' (10) Meua pal» fazem carinho um no outro (21) Meua pais fazem elogloe um para o outro (31) Meua pala coatumam ae abraçar (41) Meua pala falam bem um do outro Òilroa conjugal Negativo

coatumam xingar"um aõ outro (16) Meua pais falam mal um do outro (29) Meua pais coatumam estar brabos um com o o«

^37]_Meuaj>alsbrtjgrTUjm_co£U)^*rtro^^_^^_

Sobre Comj>ort 0,393*, regras e monitoria r— 0,259*, comunicação positiva dos filhos r=-0,308\ modelo r=-0,358*, sentimento dos filhos r=-0,402#, clima conjugal positivo r=-0,272*), e correlação positiva significativa entre o escore de depressão e todas as escalas negativas do EQIF (comunicação nogativa r=0,346*, punições inadoquadas r=0,346*, clima conjugal nogativo r=0,176*). Além disso, foi observado que entre todos os adolescentes considerados em situação de proteção, nenhum apresentou indícios de depressão (c2=5,230; gl=1; p < 0,05). Estes dados demonstraram que quanto maior a presença de aspectos positivos o menor a presença de aspectos negativos na interação familiar menores foram os indícios de depressão. (Weber, Bilobran, Dück, Hassumi, Moura, & Viezzer, 2005).

Stress X EQIF: Pesqujsa realizada com 125 crianças e adolescentes de escola municipal e estadual de Curitiba, com idade entre 9 e 16 anos. Os dados foram analisados através do teste quiquadrado, que demonstrou haver relação significativa entre o stress e metade das escalas do EQIF (relacionamento afetivo x^’5,445*, envolvimento x*"4,769*, regras e monitoria x*'2,970, comunicação positiva dos filhos x?‘2,205, modelo x2*3,291, sentimento dos filhos x*'2,546, clima conjugal positivo x^õ.õlS*, comunicação negativa x^’6,989*, punições inadequadas xa*0,440, clima conjugal negativo x2*5,333*). Estes dados, mesmo aqueles que não apresentaram significáncia estatística, demonstraram haver relação entre os maiores índices de stress com menor presença de aspectos positivos e maior presença de aspectos negativos na interação familiar. (Weber, Biscaia, Pavei & Brandenburg, 2003).

Auto-efícácía X EQIF: Pesquisa realizada com 112 adolescentes de escola estadual de Curitiba e 124 de Paranaguá, com idade entre 14 e 20 anos. Foi aplicado o teste Anova, e a análise dos dados revelou a existência de uma relação significativa positiva entre auto-eficácia e quase todas as escalas positivas do EQIF (relacionamento afetivo F=9,610*, envolvimento F=9,516*, regras e monitoria Fs3,779*( comunicação positiva dos filhos F=8,120\ modelo F=10,162*. sentimento dos filhos F=6,619\ clima conjugal positivo F=2,020), e relação negativa entre auto»eficácia e as escalas negativas do EQIF 1Todo« o* vakxtM cotn * aprowmUwn p. Wcbcr, An.1 l\iulii V. Srflv.iilor, Ollvl.i I. Hr.imlenluMR

Bardagi & Hutz, 2002, p. 10). Sendo assim, pode-so pressupor que práticas oducativas inadequadas ou ausência de práticas positivas que estão associadas a problemas do dosonvolvimento em crianças o adolescentes poderiam ser considoradas como fatores de risco presentos na esfora familiar. Os fatoros protetivos se referem a condições contrárias das de risco, ou soja, são condições ou variávois que modificam e/ou molhoram a resposta do individuo, diminuindo a probabilidade deste desenvolver problemas de desenvolvimonto (Reppold e cols., 2002). Para estes autores, uma das formas de proteção refere-se a características e qualidade das interações familiares. Portanto, novamente, pode-se prossupor quo práticas educativas positivas e a ausência de práticas inadequadas estão associadas a comportamentos pró-socias e de competência em crianças o adolescentes, e poderiam ser considoradas como fatores de protoção prosontos na esfera familiar. De acordo com as posquisas apresentadas antoriomionto, pode-se concluir que escores altos das escalas positivas do EQIF e baixo nas negativas reforem-se a fatoros de proteção para a criança ou adolescente, pois foram os sujeitos quo apresentaram molhor saúde mental, acroditavam mais neles mesmos e se relacionavam molhor com os outros. Por outro lado, escores altos nas escalas negativas do EQIF e baixo nas positivas referemse a fatores de risco, os participantes com esse perfil apresentaram piores condições de saúde mental, pior auto-imagem e pior relacionamento com os outros. Através das Escalas de Qualidade de Interação Familiar pode-se calcular um ponto de corte para definir se a criança ou o adolescente se encontra om uma familia com interação de proteção ou de risco. Para este cálculo, houve uma categorização por idade: participantes com até 12 anos o igual/acirna de 13 anos. Desta forma, foi definido um ponto de corte para crianças e outro para adolescentes, pois estes últimos tendem a apresentar escores significativamente menores que os das crianças em 8 escalas do EQIF (todos com p < 0,001). As exceções foram nas escalas de clima conjugal negativo, na qual crianças e adolescentes apresentaram a mesma média (p>0,05), e na escala de comunicação negativa, na qual os adolescentes apresentaram escores significativamente mais altos (p < 0,001). Os valores de corte encontrados na posquisa de validação do instrumento foram calculados seguindo-se alguns passos: a) Total Positivo (TP): somou-se os escores das oscalas positivas (relacionamento afetivo, envolvimento, regras e monitoria, comunicação positiva dos filhos, modelo parental, sentimento dos filhos e clima conjugal positivo); b) Total Negativo (TN): somou-se os escores das escalas negativas (punição corporal, comunicação negativa e clima conjugal negativo); c) calculou-se os percentis 40 e 60 do TP e do TN; d) o mesmo cálculo dos percentis foi realizado para a amostra de adoloscentes. Assim, caracterizaram-se como famílias protetivas aquelas que apresentaram escores altos (acima do percentil 60) nas práticas positivas e escores baixos (abaixo do percentil 40) nas negativas, e as famílias de risco como sendo aquelas que apresentaram escores baixos (abaixo do 40) nas escalas positivas e escores altos (acima do 60) nas negativas. Os pontos de corte encontrados podem ser visualizados abaixo:

- Crianças com fatores de proteção: TP igual e maior que 342 e TN igual e menor que 39. - Crianças com fatores de risco: TP igual e menor que 328 e TN igual e maior que 48. -Adolescentes oomfatoresde proteção:TP iguale maior que 310e TN igualou menor que42. - Adolescentes com fatores de risco: TP igual e menor que 284 e TN igual e maior que 49. A utilização destes pontos de corte deve ser cuidadosa. Os valores apresentados acima devem ser usados preferencialmente como parâmetro de comparações com outras pesquisas ou como indicativos da qualidade na interação familiar. Utilizá-los Soliie Comportamento c (.'ognlv.lo

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como critério de “diagnóstico", único e isolado, pode acarretar em erros ou equívocos, uma vez que os valores de corte podem ser diferentes em outras amostras. Trabalho de intervenção com pais "As pessoas tornam-se pais sem que ninguém as tenha ensinado como dar conta desta responsabilidade" (Sidman, 2001, p. 250). É por isso quo muitos pais agem orn função dos modelos recebidos geralmente em casa de seus próprios pais, do vizinhos o/ou amigos e até mesmo da mídia. Mas isso não é suficiente para aprendor a melhor forma de educar, e assim, muitos pais se engajam em relacionamentos problemáticos com seus filhos, podendo gerar gravos problemas de comportamento para estes últimos. É por isso que todo o conhecimento adquirido nestes e em outros estudos devo sair do meio científico e ser transmitido aos pais. Isso pode ser feito de diversas maneiras. Livros (como de Weber, 2005) são formas muito interessantes, trazem informações, auxiliam no autoconhecimonto e dão dicas de mudança de comportamento. Palestras também cumprem esta função. No entanto, a análise do comportamonto mostra que uma efetiva mudança e aquisição de repertório só ocorrem através de intervenções nas quais a modelagem e o treinamento de comportamentos são propiciados. Intervençõos com pais podem ser feitas por meio de: psicotorapia parental, orientação parental aliado á psicoterapia infantil ou treinamento de pais. Estas intervençõos normalmonto têm como objetivo interromper a interação coercitiva quo se estabelece entre pais e filhos e promover padrões de interação mais positivos o pró-sociais, e assim, aumontar os comportamentos pró-sociais' da criança e diminuir a desobediência (Banaco & Martone, 2001; McMahon, 2002; Patterson, Reid & Dishion, 1992). O foco gira em torno dos comportamentos parentais, já que são os pais aqueles que dispõem de maior controle de reforçadores, e são eles que precisam aprender e modificar a forma de aplicá-los para corrigir comportamentos inadequados de seus filhos (Sousa & Baptista, 2001). Se modificações ocorrem no comportamento dos pais, isso acarreta alteração das contingências ambientais que provocam mudanças nos filhos. Dentre as diferentes formas de intorvenção, o troinamento de pais é o que apresenta maiores vantagens quanto à adesão e quanto á pratiddade (Marinho & Silvares, 2000). Além disso, a literatura cientifica mostra que grupos realizados com pais são eficientes, ocorrendo mudança de comportamento dos pais (Silva, Del Prette & Del Prette, 2000; Rocha e Brandão, 1997; Webster-Stratton, Kolpacoff & Hollinsworth, 1988) e também no comportamento dos filhos (Marinho, 1999; McGillicuddy, Rychtarik, Duquette & Morsheimer, 2001). No troinamento do pais alguns procedimentos sâo utilizados, tais como instruções sobre princípios básicos para a modificação de comportamento, sobro observação o vigilância do comportamento da criança, sobre o uso do reforço (atenção positiva, elogios e sistemas de pontos ou fichas), sobre o uso adequado dos processos do extinção e punição love (time-out e custo de resposta) e sobre como ostabelecer regras claras e objetivas (McMahon, 2002; Sousa & Baptista, 2001). Porém para estes autores, a instrução pode ainda ser insuficiente, pois os pais podem não ser capazes de oporacionalizá-las. Sendo assim, McMahon (2002) e Sousa e Baptista (2001) afirmaram quo os pais precisam passar ainda por um processo do modelação, reprosentação de papéis e ensaio comportamental para que realmente possam troinar tais comportamentos. O objetivo das autoras em desenvolver um trabalho de intervonção com grupos de pais, intitulado "Programa de Qualidade na Interação Familiar", foi o de instrumontá-los com informações objetivas e científicas, oportunizando mudanças de comportamento. É muito importante levar o conhecimento cientifico a quem mais precisa deles: os pais! A partir do momento em que os pais são capacitados a discriminar e modificar seus próprios

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I Ml. Weòer, Arw P.iuIh V. Saívador, O/ívm

I. fír.miicnbuttf

comportamento dele, e a "aversividade" do grito não chega a provocar comportamento de fuga. O que uma mãe relatou, foi que o filho lhe disse que, quando ela grita, ele fica com raiva e por vingança não obedece. Sendo assim, o sentimento ruim gerado pelo grito altera (diminui) a probabilidade de o filho obedecer a mãe. O controle aqui ó diferente do presente na situação 1. Percebe-se que criança reage diferente de acordo com sua história. Quando o filho continua desobedecendo, extingue o comportamento de gritar da mãe, pelo menos naquele momento. O que acontece ó que às vezes o filho obedece, aos gritos, e às vezes não (talvez dependendo do tipo de atividade). Isso reforça intermitentemente o comportamento de gritar da mãe, que não tendo uma boa habilidade de leitura de contingências, generaliza seu comportamento e grita em diversas situações. Pode-se analisar também o grito como comportamento governado por regras. Mesmo que o filho não esteja obedecendo, ou seja, não há reforçamento positivo, a mãe continua gritando com seu filho em diferentes situações porque este comportamento era funcional anteriormente em sua vida. E isto demonstra que o comportamento controlado por regras possui menor sensibilidade às contingências atuais. Em situações como a que foi analisada, é possível identificar o ciclo coercitivo descrito por Patterson, Reid e Dishion (1992), em que os comportamentos são mantidos por reforço negativo. A coerção, tanto do filho quanto da mãe, prejudica a relação entre eles. Ambos passam a esquivar-se um do outro, o que pode caracterizar uma relação distante ou problemática. O profissional que realiza treinamento de pais se depara constantemente com análises como esta, e é seu papel auxiliar os pais na discriminação das contingências mantenedoras de um determinado comportamento. Discriminar comportamentos e suas funções ó de extrema importância por permitir modificação de comportamento. Então, quando os pais conseguem passar pelo processo de discriminação, logo começam a fazer relatos de modificação de comportamento. As autoras fizeram vários registros dos relatos que pais e mães apresentavam durante os encontros, dando especial importância àqueles que se referem à modificação de comportamento. A exemplificação destes registros pode ser visualizada na Tabela 2, de acordo com a divisão de temas do PQIF: relacionamento afetivo e envolvimento, regras e limites, reforçamento, punição e autoconhecimento e modelo.

Tabela 2: Relatos dos pais que demonstram mudança nos seus comportamentos Relaclonamento Afetivo e Envolvimenlo

• Expressão do afeio • “Mudei Agora digo 'eu te amo' com mais facilidade Mudei até com h niposn No começo me sentia melo constrangido Agora está fluindo" ■ Interesse • "Estou prestando mais atençAo no que eles gostam Procuro fazer um agrado’ • Disponibilidade - "Conversar * algo agradável Eu sento agora para falar com ele Antes eu ia conversar e jà brigava com ele* • Dar atençío de qualidade - *A gente procura aplicar o que aprende aqui com eles Dedicar um tempo para eles Eu nâo fazia Isso Eu tinha que fa /er tudo em casa e n to dava ale nçio Agora eu estou mudando Isso" - Autonomia - "Aprendi a respeitar a vontade dele, mesmo nâo concordando Claro se n lo for algo ruim para ele" • ImplementaçAo de regras na casa - ‘As regras lá em casa foram aplicadas, agora cnda um tem suas regras, tem horário para brincar, para estudar, para fa/er suas obrlgaçAes " - Clareza - "Percebi o quanto estar no lugar do filho é dlflcll, por que n lo pode Isso, n to pode aquilo, n lo A fácil, néo pode nada e n lo tem porquê Passei a explicar para a minha filha o porquê das coisas, por que ela tem que arrumar suas bonecas ou brinquedos" - Consistência • "Cumprir o que prometeu. Isso eu nâo fa /la Eu percebi que se eu cumprir o que falei, as coisas dâo certo’ - Observar comportamentos positivos do filho • "Eu sempre fazia errado, antes do curso, era só observar os erros das minhas filhas e n io as coisas certas Sempre acabava indo pelo lado negativo, agora, de pota do curso, me seguro’ - Uso do elogio - "Eu a elogio, e ela me elogia Pus em prática os elogios" • Técnica de pontuação ou tabela - "Eu só punia e nunca elogiava, depois da aula sobre o cartaz eu aprendi a fazer Isso, ele desenha aa estrelinhas e fica todo faceiro*.

Sobre Comportamento c CogniçSo

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Relaclonamento Afetivo e Envolvimento

• ExpressAo do sfsto - “Mudai Agora digo 'eu I* amo' com m ais facilidade Mudei até com n esposa No começo ma sentia meio constrangido Agora eatá fluindo" • Interesse - "Estou prestando mais alençôo no que elas gostam Procuro fa /er um agrado" - Disponibilidade - "Conversar é algo agradável Eu sento agora para falar com ele Antea au la conversar • já brigava com ala" - Dar atenção de qualidade - ’ A gente procura aplicar o que aprende aqui com elea Dedicar um tempo para eles Eu nâo fazia isso Eu tinha que fa/er tudo am casa • nAo dava atençAo Agom eu estou mudando Isso" Autonomia - 'Aprendi n reapeitar a vontade dele, mesmo nAo concordando Claro se nAo fnr algo ruim para ele"_________________________________________________________________________ - Implementação de regras na casa • "As regras IA em casa foram aplicadas, agora cada um tem suas regras, tem horário para bnncar, para estudar, para fa /er suas obrigações " • Clare/a - "Percebi o quanto estar no lugar do filho é dlflcil, por que nAo pode isso, nAo pode aquilo, nAo é fácil, nAo pode nada e nAo tem porquê Passal a explicar para a minha filha o porquê das coisas, por que nla tem que arrumar suas bonecas ou brinquedos" • Consistência ■ 'Cumprir o que prometeu, isso eu nAo fa ria Eu percebi que se eu cumprir o que falei, as coisas dAo certo" • Observar comportamentoa positivos do filho • "Eu sempre fa /la errado, antes do curso, nra só observar os erros das minhas filhas e nAo as coisas certas Sempre acabava Indo pelo lado nmgalivo, agora, depois do cun o, ma aeguro" • Uso do elogio - "Eu a elogio, e ela me elogia Pus em prática os elogios" • Técnica de pontuaçAo ou tabela • "Eu só punia e nunca elogiava, depois da aula sobre o cariar eu aprendi a fa /er isso, ele desenha as estrelinhas e fica todo faceiro"

Os depoimentos apresentados na Tabela 2 revelam que, com a participação no PQIF, muitos comportamentos parentais importantes foram instalados no repertório dos pais, e alguns comportamentos inadequados diminuíram de freqüência ou foram suprimidos. Ressalta-se que houve uma renovação do concerto "amor", pois passaram a expressar mais este sentimento de diversas maneiras, incluindo demonstração de interesse e atenção pelo filho ("Só beijo e abraço nâo são as únicas formas de expressar que você gosta de alguém. Descobri aqui que prestar atençáo é uma forma"). Os pais que náo tinham regras bem definidas em casa passaram a determiná-las, e tomaram-se mais consistentes e mais claros. O reforço foi um conceito novo introduzido no repertório verbal dos pais, o que facilitou uma mudança intensa, pois a grande maioria dos pais disse que, enquanto antes só viam erros, agora percebiam mais os comportamentos corretos dos filhos. Esta mudança é valiosa, pois interfere no próprio conceito de disciplina e educação, os quais são, muitas vezes, associados à punição. Além disso, estudos têm mostrado que a observação e valorização dos comportamentos adequados da criança também alteram a percepção que os pais têm de seus filhos - vendo-os de forma mais positiva - o de si mesmos - vendo-se como pais mais eficientes (Marinho e Silvares, 2000). Quanto à punição, houve mudança no sentido de se utilizar outras formas de conseqüenciar comportamentos inadequados, mais adequadas e menos danosas, como o ignorar e conversar ao invés de gritar e dar bronca, possibilitando a diminuiçào de palmadas. Foram muito interessantes as mudanças relacionadas ao tema “autoconhecimento e modelo". Os pais passaram a se perceber mais, a se valorizar. Eles procuraram o programa para solucionar problemas dos filhos e puderam perceber o quanto eles precisam se conhecer e se modificar, compreendendo que influenciam o comportamento dos filhos. Como os pais relataram diversas mudanças em seus próprios comportamentos, esperava-se que houvesse mudança no repertório dos filhos. Isso é esperado, uma vez que se houver mudança na contingência, nos antecedentes ou nos conseqüentes, ou nos elos das cadeias, certamente o comportamento de Interesse (neste caso o do filho) se modifica. Pelo relato dos pais Isso aconteceu. Sobre o tema relacionamento afetivo e envolvimento, os pais trouxeram informações sobre mudança na relação com os filhos, afirmando estarem mais próximos ("Houve bastante

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l >dl,i N . f>. Weber,

A m P.tuJ«i V. Sdlvdüor, Oliw.i I. Kr.mdrnburtf

mudança entro eu e a minha filha: estamos mais próximas"), havendo maior cumplicidade e, mudança nos filhos que estavam aceitando mais carinhos ou sendo mais carinhosos ("Estou dando mais carinho e recebendo também"). Pais relataram que mudanças quanto ás regras contribuíram para a obediência dos filhos ("Meu filho está diferente, a semana inteira ele chegou em casa e primeiro fez a lição e depois foi brincar. Elo está mais obediente"). O ignorar diminui birras de algumas crianças (“Comecei a ver resultado nas atitudes da minha filha. Quando ela fazia birra, comecei a ignorar, e ela parou de fazer”). A maioria das mudanças nos filhos foi relacionada pelos pais a uma nova forma de agir: reforço de comportamentos corretos. A implementação desta prática teve resultados imediatos. Muitos pais relataram quo perceberam alteração positiva no comportamento dos filhos ("Comecei a dar as estrelinhas para a minha filha e observei melhoras excelentes”), comprovando que o reforço aumenta a freqüência do comportamento ("Minha filha começou a fazer mais as coisas que eu elogiava”); alguns especificaram dizendo que houve aumonto do desempenho escolar (“Passei a elogiar o caderno do meu filho, e agora está caprichando mais no caderno"; "Minha a filha está lendo melhor após os elogios"). Os pais relataram alegria e aproximação dos filhos ("Eu passei a elogiar mais meu filho, e ele ficou tão alegre que foi contar para a avó 'Vó, a mãe tá me dando parabéns porque estou indo dormir sozinho"; “Estou elogiando mais meu filho, então ele me escreve uns bilhetinhos dizendo que me ama, ele está mais junto de mim"). Alguns rolataram mudanças em outros relacionamentos (“Aprendi a elogiar o a roceber elogios do meu filho e meu marido, percebi que eles também se sentem bom, melhorou a auto-estima do todos"; “Comecei a elogiar mais meu irmão. Falei também para meu filho para ele elogiar a namorada, percebi que mudou a relação deles"). Além das análises qualitativas dos relatos de pais e mães, foi feita também uma análise quantitativa com apenas 17 mães participantes dos grupos. Estas mães se dispuseram a responder o instrumento EQIF, versão para pais (Weber, Salvador & Brandenburg, 2005), no primeiro e último encontros do programa. Os resultados da primeira e segunda aplicação foram comparados através do teste estatístico nãoparamótrico Mann-Whitney U, e podem ser visualizados na Tabela 3. Tabela 3: Apresentação das médias dos escores de cada escala do EQIF obtidos no primeiro e último encontro do programa, valor do Mann-Whitney U e índice de significância

NolArtonnmnnto flfatlvn f nvnlvlmonto Roflrnn ModoIn PuntçAo InMrimitMdii ComunloicAo noaatlvn

Mftdla 1o oncontro 38*88 35,08 27,80 12,41

4,es 11.82

M0.06 >0.05 >0,05

Foram comparadas as médias apenas das escalas quo modom práticas educativas parentais, portanto as duas escalas de clima conjugal, comunicação positiva dos filhos e sentimento dos filhos não foram analisadas, pois estes temas não são trabalhados no programa. Ao observar as seis escalas apresentadas na Tabela 3, percebeu-se que houve aumento significativo de apenas uma delas: o envolvimento. Porém, mesmo nào havendo diferença estatisticamente significativa, pode-se perceber um sutil aumento nas médias de relacionamento afetivo e regras. As médias de modolo permaneceram praticamente iguais. E quanto às médias de punição inadequada o comunicação nogativa, pode-se perceber uma sutil diminuição nas médias.

Sobre Comport.imcnlo c C ognlvtlo

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O fato de as médias obtidas nas duas aplicações não se apresentarem diferentes estatisticamente pode ser explicado de três formas: amostra muito pequena, o quo dificulta a análise estatística; pequeno período entre as duas aplicações (apenas 8 semanas); ou ainda, mães que já iniciaram o programa com um bom repertório de comportamentos parentais (apresentando altos escores na primeira aplicação). As alterações nas médias entre a primeira e segunda aplicações, mesmo quo sutis, apontam para modificações do comportamento destas mães de acordo com o esperado. E isto podo ser considerado como indicativo da oficácia do programa. Como a modificação de comportamentos de pais e mães ó um objeto de estudo de difícil acesso e de difícil investigação, relatos verbais e apontamentos estatísticos são de extrema rolovância para se obter feedback da efetividade do trabalho realizado em grupo. Enfim, pôde-se perceber através dos relatos, que os pais avaliaram o programa de forma positiva, valorizaram a troca de experiências ontro os participantes, ressaltaram que as dúvidas que tinham foram esclarecidas e que perceberam aumento na segurança em seus papéis de pais. A aplicação do PQIF demonstrou a importância de trabalhos de intervenção com pais, estes necessitam muito de auxílio da psicologia, pois se sabe bem quo ser pai ou mãe não é intuitivo e sim um repertório específico aprendido.

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Sobre t'omporf.imcnlo o C'oflniv«1o

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I idi«i N. I>. Weber, Ana 1’dul.i V. S.ilv«ulor, Ollvld I. lU.imlrnlnirv;

Capítulo 3 Qualidade de interação familiar: uma análise da percepção de adolescentes sobre os conflitos em suas famílias Lídia Natalia Dobrianskyj W c b c r1 Josafá Moreira C u n h a 1 UFPR

Durante as duas últimas décadas os estudos sobre o desenvolvimento na adolescência têm sido notadamente voltados para questões relacionadas à interação dos adolescentes com seus pais (Steinberg, 2001; Steinberg & Lerner, 2004). Diversas pesquisas têm reforçado a importância das interações intrafamiliares para o desenvolvimento das crianças e adolescentes, em aspectos físicos, psicológicos, sociais e cognitivos (Steinberg & Silk, 2002), sendo que nesse estudo abordamos essas interações de estilos e práticas parentais. É necessário, portanto discutir a diferença entre estilos parentais e práticas educativas. O estilo parental ó o conjunto de atitudes dos pais em relação à criança, o qual define o clima emocional em que as práticas parentais se expressam (Darling & Steinberg, 1993). Durante as interações pais-filhos são observados comportamentos em que se expressa afetividade, responsividade ou autoridade ( Cecconello, Antoni & Koller 2003). A literatura sobre o tema permite identificar duas dimensões distintas na interação de pais e filhos: as práticas educativas e os estilos parentais. Weber, Viezzer & Brandenburg (2003), apontam que as práticas educativas constituem comportamentos dos pais reforçados por modificações produzidas no comportamento dos filhos. O estilo parental, por sua vez, refere-se ao padrão global de características da interação dos pais, que geram um clima emocional. Ou seja, é uma classe de respostas dos pais mais ampla, que ó comum em várias ações e momentos (Weber & cols., 2003). A relação entre pais e filhos ilustra uma situação na qual existe uma concentração de poder na figura dos pais. Existem, no entanto, duas maneiras pelas quais os pais podem utilizar este poder para alterar o comportamento dos filhos (Cecconello & cols. 2003): a primeira, através de uma disciplina indutiva, que objetiva uma modificação voluntária no comportamento da criança; e a segunda, através de técnicas que reforçam e reafirmam o poder parental, como práticas coercitivas. As práticas de maneira Indutiva 1Maitlra a Doutora am Piteoloala Expartmartfal pata USP, profeaaom da graduaçAo em Pnootogla • (ta pô*graduaçAo am EducaçAo da LM-PR Coordenadora do Núdeo da AnáNee do Comportamento 1Psicóloga pala UFPR; aluua do Programa da pôe graduaçAo em fcducaçAo (Maatrario) da UFPR

Sobre (omporfumenfo c Co^ni^lo

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promovem uma conscientização das conseqüências dos atos da criança (explicação de regras, apelo ao amor que sente pelos pais). Já a prática coerciva, envolve a aplicação direta do poder dos pais (puniçào física e privação de privilégios ou ameaças). A primeira apela para a estruturação lógica da situação, enquanto a segunda apela para a punição. Diversos estudos vêm demonstrando que práticas educativas parentais punitivas estâo associadas a problemas de comportamentos nas crianças, como raiva, sentimentos de fracasso, diminuição da auto-estima e auto-confiança da criança, além de ensinar o medo; enquanto práticas que incluem aceitação, incentivo e apoio estão associadas ao desenvolvimento de comportamentos adequados (Sidman, 2001; Weber & cols., 2003). Há estudos demonstrando também que a exposição freqüente à punição fisica aumenta o risco de o adolescente se envolver em brigas (Simons, Lin & Gordon, 1998). Para diversos autores ocorre durante a adolescência uma situação aparentemente contraditória na interação entre pais e filhos: os adolescentes buscam estabelecer autonomia em relação a eles e manter seu sentimento de associação aos pais (Oliveira & Costa, 1997; Steinberg & col., 2002), sendo que o aumento de conflitos no âmbito intrafamiliar ó esporado. Apesar disso, Steinberg (2001) ressalta que brigas freqüentes e de alta intensidade não são normativas durante a adolescência. Ainda assim, são os conflitos entre pais e adolescentes que recebem a maior atenção por parte de pais e pesquisadores. Nesta pesquisa definiu-se o termo “conflito" pelo desentendimento de duas partes sobre um determinado assunto ou situação. As dificuldades associadas aos conflitos pais-adolescentes podem ostar relacionadas menos ao conteúdo do conflito e mais à maneira pela qual o conflito é geralmente resolvido (Steinberg & cols., 2002), ou seja, o mais importante durante interações em que o pai e o adolescente entram em conflito náo é a razão da briga, mas sim as estratégias para solução de conflito que emergem durante estas situações. Mas quais os motivos pelos quais os adolescentes brigam em casa? Com essa questão em foco, foi realizado um estudo por Weber, Baptista, Cunha, Takeda & Yamakawa (2005b), no qual foram investigados por meio de um questionário aberto os motivos comuns de conflitos intrafamiliares, cujas categorias foram utilizadas para análise no presente estudo. A seguir, serão discutidos os temas de conflito que foram usadas nesse estudo, e sua relação com o desenvolvimento dos adolescentes. Uso indevido de álcool e outras drogas. Ao estudar o uso indevido de álcool observa-se a predominância do gênero masculino dentre os usuários tanto entre pais quanto entre filhos (Kelly, Kowalyszyn 2003; Costa & cols., 2004; Weber & cols. 2005b). Os estudos de Kelly & col. (2003) sugerem que em famílias onde um dos membros faz uso Indevido do álcool observa-se maior freqüência nos conflitos. Em relação ás práticas parentais, baixos níveis de monitoramento por parte dos pais estão associados ao uso abusivo de álcool e outras drogas pelos filhos adolescentes (Crouter, Head, 2002). Viagens e saldas. Os adolescentes preferem estar fora do lar, interagindo com seus pares desenvolvendo assim sua identidade adulta (Forte, 1988). Entretanto, essas saidas não supervisionadas são fonte de estresse para os pais representando um foco importante de conflitos diante da busca de autodefiniçâo dos adolescentes e a atitude de controlar essas atividades por parte dos pais (Steinberg & col. 2002). Uma forma de lidar com essa ansiedade dos pais é o investimento na qualidade do tempo, proposta por Chapman & col. (1999), sendo essa também uma estratégia possível para realizar o monitoramento das atividades dos filhos (Crouter & col., 2002). Relacionamentos extrafamiliares. Nessa categoria foram encontrados conflitos relacionados a (1) relacionamentos amorosos o (2) amizades.

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Lidia Natalia Dobriansky) Weber, Jo»afá Moreira Cunha

No campo dos relacionamentos amorosos, adolescentes que afirmaram estar envolvidos em relacionamentos românticos relatam mais conflitos que outros adolescentes (Laursen, 1995; Doyle, Brendgen, Markiewicz & Kamkar, 2003). Collins (2003) aborda essa questão afirmando que as fontes do problema não são os relacionamentos amorosos dos adolescentes em si, apontando cinco características das relações românticas entre adolescentes que podem clarificar esse tema: onvolvimento, seleção do parceiro, conteúdo do relacionamento e processos cognitivos e emocionais. Quanto ás amizades há um amplo suporte na literatura quanto ao importante papel desempenhado pelos relacionamentos horizontais no processo de individualização do adolescente (Forte, 1988; Steinberg & col., 2002; Doyle & cols., 2003; Bowker, 2004; Rubin , Dwyer, Booth-LaForce, Kim, Burgess & Rose-Krasnor, 2004), Durante a infância os pais exercem uma forte influência na escolha dos amigos de seus filhos. Entretanto, na adolescência, a escolha das amizades está freqüentemente fora do controle dos pais (Steinberg & col., 2002; Rubin & cols., 2004). Assim, os pais entram em conflito com o adolescente ao encontrar seu filho convivendo com amigos a quem os pais consideram inadequados, e mesmo quando aprovam o relacionamento de amizade os pais irão se deparar com comportamentos quo não estão de acordo com seus próprios valores. Ê importante notar que apesar do provável aumento da influência dos amigos, o relacionamento com os pais continua sendo uma base para o comportamento dos adolescentes (Steinberg & col. 2002). Finanças. Dificuldades econômicas estão relacionadas a um risco aumentado de conflitos familiares (Wadsworth & Compas, 2002; Steinberg & col., 2002) e também a problemas escolares o de saúde (Magnuson & Duncan, 2002). A intensidade dos conflitos entre os pais e entre os pais e adolescentes foi relacionada a dificuldades econômicas enfrentadas na família (Wadsworth & col., 2002). Um aspecto interessante das dificuldades financeiras está relacionado à valorização de bens materiais como forma de expressão de amor, sendo que Chapman & Campbell (1999) propõem o oferecimento de presentes como uma das linguagens de amor importantes nas interações familiares. Tarofas. Segundo Eberly & Montemayor (1999), o conteúdo, intensidade e freqüência dos conflitos familiares afeta o comportamento pró-social dos adolescentes dirigido aos pais. Nesse mesmo estudo é destacado que a falta de ajuda nas tarefas por parte dos adolescentes é um importante catalisador de brigas no âmbito intrafamiliar. No estudo de Weber & cols. (2005b) observou-se que os conflitos relacionados a tarefas domésticas envolviam principalmente mães e filhas, sugerindo uma relação com o papel social da mulher na cultura brasileira (Oliveira & cols., 1997), as quais assumem uma quantidade maior de tarefas domésticas em relação aos homens. Escola. Existe ampla literatura suportando a relação entre os estilos parentais e o desempenho escolar (Steinberg & col., 2002; Leung, McBride-Chang & Lai, 2004). Conflitos familiares podem acarretar em mau-desempenho escolar voluntário por parte dos adolescentes (Chapman & col., 1999), como forma de manifestar sua insatisfação. Outros conflitos. Dentre outros grupos de conflitos encontrados, destacam-se os motivados por banalidades, incluindo conflitos corriqueiros, como provocações entre irmãos, discussão sobre futebol, ou quebra não intencional de objetos (Weber & cols., 2005b). Tais conflitos podem ser categorizados dentro da ocorrência normal de conflitos na relação entre os adolescentes e seus pais (Steinberg & col., 2002). Entretanto, há evidências de que algumas dessas brigas podem estar relacionadas às práticas parentais, como por exemplo, a atribuição negativa a um dos irmãos por parte dos pais (Matthews & Conger, 2004) sendo também freqüente a observação de conflitos por banalidades entre irmãos, como parte normal do relacionamento fraterno (Noller, 2005).

Sobre Comporl.imcnto t Cognivào

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No estudo de Weber & cols. (2005b) sobre os conflitos familiares não foram encontradas correlações significativas entre as variáveis diretamente relacionadas aos conflitos e as dimensões de qualidade de interação familiar, sendo que tal fato pode ser atribuído à multiplicidade de fatores que contribuem para a ocorrência dos conflitos, incluindo desde aqueles relacionados aos indivíduos, ao núcleo familiar e outras influências macrossistêmicas (Cecconelo & cols., 2003). Verhofstadt, Buysse, Ickes, Clercq & Peene (2005), ao estudar interações entre casais apontam uma tendência de integração no estudo das interações de conflito e o suporte social. Ao analisar as diferenças comportamentais entre interações de conflito e suporte foi possível observar comportamentos positivos (validação, facilitação, suporte emocional, suporte instrumental), negativos (invalidação, culpa, desengajamento) e neutros (proposta de mudança, descrição do problema, irrelevante). Noller (2005) sustenta a relação entre o comportamento dos pais entre si e o comportamento dos filhos ao afirmar que “se os pais são positivos em seus relacionamentos um com o outro, eles irão também ser positivos em seu relacionamento com os filhos e os filhos serão positivos no relacionamento entre si". Assim, percebe-se que os comportamentos positivos e negativos, no presente estudo abordados a partir das práticas parentais, tem uma influência clara no desenvolvimento das crianças. Com base na literatura consultada, o objetivo da presente pesquisa foi analisar a relação entre a qualidade das práticas educativas parentais e as interações de conflitos e suporte, estudando também algumas variáveis demográficas, partindo da percepção dos adolescentes sobre essas interações.

Método 3.1 Participantes A amostra consistiu em 128 estudantes do ensino médio (72 sexo feminino, 56 sexo masculino) com idade média de 16,09 anos. Os adolescentes foram recrutados em aleatoriamente em uma escola pública de Campina Grande do Sul, na Região Metropolitana de Curitiba - PR. Os dados coletados indicam que os adolescentes eram predominantemente da classe social média. O relacionamento conjugal dos pais tem uma duração média de 17,36 anos, O tipo de família predominante foi o biparental (78,1 %), sendo 17,2 % tipo monoparental e 4,2 % outros. 3.2 Instrumentos Para a coleta de dados foram utilizados quatro instrumentos: as Escalas de Qualidade de Interação Familiar (EQIF) de Weber & cols. (2003); um questionário de avaliação da interação em conflitos3elaborado para essa pesquisa a partir do questionário de conflitos de Weber & cols. (2005b) incluindo uma adaptação do instrumento usado por Verhofstadt & cols. (2005) para medir o nível de suporte percebido pelos participantes; e um questionário de mensuração do nlvel socioeconômico desenvolvido pelo IBOPE. 3.3 Procedimento O contato com a escola selecionada foi feito através de telefone e uma carta de autorização para realização da pesquisa foi entregue. Com a autorização concedida, realizou-se a seleção da amostra de acordo com critérios já estabelecidos, sendo a participação voluntária e anônima. Os participantes responderam os questionários (1o EQIF; 2o Interação em Conflitos e 3o IBOPE) na própria escola durante um tempo de aula.

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Lídia Nalalia Dobriantkyf Wrber, lo»afá Moreira Cunha

3.4 Análise dos dados Demográficos. Os participantes forneceram informações demográficas a respeito de si e de suas famílias. Suporte. O nível de suporte foi medido através da adaptação de Verhofstadt & cols (2005) por meio do uma oscala Likert de 5 pontos. O Alfa da Cronbach (á), usado como modida de consistência intorna, foi do 0,64. Essas medidas foram somadas em um escore total do suporto. Conflitos. Os adolescentes forneceram informações sobre os conflitos em suas famílias nas 7 categorias (1 = álcool o drogas, 2 = viagens e saldas, 3 = amizade e amor, 4 = dinheiro e contas da casa, 5 = tarefas, 6 = escola, 7 = outros) om questões de 5 pontos que ofereciam informações especificas da categoria, freqüência, participação do adolescente, intensidade da reação afotiva o intensidade dos conflitos , sendo que o Alfa do Cronbach dessas questões do conflito foi de 0,88. Havia também uma questão aborta na qual os adolescentes opinaram sobre os conflitos om suas famílias. Foram computados os escores totais de froqüència, participação do adoloscente, intensidade da reação afetiva e intensidade dos conflitos somando-se as respostas a esses itens em todas as categorias do conflito (á= 0,93), sendo que postoriormente os escores dossas variáveis foram distribuídos nas catogorias alta. média e baixa (á=0,82). Qualidade do interação familiar. Para esta parto da análise foram selecionados somente 111 participantes que responderam a essa parte do questionário de forma completa. As escalas de qualidade de interação familiar foram analisadas por meio dos escores totais do cada uma das 10 dimensões da EQIF (á = 0,95). As variáveis de conflito foram relacionadas com as dez dimensões das oscalas de qualidade de interação familiar por meio do teste de Correlação do Poarson, e em outros momentos foram usados também o testo tde Student, ANOVA e Qui-quadrado para comparar as variáveis de conflito com as variáveis suporte e demográficas, conforme adequado. Utilizou-se principalmente o teste ANOVA para relacionar os níveis de suporte familiar, as diferentes categorias de família (1 = Monoparontal, 2 = biparental e 3= outros) e as diferentes classes sociais (1 = Classes C, D e E; 2 = Classes B1 e B2 e 3 = Classes A1 e A2, de acordo com os critérios do IBGE). Para analisar a relação dos escores das variáveis do conflito com gênero, idade, e tempo de casamento dos pais foi utilizado o Teste t de Student.

Resultados e discussão A relação entro o motivo do conflito e o gênero do adoloscente foi significativa nas categorias tarefas (t = -2,782; p < 0,05) e outros (t = -2,508; p < 0,05). Nessas duas catogorias a média dos participantes do sexo feminino foi maior que a dos de soxo masculino, confirmando nos conflitos relacionados às tarefas uma tendência apontada por Weber & cols. (2005b), tondo em vista que as mulheres estão mais propensas a so envolver em conflitos relacionados a tarefas por serem responsáveis pela maior parto das atividades domésticas, além de experimentarem maiores restrições em relação aos rapazes (Oliveira & cols., 1997). Foi observada uma relação significativa ontre os membros quo contribuem financoiramonto para a família o os conflitos motivados por dinheiro e contas da casa (F = 3,712; p < 0,05) sendo com mais conflitos dessa categoria nas famílias em que somente a mão foi citada como mantenedora financeira.

Sobrr Comportamento c Co#niv 0,05) e participação do adolescente nas tarefas (F = 0,424; p > 0,655). Também não foram significativas as relações da intensidade dos conflitos com definição (F = 1,029; p > 0,05) e participação do adolescente nas tarefas (F = 2,194; p > 0,05). Sobre essas variáveis seria esperada uma relação significativa, com base no estudo de Eberly & col. (1999) que propõe esses fatores como Influentes na intensidade e freqüência dos conflitos familiares. Tabela 9: Correlação entre escores de fatores de conflitos sobre tarefas e as dimensões da EQIF. As tarafos « n minha casa estflo dafinidan

Participo das tarefas em casa .078

Nalactonflmankj atetlvo

.288**

Envolvtmanlo

,293**

,039

Ragras • monitoria

,184

.221*

,093

.119

,433**

,158

Punlçâo corporal Comunicação poaitlw

-.240*

,182

,230*

,101

Santlmank) dos filhos

.209”

,001

CNma coryugal poslüvo

.162

,083

Comunicação nagatlva McxMo

** p«0,01 * p < 0,06

Sobrr Comportamento c CotinifAo

51

4.2.1 Escola "Problemas com o colégio (...) nada de mais, apenas uma discussão e, no fim um 'acordo' para os problemas“.

Nas duas questões especificas sobre o desempenho escolar encontramos uma relação significativa da primeira questão, relacionada à monitoria, com as dimensões da EQIF (Tabela 10). A relação significativa e negativa do clima conjugal negativo com o desempenho escolar era esperada (Chappman; 1996). Tabeia 10; Correlação entre escores de fatores de conflitos sobre a escola e as dimensões da EQIF. Meus pais sabem como estou me saindo na escola

Meu desem penho na escola ó

Roladonamento afetivo

.281“

-.064

EnvoM m ento

.255*

-.031

,269“

Regras a monitoria

-.136

P u n lç io corporal Comunicação positiva

,296“

Comunicação negativa

-.320**

,005 -.125 ,070 -.183

Modelo

.240*

-.113

Sentimento do* filhos

.151

-.044

.204*

-.100

Clima conjugal positivo ■



-

-J&L

**. p < 0,01 * p < 0.05

4.3 Conclusoes

Os dados da presente pesquisa revelam relações significativas entre os conflitos familiares, e suas variáveis, com as dimensões da qualidade do interação familiar. Além disso, ao fazer uma análise, mesmo que limitada, da relação entre o suporte percebido com os conflitos, sustenta-se a tendência integrativa no estudo de suporte e conflito (Verhofstadt & cols., 2005), sendo que um estudo pormenorizado dessa relação possivelmente indicará estratégias importantes para se lidar com os conflitos, sendo que essas estratégias possivelmente vão estar relacionadas também ao tema dos conflitos. Importantes direções para a prevenção de conflitos podem ser traçadas com base nos resultados, e mesmo levando-se em consideração a inevitabilidade dos conflitos entre adolescentes e seus pais, percebe-se claramente uma relação entre fatores de suporte e fatores de risco para o adolescente, sendo que em ações educativas direcionadas a pais ou adolescentes, como o treinamento de pais (Caballo, 2002; Weber, 2005a; Weber, Brandenburg & Salvador, 2005c), por exemplo, no qual os pais poderiam aprender estratégias mais eficazes para lidar com os diferentes conflitos. Cabe notar que algumas dimensões da EQIF estiveram particularmente relacionadas a formas mais positivas de lidar conflitos, em particular o relacionamento afetivo, envolvimento, regras e monitoria, comunicação positiva, sentimento dos filhos e o clima conjugal positivo. Juntamente, esses fatores podem ser considerados indicadores de eixos de desenvolvimento para estratégias para lidar com conflitos

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Lidifl Nalalia Dobrfanskyf Weber, losaíA M oreira Cunha

familiares, sendo que com o desenvolvimento destas dimensões podemos ter mais adolescentes e pais vivendo em um ambiente familiar mais saudável. Alóm disso, no que diz respeito ao estudo especifico dos conflitos, esse trabalho oferece avanços no que diz respeito à mensuração dos conflitos, sendo que o questionário de conflitos desenvolvido durante o estudo demonstrou-se um instrumento digno de estudos posteriores visando seu aperfeiçoamento. Os objetivos propostos para osso trabalho foram atingidos, observando relações significativas nào só sobre os conflitos em si, mas tambóm com outros aspoctos da vida do adolescente. Foi reforçada a afirmação sustentada em pesquisas intornacionais de que os conflitos são normativos da adolescência (Steinberg, 2001), sendo que os resultados aqui discutidos servem para que pais, profissionais o os próprios adolescentes possam pensar om formas melhores para lidar com as dificuldades nesse caminho sempre diferente que ó a adolescência. Espera-se, portanto, que esta pesquisa tenha oferecido uma contribuição significativa para o progresso da análise comportamental dos adolescentes e a relação destes com sua familia.

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Sobre ('o m por1

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condicionados e assim, professores, tarefas escolares, situações que antecipam ir à escola, ou qualquer atividade que requer leitura, escrita, organização e raciocínio, também adquirem esta propriedade- A punição, por sua vez, tem efeitos colaterais e um deles é produzir fuga e esquiva e vir acompanhada de sentimentos e sensações que caracterizam ansiedade (Sidman, 1989). No caso de B, a ansiedade e o medo quo antecipam as situações que terminam em punição não sâo as causas dos problemas do palpitação, queixas de dores abdominais, mas são comportamentos que se desenvolvem em situações onde a punição é certa, principalmente porque a pessoa não consegue emitir os comportamentos desejados, uma vez que eles não fazom parte de seu repertório ou estão deficitários e inadequados. A intervenção do terapeuta deve se dirigir a alterar as contingências atuantes por parto dos pais e da própria escola, com o objetivo de desenvolver novos comportamentos do leitura, oscríta, cálculo e de reíacionamento sociaí, que possibilitarão a obtonçáo de reforçamento positivo para esta nova classe de comportamentos, diminuindo as esquivas e fugas emitidas. B. foi encaminhada para outra escola, com um esquema educacional diferente da anterior. B. foi também encaminhada para a fonoaudióloga da clínica, que ó responsável pelo desenvolvimento de repertórios de leitura e escrita mais sofisticados. O acompanhamento na área de psicologia inclui sessões individuais e om grupo com o objetivo de desenvolver habilidades sociais mais adequadas, diminuindo as dificuldades de relacionamento em casa (com seus pais e sua irmã) e na escola (com seus colegas e adultos responsáveis), aíém de desenvolver habilidades de cáículo e matemática mais adequados á sua série escolar. B. aprendeu a identificar as situações em que apresenta medo o ansiedade; em lugar de esquivas, foi feito reforçamento de comportamentos de enfrentamcnto das mesmas (expressar seus pensamentos, expressar os sentimentos de manoira mais adequada). São feitas orientações com seus país com o objetivo de ensinar modelagem através de roforçamento positivo, identificar as situações onde os comportamentos de ansiedade e medo são mais prováveis e enfrentar estas situações sem ceder às birras ou aos evitamontos anteriormente apresentados, B. foi colocada em situações onde ficou gradualmente mais tempo sozinha na clinica, sem a presença da mãe na sala de espera, até que conseguiu permanecer o tempo todo das sessões sem ir até à sala de espera para verificar se sua mãe estaria lá. Houve ocasiões em que ficou esperando por seus pais sem demonstrar sinais de desconforto. Consegue fazer leituras e cálculos com mais rapidez. Seu relacionamento com as outras crianças ficou mais adequado; inicia conversas, mantém atividades com outras crianças nas sessões em grupo, dírige-se mais adequadamente às outras crianças e à terapeuta, brinca com algumas crianças mesmo na sala de espera, não apresenta mais comportamentos de agressão física ou verbal, tem excelente relacionamento com as terapeutas. Os comportamentos considerados de ansiedade diminuíram de freqüôncia e B. encontra-se sem medicação. O caso de B procurou descrever uma situação onde as queixas iniciais do ansiedade foram consideradas não causas dos comportamentos, mas como comportamentos que surgem como produtos de esquemas de contingências punitivos. A intervenção nas contingências atuantes teve como objetivos uma intervenção na escola e família e nos próprios repertórios deficitários de leitura, escrita e cálculo que possibilitariam o desenvolvimento de novos comportamentos, mais adequados à situação escolar e a diminuição das esquivas e fugas anteriormente utilizadas. As dificuldades de relacionamento de B. também não foram consideradas como causadas pelas dificuldades de leitura, escrita e cálculo, mas relacionam-se funcionalmente

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Márcírt d« Rochri Pittd ferra/, I /ertorv.jrn, C.tfid d x * c A|»«àtx>lt«|iiadom(>açM^ww«r a rin (|tm Mo arrameaaadoa »ob yravklada em função do lampo A primar« darivada d« aqiiaçAo em x A dy/dx »2 h x♦ ba rti|HniM!nlaavetoddadeenifunçAodotempo(ou V ■ Vo ♦ g l,comoéu»*daemíl»tca) A»egundailerlvedada«*|iiav*o* d2y/dx2■ 2 a(ou, como MMH»k;a Ala« do »ngurxlo grau, a «egiinda derivada è unia oonilartt* Por Hmki a Flaica uMH/a- wi da iwntlxiliw im n (teacrever lançamento de o ty * » gravidade pó«*» a vetocklade do* cÂtfik» varta da modo ^jroxlmadamenta linoar ami o tomfxj, txi aeja, a ixlnwwa derivada da vekxidade (qtm 6 a »egimda derivada da eqiieçâodo eapeço. ou teja, a aoeleraçAo) nfci varta muHo Auun, mi |>ariMx>laH «Ao Ixm*tf(iroxlmMçAe« (M NHo movimento de lançado. w übgravtdadn abxlnquenali» objeto» em n - [16706 -(3 7 0 )’ : 10] : (1 0 -1 ) S? - [16706 - 136900 ' 101 • 9 S '■ j 16706 - 13690]: 9 S o V3016 : 9 ~ 18,3 lfl Embora m|m *kii|>kt» do utlctilur u lácJt do af*»M»itNr, a nubmatrvn ara contar o (uno rnal d« um ufrik) com um (xwfk^tnUt d« coriflanva do 90%. I»k> dovorta «gnUcar quo a|wriai nm 10% doa coaot o peio mal mria rnakir qim 2071, ou iimnk* qu« 2011 porém. uoittoo mékxk) do rJWcuk>do kiliirvnk) do mnltança riAo 6 |imMfuos esllmtA» iwtwomiítnin*, tnh corno aobriimrnto c Cognifdo

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esse mesmo efeito preventivo contra o desamparo aprendido? Em um dos estudos, animais que receberam poucos reforços positivos, liberados de forma contínua (40-100 reforços liberados em CRF), apresentaram o desamparo de forma equivalente a outros animais que não passaram por esse reforçamonto, ou seja, não apresentaram o efeito de "imunização" (Mestre & Hunziker, 1996). Contudo, outro estudo demonstrou que o desamparo foi apresentado de forma menos intensa quando os animais foram proviamonte oxpostos a reforços positivos liberados em maior quantidade e de forma modoradamente crônica (cinco sessões com 200 reforços cada), sob contingências de reforçamento continuo (CRF) ou moderadamente intermitente (FR 2, FR 4 e FR 6). Essa redução do grau de desamparo foi considerada, pelos autores, como uma “Imunização parcial" produzida pelo reforçamento positivo (Hunziker & Lima, submetido). Por fim, experiência prolongada com reforçamento positivo (14 sessões de 200 reforços cada), sob contingências de reforçamento da variabilidade ou da repotição de seqüências de quatro respostas (que, pela sua complexidade, acarretavam alto grau de intermitência do reforçamento) produziu imunização total contra o desamparo aprendido (Hunziker, Manfré & Yamada, no prelo), Em paralelo às informações teóricas fornecidas por esses estudos, eles podem sugerir que experiências prolongadas com reforçamento positivo - principalmente aquelas nas quais o reforço é intercalado com uma grande freqüência de não reforçamento, condição denominada, no senso comum, como "frustração" podem facilitar que, futuramente, o indivíduo enfrente situações aversivas incontroláveis sem se deixar abater por elas. Por outro lado, o indivíduo "mimado" ou "super protegido", que foi poupado da exposição a situações dificeis de serem solucionadas ou que geravam baixa densidade de reforçamento, pode, quando exposto futuramente a condições aversivas intensas e incontroláveis, ser mais propenso a desenvolver um quadro depressivo. Evidentemente, essas generalizações do laboratório para a clínica são exercícios de extensão das informações obtidas em um nível experimental, onde se tem um controle relativamente alto das variáveis envolvidas, para outro, onde a complexidade de contingências om vigor extrapola qualquer arranjo experimental. Contudo, essa é apenas uma das etapas da inclusão das informações básicas para o uso aplicado, que precisa sem complementado com estudos fora do laboratório. Foi assim desde a demonstração básica de Skinner, obtida com ratos e pombos, de que o comportamento é controlado pelas suas conseqüências. Nos seus trabalhos iniciais, possivelmonte nem o próprio Skinner deve ter imaginado o quanto essas demonstrações, aparentemente simplos, poderiam modificar a forma de se pensar a psicologia e a complexidade do comportamento humano. No entanto, a evolução da análise do comportamento, nos diversos níveis de atividade humana (educação, indústria, propaganda, planejamento urbanístico, clínica, entre outros) veio provar que essa "simplicidade" do laboratório é aparente, e tem uma relação estreita com o comportamento complexo que se observa fora dele. Análises sofisticadas a respeito do comportamento complexo sendo fruto de processos simples e cumulativos corroboram a importância dos estudos de laboratório como uma estratégia indispensável para a ampliação do conhecimento sobre o comportamento humano (Donahoe & Palmer, 1994). No caso do estudo experimental da depressão, espera-se que a identificação das diversas condições ambientais que levam à redução da eficácia dos reforçadores possa ser útil, tanto para o seu tratamento como para a sua prevenção, ampliando a análise funcional iniciada por Ferster há mais de três décadas, mas que ainda precisa de estudos adicionais que aumentem sua abrangência científica e potencial de aplicação.

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Loticui Sanl Anriii, I Iclcnc Shmolt.u.

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Sobre Comportamento c Co^niçAo

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Capítulo 13 Comportamento Criativo c Análise do Comportamento I: variabilidade comportamental M aria I Iclena Leite I lun/iker l/SP

A criatividade é uma característica do comportamento humano que pode ocorrer nos mais diferentes contextos, tanto nas artes como nas guerras, na arquitetura e no urbanismo, nas vestimentas, nas diferentes formas de solucionar problemas, na diversidade da linguagem e outras formas de comunicação entre os indivíduos, etc. Mas, o que é exatamente a criatividade? Ela é uma característica mensurável do comportamento? Pode ser estudada cientificamente? É importante destacar que ao falamos de criatividade estamos falando, na verdade, de comportamento criativo. Embora a definição desse comportamento não seja simples, um possível consenso parece existir na noção de que o termo criatividade envolve, ao menos, o requisito de novidade ou difemnça em relação ao que ocorreu anteriormente (Holman, Goetz & Baer, 1977; Stokes, 1999b; Winston & Baker, 1985). Comecemos pela análise de uma situação prática que é uma visita a um museu. A grande concentração de pinturas nos pormite observar diferenças marcantes não apenas entre os quadros dos vários autores como também entre pinturas de um mesmo artista. Por exemplo, Picasso realizou ao menos duas pinturas sobre o tema "mãe com filho", em períodos diversos da sua produção. Na primeira tela, realizada durante a chamada “fase azul e rosa" (1901-1906), ele pintou essas figuras com formas e cores que se aproximam das reais; na segunda tela, realizada décadas depois, ele as pintou com linhas distorcidas e cores berrantes, totalmente diferentes das encontradas na realidade. No senso comum, tais “originalidades" são chamadas de criatividade, sendo seus autores apontados como indivíduos criativos. Apesar do requisito da novidade ser um consenso na caracterização da criatividade, o fato de “ser novo" não basta para caracterizar um comportamento como "criativo". De uma maneira geral, a criatividade está relacionada a critérios sócio-culturais quo nem sempre atingem um consenso. Por exemplo, para ser criativo, algumas vezes exige-se que o comportamento atenda a um objetivo especificado (seja útil), outras que agregue um valor estético adotado pela cultura, outras ainda quo solucione um problema (seja funcional), entre outros (Winston & Baker, 1985). Como o objetivo aqui não é tratar profundamente da definição de criatividade, vamos adotar como requisito mínimo (embora sabidamente não suficiente) o aspecto aparentemente mais característico desse conceito, ou seja, ao fato de que ser criativo implica, ao menos, em "ser diferente de" (sobre a conceituaçào de comportamento criativo, ver Marr, 2003; Skinner, 1953; 1974; Stokes, 2001; Winston & Baker, 1985) Porém, mesmo com essa simplificação conceituai, novas questões surgem. Qual é o grau de diferença requerido? Basta ser diferente de alguns comportamentos omitidos

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Maria l Iria m Leilr I lu n /ikrr

mais recentemente ou precisa ser diferente de qualquer comportamonto já emitido anteriormente? É necessário diforir totalmente de qualquor comportamento previamente emitido pelo sujeito (fazer algo que nunca fez antes), ou basta diferir do comportamento apresentado anteriormente pelo sujeito naquolo ambiente (fazer algo que nunca havia sido feito naquela condição)? De uma forma mais radical, pode-se considerar que, para ser criativo, é necessário quo o comportamento difira de qualquor outro apresentado por um mombro da sua espécie? Por oxomplo, quando o astronauta Arrnstrong pisou na lua pela primoira vez, esse comportamento diferiu de qualquor outro já apresentado pela espécie humana. Isso basta para elo ser chamado de criativo? Uma música, nova para alguns mas conhecida de outros, ó criativa para uns mas não para outros? Tais questões parocom apontar para um aspecto a sor considerado na análise da criatividade: a característica de ser novo/original/criativo não ó propriodado do comportamento, mas sim ó uma propriodade fornecida pelos referentes aos quais elo está sendo comparado, dentro de um universo particular. Ou soja, a caracterização do comportamento como criativo ó mutanto e relativa, o que toma a sua análise bastante complexa. A dlficuldado, encontrada nessa conceituaçào, não ó menor quando são buscadas as causas do comportamento criativo. O que produz osse comportamento? No senso comum, criar ó tido como fruto de um “talento" que o indivíduo traz em si e que o distingue das demais pessoas. Apesar de sermos capazes de rabiscar dosonhos e criar sons, admitimos que não somos comparáveis (em nlvel de criatividade) a um Picasso ou a um Chico Buarque. O que os toma diferentes de nós? No geral, diz-se que esses artistas se distinguem das demais pessoas porque tôm talento; Contudo, essa forma de encarar a criatividade incorre na conhecida falácia da explicação circular: considera-se que um indivíduo ó talentoso porque faz coisas criativas, e ao mesmo tempo diz-se que ele faz coisas criativas porque ó talentoso. Ou seja, esse raciocínio caminha em círculos, sem avançar na compreensão do que se convencionou chamar de criatividade (Skinnor, 1953). Sem uma explicação que extrapole essa circularidade, não ó de se estranhar que o “talento", como explicação causal da criatividade, venha acompanhado de uma boa dose de "mistério" ou "magia", que, se assumidos, impediriam a sua investigação cientifica. Contudo, não é essa a perspectiva da análise do comportamento. Ao invés de dizer que o Chico Buarque faz músicas maravilhosas porque é talentoso, considera-se mais útil simplesmente admitir que elo é considerado talentoso porque seguidamonte faz músicas maravilhosas. Dessa forma, o “talento" deixa de ser causa e passa a ser simplosmente um termo descritivo para um conjunto de comportamontos ditos criativos. Assim, para compreender porque, ou como, o Chico Buarque faz suas músicas, devese abandonar a noção do "talento" como causa dessa criatividade o passar a investigar os processos que controlam seus comportamentos. Por uma questão de parcimônia, esse toxto pressupõe que não há porque assumir uma natureza diferenciada para o comportamento criativo. A menos que se prove o contrário, está sendo assumido que, aposar da sua aparência desordenada ou aleatória, o comportamento criativo é tão organizado e sujeito a leis como qualquer outro comportamento (Skinner, 1974; Stokes, 1999a; 2001). Assim, em princípio, ele pode ser estudado cientificamente através da idontificação das condições que alteram a sua probabilidade de ocorrência. Essa porspectiva analltico-comportamental também modifica outro aspecto básico da análise não científica da criatividade: ao contrário do sonso comum, que considera que os indivíduos sâo criativos, a perspoctiva ciontífica considera que as pessoas tornam-se criativas ao longo da vida (ou soja, aprondom a agir do forma criativa). Admitir esse ser implicaria admitir que a criatividade é uma característica que nasce com o indivíduo, portanto é determinada geneticamente. Essa suposição, além de não ter indícios científicos

Sobre C*ompoi1«imenfo c CoflnivAo

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comprobatórios, limita o estudo da criatividade ao campo da genética e nos impodo do atuar diretamente sobre essa característica humana. Por outro lado, a suposição do que os indivíduos tomam-se criativos baseia*so no pressuposto de que a criatividade ó um conjunto de comportamentos quo, como todos os demais, podem ser aprendidos através do processos simplos e cumulativos de interação do organismo (geneticamente constituído) com o sou moio ambionto (Donahoo & Palmor, 1994). Sob essa perspectiva, o estudo da criatividado podo se dar através da investigação das condições ambientais quo tornam mais provável os comportamentos criativos, conhecimento esse que pode gorar possibilidades do atuação direta sobre eles. Ou seja, a criatividade passa a ser oncarada como uma característica comportamontal passível de modificação (via história de roforçamonto), o que equivale a dizer quo ela pode sor investigada cientificamente o alterada através de um planejamento ambiental. Não se está nogando, aqui, que a constituição genética do indivíduo interfira na sua criatividade. Pela lógica, se é o organismo que interage com o moio, e se elo tem uma constituição genética básica, então o comportamento necossariarnonto sofre intorferôncia do variáveis genéticas. A investigação dirota do grau de interforôncia dessas variáveis, a ser dosonvolvida pola engenharia genética, pode acrescentar informações relovantos para a compreonsão do comportamento criativo. Porém, no atual estágio de conhecimento cientifico não há informações que permitam apontar que essas variávois sejam responsáveis por esse comportamento. Conforme se verá mais á frente, investigações indiretas sobre a influência de variáveis genéticas mostram quo elas oxistem, mas nâo são as mais críticas. Por outro lado, há muitas demonstrações experimentais que apontam para a rolovância das contingências ambientais na determinação de comportamentos que se relacionam à criatividade. Dada a variedade de características comportamentais que definem a criatividado, o seu estudo envolve análises separadas dessa diversidado de comportamentos. Um exemplo desses estudos, são as pesquisas experimentais sobre a variabilidade comportamontal. Assim como a criatividade, a análise da variabilidado comportamental envolve o requisito do comportamento sor diferonte de outros, ela requer referentes (que podem sor mutantos) para que se estabeleça essa comparação, e esses referentes são sempro relativos a um determinado universo de análíso (para uma análise conceituai da variabilidado comportamontal, ver Hunziker & Moreno, 2000). Tantas semelhanças sugerem que a análise funcional do comportamento de variar pode ter implicações diretas para a análise do comportamento de criar (Neuringer, 2002; 2003; 2004; Stokes, 1999a; 1999b; 2001). Sabo-so que a variabilidade comportamontal pode ser função de urna enorme gama de condições, fisiológicas (por exemplo, losões, patologias ou drogas) ou ambientais. Essas últimas são estudadas em processos comportamentais diversos, dentro eles o reforçamento operante. Nesse processo, entende-se quo o roforço seleciona a classo de respostas que o produziu, sendo essa seleção definida pelo aumento da probabilidade do emissão daquela classe de respostas, e conseqüente diminuição da probabilidade de omissão do outras (Skinner, 1981). Portanto, sondo sempro seletivo, o esperado seria que o reforço necessariamente reduzisse a variabilidade comportamontal. Por analogia, seria também razoável supor que a doscontinuidade do reforçamento doveria produzir maior variação. Trabalhos oxporimontais confirmam apenas parcialmonto essas suposições lógicas. Foi demonstrado que a supressão (total ou parcial) da contingência do reforçamento é uma das condições favorecedoras de maior variação comportamental. Em um desses estudos (Antonitis, 1955), ratos foram expostos ao roforçamonto contínuo (CRF) da rosposta de tocar um painel com o focinho e dopois submetidos à extinção dossa rosposta. Modindo-se o ponto do painel tocado pelo rato, verificou-se que eles

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M d« arterial, dAflcit* cardiopallas, anma, respirai. anflsama pulmonar (H pacientes)

24-25. canal gímitt> ) podem ser parcialmente justificadas pelo maior grau de dificuldado onvolvido nas tarefas om questão, quando comparado ao grau de dificuldade das outras tarefas. Nas tarofas relativas a essas duas habilidades om que continuaram ocorrendo orros durante o pós-teste, além da maior complexidade da subtração comparativamente à subtração, houve prosumivolmonte uma dificuldado adicional: a criança poderia tor quo rosolvor de uma a trôs oporações aprosentadas como ostimulos-comparação, até chogar àquola cujo resultado fosse o conjunto ou algarismo aprosontado como estimulo-modolo; a domanda de rosolvor mais de uma operação aumentou a cadeia do respostas, quando comparado àquela cadoia exigida nas tarofas om quo nocessariamente apenas uma operação toria que ser resolvida, isto é, aquela operaçào apresentada como estímulo-modelo. Após o troino direto da habilidade de identificar a sentença de subtração improssa om forma do conjunto quo tinha como resultado a quantidade do figuras apresentada no conjunto/ostimulo-modelo (CG-), houvo aumento número de acertos

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Ucif.iell.i Poiiinl, P.inlcl Prl Rey. Nil/.i Michrlrttn

no teste emergente para trôs crianças. Os resultados indicam a maior necessidade de treino para o estabelecimento destas relações. Os resultados obtidos com estes participantes indicam a necessidade de ampliar estudos que investigam os controles de estímulos que se estabelecem na realização de operações matemáticas. Como indicam Ferster e Hammer, Jr. (1966), apesar dos comportamentos componentes de um repertório aritmético envolverem um número pequeno de símbolos, as maneiras complexas em que eles podem ser arranjados, e os estímulos adicionais, tais como a posição de dígitos [entre outros], determinam as respostas que serão reforçadas. Investigações quo identifiquem e descrevam as diferentes possibilidades destes controles podem dar condições a educadores de planejar condições de ensino adequadas às necessidades de cada aprendiz.

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Sobrc Comport.tmrnto c Coflnlçío

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R.ifiiclla Ponini, Punicl Pci Rcy, NHai Micliclctto

Capítulo 27 O desenvolvimento sócio-emocional nos primeiros anos de vida e as contingências em operação na interação pais-criança Patrícia Alvarcnfld Universidade Federal da Hahia

Na perspectiva da Análise do Comportamento, a compreensão das mudanças que ocorrem ao longo do desenvolvimonto de um indivíduo requer o exame das contingências filogenéticas, ontogenéticas e culturais que operaram na sua história. Abordar o desenvolvimento sócio-emocional, portanto, significa tratar da aquisição e das modificações em repertórios comportamentals ligados à interação do indivíduo com o seu ambiente social e com ele mesmo, como a assertividade, afetividade, empatia, cooperação, auto-regulação e auto-conhecimento, entre outros. Este trabalho discute algumas idéias relacionadas à socialização infantil que ocorre no contexto familiar, enfatizando as contribuições do modelo de seleção por conseqüências para a compreensão desse processo. According to Behavior Analysis perspective, comprehension about the changes that occur through the development of an individual requires the study of phylogenic, ontogenetic and cultural contingencies on his own history. Approaching to social and emotional development, therefore, means to understand the acquisition and modification in behavior repertories related to the interaction of the individual with his social environment and with himself, such as assertiveness, affection, empathy, cooperation, self-regulation and self-conscience, among others. This paper discusses some ideas related to child socialization that occurs In the family environment, emphasizing contributions of the selection by consequences model to the comprehension of this process. O desenvolvimento sócio-emocional na primeira infância tem recebido atenção de teóricos e pesquisadores de diferentes abordagens na Psicologia por suas importantes implicações no funcionamento do indivíduo em diversos contextos. Na perspectiva da Análise do Comportamento, a compreensão das mudanças que ocorrem ao longo do desenvolvimento de um indivíduo requer o exame das contingências filogenéticas, ontogenéticas e culturais que operaram na sua história. A proposta da Análise do Comportamento para a compreensão do desenvolvimento humano, portanto, não descreve estágios ou fases. Para o Behaviorismo, o que se desenvolve junto com o organismo biologicamente constituído, e respeitando esses limites, é um repertório comportamental, produto da interação do organismo com seu ambiente. Nas palavras

Sobro Comport.imcnto c CoRniç.lo

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de Skinner (1974/1993, p.60) "Diz-se que o comportamento de uma pessoa ou cultura passa por vários estágios até atingir a maturidade (...)• Conforme sugerem esses exemplos, diz-se que aquilo que cresce ó algo que pertence à mente, como em Piaget, ou à personalidade, como em Freud. Mas se uma criança não se comporta mais como se comportava no ano anterior, não ó só porque cresceu, mas também porque teve tempo de adquirir um repertório bem mais amplo à mercô da exposição a novas contingências de reforço e, particularmente, porque as contingências que afetam as crianças em diferentes idades são diversas. O mundo infantil se "desenvolve" também". Assim, na perspectiva da Análise do Comportamento, abordar o desenvolvimento sóciO‘ emoclonal significa tratar da aquisição e das modificações em repertórios comportamentais ligados á interação do indivíduo com o seu ambiente social e com ele mesmo (ver Catania 1999; Skinner 1974/1993; Skinner, 1991). Desta forma, estaremos tratando de repertórios comportamentais relacionados à assertividade, afetividade, empatia, cooperação, auto-regulação e auto-conhecimento, entre outros. A assertividade permitirá á criança negociar sua independência no contexto das expectativas e exigências do mundo social. Ela pode ser definida como a habilidade de atingir os próprios objetivos, sem violar a integridade dos objetivos do outro (Crockenberg & Litman, 1990). É a capacidade de defender os próprios direitos o de expressar pensamentos, sentimentos e crenças de forma honesta, direta e apropriada, sem violar os direitos da outra pessoa (Falcone, 2001). Em termos operacionais a assertividade se expressa quando a criança, por meio de gestos ou palavras, revela sentimentos, preferências ou pontos de vista, sem demonstrar hostilidade, comportamento agressivo ou desafiador. Por exemplo, a criança diz o que deseja fazer, ou responde dizendo "não" ou "eu não quero", a um comando, pedido ou sugestão de outra pessoa, ou ainda quando a criança tenta negociar o comando ou pedido em questão. É em torno dos 2 anos de idade que a criança começa a desenvolver o comportamento assertivo e uma das aquisições mais importantes para o desenvolvimento desta habilidade é a capacidade de dizer "não". A empatia pode ser definida como a capacidade de compreender e de expressar compreensão acurada sobre a perspectiva e sentimentos de outra pessoa, além de experimentar sentimentos de compaixão e de interesse pelo seu bem estar (Falcone, 2001). Nesse sentido, a empatia expressa uma resposta emocional à situação da outra pessoa. Assim, quando uma criança sente-se triste quando outra está triste, ou alegre quando outra está alegre, ela está manifestando empatia, e pode então, ter ações que envolvem prestar auxilio ou demonstrar compreensão ao outro (Schaffer, 1996). A empatia requer discriminações de propriedades do comportamento dos outros indivíduos (Catania, 1999) e respostas especificas de auxilio, proteção ou cuidado. Segundo Hay (1994), indícios desses aspectos da conduta são visíveis a partir do segundo ano de vida. Outro indicador importante do desenvolvimento social na infância é a obediência, considerada um preditor de cooperação em etapas posteriores do desenvolvimento. O comportamento da criança é considerado obediente quando se segue e é congruente a um pedido ou ordem (Crockenberg & Litman, 1990). Maccoby (1966) enfatizou a necessidade da aquisição da obediência como o primeiro passo no processo de socialização. Ela argumentou que crianças que não tinham habilidade de obedecer estavam em desvantagem para aprender as habilidades sociais essenciais para o sucesso na escola e para a construção de relações com os pares. Para Patterson, Reid e Dishion (1992), não atingir um nlvel adequado de obediência coloca a criança em risco de desenvolver déficits de competência social, bem como de apresentar condutas anti-sociais. A obediência é considerada um sinal de maturidade crescente e é um dos objetivos da

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P.itilcia Alv.ireiitf.i

socialização durante a infância (Crockenborg & Litman. 1990). No ontanto, ó importante diferenciar a obediência que é produto da compreensão e concordância com o que é solicitado, da obediência baseada no medo e na coerção (Kochanska, 2002). A auto-regulação e o auto-conhecimento estão bastante relacionados e envolvem o desenvolvimento de repertórios semelhantes. O auto-conhecimento, sogundo Skinner (1974/1993; 1991), está relacionado à capacidade de descrover contingências que envolvem o próprio comportamento. Nesse sentido, o auto-conhecimento está rolacionado ao comportamonto verbal e tem origem social. A auto-regulação foi definida por Kopp (1982) como a habilidade de iniciar ou cessar atividades de acordo com exigências situacionais; de modular a intensidade, freqüência o duração de atos verbais o motoros em contoxtos sociais e educacionais; de adiar objetivos e desejos conforme necessidados impostas e do gorar comportamento socialmente aprovado na ausência do monitoramento externo. A relação entre os dois tipos de repertório pode ser compreendida a partir desta afirmação do Skinner (1974/1993, p.31): "O autoconhecimento ó de origem social. Só quando o mundo privado de uma pessoa se torna importante para as demais é que elo se torna importante para ela própria (...) Mas o autoconhocimento tem uma valor especial para o próprio indivíduo. Uma pessoa que se "tornou consciente de si mesma" por meio de perguntas que lho foram feitas está em melhor posição de prever e controlar seu próprio comportamento". Assim, o autoconhecimento seria uma importante aquisição para a capacidade de auto-regulação ou auto-controle (Skinner, 1953/1994). Na medida em que a criança é capaz de descrever as relações entre os contextos, suas respostas (sejam elas sentimentos, pensamentos ou ações) e as conseqüências que elas produzem, ela poderá ficar sob controle dessas descrições, e assim, regular seu próprio comportamento com maior autonomia. Além desses indicadores específicos, alguns autores argumentam que a habilidade da criança de engajar-se em interações sociais de forma positiva com os pais, incluindo gestos, vocalizações, olhares e demonstrações de afeto positivo, são importantes sinalizadores de um desenvolvimento social apropriado. Para Landry, Smith, Swank, Assei e Vellot (2001), esses comportamentos podem ser observados a partir dos 6 meses de vida e utilizados como indicadores do desenvolvimento social da criança. Como se pode perceber pelos conceitos discutidos até aqui, boa parte do repertório comportamental que indica um desenvolvimento sócio-emocional pleno nos primeiros anos da infância está relacionado a responder adequadamente a demandas dos contextos sociais. Contudo, o desenvolvimento sócio-emocional não deve ser considerado como a mora adequação do comportamento da criança a normas e expectativas sociais. Ao se comportar de forma assertiva, afetiva, empática ou cooperativa, a criança deve estar gerando conseqüências positivamente reforçadoras (e conseqüentemente sentimentos positivos) não só para os outros, mas também para si própria. Do mesmo modo, em determinados contoxtos, comportamentos considerados socialmente inadequados podem estar desempenhando uma função importante na interação da criança com seu ambiente, e dosse modo, não deveriam ser punidos ou colocados em oxtinção. Muitas vezes, nesse tipo de situação, é mais importante reforçar o comportamento, no sentido de deixar que ele ocorra, compreender sua função, e esperar o momento certo de exigir uma conduta mais adequada da criança. Um exemplo típico dosso tipo de situação é a ocorrência de comportamentos chamados "regressivos" durante um período de hospitalização (ex. a criança quer ficar o tempo todo no colo, chora ou choraminga com muita freqüência e solicita a presença o o contato físico com os pais constantomente). Diante do caráter extremamente aversivo da situação, os comportamentos "regressivos" da criança devem ser positivamente reforçados pelos

Sobre Comportamento e C ormí( Sr) 3-14 Definir, identificar e dar exemplos do modelo respondente de condicionamento, incluindo CER’s. 3-15 Definir, identificar e dar exemplos de sombreamento, bloqueio, précondicionamento sensorial e condicionamento de segunda ordem. 3-16 Definir, identificar e dar exemplos do modelo operante de condicionamento. 3-17 Definir, identificar e dar exemplos de operantes. 3-18 beflnír, identificar e dar exemplos da interação operanterespondente (emoção), incluindo CER's, supressão condicional e estímulos préaversivos e pré-apetitivos. 3-10 Definir, identificar e dar exemplos de comportamentos encobertos, incluindo o papel das CER's.

394 Koosrvrlt R. Starling

3-20 Definir, identificar e dar exemplos de reforçadores e punidores condicionais e incondicionais, incluindo os estímulos sensorlais.____________ 3-21 Definir, identificar e dar exemplos de reforçamento positivo e negativo.__ _______ _________ ______________ ______ 3-22 Definir, Identificar e dar exemplos de punição positiva e negativa. 3-23 Definir, Identificar e dar exemplos de extinção. 3-24 Definir, identificar e dar exemplos de operações e procedimentos de _ controle de estimulo^ 3-25 Definir, identificar e dar exemplos de generalização e discriminação. 3-26 Definir, identificar e dar exemplos de discriminação condicional e classes de ordem superior._______________________________________ 3-27 Definir, identificar e dar exemplos de operações estabelecedoras. 3-28 Definir, identificar e dar exemplos de esquemas de reforço discriminando os seus efeitos diferenciados nas dimensões do responder. 3-29 Definir, identificar o dar exemplos de combinações de esquemas de reforço, discriminando os seus efeitos diferenciados nas dimensões do responder.____________ ______________________________________ 3-30 Definir, identificar e dar exemplos de comportamento de escolha relacionando-o à "comparação com o modelo" (matching taW).______________ 3-31 Definir, identificar e dar exemplos de relações de equivalôncia de estímulos._______________________ ____________________________ 3-32 Definir, identificar e dar exemplos da unidade de análise do comportamento verbal. __ 3-33 Definir, identificar e dar exemplos de comportamentos de transcrição, ditndo, textual, ecóico e imitativo. ______________ 3-34 Definir^ identificar e dar exemplos de mandos. __ 3-35 Definir, identificar e dar exemplos de tatos. 3-36 Definir, identificar e dar exemplos de intraverbais.______________ 3-37 Definir, identificar e dar exemplos de autocllticos. 3-38 Definir, identificar e dar exemplos de comportamento modelado pelas contingências e comportamento verbalmente governado (regras)._______ 3-39 Identificar e dar exemplos das relações e interações entre a aprendizagem verbal e não-verbal. _______________ 3-40 Definir, identificar e dar exemplos do comportamento de resolução do problemas, distinguindo tomada de decisão de situação problema e declarando a funçflo dos pré-correntes.______________________________ 3-41 Discriminar as relações entre os princípios, processos e conceitos básicos explicitando os seus mecanismos de açflo e interações na análise funcional de episódios comportamentals reais ou modelares._______________ 3-42 Listar pelo menos trôs áreas da Análise do Comportamento sob controvérsia nos últimos quatro anos, conforme publicações nos JEAB/ JABA/ TAVB, declarando as principais teses defendidas pelos autores envolvidos, a natureza da evidência oferecida e a que teses se opõem.__________________

Sobre Comportamento e CoRniçilo

395

~ X rè a de COMPETÊNCIAS # 4 AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO [CARACTERÍSTICAS E RACIONAL] DESEMPENHOS_________________ _ ______ 4-1 Declarar as características definidoras de uma análise descritiva._________

4-2 Declarar o racional para conduzir uma análise descritiva. 4-3 Declarar as características definidoras do processo de manipulação sistemática (demonstração de relações funcionais): a. selecionando e justificando a seleção de vários métodos; _________ b. utilizando e justificando a utilização de vários métodos._____________ 4-4 Declarar o racional para utilizar a manipulação sistemática (demonstração de relações funcionais) e para a determinar a fidedignidade, validade e genoralidade __________________________ das relações tuncionais demonstradas.

ÂREA DE COMPETÊNCIAS # 5 AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO _____________ [MÉTODOS DE ANALISE DESCRITIVA]_________ _______________________ DESEMPENHOS___________ ~_______ 5-1 Coletar dados descritivos. a. selecionando e justificando a seleção de vários métodos; _________ b. utilizando e justificando a utilização de vários métodos._____________ 5-2 Utilizar vários métodos para organizar e interpretar dados descritivos, justificando a utilização. ___________

ÁREA DE COMPETÊNCIAS # 6 AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO ________ [AVALIAÇÃO EXPERIMENTAL DA INTERVENÇÃO! '___________ DESEMPENHOS _________ 6-1 Utilizar várias metodologias para demonstrar relações funcionais e para determinar a sua fidedignidade e generalidade, através da replicação direta e da ______________________ ______ repllcação sistemática, respectivamente. 6-2 Manipular sistematicamente variáveis independentes para analisar seus efeitos no tratamento, a. Utilizando delineamentos A-B, A-B-A ou A-B-A-B, justificando seu uso fócnlco e ótico e interpretando as evidências obtidas. 6-3 Utilizar delineamentos terapêuticos alternados (multi-elemento, tratamento simultâneo, esquemas múltiplos ou concorrentes, condições alternadas e ensaio randômico). ___________ _________ _ _ _ _ _ _ _____ 6-4 Utilizar delineamento de critérios móveis.__________________________ 6-5 Utilizar delineamentos de base múltipla. 6-6 Identificar variáveis particulares aos contextos aplicados que precisam ser gerencjadasjjuando da utilização de manipulações sistemáticas. 6-7 Completar uma análise de componentes. 6-8 Completar uma análjse paramétrica. __

396

Rooscvelt R. Sl.irlin#

,

ÁREA DE COMPETÊNCIAS # 7 AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO ____________ ÍMENSURAÇÃO DO COMPORTAMENTOl_______ DESEMPENHOS

I_____ 7-1 Definir comportamento em termos observáveis e mensuráveis.__________ I 7-2 Identificar as dimensões mensuráveis do comportamento (por ex., freqüência, duração, latència e IKT) 7-3 Dizer as vantagens e desvantagens do uso de procedimentos de mensuraçâo continua e tócnicas de amostragem (por ex., registro por intervalos i parciais ou totais, amostragem instantânea, etc.)____________________________ | 7-4 Selecionar o procedimento adequado de mensuraçâo dadas as dimensões do comportamento e a logística da observação e registra 7-5 Selecionar um esquema de observação e periodos de registro 7-6 Usar e justificar o uso de medidas diretas do comportamento (por ex., freqüência, razão, duraçfio, latència, tempo inter-respostas (IRT).________________ 7-7 Usar e justificar o uso de medidas indiretas do comportamento (por ox., percentual de ocorrência, critério de tentativas, registro de intervalo parcial, registro de intervalo total, amostragem temporal momentânea). 7-8 Usar vários métodos para avaliar os produtos de procedimentos de medidas, tab como Indice de concordância inter-observadores, fidodignidade, validade j e confiabilidade.___________________________________________________

AREA d e COMPETÊNCIAS # 8 APRESENTAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DE DADOS _____________________DESEMPENHOS___________________ 8-1 Selecionar métodos de apresentação de dados que assegurem a discriminação precisa de relações quantitativas. 8-2 Usar gráficos de intervalo fixo. a. titulando e calibrando os eixos horizontal e vertical; b. plotando os dados, c. mostrando linha de base, mudanças em funçáo de intervenções, mudanças ambientais potencialmente significativas e interrupções na coleta de dados, ________d. determinando o nivel, tendência e variação dos dados.___________ _____ 8-3 Usar Celeratlon Chart padrão.______________________________ _____ 8-4 Usar um Registro Cumulativo para apresentar dados_____________ 8-5 Usar representações de dados que evidenciem padrões de comportamento (por ex., gráfico de dispersão) 8-6 Determinar discrepâncias entre o nível atual e padrões de desempenho, onde aplicável. ______________ _____ 8-7 Decidir e justificar a decisão de continuidade/ mudança da intervenção atual com base em alterações no nível, tendência e variação apresentados._____ 8-8 Interpretar dados apresentados em vários formatos de acordo com os princípios básicos da Análise do Comportamento.________________________ 8-9 Fundamentar decisões de ação clinica com base em dados apresentados em vários formatos.__________________________________ _

Sobre Comport.imenlo e C'o^nivTingo (lo Mmmpalox (ximoiitArio» crlllnoii ao loxio

Sobro l omport.imcnfo c CoflnlçJo

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crenças e possa ser denominado conhecimento. Não obstante a diversidade do ceticisrnos, trataremos do que pode ser chamado de ceticismo global ou, em outras palavras, da dúvida e da apresentação de argumentos que impossibilitem a existência de conhecimento om qualquer ordem, seja o conhecimento de si mesmo, do outro ou da naturoza.2 Essa nâo ó uma tarefa simples. Entonder a naturoza do conhecimonto em Skinnor é entondor um tipo ospocial de Behaviorismo, chamado Behaviorismo Radical, quo foi fundado por este autor em uma tradição naturalista de aproximação da Teoria do Conhocimento com 0 método das ciências naturais. Firmou-se, certamente, como um esforço do "devolver" o homem à natureza e, para além do óbvio, de mostrar como o conhecimento, assim como as demais faculdades da mente, são parte integrante do quo o homem faz. Explicar o Behaviorismo Radical é, também, separá-lo das demais formas de Behaviorismo - como o Bohaviorismo Intencional/cognitivo - mas principalmente separálo do Behaviorismo Clássico Watsoniano. Essa tambóm não ó uma tarefa simples por que a difusão da teoria do conhocimento watsoniana tem uma prognância no mundo intelectual que parece englobar o Behaviorismo Radical. Autores como Abib (2001a) se esforçam por domonstrar os maloficios derivados da identificação de uma unidade no pensamento de autores distintos (como Skinner, Watson, Hull, Tolman) que são agrupados sobre um determinado ismo (nesse caso, o Behaviorismo). A crítica epistemológica ao Behaviorismo, corno a realizada por Hacker (1993) no texto sobro "Behaviour and Behaviourism", comumente entende quo o cetismo watsoniano sobre o conhocimento da própria mente ó um princípio válido para qualquer modalidade do Behaviorismo. Se Watson afirma que: "Muy pronto se descubrirá que la autoobservación, además de no ser la manera más fácil y natural de estudiar psicologia, resulta simplemente imposible. (...) cuando empezamos a estudiar lo que hace nuestro vecino, advertimos que rápidamente adquirimos experiencia para clasificar su conducta" (WATSON, 1945:34) Então Hacker (1993) pode afirmar que o Behaviorismo ó um ceticismo acerca da própria monte e quo sua metafísica materialista sustenta um objetivismo ©pistomológico em relação ao conhecimento do mundo. Afinal: "Refinement and sophistication were added to this theory of human conduct by Hull and Skinner, but lhe splrlt of behaviourism remained essentially the same" (HACKER, 1993:99).

Mas este pode não ser o caso, e este texto dofende que não é. Conquanto não seja destinado, aqui, espaço suficiente para uma revisão das críticas a leitura do Behaviorismo Radical como Metafísica materialista (ABIB, 1982), como objetivismo epistemológico (ABIB, 2001b; DITTRICH, 2004) e como uma continuidade em relação ao toxto watsoniano (ABIB, 2005), sorá recorrente o uso do termo Behaviorismo referindose ao behaviorismo radical o, portanto, o objeto de análise será o texto skinneriano. O objetivo deste ostudo ó, portanto, um trabalho analítico pontual: o de explicar aspectos fundamentais da Teoria do Conhecimento em Skinner. Para toda empreitada, diria um engenheiro, é necessário que se faça um levantamento de qual o material necessário (blocos, cimento, ferramentas) e de qual o procedimento mais adequado para a construção de um edifício. Parece quo o esforço de um epistemólogo pode ser ontondido de forma análoga: levantamos o material (textos do autor, comentadores, outros textos que demonstrem a tradição epistemológica) e a maneira que iremos nos utilizar desse material. Tais elementos compõem o método epistemológico a ser utilizado. 1 Pnm H[Kofu[i(lHiiwiMk> no toma do oeUdutio, ver SILVA FILHO (2005)

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íiuflo Alírcilo (l.i Silvd Fcrrcini

Quanto a delimitação do corpus do trabalho para a consecução do objetivo deste texto, temos uma proposta: a utilização de um único capítulo de um único livro escrito por Skinner na década de 70 como objeto direto de análise. Esta circunscrição possui, ao menos, duas justificativas razoáveis: a primeira diz respeito ao espaço destinado a este texto. O espaço de um artigo não permite o levantamento de toda a concepção skinneriana a respeito do conhecimento e nem da sua expressão mais destacada, que é o conhecimento lógico e cientifico. Seria desleal, no espaço de um artigo, tentar uma síntese do que o autor considera a respeito da natureza, da possibilidade e das implicações do conhecimento.J A segunda justificativa diz respeito diretamente à extensão da obra skinneriana. Skinner escreveu seu primeiro livro om 19384, e finalizou sua produção académica em 1990. Ao longo desses anos obteve mais de cem publicações, o que tornou a sua obra um rico e extenso, veio de idéias. A conseqüência mais direta de uma obra dessa magnitude é a divergência entre idéias apresentadas pelo autor em obras distintas. Não é simples encontrar na crítica séria a Skinner um bom número de artigos que denunciem estas divergências, no entanto, o próprio Skinner em um texto chamado "Um novo prefácio para Beyond Freedom and Dignity" (SKINNER, 1989/1995) atesta a existência das divergências. Outras discrepâncias podem ser encontradas principalmente em uma análise longitudinal do argumento do autor sobro a tooria da cultura. Conseguinte, não estaremos falando sobre a concepção skinneriana sobre o Conhecimento, mas sobre as idéias presentes em um capítulo específico de um livro específico deste autor. Faz-se desnecessário dizer que as idéias presentes neste texto devem ser bastante representativas de uma concepção Behaviorista Radical sobre o Conhecimento, do contrário seria apenas um palavrório infértil, o o leitor poderia gastar seu tempo lendo algo mais produtivo.1 O livro Sobre o Behaviorismo (SKINNER, 1974/1996) apresenta algumas idiossincrasias que podem ser uma justificação razoável para sua escolha como objeto de análise. A sua proposta explícita é de que seja um livro escrito para leigos no Behaviorismo, e mais, que seja um livro escrito a partir de críticas. Skinner (idem) inicia o livro listando vinte críticas comumente feitas ao Behaviorismo e afirma, de antemão: "creio que são todas falsas" (SKINNER, 1974/1996:7). Em suma, é um texto que reúne diversas tradições intelectuais sobro os mais diferentes temas sobre o comportamento humano e, dentre estes temas, podemos encontrar o conhecimento como objeto submetido a cuidadosa análise. Em segundo lugar, este é, possivolmente, o livro em que o autor mais explicitamente se propõe a discutir questões epistemológicas como verdade, conhecimento subjetivo, consciência do mundo, dentre outros. Estamos, então, em terreno familiar quando o dispomos para tratar de um tema diretamente vinculado a Epistemologia. A parte do livro que será submetida a análise neste texto será o nono capítulo, intitulado “O Conhecer" - cujo título dispensa maiores justificações. A estrutura de composição desse capítulo funciona como uma miniatura de um tratado: o autor se empenha em descrever, de forma condensada, com que tradições filosóficas está dialogando, e a partir dessas descrições desenvolve sua tese. ' Um estudo malit amplo sobre a epl»temnlogla «kjnnwlanrui mIA «ando (k»*envo(vtdo ou pmqutta d« maitrado do autor, asor dofendk)« para o programa da mettrado em Erwlno. HMAria • FHowifia dai ciéndaa da Unlv*r*tdad* Fadaral |uto nAo Impede que determmedee axpUcaçõM. do próprto capitulo, recorram a outroa lauto» do Skinner Tal rlrcunacrtçAo tem «uno ob|otta> urna m M d pontual, ma» nAo dmcontaxtuafaada. da tooria do oonhecimanto no aulor

Sobre Comportamento e Cognição 4 4 9

O Conhecer Há uma grande probabilidade de frustração na leitura de um texto skinneriano a procura da definição de um conceito. Seguindo uma tradição analítico-filosófica, o autor normalmente inicia sua análise de um conceito mostrando os usos possíveis de tal palavra. Qualquer conceito 6, em última instância, uma palavra: “Uma palavra que é usada tanto nos moios académicos quanto leigos e que possu/ um certo critério de uso em cada comunidade verbal especifica" (FERREIRA, 2004).

Não ó diferente com o Conhecimento. Um cachorro sabe como morder, um rato sabe pressionar uma barra, uma criança sabe chorar, em um sentido muito mais trivial do que o utilizado em reflexões epistemológicas sobre o conhecimento. A questão é que a prova de que alguóm possui um conhecimento específico (morder, pressionar ou chorar) ó a execução do comportamento especificado, "dizemos que possuem conhecimento e a prova disso ó que possuem comportamento” (SKINNER, 1974/1996:119). Inicialmente, para entender como alguóm possui conhecimento, é necessário questionar o que significa possuir comportamento. Ao afirmar que um sujeito possui o comportamento de choro, é comum afirmar que tendemos a procurar onde está esse comportamento, afinal, se possuo um alfinete é porque o tenho em algum lugar e, provavelmente, posso utilizar-me dele quando necessário. Com o comportamento parece não acontecer o mesmo e a frase de Skinner "o comportamento só existe enquanto está sendo executado" (idem) merece algumas explicações. O sujeito possui um repertório em sentido disposiclonal, de forma análoga a discutida por Ryle (1949) - De forma análoga, mas não de igual forma. Abib e Lopes (2003) realizaram um estudo sobre as semelhanças entro as explicações desses dois autores e demonstraram as possibilidades e os limites de tal analogia. Em Skinner, o organismo é modificado a partir de sua relação com o mundo: "Os homens agem sobre o mundo, modificam-no e, por sua vez, sõo modificados pelas consequências de sua ação" (SKINNER, 1957/1978:7)

É essa relação de reciprocidade (a contingência) que determina o comportamento do sujeito. Tal assertiva ganha um significado mais forte quando partimos do princípio quo, em Skinner, Pensamento é comportamento (FERREIRA, 2004), Sentimento é também um fenômeno comportamental (ABIB, 1982; SKINNER, 1989/1995) e, conseqüentemente, a mente é um produto direto da contingência (ABIB, 2001a; 2003). Defende-se, portanto, que as intenções, os desejos e os pensamentos são produtos da contingência. A mente não existe como substância, mas como relação direta do sujeito-que-se-comporta ithe Behavei) com o mundo. É nesta rolação que subsiste a construção da explicação sobre como a mente conhece e sobre o que ela conhece. Dito isso, estamos frente a uma mente esvaziada de conteúdo que não seja a ação do próprio sujeito. Conhecer é agir e conhecimento é ação. O conhecimento do mundo, da própria monto e da mente dos outros está limitada e construída pela contingência. Não ó possível então desvelar o real, nem contemplar a natureza, antes construímos o real e agimos sobre a natureza (ABIB, 2001b) - o realismo watsoniano, então, nem é posto em discussão: não há nada para des-cobrir através da experimentação por que não há nada coberto. Não são estas as assertivas tradicionalmente atribuídas ao Behaviorismo radical. Comumente, associa-se em Skinner um princípio de coerência metafísica entre ontologia e epistemologia que pode ser assim sumarizada: uma interpretação behaviorista é ontologicamente realista e epistemologicamente objetivista - a realidade está lá e podemos

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í i.iho Alfredo da Silva Ferreira

conhece-la. Novamente ancorados em uma continuidade com o texto watsoniano, seria possível afirmar que conhecemos o mundo, mas 6 impossivel conhecer a própria mente'. Conhecimento como contemplação é desvelar a realidade, ó tocar o real através dos sentidos ou da razão. Se, em acordo com o cético cartesiano, não conhecemos com os sentidos, ao menos podemos desvelar com a razão a realidade, mesmo que seja apenas a realidade da própria mente. No entanto, a razão em Skinner ó uma análise de contingências, uma formulação de regras (1974/1996). Uma crença razoável (dotada de razão) ó uma crença baseada na formulação descritiva de regras sobre uma dada contingência. Portanto, se o conhecimento ó definido pela crença justificada: ó comportamento a crença e também o ó a justificação razoável de crenças. O Eu (self) cognoscente que, reflexivo, conhoce a própria mente é apenas um sistema organizado de respostas em relação ao repertório mental (SKINNER, 1974/1996). Não há a possibilidade de fugir de si mesmo, olhar para trás e ter um acesso privilegiado a mente como ela é. Conhecimento ó ação, ó poder (1974/1996) sujeito as mesmas contingências que os sentidos. Se os sentidos foram excluídos como fundamentos do conhecimento, então se segue o mesmo mecanismo para excluir a razão ou a mente. Estamos, então, em coro com o cético global que afirma “não conhecemos"? De maneira alguma, o aparente subjetivismo epistemológico em Skinner não sobrevive a expressões como "há certos estados objetivos do conhecimento" e, menos ainda, a algumas proposições prescritivas acerca da ciência (DITTR1CH, 2002): "A ossôncia de um conhecimento cientifico é prever o controlar" (SKINNER, 1953). A critica ao fundacionalismo epistemológico não é uma relação direta com o relativismo (SILVA FILHO, 2003), mas uma porta aberta para responder ao cético. Grosso modo, conhecemos quando agimos eficazmente em situações especificas ou quando construímos regras para a ação. Conhecemos matemática se podemos resolver eficazmente problemas matemáticos; conhecemos alguém quando agimos diferoncialmente em sua presença. Um aluno pode, por exemplo, dizer que para ser bem sucedido em uma disciplina oscolar, importa prioritariamente conhecer o professor que o conteúdo da disciplina. Dai segue-se que responder eficazmente a questões acerca do conteúdo é menos importante que saber o que o professor quer 1er na prova. Estes exemplos têm algo em comum: "Todas estas formas de conhecer dependem de uma exposição prévia a contingências de reforço, mas afirma-se também que possuímos um tipo especial de conhecimento se pudermos simplesmente formular instruções, orientações, regras ou leis" (SKINNER, 1974/1996:120).

Poder-se-ia afirmar que, então, existem formas distintas de conhecer. No entanto, por mais que o autor afirme que "nenhuma das formas (do conhecer) implica a outra" (idem), os dois processos dizem respeito à mesma realidade. As regras são aprendidas através das contingências e o seguir regras também é um repertório aprendido na relação do sujeito com o mundo. A critica skinneriana ao mentalismo se consolida quando corriqueiramente transformamos adjetivos e verbos em substantivos: Afirmamos que João fez uma pergunta inteligente; seguido podemos afirmar que João é inteligente; que João possui inteligência e, finalmente, que João fez aquela pergunta por causa da sua inteligência. A inteligência é a causadora da pergunta inteligente de João, assim como o conhecimento ' O que lovarla írlptochK) & TripKxhio (2004) a «flrmurqua ■ FKoaofla da mente behaviorttta é expressa na propoelçAo: "Te conheço". Que oAo detxa de mmMTMxJmnUtdoru

Sobrr Comportamento c CoflniçAo

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seria o responsável por uma ação efetiva no mundo. Em Skinner, Conhecer ó comportarse, seguindo regras ou não. Conseqüentemente, o comportamento não é a expressão de um conhecimento, mas o próprio ato de conhecer: "Nós nâo agimos pondo em uso o conhecimento; nosso conhecimento é açôo, ou polo menos regras para a açâo. Enquanto tal, è poder, como assinalou Francis B aco n ao re je ita r a eacoláatlca o nua ê n fa se no nabar p e lo s a b e r" (S K IN N E R , 1974/1996 121)

Outra consequência dessa definição deve ser destacada. Se a contingência é a relação sujeito-mundo, então o empirismo estaria correto na afirmação de que o conhecimento provém da experiência? Explicitamente criticando Locke, o behaviorista radical não pode aceitar que o contato com o mundo gero conhecimento. Afirmar que este contato produz conhecimento do mundo não explica por que uma pessoa aprende com o mundo, ou por que determinadas experiências produzem uma dada ação do sujeito e outras não. Em resumo, A "experiência" de que o conhecimento deriva consiste nas contingências completas e a explicação da contingência não está no mero contato com o mundo, mas em certas estruturas de relação das quais o analista do comportamento é estudioso. Ató agora, operamos com conceitos vulgares de conhecimento. O epistemólogo poderia afirmar, então, que não é desse uso corriqueiro do tormo conhecimento que a epistemologia trata. No entanto, em Skinner, tais conceitos vulgares são os alicerces para o entendimento da possibilidade do Conhecimento verdadeiro e justificado que pormeia a Epistemologia. Em última análise, os diversos tipos de conhecimento, seja o conhecimento de um cachorro ao latir, o conhecimento de um pescador ao afirmar "existem peixes no lago” ou o conhecimento de um filósofo ao afirmar "não conhecemos" são frutos da sua relação com o mundo natural. Ató mesmo a diferença entre o físico e o social se perde no esforço de devolver o homem a natureza, mas não se perde que cada um desses casos apresenta especificidades e complexidades diferentes: operam na mesma realidade, mas de diversos modos. São frutos de contingências, mas de diferentes tipos de contingências. São as diferentes qualidades de contingências que operam no indivíduo que possibilitam que o conhecimento mundano seja diferente do conhecimonto cientifico e, sobretudo, que a diferença não constitua um valor moral: o conhecimento mundano não ó melhor que o conhecimento cientifico, ambos fazem parte do escopo do humano, do natural. Mas o cótico náo poderia deixar de incomodar; "então nào existe conhecimonto enquanto uma crença verdadeira justificada, só existe a ação do sujeito, fruto de suas relações pessoais com o mundo - a objetividade se perde". Há a sombra de um subjetivismo opistemológico em Skinner. A resposta skinneriana é topograficamente simples, mas excede o quo um argumento simples pode conter. A ciência não pode escapar do humano ou mesmo propor algo que nào parta da ação humana. É certo que "Só uma pessoa viva conhece a Ciência no sentido de agir sobre seu controle em relação a natureza" (SKINNER, 1974/1996: 125), mas a objetividade não depende do ideal platônico“, depende sim da natureza do que ó essencialmente humano: da linguagem. Segue-se o aparentemente misterioso trecho skinneriano: "O conhecimento é subjetivo no sentido trivial de ser o comportamento de um sujeito, mas o ambiente, presente ou passado, que determina o comportamento, está fora desse sujeito" (SKINNER, 1974/1996:125). • Fmlxjfn »MMMxtinlhe rnuitn ho Iduol prtjpotitej pof DtirVhetni (2003)

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(latfo Alfredo il.i Silv.i f erreira

Este trecho apresenta alguma necessidade de reflexão demorada. Sua leitura descontextualizada informa ao leitor que a resposta behaviorista á sombra subjetivista ò um apelo a realidade. Em outros termos, subjetividade é trivial porque a estimulação está lá (no mundo real) o causa o que os sujeitos conhecem, Isso é realismo metafísico, e é indefensável no texto skinnoriano (ABIB, 2001a). São trechos como este que deixam clara a dupla rosponsabilidado de um epistemólogo: saber sobre a teoria cientifica que questiona o sabor sobro o debate epistemológico (ABIB, 1996). Não ó viável uma leitura ofetiva deste capitulo sem que estes dois fundamentos estejam lançados. Skinner, neste momento, está em um diálogo claro com a epistemologia contemporânea e suas questões com o Psicologismo. Não são questionamentos tão recentes, mas autores Importantes para a epistemologia como Popper e Davidson se posicionaram firmemente nesta questão. Skinner (1974/1996) segue uma posição semelhante ao argumonto Davidsoniano: “aunque la sensación desempefla un papel crucial en el proceso causal que conecta las creenclas cort el mundo, es un error pensar que desompefia un papel «pistemológico en la determinaclôn de los conlenidos de dlchas creenclas'' (DAVIDSON, 1992:62)

Preocupar-se com um objetivismo epistemológico a partir da porcepçáo do sujeito é preocupar-se com o representacionismo. Em Skinnor, como om Davidson, não há nada para ser representado e é trivial afirmar que qualquer conhecimento ó produzido a partir do sujeito, do natural. Não ó trivial para a Psicologia, mas Skinnor não está fazendo Psicologia nessa discussão, está se propondo a uma reflexão epistemológica e, por essa razão, pode se dar ao contra-intuitivo argumento de rologar a percepção a outra discussão. O "ambiento, presente ou passado, que determina o comportamento" (SKINNER, 1974/1996:125) se refere as condições de significação de urna crença sobre algo e não a um mundo real que justifica empiricamente nossas crenças. No parágrafo seguinte, Skinner esclarece a natureza do "ambiente" a que se refere: “Mas se ao analisar o mundo em seu redor, e se, em resultado dessa análise, estabelecer fatos ou leis que tornem possível a outras pessoas responderem efetivamente sem terem sido pessoalmente expostas a esse mundo, então o cientista produz algo em que ole própno nâo está mais envolvido. Quando muitos outros cientistas chegam aos mesmos fatos ou leis, qualquer contribuição ou participação pessoal se reduz ao mínimo" (SKINNER, 1974/1996:125)

Não há subjotivismo epistomológico em Skinnor. Epistemologia e Psicologia dialogam, mas uma nâo se reduz a outra. Há o diálogo, mas não há a redução. A natureza do comportamento verbal em Skinnor não permito uma intorprotação ropresontacionista do conhecimento e, conseqüentemente, não permite um subjotivismo fundado om uma tooria da percepção. As condições de significação da comunidade verbal selecionam" o conhocimonto o este conhecimento selecionado não podo ser chamado subjetivo, porque a seleção não ó do indivíduo, e sim das contingências sociais. A objetividade parte da comunicação. Um filósofo ou cientista isolado om um claustro ou om um Dopartamonto, ou mesmo em sua própria teoria, não produz conhecimento - o conhocimonto ó comunicativo, é ação e, como tal, depende da rotroalimontação característica da contingência. Não é curioso que uma argumentação tão pontual da tooria skinneriana se rosolva na primoira fraso de um livro escrito em 1957? • O UmiK) “imlocKHmr" rijoí «wtik mtrxlo uwKtooin mhi Mtntkto *cntoo NAoconio um« m*ivAc> |>nrn um «mpfttgo, pof exempla é Intmidorml d HiKUtmHÜ/rtdii, rim* iniui MitoçAo (xtatt mfuri^KtuH» (V>unM (M a oomunklndo vnrtiwl
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