01 Vitruvius

September 11, 2017 | Author: Tiago de Souza | Category: Pop Culture, Knowledge, Geometry, String Instruments, Science
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Vitrúvio - Os Dez Livros Sobre Arquitetura Livro 1 (Capítulo I) A educação do arquiteto 1. O arquiteto deve ser dotado com o conhecimento de muitos ramos do saber e variados tipos de aprendizados, pois é por seu julgamento que todo trabalho feito nas outras artes é colocado a teste. Este conhecimento nasce da prática e da teoria. Prática é o exercício contínuo e regular de atividades em que trabalhos concretos são feitos com quaisquer materiais necessários e de acordo com os projetos devidamente representados. Teoria, por outro lado, é a habilidade de demonstrar e explicar aquela hábil produção feita segundo os princípios das proporções.

Vitrúvio - Os Dez Livros Sobre Arquitetura Livro 1 (Capítulo I) A educação do arquiteto

2. Segue-se, portanto, que aqueles arquitetos que se esforçaram em adquirir habilidades práticas ou manuais sem uma adequada preparação teórica nunca se tornaram capazes de atingir posições de autoridade correspondente a seus esforços, enquanto aqueles que se apoiaram apenas em teorias e na erudição estiveram obviamente caçando sombras sem atinar com a substância de seu ofício. Mas aqueles que conseguiram um completo domínio da teoria e da prática, como homens guarnecidos por todos os lados rapidamente atingiram seus objetivos e detiveram consigo a autoridade de seu ofício.

Vitrúvio - Os Dez Livros Sobre Arquitetura Livro 1 (Capítulo I) A educação do arquiteto 3. Em todos os assuntos, mas especialmente na arquitetura, devem-se considerar dois aspectos: a coisa significada, e aquilo que dá à coisa a sua significância. Aquilo que é significado é o objeto do qual nós falamos no momento; e aquilo que lhe dá significância é uma demonstração baseada em princípios científicos. É aparente que, aquele que se acredita arquiteto, deva ser bem preparado nessas duas direções. Ele deve, portanto, ser tão naturalmente dotado quanto aberto ao aprendizado. Nem a habilidade natural sem adequada instrução, nem a instrução desprovida de habilidade natural conseguem perfazer o artista perfeito. Que o arquiteto seja educado, que seja habilidoso com o traço, instruído em geometria, que conheça muito bem a história, que haja aprendido com os filósofos de forma atenta, que entenda música, que tenha algum conhecimento de medicina, que conheça as opiniões dos juristas, que seja familiar com a astronomia e com a teoria dos céus.

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4. Saibamos as razões para tudo isso. O arquiteto deve ser um homem educado de modo a deixar a mais duradoura herança em seus tratados. Em segundo lugar, ele deve ter tal conhecimento do desenho de modo a rapidamente representar as obras que projeta. A geometria, também é de grande auxílio em arquitetura, ensinando em particular o uso da régua e do compasso o que nos faz hábeis no desenvolvimento de projetos para edifícios desde suas fundações, e corretamente aplicar o esquadro, o nível e o prumo. Pelo conhecimento da óptica a luz nos edifícios pode ser representada a partir de quaisquer pontos da cúpula celeste. É verdadeiro que através da aritmética o custo total dos edifícios é calculado e são computadas as suas medidas, mas as difíceis questões envolvendo simetria são solucionadas por meio das teorias e métodos da geometria.

Vitrúvio - Os Dez Livros Sobre Arquitetura Livro 1 (Capítulo I) A educação do arquiteto 5. Um amplo conhecimento de história é requerido, pois, dentre os elementos ornamentais da obra elaborados pelo arquiteto, muitas são aqueles cujo emprego deva ser justificado frente a questionamentos por sua escolha. Por exemplo, suponha-se que decida substituir as colunas por aquelas estátuas de mulheres em longas túnicas, chamadas cariátides, com suas cestas e coroas colocadas diretamente sobre suas cabeças; nesse caso, ele deve dar a seguinte explicação aos que questionarem sua decisão: Caryae uma cidade do Peloponeso, aliou-se aos persas contra os gregos. Logo depois, os gregos tendo gloriosamente conquistado sua liberdade pela vitória na guerra, decidiram tomar Caryae. Eles conquistaram a cidade, mataram todos os seus homens, arrasando o seu sítio, e levando as suas mulheres como escravas - sem permitir contudo que elas tirassem as suas longas túnicas e as outras marcas de sua condição de senhoras, casadas. Desse modo, elas foram obrigadas não apenas a marchar no retorno do triunfo grego mas também a figurar como um novo tipo de escravidão, agravado pelo peso de sua vergonha e pela desonra de sua cidade. Desde então, os arquitetos daquele tempo passaram a colocar em edifícios públicos estátuas daquelas mulheres, carregando o peso das arquitraves em suas cabeças, de modo a que a culpa e a punição do povo de Caryae fosse conhecido e divulgado a toda a posteridade.

Vitrúvio - Os Dez Livros Sobre Arquitetura Livro 1 (Capítulo I) A educação do arquiteto 6. O mesmo ocorreu com os lacedemonianos sob a liderança de Pausanias de Agesipolis, depois de baterem os exércitos persas, infinitos em número, com um pequeno contingente na batalha Platea, celebrando seu glorioso triunfo com o rico espólio do adversário. Com o dinheiro obtido de sua venda, construiram o Pórtico Persa, como monumento ao renome e valor lacedemoniano e um troféu de vitória para a sua posteridade. Nesse pórtico, representaram em relevo os prisioneiros, vestidos em seus costumes bárbaros, sendo arrastados na direção do teto, mostrando como sua arrogância fora devidamente punida, e que os inimigos dos lacedemonianos deveriam temer pelos feitos de sua coragem; seu próprio povo, ao contemplar essa demonstração de seu valor, encorajando por sua própria glória, deveria estar sempre prestes a defender sua independência. Então, a partir dessa época em muitas obras se colocou estátuas de persas substituindo as colunas, suportando pesadas entablaturas e seus ornamentos - motivo arquitetônico que muito enriqueceu a diversidade de seus trabalhos. Há ainda outras histórias do mesmo tipo, que os arquitetos devem conhecer.

Vitrúvio - Os Dez Livros Sobre Arquitetura Livro 1 (Capítulo I) A educação do arquiteto 7. Também a filosofia deve elevar o espírito do arquiteto, tornando-o menos pretensioso, mas fazendo-o mais cortês, justo e honesto, sem ser avaro. Isto é muito importante, pois nenhum trabalho pode ser corretamente feito sem honestidade e incorruptibilidade. Que o arquiteto não seja ganancioso nem se torne interessado pelas vantagens de receber propinas mas que com dignidade mantenha a sua posição, conquistando uma boa reputação. Estes estão entre os preceitos da filosofia. Além disso, a filosofia trata da física (em grego fusiologia), onde um conhecimento mais cuidadoso é necessário dado que os problemas tratados nesse assunto são numerosos e de diversos tipos; como no caso, por exemplo, do abastecimento de água. Pois, nos pontos de tomada de água, nas curvas, e nos lugares onde a água é elevada em nível, correntes de ar formam-se naturalmente em uma ou outra direção; e ninguém que não tenha aprendido os princípios fundamentais de física desde a filosofia será capaz de precaver-se contra os danos que tais correntes podem provocar. Assim, o leitor de Ctesibius ou Arquimedes e os outros autores de tratados do mesmo tipo, não será capaz de apreciá-los a não ser que tenha sido educado nesses assuntos pelos filósofos.

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8. O arquiteto também deve conhecer a música, e compreendê-la de modo a dominar a teoria matemática e canônica e além disso ser capaz de afinar as ballistae, as catapultae e os scorpiones, como se fossem instrumentos musicais, na escala certa. Também à direita e à esquerda de suas vigas estão os furos em suas estruturas através dos quais as cordas entrançadas são esticadas por meio de roldanas e barras, sendo que tais cordas não podem ser fixadas e apertadas até que produzam a correta nota sonora, somente audível aos ouvidos do habilidoso profissional; pois os braços do aparelho acionados por essas entrançadas cordas devem, ao ser liberadas, atingir a peça de artilharia juntos e ao mesmo tempo. Caso não o façam em simultaneidade, não se conseguirá uma trajetória previsível dos projéteis.

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9.Também nos teatros são utilizados vasos de bronze (em grego hceia), que são colocados em nichos sob as cadeiras, de acordo com a modulação de intervalos musicais, a partir de princípios matemáticos. Esses vasos são arranjados buscando a harmonia musical, e proporcionados com relação ao compasso de uma quarta, uma quinta, uma oitava, e assim por diante, até que se atinja a dupla oitava, de uma tal maneira que, quando a voz de um ator se posta em uníssono com qualquer dessas alturas, seu poder é ampliado, e ela alcançará os ouvidos da audiência com muito maior clareza e doçura. Órgãos hidráulicos e outros instrumentos assemelhados também não podem ser construídos por aqueles que não sejam familiarizados com os princípios da música.

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10. O arquiteto também deve ter conhecimento dos estudos da medicina, ao considerar questões relacionadas ao clima (do grego klimata), ao ar, à salubridade e à insalubridade dos sítios, e ao uso de diferentes águas. Pois, sem essas considerações, a higiene de um edifício não pode ser assegurada. O mesmo se dá com relação aos princípios legais que o arquiteto deve conhecer, como os que se aplicam aos edifícios que possuem paredes comuns, com respeito ao derramamento de água desde calhas ou gárgulas, bem como as leis sobre esgotos, drenos, janelas e suprimento de água. E outras coisas desta sorte devem ser conhecidas pelos arquitetos de modo que, antes de começarem a construir devem ser cuidadosos ao não deixarem pontos omissos ou lapsos a serem resolvidos com os proprietários após a conclusão das obras, e de modo a que, na definição dos contratos de obras, os interesses do contratante, do contratado e seus empregados sejam sabiamente resguardados.

Vitrúvio - Os Dez Livros Sobre Arquitetura Livro 1 (Capítulo I) A educação do arquiteto

Vitrúvio - Os Dez Livros Sobre Arquitetura Livro 1 (Capítulo I) A educação do arquiteto Se um contrato é bem definido todas as partes obterão benefícios, umas das outras, sem desvantagens. Com a ajuda da astronomia nós achamos as direções leste, oeste, sul e norte, bem como conhecemos a teoria dos céus, os equinócios, os solstícios e as trajetórias das estrelas. Aquele que não detenha conhecimento destas matérias de modo algum compreenderá a teoria dos relógios de sol.

11. Conseqüentemente, dado que estes estudos são tão vastos em sua extensão, tão enriquecidos e tornados atrativos com tantos diferentes tipos de aprendizado, que eu penso que ninguém tem o direito de se dizer, de súbito, arquiteto, sem ter escalado desde sua juventude os degraus destes estudos, e então, nutrido pelo conhecimento das artes e ciências, ter alcançado as elevações do sagrado solo da arquitetura.

Grupo 6Hellen, Isabela, Maísa, Yasmine

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12. Talvez, para as pessoas inexperientes, pareça fabuloso que a natureza humana possa compreender um tal extraordinário número de estudos, e ainda mantê-los na memória. Ainda assim, a observação de que todos os estudos possuem vínculos comuns de união e associação uns com os outros, levará à compreensão de que possam ser facilmente dominados. Pois uma educação liberal forma um corpo comum, feito desses membros. Aqueles, portanto, que desde a juventude recebem sua instrução nas várias formas de conhecimento, reconhecem o mesmo caráter em todas as artes, e uma associação entre todos os estudos, podendo ainda mais prontamente compreendê-los todos. Isso é o que levou um dos antigos arquitetos, Pytheos, o celebrado construtor do templo de Minerva em Priene, a dizer em seus Comentários que um arquiteto deveria ser capaz de compreender muito mais em todas as artes e ciências que os homens que, por seus tipos particulares de trabalho, por sua prática, levaram suas delimitadas obras à mais elevada perfeição. Contudo, na realidade, isso não acontece.

Templo de Minerva

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13. Pois um arquiteto não pode pretender ser, nem pode realmente ser, um filólogo como o foi Aristarchus, embora não possa ser iletrado; nem um músico como Aristoxenus, embora não possa ser completamente ignorante da música; nem um pintor como Apelles, embora não possa ser inábil no desenho; nem um escultor como o foi Myron ou Polyclitus, embora não possa ser pouco familiarizado com as artes plásticas; nem tampouco um médico como Hippocrates, embora não possa ser ignorante da medicina; nem em cada uma das outras ciências deva ser proficiente, embora ele não possa ser ignorante delas. Pois, em meio a toda essa grande variedade de assuntos, um indivíduo não pode atingir a perfeição em cada em deles, porque dificilmente estará em seu poder compreender e dominar suas teorias gerais.

Habilidades de um arquiteto

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14. Da mesma forma não apenas os arquitetos são impedidos de alcançar a perfeição em todos os assuntos, mas mesmo os homens que individualmente praticam especialidades nas artes não atingem o mais elevado ponto de mérito. Se, dentre os artistas que trabalham em um singelo campo das artes, muito poucos em toda uma geração adquirem fama - e ainda assim com grande dificuldade - , como pode um arquiteto, que deve ser competente em muitas artes, atingir não apenas o feito (que, em si, é uma grande maravilha) de não ser deficiente em nenhuma delas, mas ainda ultrapassar todos aqueles artistas que se devotaram com enorme esforço a determinadas artes?

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15. Fica a parecer, então, que Pytheos cometeu um erro ao não observar que as artes são compostas de duas partes: o trabalho realizado e a sua teoria. Uma dessas partes, o fazer do trabalho, é própria dos homens treinados em assunto específico, enquanto a outra, a teoria, é comum a todos os estudiosos. Por exemplo, para os médicos e para os músicos é comum o rítmico batimento do pulso e a métrica de seu movimento. Mas, havendo uma ferida a ser tratada ou um homem doente a ser salvo do perigo, ninguém chamará um músico, pois o trabalho será apropriado ao médico. Assim também no caso de um instrumento musical, não será o médico mas o músico, o homem a ser chamado a afiná-lo de modo a que os ouvidos encontrem o devido prazer em seus sons.

O Templo de Athena em Priene, construído em 350 antes de Cristo, pelo arquiteto romano Pytheos no estilo Ionic.

Vitrúvio - Os Dez Livros Sobre Arquitetura Livro 1 (Capítulo I) A educação do arquiteto 16. Também os astrônomos possuem um campo comum de discussão com os músicos, na harmonia das estrelas e nas concórdias musicais nas tétrades e tríades das quartas e das quintas, e com os geômetras nos assuntos da visão (em grego logoζ optikoζ); e em todas as outras ciências muitos pontos, talvez todos, são comuns, até onde sua discussão seja cabível. Mas a efetiva realização de trabalhos que são levados à perfeição pelas mãos é função daqueles que foram especialmente treinados para lidar com uma das artes. Parece-me que esse artista faz o que é suficiente com sua arte, poupando aquele que em cada assunto possui um amplo conhecimento de suas partes, de seus princípios, sobretudo aqueles que são indispensáveis para a arquitetura; se este último for requerido para julgar e para expressar sua aprovação no caso desses assuntos ou artes, não será encontrado à nossa disposição. Assim é para os homens sobre os quais a natureza depositou tanta inteligência, agudeza e memória, que eles são capazes de portar um completo conhecimento da geometria, da astronomia, da música, e das outras artes, indo além da função de arquitetos, e tornando-se puros matemáticos. Eles podem até mesmo tomar posições críticas às artes pois muitas são as armas artísticas de que estão guarnecidos. Tais homens, no entanto, são raramente encontrados, ainda que existam de tempos em tempos; por exemplo, Aristarchus de Samos, Philolaus e Archytas de Tarentum, Apollonius de Perga, Eratosthenes de Cyrene, e entre os sábios de Siracusa, Archimedes e Scopinas, que através da matemática e da filosofia natural, descobriram, expuseram e legaram muitos conhecimentos sobre a mecânica e sobre os relógios de sol.

Heliocêntrico Astrolábio

Teoria de Aristarco

Estrela Pitagórica

Vitrúvio - Os Dez Livros Sobre Arquitetura Livro 1 (Capítulo I) A educação do arquiteto

Arquimedes

Duplicação cubo Arquitas

Eratóstenes circunferência da terra pela teoria das sombras Hipérbole e Espiral de Apolônio

Vitrúvio - Os Dez Livros Sobre Arquitetura Livro 1 (Capítulo I) A educação do arquiteto 17. Dado que, a posse de tais talentos devidos à capacidade natural não é distribuída aleatoriamente às populações de quaisquer nações, mas somente a poucos grandes homens; dado que, acima de tudo, a função do arquiteto requer treinamento em todos os aspectos do conhecimento; e dado que a razão, considerando-se a ampla extensão desses assuntos, impõe que ele deva possuir nem o mais elevado, nem mesmo um moderado conhecimento das artes e ciências, eu requeiro, Caesar, tanto de vós quanto daqueles que venham a ler esses livros que se algo for aqui escrito com pouca atenção às normas gramaticais, que me seja perdoado. Pois não foi como um grande filósofo, nem como eloqüente retórico, nem como um gramático treinado nos mais elevados princípios de sua arte, que me lancei a escrever esta obra, mas como um arquiteto que apenas mergulhou nesses assuntos. Em respeito à eficácia da arte e de suas teorias, eu prometo e espero que nestes volumes, possa indubitavelmente mostrar-me importante não apenas para aqueles que constroem, mas também a todos os estudiosos.

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